Seu nome. Japonesa

Tradução: Virtual Core


Volume Único

Capítulo 2: Começo

Um alarme desconhecido.

Esse pensamento passou pela minha cabeça ainda adormecida. Um despertador? Mas ainda estou com sono. Ontem à noite, eu fiquei tão concentrado no meu desenho que acabei não indo para a cama até o amanhecer.

— ...kun ...Taki-kun.

Agora, alguém estava chamando meu nome. Uma voz de garota... uma garota?

— Taki-kun. Taki-kun.

A voz tinha um tom de urgência, como se seu dono estivesse prestes a chorar. A voz tremeu, como o solitário brilho de uma estrela distante.

— Você não... se lembra de mim? — A voz perguntou incerta.

Eu não te conheço.

De repente, o trem parou e as portas se abriram. Oh, isso mesmo, eu estava andando de trem. No momento em que me lembrei disso, percebi que estava em um vagão cheio de gente. Na frente dos meus olhos havia outro par de olhos, de uma garota, me encarando abertamente. À medida que os passageiros saíam do trem, sua figura de uniforme escolar foi empurrada cada vez mais para longe de mim.

— Meu nome... é Mitsuha! — ela gritou, então desfez o laço amarrando seu cabelo e o estendeu para mim.

Instintivamente, estendi a mão. A fita era de um laranja vívido, como os raios do sol ao entardecer brilhando no vagão escuro de um trem. Eu empurrei meu corpo na multidão e agarrei firme.

E então, eu acordei.

Os ecos da voz da garota ainda vagavam lentamente no meu tímpano.

...nome ...Mitsuha?

Um nome desconhecido, e uma garota estranha que veste um uniforme escolar desconhecido. Parecia tão desesperada. Eu me lembro do olhar em seus olhos bem antes das lágrimas começarem a cair. Era uma expressão séria e solene, como se agarrasse o destino do universo em suas mãos delicadas.

Mas, bem, era apenas um sonho. Um sonho sem sentido. Eu já não consigo me lembrar com clareza de como seu rosto parecia. Os ecos em meus ouvidos também desapareceram.

Mas ainda assim.

Ainda assim, meu coração está acelerado. Meu peito se sente estranhamente pesado. Meu corpo está coberto de suor. Para me acalmar, respiro fundo.

— ...?

Peguei um resfriado? Algo está errado com meu nariz e garganta. Minha traqueia está um pouco mais estreita do que o normal. Meu peito se sente estranhamente pesado. Tipo, fisicamente pesado. Olho para o meu corpo e vejo meu decote. Meu decote.

— ...?

O sol da manhã se refletia naquelas protuberâncias, fazendo com que a pele branca e lisa brilhasse. Entre os dois seios, havia uma sombra profunda, como um lago azul no vale entre duas montanhas.

Bem, acho que vou tocá-los, eu pensei de repente. A ideia surgiu de forma tão natural e automática, assim como uma maçã cai no chão pela força da gravidade.

......

...

...?

...!

Fiquei impressionado. Oooh, eu pensei. O que é isso? Levando a sério, continuei a acariciá-los. Era... como posso dizer... os corpos das garotas são surpreendentes...

— ...onee-chan? O que você está fazendo?

Rapidamente me viro em direção à voz, vejo uma menina pequena ao lado da porta aberta. Enquanto ainda movia minhas mãos, falei honestamente.

— Oh, você sabe, eu estava apenas testando como é essa sensação... eh?

Olhei de novo para a garota: atrevida, por volta dos dez anos, de maria chiquinha e olhos oblíquos.

— ...onee-chan? — Eu perguntei à criança, apontando para mim. Isso significa que... essa garota é minha irmãzinha?

— O que você está fazendo? Levanta! Rápido que é hora de comer! — A menina disse com uma expressão de desgosto, em seguida, bateu a porta.

Enquanto pensava que ela parecia uma criança muito violenta, eu me levantei do futon¹. Agora que a garota mencionou o café da manhã, percebo que estou com fome. De repente, vejo uma cômoda pelo canto do olho.

Depois de caminhar alguns passos no tatame, eu estava em frente ao espelho. Tirei o pijama que caiu no chão, me deixando nua, e comecei a olhar fixamente para o corpo refletido no espelho.

Longos cabelos pretos como uma corrente de água, com fios soltos em vários lugares após uma noite de sono. Em uma pequeno rosto redondo, grandes olhos curiosos e lábios que pareciam um pouco alegres. Um pescoço fino e profundas lacunas acima das clavículas. Uma protuberância saudável no peito. As curvas suaves do estômago e dos quadris, que se estendem por baixo da sombra da caixa torácica levemente saliente.

Eu nunca tinha visto em primeira pessoa, mas sem dúvidas era o corpo de uma mulher.

Uma mulher?

Eu sou... uma mulher?

De repente, meu corpo, que estava sonolento desde que acordei, despertou completamente.

Em um instante, minha cabeça estava clara, e em seguida, caiu em confusão.

E então, incapaz de aguentar, eu gritei.

✧ ✧ ✧

— Onee-chan, você está atrasada!

Quando eu abri a porta e entrei na sala de estar, Yotsuha me confrontou com aquele tom agressivo dela.

— Amanhã eu preparo o café! — disse como um pedido de desculpas.

Esta criança tem o mau hábito de pensar que ela é mais confiável e crescida do que sua irmã mais velha, apesar do fato de que nem todos os seus dentes de leite tenham caído. Não devo mostrar qualquer fraqueza pedindo desculpas! Pensei quando abri a panela de arroz e empilhei os grãos frescos em minha tigela. Ah, eu peguei muito? Meh, que seja.

Itadakimaasu².

Depois de derramar bastante molho no meu ovo frito, coloquei um pedaço na minha boca junto com um pouco de arroz.

Aaah, delicioso. Talvez esta seja a verdadeira felicidade... hm? Sinto um par de olhos me observando.

— Você está normal hoje?

— Eh?

Olhei e notei que a vovó estava olhando para mim mastigando o arroz.

— Ontem estava muito estranha! — Yotsuha, também olhava para mim, falando com um sorriso. — De repente gritando, coisas assim...

Gritando? A vovó continuou a me olhar como se estivesse inspecionando cuidadosamente um objeto desconhecido, Yotsuha continuou a zombar de mim com aquele sorriso.

— Hã? O quê, o quê? O que é isso!?

O que está acontecendo... as duas agindo assustadoramente e tudo-

Ping pong pang pooong.

O alto-falante perto da porta tocou com um estalo súbito, quase violentamente alto.

< Bom dia a todos. >

A voz pertencia à irmã mais velha da minha melhor amiga Saya-chin, que trabalha no departamento de vida comunitária na prefeitura. Aqui na aldeia sonolenta de Itomori, a população é de cerca de 1500, a maioria das pessoas se conhecem ou pelo menos são conhecidos de conhecidos.

< Aqui estão os anúncios da manhã. >

Alto-falantes como estes são instalados ao longo da cidade também, assim que a transmissão soa pelas montanhas próximas, cria-se um tipo de eco quando os sons se acumulam uns sobre os outros. Duas vezes por dia, de manhã e à noite, sem falhas, esta transmissão no sistema wireless de alerta de desastre pode ser ouvida em cada casa e cada rua da cidade, anunciando coisas como a programação de esportes para o dia, ou quem é o responsável por retirar a neve, ou quem nasceu ontem e de quem é o funeral de hoje.

< Primeiro, um anúncio do Comitê de Administração Eleitoral sobre a eleição de prefeito de Itomori a ser realizada no dia 20 do próximo mês — >

O alto-falante perto da porta abruptamente ficou em silêncio. Como ela não conseguia alcançar o alto-falante, vovó, com mais de oitenta anos e sempre usando um kimono antiquado, simplesmente o desconectou em uma silenciosa exibição de raiva. Ligeiramente impressionada, eu agarrei o controle remoto e liguei a TV. Uma apresentadora sorridente da NHK começou a falar no lugar da irmã de Saya-chin.

“Em apenas um mês, um cometa que só visita a Terra uma vez a cada 1200 anos vai finalmente se aproximar novamente. Será visível a olho nu por alguns dias. As agências de pesquisa em todo o mundo, incluindo a JAXA, estão ocupadas se preparando para observar o show celestial do século.”

Na tela estavam as palavras “Cometa de Tiamat: Observável a olho nu em um mês” e uma imagem embaçada de um cometa. Eventualmente nossa conversa parou, restando apenas o som de nós três comendo, um sussurro silencioso como o trocado durante as aulas, se misturando com a transmissão da NHK.

— ...dê um jeito e se decida logo, ok? — Yotsuha ordenou de repente.

— Isso é problema de quem já cresceu! — Respondi. Isso mesmo, é um problema de adulto. Eleição municipal? Não me venha com essa porcaria.

Pii-hyororo. Em algum lugar ao longe, um milhafre³ negro cantava preguiçosamente.

“Até mais!” Yotsuha e eu sincronizamos nossas vozes, dizendo adeus à vovó antes de sairmos.

O canto dos pássaros montanheses do verão soava alto por todo lugar enquanto caminhávamos pelo estreito caminho de asfalto que corria ao longo da encosta. Depois de descer alguns degraus de pedra, perdemos a proteção das sombras das montanhas, e os raios do sol começaram a bater diretamente em nós.

Se espalhando à vista estava um lago redondo, Lago Itomori. A superfície calma da água, refletindo a luz do sol da manhã, brilhava implacavelmente. Acima das montanhas, que se desenrolavam em uma cadeia irregular de verde escuro, o céu azul manchado de nuvens brancas, surgiu. Perto de mim, uma moça, ostentando maria chiquinhas e uma mochila vermelha, pulava sem nenhuma razão em particular. E então eu estava lá, a garota do colégio com pernas deslumbrantes. Experimentei tocar uma música de corrida de trilha sonora na minha cabeça. Ooh, agora isso se parece um pouco com a abertura de um filme japonês. Em outras palavras, vivemos no meio do nada, em uma cidade rural com aquele estilo japonês que já saiu da moda.

— Miitsuhaaa!

Algum tempo depois que me separei da Yotsuha na frente da escola primária, uma voz me chamou pelas costas. Me virando, vi Tesshi pedalando em sua bicicleta com um rosto desagradável, e uma sorridente Saya-chin sentado casualmente no bagageiro.

— Anda logo e cai fora — Tesshi reclamou.

— Tudo bem, seu estraga prazer.

— Você é pesada.

— Ei, seu rude!

Os dois pareciam estar começando a manhã como comediantes, tipo um casal discutindo em programa de TV.

— Vocês dois são muito próximos.

— Não! — Os dois gritaram em harmonia.

Eu comecei a rir com essa negação sincronizada, minha música interna mudando para um solo de guitarra melódico. Nós três já somos melhores amigos há dez anos: eu, a pequena Saya-chin, com os dentes retos na frente e as tranças penduradas na parte de trás, e o esguio Tesshi com o seu penteado fora de moda. Saya-chin e Tesshi parecem sempre estar discutindo, mas suas conversas fluem perfeitamente, e, secretamente, estou convencida de que dariam um bom casal.

— Hey Mitsuha, seu cabelo está normal hoje. — Saya-chin disse com um sorriso ao tocar a minha fita de cabelo.

Eu sempre uso o mesmo penteado, aprendi há muito tempo com a vovó: uma trança tripla francesa com a fita se enrolando em torno dela e amarrada atrás da minha cabeça.

— Meu cabelo? O que você quis dizer?

Me lembrei da conversa misteriosa desta manhã. Você está normal hoje? Primeiro a vovó e agora Saya-chin... eu estava agindo estranho ontem ou algo assim? Quando tentei lembrar o que aconteceu ontem...

— Eh, você pediu para sua avó te exorcizar? — Tesshi perguntou com um rosto preocupado.

— Exorcizar?

— Você definitivamente estava possuída por um espírito de raposa!

— O quê?

Enquanto lutava para acompanhar as súbitas acusações de Tesshi, Saya-chin me deu cobertura com um rosto revoltado.

— Você sempre tenta esconder tudo! Mitsuha, provavelmente está realmente estressada, não é?

Estresse?

— Eh? E-espere um segundo, sobre o que vocês estão falando?

Por que todo mundo está tão preocupado comigo? Ontem... Eu realmente não consigo lembrar o que aconteceu, mas deveria ter sido apenas um dia normal, não um agitado.

— Hã?

Tenho certeza disso? Ontem eu

— E o mais importante! — Uma voz profunda, amplificada por um megafone, interrompeu meus pensamentos.

Do outro lado da rua, ao lado de uma fileira de estufas, na área desnecessariamente grande da cidade, havia uma multidão reunida de aproximadamente uma dúzia de pessoas. E, no meio da multidão, um homem proeminentemente alto segurava um megafone: meu pai. Na faixa que ele usava sobre de seu terno exibia orgulhosamente as palavras “Encarregado - Miyamizu Toshiki”. Ele parecia estar dando um discurso para a eleição de prefeito.

— Mais importante que qualquer coisa, para continuar a construir e melhorar a nossa comunidade, temos de estabilizar as nossas questões financeiras! Assim que conseguirmos isso, poderemos nos concentrar totalmente na segurança e no conforto de nossa cidade. Durante meus anos no cargo, fui capaz de chegar até aqui, mas quero terminar o trabalho e dar ainda mais polimento para esta cidade! Vou liderar esta terra com uma paixão sem precedentes e construir uma sociedade na qual todos, desde crianças até idosos, possam viver uma vida plena e sem preocupações! Essa é a minha missão...

Seu discurso, feito com tanta habilidade que era quase irresistível, me lembrou dos políticos na TV e me senti extremamente deslocada naquele estacionamento cercado por vegetação. Comecei a me sentir desconfortável. Os sussurros que ouvi entre o público pioraram ainda mais o meu humor. De qualquer forma vai dar Miyamizu de novo. Parece que sua palavra se espalha muito rápido.

— Ei, Miyamizu.

— …bom dia.

Isso é ainda pior. Um grupo de três colegas, que eu particularmente não gosto, vieram falar comigo. Essas pessoas, que pertencem à classe alta e nobre no topo da hierarquia, nos incomodam, os que pertencem à classe comum, em todas as chances que têm.

— O prefeito e seu contratante — um deles disse, então se virou para olhar o meu pai fazendo seu discurso. Ao lado dele na plataforma, o pai de Tesshi estava com um grande sorriso em seu rosto. Sua jaqueta exibia o nome de sua própria empresa de construção, e em torno do seu braço estava uma faixa onde se lia “Apoio Miyamizu Toshiki”. O garoto então se virou para olhar para mim e Tesshi. “Vejo que os filhos também estão sempre juntos. Os seus pais mandaram?”

Estúpido. Sem me incomodar em responder, comecei a andar mais rápido. Tesshi também conseguiu manter um rosto inexpressivo. Saya-chin parecia irritada.

— Mitsuha!

De repente, uma voz alta gritou meu nome. Quase parei de respirar. Não posso acreditar. Meu pai estava me chamando com o megafone. O público ouvindo seu discurso interrompido, de repente se virou para me olhar.

— Mitsuha! Você não está orgulhosa!?

Meu rosto ficou vermelho. De tão absurdo, senti como se fosse chorar. Desesperadamente lutando contra a tentação de fugir, continuei caminhando.

Duro até mesmo com a família... assim que é o prefeito. Ouço os sussurros abafados da plateia.

Ouch! Meio que sinto pena dela. Ouço os meus colegas falando e rindo.

Isso é o pior de tudo.

A música tocando na minha cabeça desde que saí de casa tinha parado no meio da agitação, me lembro que sem qualquer música de fundo, esta cidade não é nada além de um lugar opressivo, sufocante.

✧ ✧ ✧

Ka ka ka. O quadro-negro produziu um ruído enquanto a professora escrevia algo que parecia um tanka .

Ta so kare to 

Ware wo na tohi so 

Nagatsuki no 

Tsuyu ni nuretsutsu 

Kimi matsu ware so 

 Quem é ele?

 Não me faça essa pergunta

 É setembro

 O orvalho me molha

 Enquanto espero o meu amado

 

Tasokare. É daí que vem a palavra tasogaredoki. Vocês sabem o que isso significa, certo? — Yuki-chan-sensei perguntou em sua voz clara, depois escreveu “tasokare” em letras grandes no quadro-negro. — Crepúsculo. Um momento que não é nem dia nem noite. Quando as silhuetas começam a desfocar, e você não consegue mais dizer quem é quem. A hora em que vocês podem encontrar coisas que não são deste mundo, como demônios ou os mortos. É daí que vem a palavra “oumagatoki”. Antigamente, eles também usavam as palavras “karetasodoki” e “kawataredoki.

Yuki-chan-sensei agora rabiscou “karetaso” e “kawatare” no quadro. O que é isso, algum tipo de trocadilho?

— Sensei, pergunta. Não é devia ser “katawaredoki”? — Alguém perguntou, e eu concordei silenciosamente em minha cabeça.

Claro que eu conhecia “tasogaredoki”, mas a outra palavra para o crepúsculo que aprendemos quando crianças era “katawaredoki”.

Ouvindo a pergunta, Yuki-chan-sensei riu suavemente. Esta professora parecia muito bonita para estar trabalhando neste colégio no meio do nada.

— Esse é apenas o dialeto por aqui. Você sabe, às vezes os idosos de Itomori ainda falam como as pessoas que escreveram esses poemas.

Alguém deu continuidade a resposta da professora com uma piada sobre como estamos no meio do nada, e a classe começou a rir. É verdade que às vezes quando ouço a vovó falar eu penso “isso é mesmo japonês?”. Como, ela usa “washi para se referir a si mesma. Eu folheei as páginas do meu caderno enquanto pensava sobre isso, e descobri uma mensagem escrita com letras grandes em uma página que ainda devia estar em branco.

Quem é você?

....Hã? O que é isso? Os sons ao meu redor subitamente ficaram em silêncio, como se tivessem sido sugados pela letra desconhecida em frente aos meus olhos. Esta não era a minha caligrafia. Não emprestei meu caderno a ninguém. O que isto significa?

— ...san. Miyamizu-san!

— Ah, sim? — Eu entrei em pânico e me levantei.

— Por favor, leia a partir da página 98 — Yuki-chan-sensei disse, então, olhando para o meu rosto, ela acrescentou — Miyamizu-san. Fico feliz em ver você se lembrou do próprio nome hoje.

A classe explodiu em gargalhadas. Huuuh? O quê? Sobre o que ela está falando?

✧ ✧ ✧

— ...você não se lembra?

— …não.

— Sério?

— Estou te dizendo que não — eu respondi, então tomei um grande gole de suco de banana. Hum. Saya-chin está me olhando como se eu fosse um objeto estranho.

— Quero dizer... ontem você esqueceu onde se sentava e qual seu armário. Seu cabelo ainda estava bagunçado por causa do sono e não estava amarrado como de costume, seu uniforme não estava com a fita, e você estava de mau humor o tempo todo.

Eu tentei imaginar tudo isso.... Eh?

— Ehhhhh? De jeito nenhum! Sério!?

— Era como se tivesse amnésia.

Completamente confusa neste momento, tentei mais uma vez me lembrar de ontem... algo definitivamente estava estranho. Não me lembro de nada sobre ontem. Espere, não. Posso lembrar vagamente de algumas coisas.

Eu estava... em uma cidade desconhecida?

No espelho estava... um garoto?

Tentei dar sentido aos fragmentos. Um milhafre negro em algum lugar próximo cantava como se zombasse de mim. Pii-hyororo. Agora é hora do almoço, e nós três estamos sentados na esquina do jardim da escola, conversando com caixas de suco na mão.

— Hmm... Eu sinto que tive um sonho muito longo e estranho. Era como... a vida de outra pessoa? Ugh, realmente não me lembro.

— Entendi! — Tesshi exclamou de repente, me fazendo piscar. Ele enfiou uma revista de ocultismo “Mu” em nossos rostos e começou a explicar um pouco excitado. — Deve ser lembranças de sua vida anterior! Bem, vocês provavelmente vão dizer que isso não é científico e tudo mais, então deixe-me dizer de forma diferente. O que provavelmente aconteceu é que seu subconsciente conectado ao multiverso, como descrito na interpretação de muitos mundos em Everett-

— Fica quieto — repreendeu Saya-chin.

— Ah! Foi você quem escreveu no meu caderno!? — Eu gritei acusando Tesshi.

— Hã? Do que você está falando?

Eu acho que não. Bem, Tesshi não é de fazer esse tipo de brincadeira estúpida e ele não tinha nenhum motivo.

— Ah. Nada. Não importa. — Tentei retirar o que eu disse.

— Qual é? Acha que fiz alguma coisa?

Eu disse, deixa para lá.

— Uau, Mitsuha, tão malvada. Você ouve isso Saya-chin? Falsas acusações! Chamem um procurador... ou é um advogado? Que tipo de situação é essa?

— Mas Mitsuha, você estava realmente meio estranha ontem — disse Saya-chin, ignorando completamente as queixas de Tesshi — você não está se sentindo bem ou algo assim?

— Hmm... isso é estranho... talvez seja realmente estresse...

Pensei em todas as provas que ouvi hoje. Tesshi se concentrou mais uma vez em sua revista de ocultismo, como se toda a nossa conversa nunca tivesse acontecido. Esse é um de seus pontos positivos: ele não fica remoendo as coisas.

— Sim, é definitivamente estresse! Tem muita coisa acontecendo recentemente, Mitsuha.

E você diz isso para mim. Não bastava a eleição estúpida de prefeito, esta noite ainda tem a temida cerimônia! Nesta minúscula cidadezinha, como poderia é possível que meu pai seja o prefeito, e minha avó é a sacerdotisa do santuário? Enterrei minha cabeça entre meus joelhos e lamentei alto.

— Ugh, eu só quero me apressar em me formar e me mudar para Tóquio. Estou cansada de ficar presa nesse lugar estúpido!

Compreendendo minhas queixas, Saya-chin acenou com a cabeça repetidamente em acordo.

— Minha família teve três gerações de radialistas de emergência da cidade. As senhoras de idade ao lado me chamaram de “menina broadcast” desde que eu era criança! E agora, por alguma razão, estou no clube de broadcast! Já nem sei o que quero fazer.

— Saya-chin, uma vez que nos formarmos vamos mudar para Tóquio juntas! Nesta cidade, mesmo adultas, a hierarquia do ensino médio vai continuar! Devemos nos libertar deste ciclo! Tesshi, você também vem, certo?

— Hmm? — Tesshi ergueu a cabeça lentamente de sua revista.

— ...você estava pelo menos ouvindo?

— Ah... eu estava pensando em ficar aqui e levar uma vida normal.

Saya-chin e eu suspiramos profundamente. Por isso que ele não consegue uma garota. Bem, eu nunca tive um namorado, mas não é esse o assunto.

Segui o vento que soprava com meus olhos, e isso me levou a uma visão do Lago Itomori, parado, em paz, indiferente aos nossos problemas.

✧ ✧ ✧

Esta cidade não tem loja de livros, não tem dentista, tem apenas um trem a cada duas horas e apenas dois ônibus por dia, não tem sequer uma previsão do tempo para a nossa área, e as imagens daqui no Google Maps são apenas um borrão de pixels. A loja de conveniência fecha às nove e vende sementes de hortaliças e equipamentos agrícolas de alta qualidade...

No caminho da escola para casa, Saya-chin e eu entramos no modo de queixa anti-Itomori. Não temos um McDonald's ou Mos Burger, apenas dois bares. Não existem empregos, as horas com a luz do dia são curtas... a lista apenas cresce. Normalmente, o isolamento da cidade é realmente refrescante e até me sinto orgulhosa de viver aqui, mas hoje estamos cheias de puro desespero.

— Ei! — Tesshi, que estava empurrando sua bicicleta silenciosamente atrás de nós o tempo todo, de repente levantou a voz com raiva.

— …o que.

Então, ele olhou para nós duas com um sorriso assustador.

— De qualquer forma, querem parar em uma lanchonete?

— Eh…

— O qu-

— Lanchonete!? — gritamos unidas.

✧ ✧ ✧

Gachan! Um som de choque metálico soou brevemente antes de se misturar com o coro das cigarras noturnas.

Tesshi estendeu a lata de suco que acabou de pegar da máquina de vendas. Na estrada, uma scooter zumbia enquanto passava, carregando um velho que voltava para casa dos campos. Também passava um vira-lata, que, aparentemente decidindo nos agradar com a sua presença, se sentou nas proximidades e bocejou.

A “lanchonete” não era realmente uma. Em outras palavras, não era Starbucks ou Tully's, ou uma bela loja de doces como as que certamente existem em algum lugar deste mundo. Em vez disso, ela consistia de apenas uma placa de sorvete de 30 anos presa a um banco e uma máquina de venda automática. Em outras palavras, era apenas uma parada de ônibus do bairro. Nós três estávamos sentados alinhados no banco, com o vira-lata aos nossos pés, bebendo nossos sucos enlatados. Ao invés de ficar com raiva de Tesshi por nos enganar, simplesmente desisti, percebendo o quão estúpido eu fui por acreditar que realmente haveria uma boa lanchonete nesse lixo.

— Parece que está um grau mais frio do que ontem.

— Não, para mim está um grau mais quente.

— Certo, eu vou voltar para casa — disse aos outros dois depois que tive o suficiente de suco enlatado e conversas sem sentido.

— Boa sorte esta noite — disse Saya-chin.

— Vou passar para ver como você está — disse Tesshi.

— Você não tem que vir! Na verdade, definitivamente NÃO venha! — Enquanto confrontava Tesshi, internamente fiz uma pequena oração por eles. Boa sorte com o seu relacionamento! Depois de subir alguns lances de escada de pedra, me virei para ver o casal ainda sentado no banco com o pôr do sol colorindo o lago no fundo. Eu experimentei uma música de piano lírico para combinar com a cena. Saya-chin e Tesshi realmente são perfeitos juntos. Estou prestes a ter uma noite muito infeliz de trabalho, mas vocês dois pelo menos devem desfrutar de sua juventude, ok?

✧ ✧ ✧

— Ah, eu quero aquele também — murmurou uma Yotsuha insatisfeita.

— Ainda é muito cedo para você, Yotsuha — respondeu a vovó. O som dos pesos de ferro que se chocavam tocou sem cessar ao longo da sala de trabalho de seis tatames. — Tente ouvir a voz dos fios — continuou a vovó, nunca descansando suas mãos ocupadas.

— Se continuar enrolando fios assim para sempre, você começará a ter sentimentos por eles.

— Eh? Fios não podem falar.

— Em nosso kumihimo... — continuou a vovó novamente, ignorando completamente os protestos de Yotsuha.

Nós três estamos usando nossa roupa tradicional terminando o kumihimo para ser usado na cerimônia de hoje à noite. O kumihimo, um artefato tradicional passado por gerações desde muito tempo, consiste em muitos fios finos entrelaçados para formar um cordão. Um kumihimo finalizado pode ter vários desenhos e padrões tecidos nele, tornando-o colorido e bonito, mas para fazer um requer uma quantidade equivalente de conhecimentos. Consequentemente, a vovó era responsável de fazer um para Yotsuha, que foi forçada a fazer o trabalho grunhido como sua assistente, simplesmente envolvendo a linha em torno dos pesos.

— Em nosso kumihimo, é esculpido mil anos de história Itomori. As escolas das crianças deveriam ensinar esse tipo de história da nossa cidade, mas, de qualquer forma, ouçam. Há duzentos anos...

Está começando de novo, pensei com um sorriso irônico. Desde que eu era pequena, tive que ouvir a lição de história da vovó aqui nesta oficina.

— Um incêndio começou na casa de banho Mayugorou Yamazaki, e toda essa área queimou em cinzas. O santuário, os arquivos, tudo. Este evento é conhecido como-

Vovó olhou para mim.

— O Fogo de Mayugorou — respondi, completando sua sentença, e vovó assentiu contente.

— Eh? Os incêndios têm nomes!? — Yotsuha surpreendida exclamou. —Me sinto mal por Mayugorou-san, já que seu nome sobreviveu por isso.

— O significado por trás do padrão em nosso kumihimo e em nossa dança foi perdido com o fogo. O que restava era apenas a forma. Mas, embora não saibamos mais o significado, não devemos nos livrar da forma. Pois o significado esculpido na forma um dia ressuscitará.

A maneira como a vovó falava tinha um tipo de ritmo, e eu repeti suas palavras silenciosamente enquanto trançava meu kumihimo. O significado esculpido na forma um dia vai voltar. Esse é o importante dever que nós -

— Esse é o dever importante que temos no Santuário Miyamizu. Mas apesar disso...

Os olhos gentis da vovó se preenchem com tristeza. — Apesar disso, aquele filho idiota... não só abandonou o sacerdócio e saindo de casa, mas tentando ser um político...

Acompanhando o suspiro da vovó, eu também suspirei levemente. Gostando ou odiando esta cidade, indo para algum lugar distante ou ficando aqui para sempre com a família e amigos, eu realmente não me conheço. Peguei meu kumihimo finalizado, tecido com cores vivas, e o removi de seu estande, fazendo um solitário som estridente.

✧ ✧ ✧

Ouvindo o som da flauta do santuário à noite, imaginei que se uma pessoa da cidade estivesse aqui, eles poderiam pensar que era algo saído de um filme de terror. Como um assassinato brutal em alguma pequena aldeia, ou uma família misteriosa, ou algum outro acontecimento sinistro. E então aqui estou eu, fazendo a minha dança de donzela de santuário, desejando que Sukekiyo ou Jason ou alguém viesse me libertar de minha miséria.

Os papéis principais deste festival anual da colheita do santuário de Miyamizu são, infelizmente, dados a nós, as irmãs. Nesse dia, temos o privilégio de vestir trajes elegantes de damas de santuário, usar o batom vermelho escuro, ornamentos com sinos na cabeça, ficar em frente a uma audiência no palco e fazer a dança que aprendemos com a vovó. Uma dança realizada por um casal, cujo significado aparentemente foi perdido naquele fogo, precisamos segurar sinos com cabos coloridos pendurados neles, tocando os sinos ruidosamente, girando e acenando os cordões pelo ar.

A última vez que me virei, vi Saya-chin e Tesshi pelo canto do olho, me deixando ainda mais deprimida. Vieram de qualquer jeito, mesmo quando especificamente lhes disse para não vir, eu decidi que iria amaldiçoá-los com meus poderes de dama do santuário e enchê-los com adesivos de maldição. Esta dança, porém, não é a parte ruim. Quero dizer, é um pouco embaraçosa, mas tenho feito isso desde que eu era criança, então me acostumei. O verdadeiro problema é a cerimônia que vem depois, e só fica mais vergonhosa à medida que cresço. Aquela coisa amaldiçoada, aquela coisa que não é nada além de uma desgraça para uma garota.

Aggghhh!!

Pensamentos terríveis passaram por mim, continuei sem prestar atenção até que, antes que percebesse, a dança terminou. Finalmente, chegou a hora.

Om nom nom nom nom.

Nom.

Om nom nom nom.

Estou simplesmente mastigando arroz. E mastigando. E mastigando. Tentando o meu melhor para não pensar em nada, fechando os olhos em uma tentativa de bloquear qualquer visão, gosto, som ou cor, mastigo. Yotsuha está ao meu lado fazendo a mesma coisa. Estamos ajoelhadas no chão lado a lado, e na frente de cada um de nós está uma pequena caixa colocada sobre a mesa. E, claro, além dela está o público, homens e mulheres, velhos e jovens, nos observando.

Om nom nom nom.

Nom nom.

Ughh.

Om nom nom.

Precisa sair em breve.

Nom nom.

Agh.

Nom.

Desisti e peguei a caixa na minha frente, levei à minha boca e pelo menos tentei escondê-la com a manga.

E então, ahh.

Abri a boca e vomitei todo o arroz que eu estava mastigando na caixa, deixando uma substância líquida pegajosa, branca, consistindo de uma papa de arroz e saliva pendendo de meus lábios. Ouço sussurros circulando entre a multidão. Ahhh. Chorei por dentro. Por favor, eu imploro, não olhe.

Kuchikamisake.

O mais antigo tipo de saquê do Japão, feito ao mascar arroz, cuspí-lo, e aguardar a mistura de saliva fermentar, criando álcool. E então oferecemos aos deuses. Há muito tempo, aparentemente era feito em muitas regiões diferentes, mas se outro santuário ainda faz isso no século 21 é questionável. Quero dizer, vamos lá. Isto é loucura absoluta, com os uniformes de dama do santuário e tudo mais. Quem exatamente está se beneficiando com isso!? Mesmo reclamando internamente, eu corajosamente peguei outro punhado de arroz e enfiei na minha boca. E mastiguei. Yotsuha seguiu o exemplo, parecendo totalmente despreocupada. Devemos continuar fazendo isso até que a pequena caixa esteja cheia. Blargh. Cuspi um outro lote de saliva e arroz. Chorei por dentro novamente.

De repente, uma voz familiar passou por minhas orelhas. Ondas de inquietação vieram sobre mim, como ondulações cada vez maiores. Levantei os olhos apenas um pouco.

...Ah.

O que vi me fez querer explodir todo este santuário. Claro, lá estavam eles: o grupo legal e chamativo dos três colegas. Eles estão olhando para mim com sorrisos em seus rostos estúpidos e falando sobre algo que deve ser muito engraçado. “Ick, definitivamente não consigo fazer isso” ou “meio obsceno” ou “fazer isso na frente das pessoas... acho que ela não pode mais ser uma esposa” ou algo assim. Sinto que posso ouvir exatamente o que eles estão dizendo, apesar de ser fisicamente impossível nessa distância.

Definitivamente, definitivamente tomei uma decisão.

Quando me formar, vou deixar esta cidade e vou para bem longe.

✧ ✧ ✧

— Onee-chan, se anime! Não é grande coisa, ser vista por algumas pessoas da escola. Além disso, você já esperava, certo?

— Ser uma criança deve ser tão agradável...

Olhei para Yotsuha. Nós tínhamos trocado para camisetas e acabamos de sair do escritório do santuário. Após o Festival da Colheita, durante o grande encerramento da noite, tivemos que oferecer um banquete para todos os homens e mulheres idosos ao redor do bairro que ajudaram com os preparativos do festival. Vovó era a anfitriã, enquanto Yotsuha e eu ficávamos com o trabalho de servir álcool e manter a conversa.

— Quantos anos você tem, Mitsuha-chan? Eh, dezessete! Ter meu álcool servido por uma menina tão jovem e linda, me sinto jovem novamente.

— Por favor, vá em frente! Sinta-se jovem novamente! Beba mais, mais!

Eu estava desesperadamente servindo nossos convidados e prestes a ter um colapso, até que vovó e os adultos finalmente decidiram que era hora das crianças voltarem para casa e nos liberaram. Eles continuaram no escritório, falando sobre os velhos tempos.

— Yotsuha, sabe qual era a idade média naquele escritório?

As luzes ao longo do caminho que levava ao santuário já haviam se apagado, deixando apenas a escuridão enluarada e o barulho refrescante dos insetos para preencher a área.

— Não sei. Cerca de sessenta?

— Calculei na cozinha. Setenta e oito anos. Setenta e oito!

— Hmm.

— E agora que nós fomos embora, é noventa e um! Já estão praticamente mortos! Eu não ficaria surpresa se uma escolta do submundo viesse até o santuário para carrega-los agora!

— Hmmm.

Eu estava tentando convencê-la de que precisávamos nos apressar e sair dessa cidade o mais rápido possível, mas a resposta de Yotsuha ao discurso de sua irmã mais velha era um pouco ausente. Ela parecia estar pensando em outra coisa, então desisti. No final, a criança não conseguia entender os problemas de sua irmã mais velha. Olhei para cima. As estrelas enchiam todo o céu, brilhando transcendentalmente, livres de preocupações terrenas.

— ...é isso! — Yotsuha exclamou de repente enquanto caminhávamos pela longa escadaria de pedra do santuário. Com um rosto orgulhoso, como se acabasse de encontrar um bolo escondido ou algo assim, ela explicou — Onee-chan, você deve fazer uma tonelada de kuchikamisake, e vendê-lo para conseguir dinheiro para ir para Tóquio!

Por um momento, eu estava sem palavras.

— Essa é uma... ideia interessante.

— Você pode até incluir uma seção “making of” com fotos e vídeos do processo. Se chamaria "Kuchikamisake da donzela do santuário" ou algo assim! Definitivamente vai vender!

Enquanto me preocupava se a Yotsuha ficaria bem, tendo este tipo de perspectiva sobre o mundo aos nove anos de idade, percebo que era apenas seu modo de cuidar de mim e me lembro mais uma vez de como ela é linda. Certo, talvez eu considere isso, um negócio de kuchikamisake... espere, está tudo bem vender álcool assim?

— Ei, o que você acha da minha ideia?

— Ummmmm...

Hmmm. Depois de tudo…

— Nada boa! Violação da Lei do Imposto sobre o Bebidas Alcoólicas!

Hã? O problema era esse? Pensei, e, a próxima coisa que percebi é eu estava correndo a toda velocidade. Uma miríade de lembranças e sentimentos, esperanças e dúvidas misturadas, fazendo meu coração sentir como se estivesse prestes a explodir. Saltei a passos rápidos um lance de escadas e, em seguida, usei os freios de emergência, chegando a uma parada sob o torii do salão de baile. Puxei o ar frio da noite para os meus pulmões e então, exalando com todas as minhas forças, expulsei a bagunça no meu coração junto com o ar.

– Já estou cansada dessa cidade! Estou cansada dessa vida! Por favor, me deixe renascer como um garoto atraente em Tóquio!!

Tóquio Tóquio Tóquio Tóquio.

Meu desejo reverberou entre as montanhas e então simplesmente desapareceu, como se fosse sugado pelo Lago Itomori lá embaixo. Com a estupidez das palavras que instintivamente soltei da minha boca, minha cabeça esfriou junto com o suor correndo por ela.

Ah, mas ainda assim.

Deus, se você realmente está aí.

Por favor—

Se os deuses realmente existem, eu ainda não sei o que realmente gostaria de desejar.


Notas:

1 Tipo de colchão usado na tradicional cama japonesa.

2 Expressão japonesa bastante utilizada antes de uma refeição para demonstrar gratidão.

3 Espécie de ave de rapina.

4 Tipo de poema clássico japonês.

5 Todas essas palavras são formas atuais ou arcaicas de se referir ao crepúsculo.

6 Pronome 'eu' normalmente usado por homens idosos.

7 Portão tradicional japonês, normalmente vermelho, que assinala a entrada ou proximidade de um santuário.

 



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