Volume 2 – Arco 9
Capítulo 88: Cordeiro
Com a partida do pequeno híbrido pela janela, um silêncio curioso se instalou no quarto. Todos se entreolharam, como se esperassem que alguém tomasse a dianteira e desse um rumo àquele momento incerto.
O sol começara a nascer no longínquo horizonte, junto a ele, a cidade começava a despertar; as lojas abriam e as pessoas andavam pelas ruas. Ainda que estivessem em número reduzidos, ou talvez exatamente por isso, a cidade se tornava atrativo para aqueles que ainda não a exploraram.
Foi Fox quem quebrou a quietude. Relaxou o corpo, soltou um suspiro breve e disse:
— Acho que conseguimos uma folga. Todos estão livres para fazer o que quiserem. Peguem o dinheiro que lhes cabe e aproveitem a cidade!
A proposta parecia boa demais diante das últimas semanas de tensão, ainda assim, os olhares se voltaram para o casal. Era como se, mesmo sem a liderança formal, a aprovação deles ainda fosse necessária.
Erina notou os olhares e esboçou um sorriso suave, quase contido.
— É como ele disse. — Sua voz tinha uma calma que inspirava confiança. — Aproveitem. Sabem que essas oportunidades são raras durante a nossa jornada. Não desperdicem.
— Por favor, venham pegar — completou Kaji, abrindo uma pequena gaveta. Dentro dela, bolsas de couro estavam organizadas, cada uma marcada com o nome de seu dono.
Um a um, os membros do grupo se aproximaram, recolhendo o que lhes cabia antes de sair.
Takashi foi um dos primeiros. Segurou sua bolsa, não demonstrou entusiasmo. Não tinha em mente nada para comprar. Para ele, explorar a cidade era mais útil do que gastar moedas: observar ruas, padrões de patrulha, rotas de fuga. Criar um mapa mental seria sua prioridade — uma tarefa ingrata, mas necessária.
Xin, por outro lado, estava radiante. Seu coração batia acelerado diante da chance de conhecer uma cidade grande. Vivera toda a vida em uma cidade simples e monótona, onde nada jamais mudava. Agora, em Cenara, as possibilidades pareciam infinitas.
Gurok, sempre prático, já sabia aonde queria ir: às oficinas e lojas de artesãos. Queria observar ferramentas, metais, couro, e tudo que pudesse servir para manter as armas e armaduras do grupo em perfeito estado. Não perderia a chance de aprender novas técnicas — e talvez até adaptar melhorias ao seu trabalho.
Zhen, para sua surpresa, foi convidado por Xin para acompanhá-la. Sentiu o rosto aquecer e o coração tropeçar de vergonha, sem coragem de perguntar o motivo. Mas ela, com naturalidade, explicou: precisava de alguém mais maduro ao seu lado, que a impedisse de gastar tudo ou de se perder no tempo. Zhen apenas assentiu, ainda sem palavras.
Vaelis e Soren, animados como crianças em feira, já sabiam o que buscariam: artefatos arcanos. Anéis, pingentes, braceletes ou qualquer adorno que ampliasse sua reserva de mana ou potencializasse seus feitiços. Planejavam visitar cada loja, catalogar opções e, só no fim, decidir pelo melhor.
Fox e Nolan não revelaram planos. Apenas ficou claro que não estariam juntos.
Restando apenas Sebastian à porta, ele ergueu uma sobrancelha, notando que o casal permanecia no quarto.
— Vocês não vêm? — perguntou, a voz carregada de curiosidade.
— Não há nada do nosso interesse lá fora — respondeu Erina com tranquilidade. — Pode ir.
Sebastian demorou apenas alguns segundos para entender o subtexto: o casal precisava de tempo a sós. Ele deu um meio sorriso compreensivo e saiu.
Kenshiro, porém, não pareceu captar a mensagem. Encarou sua esposa, intrigado com a resposta dela.
Nnnngh–crrrrk… tok.
O som pesado da porta se fechando selou o silêncio no quarto, agora habitado apenas pelos dois.
***
Houve tempo suficiente para que Sebastian visse Fox e Nolan atravessarem a porta da hospedaria. O vampiro, o último a permanecer dentro do prédio, não sentia o menor desejo de explorar a cidade ou gastar moedas em mercadorias que, para ele, não passavam de distrações banais. A agitação das ruas, as cores dos mercados, os pregões dos vendedores — nada disso lhe despertava interesse.
Com um gesto breve, ele pendurou uma pequena placa na maçaneta do quarto que dividira com os demais. “Não Perturbe.” O aviso não era apenas para proteger a privacidade do casal lá dentro, mas também uma forma silenciosa de mostrar que compreendia mais do que dizia. Feito isso, afastou-se do quarto e desceu as escadas com passos lentos, o eco suave das botas acompanhando sua descida até o salão principal.
O lugar estava cheio de vida: o cheiro adocicado de café recém-servido misturava-se ao aroma mais rústico de carne assada e pão fresco. Risadas e conversas atravessavam o ar como ondas sonoras, criando uma sinfonia confusa, mas calorosa. Sebastian, porém, buscava silêncio no meio daquilo tudo. Escolheu uma mesa afastada, perto da parede, onde a sombra dos lampiões deixava o ambiente mais discreto. Sentou-se ali, encostando as costas na madeira fria da cadeira, decidido a esperar. Não importava quanto tempo levasse para seus companheiros retornarem; estava acostumado à monotonia, e até a apreciava. Para ele, o ato de não fazer nada era quase um luxo.
— O que está fazendo aqui? — perguntou uma voz feminina, interrompendo seus devaneios.
Era Anastasia. Carregava nos braços uma bandeja pesada, equilibrando três canecos de hidromel espumante que refletiam a luz dourada das tochas. O avental, um tanto amarrotado, tinha manchas de vinho e caldo, testemunhas do trabalho árduo.
Sebastian não respondeu de imediato. Observou-a percorrer o salão e entregar os canecos a um grupo de viajantes barbudos, que riram alto ao brindar. Somente quando ela retornou, passando próxima de sua mesa com a bandeja agora presa debaixo do braço e uma comanda rabiscada na mão, o vampiro abriu a boca:
— Matando tempo.
Anastasia arqueou uma sobrancelha, curiosa. A expressão dela mesclava cansaço e interesse genuíno. Continuou indo de mesa em mesa, sempre que se aproximava de Sebastian, puxava conversa como quem queria prolongar um fio invisível de contato.
— Por quê? — perguntou, ao deixar dois pratos fumegantes diante de um casal de viajantes. — Há uma cidade inteira lá fora para você explorar e conhecer.
— Não há nada do meu interesse lá fora — respondeu ele, sem mover muito o rosto, apenas deixando a voz grave ressoar.
Ela riu de leve, apoiando-se por um instante na borda de sua mesa antes de seguir. — Então, pelo menos, peça algo. Não vai aguentar só de olhar.
— Duvido que haja algo que agrade ao meu paladar... — retrucou Sebastian, cruzando os braços.
Anastasia o encarou por cima do ombro, um sorriso enigmático nos lábios.
— Qual é! Eu sei que você não se alimenta de seres humanos.
Essas palavras atingiram Sebastian como uma lâmina invisível. Em um instante, sua calma habitual se quebrou. Levantou-se da cadeira e, em passos rápidos, alcançou-a, segurando-lhe o ombro com firmeza.
— Como sabe? — a voz dele soou mais dura do que pretendia.
Anastasia não pareceu intimidada. Apenas inclinou a cabeça, os olhos dela refletindo uma estranha mistura de ousadia e vulnerabilidade.
— Façamos assim: me ajude a terminar meus pedidos, e depois poderemos ir até meu quarto conversar com calma.
— Conversar sobre o quê? — Sebastian manteve o tom desconfiado, a força em sua mão diminuiu.
— Sobre nada em especial — respondeu ela, virando-se para atender outra mesa, como se tivesse dito a coisa mais banal do mundo. — Você não é o único que quer matar tempo. Eu também preciso. E, acredite, não me restam muitas pessoas para conversar.
Sebastian hesitou, observando-a caminhar com naturalidade entre as mesas.
“Quanta dor ela está escondendo?”, pensou. “Não é qualquer um que consegue seguir em frente depois de perder todos que conhecia.”
Talvez fosse apenas um pedido por companhia. Talvez uma tentativa de aliviar o peso que carregava em silêncio.
Sem contestar, ele pegou uma bandeja vazia, uma caneta e uma comanda, decidindo ajudá-la.
(...)
O tempo passou sem que percebessem. O salão, antes cheio, foi esvaziando lentamente. O barulho de risadas deu lugar a vozes espaçadas, e o cheiro forte de álcool se dissipou, substituído pelo aroma mais ameno das velas queimando.
Quando a última rodada foi servida, a dona da hospedaria apareceu, brava, repreendendo os funcionários por terem deixado Anastasia assumir quase todo o trabalho sozinha. Depois, num gesto surpreendente, concedeu-lhe uma hora extra de folga. Sebastian sabia que aquilo havia sido, de certo modo, resultado de sua ajuda improvisada.
(...)
O quarto de Anastasia era simples, carregava uma estranha sensação de aconchego.
As paredes estreitas e descascadas mal comportavam os dois móveis que ocupavam o espaço: uma cama estreita de lençóis limpos e uma escrivaninha de madeira gasta. O espaço entre eles era tão reduzido que bastava puxar uma cadeira para bloquear o caminho.
Em vez de compartilhar dormitórios coletivos, como a maioria dos funcionários da hospedaria, ela tinha direito àquele pequeno refúgio privado. Um privilégio raro, ainda que modesto.
Anastasia puxou dois bancos baixos de madeira, posicionando-os frente a frente no espaço limitado.
— Assim está bom.
Era uma escolha consciente: usar a cama para sentar parecia íntimo demais, algo que nenhum dos dois desejava.
— Por favor, sente-se — pediu Anastasia, empurrando um dos bancos para ele com o pé. O gesto foi simples, havia nele uma delicadeza natural, como se quisesse suavizar a rigidez do momento. — Sei que não é tão confortável quanto o seu quarto, mas... sinta-se à vontade.
Sebastian inclinou a cabeça em sinal de respeito.
— Com sua licença.
A madeira do banco rangeu levemente sob o peso do vampiro quando ele se sentou, mantendo a postura ereta e os olhos fixos nela. O ambiente era estreito, e o silêncio ali dentro parecia mais denso do que no salão da hospedaria. Foi nesse silêncio que ele lançou a primeira pergunta, direta, cortante:
— Agora pode me dizer... como sabe que eu, um vampiro, não me alimento de humanos? Não ouviu as histórias?
Anastasia ajeitou-se no banco, cruzando as pernas, e sorriu de um jeito estranho, como quem carrega uma resposta há muito guardada.
— Eu já ouvi diversas histórias — começou. Sua voz soava firme, havia uma ternura no olhar. — E todas descrevem seus olhos com uma precisão assustadora.
Ela ergueu a mão, desenhando no ar a lembrança das palavras que conhecia.
— “Olhos rubros como brasas acesas. Oscilando entre o vinho e o sangue recém-derramado, sempre vibrante, sempre inquieto. O olhar de um predador faminto e desumano, guiado apenas pelo instinto.”
A descrição, quase poética em sua crueldade, pesou sobre Sebastian. Ele desviou o olhar, tomado por uma vergonha silenciosa — não apenas da espécie à qual pertencia, mas também do que fora no passado. Cada palavra era um reflexo distorcido de uma verdade que ele conhecia bem demais.
Anastasia não parou por aí.
— No entanto... — disse, inclinando-se um pouco para a frente —, seus olhos me lembram outra descrição. Algo que li apenas uma única vez.
Ela respirou fundo, como se buscasse em sua memória as palavras exatas:
— “Vermelhos como rubis expostos ao sol, quase cristalinos. Ainda que carregassem a voracidade da fome, já não eram mais ameaçadores do que qualquer animal ou ser ainda desconhecido.”
Sebastian voltou a encará-la, intrigado. Aquelas palavras soaram como um bálsamo inesperado.
— O que quer dizer com isso? — sua voz saiu quase sussurrada.
— A primeira descrição é a que todos conhecem. A segunda... fala de um tempo muito mais antigo, anterior à sua espécie ser classificada como mortos-vivos. E é nela que você mais se encaixa.
Sebastian arregalou os olhos.
— Como... como pode saber disso? Nem eu encontrei um livro sequer com essa descrição!
Ele não desconfiava dela, não havia espaço para paranoia. O que sentia, pela primeira vez em muito tempo, era esperança.
— Infelizmente, eu nunca pude ler o livro em si — respondeu Anastasia. — Mas minha mãe... ela era uma mulher muito sábia. Teve paciência de me recontar várias histórias que conhecia. Algumas, de memórias antigas, quase esquecidas.
Um raro sorriso se formou no rosto de Sebastian, carregado de melancolia.
— Sim... parece alguém muito especial.
Anastasia não conteve o brilho nos olhos.
— Ah, ela é!
Sebastian arriscou mais uma pergunta, escolhendo as palavras com cuidado.
— Ela... por acaso estava no vilarejo quando aconteceu...?
A expressão dela se fechou um pouco, e o sorriso se perdeu.
— Não. Mas se tivesse... talvez as coisas fossem diferentes.
— Como assim? — insistiu ele.
— Deixa isso pra lá — respondeu ela, num tom apressado, quase como quem fecha uma porta que não queria abrir. Mas logo emendou com entusiasmo, mudando de assunto: — Acha que pode me contar mais sobre a jornada de vocês?
Sebastian arqueou as sobrancelhas, surpreso com o pedido.
— Não acho que você deveria saber sobre isso...
— Por que não? — Anastasia inclinou-se à frente, como uma criança que se recusa a aceitar um “não” como resposta. — Que mal pode fazer?
— Muito, acredite. É para o seu próprio bem.
Ela jogou a cabeça para trás, quase perdendo o equilíbrio do banco.
— Fala sério! — reclamou. — Parece até que não confia em mim. — Voltou a se endireitar rápido, tentando disfarçar o quase-tombo. — Não confia em mim?
— Não é isso! — Sebastian ergueu as mãos. — É para sua segurança.
— Perdão, mas não estou convencida — retrucou ela, firme. — Ainda que seja verdade, qual seria a razão de alguém me ferir apenas por eu saber de vocês? Além do mais... estando aqui, em Cenara, é difícil imaginar qualquer ataque sendo direcionado a mim.
— Bem... — Sebastian hesitou.
— Só digo o seguinte — interrompeu Anastasia. — Se não quiser me contar, não conte. Mas não invente desculpas. Isso me irrita.
Aquela teimosia surpreendeu Sebastian.
— Afinal, por que você quer tanto assim saber?
A pergunta caiu como um peso. Anastasia piscou, surpreendida. Por um instante, parecia que ele havia rompido a máscara dela.
— Curiosidade — respondeu, seca. — Só isso.
O silêncio retornou ao quarto. Sebastian afundou em pensamentos, lembrando-se de Varelith, das sombras que ainda o perseguiam e da ameaça constante que representava. Ainda assim, Anastasia estava sendo persistente — e, até aquele momento, nada nela soava como ameaça ou falsidade. Ela parecia apenas... humana, com todas as fragilidades e contradições que isso implicava.
“Talvez seja apenas isso”, refletiu. “Alguém que não quer carregar o peso sozinha.”
Por fim, respirou fundo.
— Está bem... tudo começou...
— Shhh... — Anastasia colocou o dedo nos lábios.
Ele a encarou, irritado.
— Você quer saber ou não?
— Quero, mas não desse jeito — disse, sorrindo de lado.
— Em Signês? — sugeriu Sebastian. — Isso levaria tempo demais.
— Falando também — respondeu ela, puxando as mangas da blusa até revelar os pulsos. O gesto foi deliberado, como uma oferta. — Transmita suas memórias para mim. Será muito mais rápido.
Um arrepio percorreu a espinha de Sebastian. Ele já havia mergulhado nas lembranças de outros — Kenshiro fora a prova disso. Sabia que podia invadir memórias, mas nunca havia tentado o caminho inverso. Nunca sequer cogitara.
“Será que é possível... ou perigoso demais?”
— Sua mãe também lhe contou sobre isso? — perguntou, a voz carregada de cautela.
Anastasia apenas sorriu, um sorriso simples, quase infantil.
— Mamãe é sabida.
Ainda tenso, Sebastian estendeu as mãos. As sombras do quarto pareciam aproximar-se deles, como se até o silêncio quisesse ouvir o que estava prestes a acontecer.
Sebastian aproximou seu pulso do de Anastasia, hesitante. Sua pequena unha tilintou suavemente quando ele a ergueu e fez um pequeno corte, primeiro em si mesmo, depois nela. O sangue quente escorreu em fios finos até se encontrarem, misturando-se em uma única gota que parecia vibrar com uma força invisível.
No instante em que o contato se completou, um arrepio percorreu a espinha de Sebastian. As memórias, antes guardadas em silêncio profundo, começaram a transbordar como se um dique houvesse se rompido. Anastasia, imóvel, manteve os olhos abertos, o brilho em suas írises denunciava que já não via o quarto — ela estava imersa no fluxo da mente dele.
Séculos se comprimiram em segundos. Ela sentiu a frieza de fortalezas esquecidas, o peso de batalhas travadas em noites intermináveis, a fome insaciável que corroía o espírito de Sebastian em seus primeiros anos de existência. A cada cena, era como se uma torrente de emoções lhe atingisse: dor, arrependimento, orgulho, solidão. Anastasia não apenas assistia — vivia cada fragmento, respirava cada lembrança como se fosse dela.
O turbilhão só desacelerou quando alcançou um ponto em comum: o momento em que Sebastian encontrara o casal pela primeira vez. A partir dali, as memórias se tornaram mais nítidas, menos caóticas, ainda rápidas, como páginas viradas sem pausa.
Quando Sebastian percebeu que Anastasia já havia visto o suficiente, recuou bruscamente o braço, rompendo o vínculo. Seu ferimento fechou-se quase de imediato, a pele retornando ao estado original sem deixar cicatriz.
Anastasia, porém, continuou imóvel. O corpo estava ali, os olhos vagavam em vazio, como se demorassem a voltar da travessia. E por um breve momento, quase como uma ilusão, a coloração de seus olhos pareceu similar ao do vampiro.
— Está tudo bem? — perguntou Sebastian, preocupado, inclinando-se para enxergar seu rosto.
Ela demorou a responder, a voz surgindo lenta, arrastada:
— Sim... eu acho que sim. — Tragou em seco, ainda atônita. — É estranho... tão estranho ter dentro de mim as memórias de outra pessoa. Não é como ouvir uma história ou imaginar uma cena... é como se eu tivesse vivido a sua vida. — Fechou os punhos, respirando fundo. — Minha mãe nunca me contou sobre essa sensação.
Um peso incômodo se instalou no peito de Sebastian, a vulnerabilidade de ter aberto o próprio passado como um livro exposto ao sol.
— A ideia foi sua — respondeu, em tom seco, tentando disfarçar o desconforto. — Então... satisfeita?
Anastasia piscou rápido, os olhos voltando a focar nele. O rubor tomou-lhe as faces, como se finalmente retornasse à realidade.
— Sim — Um pequeno sorriso brotou, trêmulo, sincero. — Agora tudo faz mais sentido para mim...
Ainda com as mãos ligeiramente trêmulas, ela alcançou a escrivaninha ao lado. Pegou uma tesoura enferrujada, cortou um pedaço de tecido de linho e amarrou firmemente ao redor do pulso, estancando o leve sangramento.
— Me perdoe por ter insistido tanto — disse, a voz mais baixa, quase envergonhada. — Imagino que isso tenha sido desconfortável para você também. Não quero ser um fardo... não vou mais importuná-los com perguntas.
Anastasia já se levantava, pronta para sair, quando sentiu a mão de Sebastian segurar a sua com firmeza.
— Não! — A palavra saiu mais intensa do que ele pretendia, quase um pedido desesperado. — Você não me importunou em nada. — Seus olhos a encararam com uma sinceridade desarmada. — Pode continuar conversando comigo... e com os outros. Só... — fez uma pausa, buscando as palavras certas — não conte nada sobre isso, está bem?
A rigidez no peito de Anastasia se dissolveu. Um sorriso leve, quase infantil, brotou-lhe no rosto, e ela assentiu com a cabeça.
— Tá! — respondeu, curta e simples, com uma alegria que Sebastian não esperava.
Por um instante, o silêncio que se seguiu pareceu mais confortável do que qualquer palavra.
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