Volume 2 – Arco 6

Capítulo 66: Última Chance

Enquanto caminhavam pelos corredores iluminados por tochas trêmulas em direção ao que parecia ser a saída, Silas ia à frente, explicando o favor que exigia do grupo. 

— Alguns dias antes de salvá-los — começou ele, com a voz carregada de cansaço, ainda firme —, convoquei Fox para me ajudar em uma missão pessoal. Agora que estão sob sua liderança, é justo que o acompanhem. 

Kenshiro e Erina seguiam um pouco mais atrás, seus passos lentos e olhos atentos. Observavam como Fox, mesmo sem perceber, assumia naturalmente a dianteira, liderando com postura instintiva — o que antes parecia improviso, agora soava inevitável. 

— Um velho professor meu retornou, pedindo auxílio para resolver um problema... bastante delicado — continuou Silas. — Sei que a AMA não costuma se envolver em assuntos mundanos, mas dadas as circunstâncias... abri uma exceção. 

— Nolan Sriptor — prosseguiu Fox. — Um mago que não controla nenhum elemento, mas é um mestre absoluto das runas e dos pergaminhos. E, além disso, governador da cidade comercial mais importante do Império: Cenara. 

— Lembro desse nome — murmurou Vaelis. — Um homem estudioso, reservado. Sempre foi respeitado, mesmo entre os magos mais arrogantes. 

— Por que alguém assim precisaria da nossa ajuda? — perguntou Xin, os olhos semicerrados, desconfiada. 

— Há alguns dias, Cenara foi infiltrada por um metamorfo — explicou Fox. — Uma criatura capaz de alterar completamente sua forma. No início, os ataques eram sutis: desaparecimentos de pessoas, de pertences menores... Mas logo o foco passou a ser os cofres da cidade, não por ouro, e sim por documentos. 

— Documentos? — repetiu Gurok, intrigado. — Quem ignoraria joias e riquezas para roubar papéis? 

— Alguém com um plano muito maior — respondeu Fox. — Nolan conseguiu interceptar o metamorfo antes que qualquer informação fosse roubada, mas... não a tempo de impedir que ele copiasse sua aparência. Desde então, o verdadeiro Nolan foi desacreditado. E pior: sua família, presa. 

Ao verem a maneira como Fox conduzia seu novo grupo, como explicava os detalhes de sua missão, um pensamento tomou contado do casal: “Talvez, se ele estivesse lá, Shenxi teria tido uma chance...” 

— Acham mesmo que ele é a escolha certa? — perguntou Sebastian, que caminhava alguns passos atrás, observando o casal em silêncio. 

Os dois pararam. O peso da pergunta se acomodou sobre seus ombros já cansados. 

— Não sei — admitiu Kenshiro. 

— Mas é melhor do que nós, neste momento — disse Erina, com amargura. 

— Vocês acreditam nisso... ou estão apenas fugindo do peso? — insistiu Sebastian, a voz baixa, sem julgamento, apenas verdade. 

— Por que se importa? — Kenshiro o encarou. 

— Porque vi o que vocês passaram. Nas memórias. Senti. E sei como se sentem agora — respondeu o vampiro. — E é por isso que entendo a decisão de vocês... Também sei que vocês ainda importam. 

Erina o fitou, surpresa com a intensidade contida nas palavras dele. 

— Vocês não estão em condições de liderar hoje, talvez nem amanhã — continuou Sebastian —, mas isso não apaga o que fizeram. Fomos unidos por vocês. Aprendemos a aceitar nossas diferenças, a confiar uns nos outros... por causa de vocês. E sobrevivemos por causa de vocês. 

Ele se afastou, voltando ao grupo. Seus passos não eram apressados, firmes. 

Enquanto isso, Fox ainda falava: — O herói imperial encarregado da segurança decidiu prender Nolan e sua família por precaução. Nolan escapou, mas... sua esposa e filha continuam em cativeiro. 

— Então o favor é resgatá-las? — perguntou Zhen. 

— Exatamente. 

— Invadir uma cidade imperial não é brincadeira — advertiu Kenshiro. — São fortemente protegidas, vigiadas em cada canto. E se o herói nos descobrir, pode nos denunciar. Seríamos caçados pelo Império inteiro. 

— Seu título de “Herói do Povo” pode não significar mais nada — acrescentou Erina. 

— Eu sei — disse Fox, encarando-os com seriedade incomum. — Mas não vou mais precisar dele. 

O casal trocou um breve olhar. A resposta os desarmou. Kenshiro abriu a boca para perguntar o que ele queria dizer com aquilo, mas Fox já havia voltado à frente, encerrando o assunto. 

— Seja como for, não temos tempo a perder. Podemos seguir ou alguém ainda tem algo a dizer? 

O grupo trocou olhares silenciosos. Todos pareciam aguardar que alguém se manifestasse — uma dúvida, uma discordância, qualquer freio que adiasse o inevitável. 

Mas nada foi dito. 

— Então vamos — disse Fox. 

E deram o primeiro passo rumo à próxima missão. 

(...) 

Ao passarem pelo grande arco, chegaram ao que um dia fora a entrada da AMA. A gigantesca porta, ainda escancarada, ostentava as marcas do ataque que a arrombara — um ataque do passado mantido como cicatriz visível. Do lado de fora, abria-se a vastidão do espaço: o planeta azul e sereno os encarava à distância, como se observasse em silêncio o destino que escolhiam trilhar. 

Sentado num banco à sombra da estrutura destruída, um homem se agitava. Seus pés batiam contra o chão em ritmo irritadiço, e os dedos trêmulos roçavam uns nos outros com insistência nervosa. 

Ao notar o grupo se aproximando, ele se ergueu num salto, visivelmente contrariado. 

— Mas o que é isso? — exclamou com desdém. — Silas me disse que enviaria alguém. Alguém. Não um pelotão inteiro! 

— Quanto mais, melhor, não acha? — disse Fox, com um sorriso indecifrável, tentando manter o tom leve. 

— Essa missão exige discrição! — esbravejou o homem, apontando o dedo. — E veja só isso! Um elemental de fogo?! Estamos tentando resolver um problema, não incendiar a cidade! 

Fox deu um passo à frente. Seu semblante endureceu, a leveza anterior dissolvida num instante. 

— Eles estão comigo — disse, a voz firme como aço. — Vai aceitar a ajuda, Nolan, ou prefere lidar com isso sozinho? 

A autoridade em sua voz fez o homem hesitar. Nolan recuou meio passo, desviando os olhos. 

— T-tudo bem — murmurou, cedendo. — Vamos acabar logo com isso. 

Puf! Puf! 

Mana e Estamina surgiram num estalo súbito, como sempre em sincronia. 

— Senhor Nolan! — saudaram, com entusiasmo quase teatral. — É sempre uma honra receber um antigo professor. Boa sorte! 

Bateram as mãos uma na outra. Onde antes havia a abertura da porta, agora se desenhava um novo portal — um vórtice de energia indistinta, sem revelar seu destino. 

O grupo observou o portal com cautela. 

— Não se preocupem! — disseram os mascotes, alegres. — Este portal os levará exatamente para o ponto onde foram resgatados! 

— Era isso o que eu temia... — murmurou Xin, semicerrando os olhos. 

Ah... — Mana e Estamina se entreolharam, um pouco constrangidos. — Talvez possamos ajustá-lo para outro ponto de entrada? 

— Não — interrompeu Fox, já à frente de todos. — Continuaremos de onde paramos. 

Zhen e Xin trocaram um olhar tenso, claramente incomodados. Erina, percebendo, caminhou até o novo líder.

— Fox... talvez devêssemos considerar uma rota alternativa. Varelith pode estar à nossa espera lá. 

— Improvável — respondeu ele, sem hesitar. — Além disso, precisamos da carruagem. E da sua armadura. São recursos preciosos demais para abandonarmos. 

— Mas talvez...

Antes que ela terminasse, Fox se virou abruptamente. Aproximou-se até invadir seu espaço pessoal, e Erina recuou um passo, instintivamente. 

Kenshiro, de onde estava, apertou os punhos. Tudo em seu corpo gritava para agir, mas a certeza de sua inferioridade o mantinha imóvel. 

— Se quer tomar decisões — disse Fox, a voz baixa, cortante —, então reassuma o comando. 

Erina desviou o olhar. Seu silêncio respondeu por ela. 

— Não? Então não questione minhas ordens. 

Ela se afastou, voltando para o lado de Kenshiro, buscando amparo no único que ainda considerava seu igual. 

O grupo observava em silêncio, desconcertado com a cena. 

— Quem não quiser me acompanhar — declarou Fox, voltando-se para todos —, pode ficar deste lado. Mana e Estamina irão providenciar o retorno para casa. 

Sem esperar resposta, Fox e Nolan cruzaram o portal. Não olharam para trás. 

Por alguns segundos, ninguém se moveu. O grupo observava o casal em busca de um gesto, um sinal — qualquer coisa que indicasse se deviam seguir ou recuar. Mas Kenshiro e Erina permaneceram imóveis, suas expressões fechadas, abatidas. 

Kaji foi o primeiro a se mover. Cruzou o portal sem uma palavra, sem sequer lançar um olhar ao casal que eram seus mestres anteriores. 

Em seguida, Vaelis e Soren, depois Gurok e Takashi. Sebastian hesitou por um momento, mas também os seguiu. 

Por fim, restaram apenas Zhen e Xin. Aproximaram-se dos dois líderes silenciosamente. Sem pressa, mas também sem dúvida. 

— Obrigada pelo que tentou fazer — disse Xin, segurando com delicadeza as mãos de Erina. 

— Não adiantou muito — respondeu Erina, voz baixa, olhar perdido no chão. — Você viu quem está no comando agora. 

Percebendo o peso que Erina carregava nos ombros — a dor mal disfarçada, a humilhação engolida em silêncio —, Xin tentou reacender um fio de ânimo. Não diretamente, mas por meio de algo mais leve, mais íntimo. 

— Talvez algo bom saia disso... — disse com um meio sorriso. — Em vez de capitã e subordinada... agora somos apenas amigas, não é? 

Erina ergueu os olhos. Uma lágrima solitária escorreu sem resistência por sua bochecha. 

Xin não esperou por palavras. Antes que Erina pudesse responder, a abraçou com firmeza, retribuindo o carinho que recebera quando fora ela a desabar. Agora era sua vez de oferecer abrigo. 

E não permitiu que ela dissesse mais nada. Mesmo que fosse para concordar, mesmo que quisesse agradecer. Às vezes, o silêncio é o único pensamento que importa preservar. 

Sem dizer adeus, Xin atravessou o portal. 

Erina respirou fundo. O peito doía, o gesto da amiga lhe dera um alívio inesperado. Ainda havia incerteza no caminho à frente, mas não estava tão só quanto temia. 

Foi então que notaram: Zhen ainda estava ali. Diferente de Xin, ele não parecia confiante. Havia algo em seu semblante — um peso, uma hesitação contida. 

— Perdão por falar com vocês neste momento em que estão tão... vulneráveis — disse ele, com uma reverência tímida. 

— O que houve, Zhen? — perguntou Kenshiro, mantendo o tom firme, tentando proteger Erina de um novo abalo. 

— Eu tomei uma decisão... estúpida. Mesmo sabendo que era o certo... não consigo parar de me culpar por isso. 

— O que você fez? — perguntou Erina, franzindo o cenho. 

À medida que Zhen explicava, os rostos do casal se transformaram. Da surpresa, passaram ao pesar, e deste ao silêncio carregado de julgamento contido. 

— E agora... eu não sei mais o que fazer — concluiu o monge, cabisbaixo. 

Kenshiro e Erina se entreolharam. Um diálogo mudo aconteceu entre eles. Um aceno, um suspiro, uma decisão. 

Erina assentiu para si mesma. Respirou fundo. 

— Deixa comigo — disse ela, com firmeza. — Mas você terá que ficar de fora disso. Caso contrário... pode acabar mal para você. 

— Mas eu... 

— Zhen — interrompeu Kenshiro, com um leve tom de urgência — acredite, é o melhor. 

Zhen fechou os olhos por um instante. Respirou profundamente. Quando os abriu, a frustração havia dado lugar à serenidade. Havia reencontrado o equilíbrio, como um monge deveria. 

— Obrigado — disse ele, com um leve sorriso. — E, se me permitem dizer... ainda os considero meus verdadeiros líderes. 

— Zhen, agora não é o momento para... 

— Eu sei que é temporário — continuou, sem se abalar —, mas quero que saibam: eu não os culpo pelo que aconteceu em Shenxi. Dadas as circunstâncias... foi o melhor resultado possível. Tivemos sorte. 

O casal permaneceu em silêncio. 

Então, Zhen estendeu a mão, oferecendo não apenas companhia, mas confiança. 

— Podemos ir? 

Queria que soubessem: ele continuava com eles. 

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