Volume 2 – Arco 13

Capítulo 142: Ventos se Encontram

— Finalmente... o Vice-líder entra em cena — disse Viktor, inclinando levemente a cabeça, os olhos faiscando de excitação. 

Kenshiro não respondeu. Inspirou fundo, e atacou. 

O primeiro movimento foi um corte baixo — o segundo, um arco descendente com a lâmina inversa. 

Kenshiro alternava entre precisão e improviso, entre técnica e instinto. Era como se dançasse no fio de uma navalha, usando o mínimo de esforço para o máximo de efeito. 

Viktor, por outro lado, bloqueava tudo com uma só mão. 

Athena zumbia, refletindo cada ataque com uma elegância cruel. 

Ele sequer parecia pressionado; sua outra mão permanecia para trás, pendendo o corpo de propósito, exibindo controle e desdém. 

Faíscas saltavam. Nenhum dos dois se permitia piscar. 

Então, Viktor rompeu o ritmo — um passo à frente, o joelho girando, o calcanhar subindo — THUMP! 

Um chute direto no peito de Kenshiro o lançou para trás, fazendo o chão ressoar sob seus pés. 

— Não está utilizando nenhuma habilidade — disse Viktor, limpando o ar ao redor de si, entediado. — Acha mesmo que conseguirá me vencer apenas com... isso? 

O tom era de um professor desinteressado corrigindo um aluno medíocre. 

Kenshiro, ajoelhado, apoiou-se na espada cravada no chão. 

Não respondeu, apenas o olhou. 

Viktor suspirou e virou-se, pronto para encarar novamente Ren e Fox. 

Mas o que viu o fez hesitar. 

Os dois espadachins, que antes o encaravam com coragem, agora pareciam imóveis, tensos, como se vissem algo impossível. 

Fox engoliu seco; Ren deu um passo instintivo para trás. 

— O que foi? — perguntou Viktor, erguendo uma sobrancelha. — Eu os assustei tanto assim? 

— Não é você que eles estão com medo — disse Kenshiro, erguendo o rosto. 

Viktor virou-se. 

E por um instante, seu sorriso desapareceu. 

A aura dourada de Kenshiro começava a se expandir, fluindo a partir de seus ombros como um vapor vivo. 

O ar ao redor se curvava, distorcendo-se. 

Pedras pequenas começaram a flutuar, e o chão vibrou sob seus pés. 

Era uma luz pura, densa, antiga. 

Kenshiro respirou fundo. 

Rajadas curtas de energia dançavam sobre seus braços, subindo até os ombros, costurando um manto invisível que o envolvia por completo. 

— Finalmente... algo interessante — disse Viktor, recuperando o sorriso, mas com os músculos tensos. 

Kenshiro sabia o risco. 

Aquela técnica destruía seu corpo, rasgava seus músculos e quebrava seus ossos. Mas ele lembrava da “dica” da própria Sombra: encerrar a luta rapidamente, antes que ela se adaptasse. 

Não podia prolongar o duelo. 

Era sua única chance. 

AAAAAH! 

O grito partiu o ar como uma onda. 

Kenshiro avançou um passo, executando um corte lateral na direção de Viktor. 

Poucos segundos depois... 

Um corte aparecera na altura do pescoço da Sombra. 

Viktor cambaleou. 

Um filete de sangue escorreu por seu queixo, quente, brilhante. Ele levou a mão ao pescoço, surpreso. 

O corte fora fundo — quase o decapitara. 

Por um segundo, ele sentiu o gosto metálico do próprio sangue. A dor veio depois. E, com ela, o riso. 

— Ahh... isso doeu... 

Sua carne começou a se recompor. O ferimento fechou-se diante dos olhos de Kenshiro, o sangue evaporando em fumaça. 

Mas o olhar de Viktor havia mudado. Aquele brilho entediado dera lugar a algo mais agudo — admiração. 

— Agora entendo por que os outros temem você... — disse Viktor, girando Athena e assumindo, pela primeira vez, uma guarda real. — Se continuar assim, talvez eu tenha que parar de brincar. 

“Que estranho... Ele está emitindo Essência por todo o corpo, mas não pude ver o corte chegando...”, pensava Viktor, franzindo o cenho, atento à movimentação quase imperceptível do espadachim.  

A energia ao redor de Kenshiro não apenas pulsava — ela vibrava como um tambor de guerra, distorcendo o ar, fragmentando a luz. 

Ele fechara os olhos, buscando se concentrar. 

A respiração do Vice-líder tornara-se pesada, profunda, cadenciada, como se cada inspiração sugasse a própria vitalidade e cada expiração libertasse o poder contido em suas entranhas. Ajustou os pés no solo, firmando o corpo, concentrando-se até que os músculos de seus braços tremessem. 

Então, abriu os olhos. 

A cor deles mudara. O tom escuro transformando-se em dourado. 

AAAAHHHHHHHHHHHHHHH!!! 

O grito rasgou o ar, misto de fúria e dor, um som que parecia vir não da garganta, mas da alma. 

O espaço entre eles se encheu de aço e vento. Dezenas de golpes consecutivos, indistinguíveis uns dos outros, golpeavam Viktor de todos os ângulos possíveis. Era impossível saber onde terminava um ataque e começava o próximo. A velocidade era tamanha que o som das lâminas transformava-se num zumbido constante, quase ensurdecedor. 

Viktor, assustado, ousou pensar em recuar. Ainda tentava entender a natureza daquela técnica, seu ritmo, sua lógica — mas não havia lógica alguma. Era instinto puro, um caos ordenado apenas pela dor. 

Então veio o primeiro corte. 

Profundo, cruzando-lhe o peito. A carne se abriu, o sangue escorreu. Um segundo corte, nos braços. Outro nas pernas. Depois dezenas, em sequência, cada um com uma intenção diferente, um ângulo distinto. Nenhum padrão. Nenhum descanso. 

“Por que se destruir assim?”, pensava Viktor, ainda tentando compreender. “Qual o sentido de tanto desperdício de força...?” 

Deu um passo para trás. 

Mas o som de duas presenças logo atrás o alertou — Ren e Fox estavam o aguardando, com as lâminas erguidas, seus olhos brilhando com a mesma determinação de quem não tinha outra escolha. 

Ao perceber que o haviam encurralado, Viktor sorriu. 

Um passo à frente e enfrentaria Kenshiro — a tempestade de cortes. 

Um passo atrás, e seria engolido pela dupla que conseguira feri-lo. 

Escolheu o caminho mais insano. 

Sorriu, ergueu Athena e avançou. 

Kenshiro cerrou os dentes. Aquele sorriso zombeteiro, aquela confiança imutável, o irritaram profundamente. Imagina que Viktor ainda o via como o mais fraco, a opção mais fácil, o adversário descartável. 

Sua aura oscilou, tremendo, o dourado intenso se tornando um alaranjado que lembrava o fogo, ardendo como o sol nascendo. Seus gritos se transformaram em rugidos, quase bestiais, e cada movimento da espada rasgava o ar em explosões de vento cortante. 

A dor já era insuportável. Os músculos de seus braços pareciam prestes a se romper. Mas ele não parava.  

Não podia parar. 

Viktor, por outro lado, parecia uma pequena criança, movimento seus braços e corpos como se tentasse prever os próximos ataques que lhe fossem causados.  

Então, seu sorriso cresceu. Seu olhar pareceu brilhar. Por um momento Kenshiro imaginou ter vistos aqueles olhos azuis tornarem-se avermelhados por um único segundo. 

“Eu entendi...” 

A mente da Sombra finalmente decifrou o padrão — ou, melhor, a ausência dele. Kenshiro usava o próprio colapso como arma. A energia que o destruía também o fortalecia, e era isso que gerava tamanha imprevisibilidade. 

Porém todo caos podia ser aprendido. 

Viktor respirou fundo. Girou Athena e assumiu uma postura diferente, posicionando a espada ao lado do corpo. Esperou. Um segundo. Dois. Os cortes se tornaram mais fundos, a dor aumentava, mas ele manteve-se imóvel, estudando o ritmo, medindo o pulso da tempestade. 

Então, deu o primeiro passo. 

E replicou o movimento. 

De repente, suas lâminas se moveram na mesma frequência, copiando cada gesto, cada giro de Kenshiro — com precisão absoluta. Era como se a sombra do mestre tivesse ganhado vida e lutasse contra ele. 

As feridas sobre o corpo de Viktor cessaram instantaneamente. 

O fluxo caótico se estabilizou. 

E por um instante, o ar ficou imóvel. 

Os três espadachins — Ren, Fox e o próprio Kenshiro — observaram, incrédulos, Viktor imitar, perfeitamente, a técnica que haviam acabado de testemunhar. 

Sem treino. Sem preparação. Sem hesitação. 

Com uma única espada. 

Os ventos dos espadachins, atacando-se, criavam ondas de forças que arremessava tudo para longe. Duas forças invisíveis, ainda físicas, entrando em conflito direto, quase empatadas. 

Enquanto os braços de Kenshiro se tingiam de roxo, inchados e trêmulos, o da Sombra permaneciam firmes, sólidos, imutáveis. Nenhum sinal de desgaste, nenhuma fissura. 

Kenshiro sabia, com uma certeza amarga, que ele não estava se regenerando. 

Não havia cura ali. Apenas resistência. Apenas força bruta — o tipo de força que o tornava inumano. 

Ainda assim, Kenshiro não poderia se dar por vencido. 

Mesmo com os braços latejando, os músculos rasgando-se sob o próprio esforço e a mente turva de dor, ele continuou. A força de sua alma suplantava as limitações do corpo.  

A cada novo golpe, sentia o impacto reverberar em seus ossos, partindo-o pouco a pouco — mas também o lembrando de por que lutava. Shenxi ainda ardia em sua memória. As vozes, o fogo, os rostos de quem ele não pôde proteger. 

Seus golpes agora eram pura desesperança transformada em aço. Cada corte parecia uma súplica, um grito de dor materializado. Mesmo que seus braços fossem arremessados pela violência de seus próprios movimentos, mesmo que restasse apenas um único minuto de vida útil em seu corpo, Kenshiro precisava vencer. 

Precisava — por si, por Erina, por seus companheiros, por todos os que haviam caído. 

— É impressionante o que você conseguiu fazer — elogiou Viktor, em meio à tempestade de golpes, desviando de um e interceptando outro sem esforço aparente. Sua voz mantinha-se calma, quase admirada. — Está usando tanto de seu vigor, sua Estamina, que o próprio ar obedece à sua lâmina. Você o transformou em uma extensão de si mesmo... 

— CALA A BOCA! — rugiu Kenshiro, cuspindo sangue. 

Suas pernas vacilavam, mas seu espírito não. O som do vento cortante era ensurdecedor. Cada investida produzia ondas de choque que rachavam o solo e faziam poeira e detritos voarem em todas as direções. 

Viktor, porém, estava avançando. Um passo após o outro, como uma montanha viva empurrando a tempestade. 

O campo de vento e fúria que Kenshiro criara estava se dobrando diante da presença do espadachim sombrio. O som dos ventos que antes o protegiam agora ecoava atrás dele — um presságio de que estava perdendo terreno. 

— Pensei que esse tipo de técnica havia se perdido para sempre — continuou Viktor, sem traço de ironia, apenas um respeito sincero. — Obrigado por me permitir contemplá-la. É uma arte antiga, feita de sacrifício. Mas... — Seus movimentos cessaram, sua espada baixou levemente —, existe uma razão para que ela tenha sido esquecida. 

Kenshiro arfava, o suor e o sangue misturando-se e escorrendo por seu rosto. Não ouviu as últimas palavras. Ou as ignorou. Tudo o que importava era que Viktor havia parado. 

“Agora!”, gritou sua mente, e ele concentrou o que restava de energia em um único golpe. 

O corte que desferiu foi sublime — o tipo de golpe que nasce de uma vida inteira de disciplina e de arrependimento. O ar vibrou, um arco dourado se formou à sua frente, cortando o espaço com força suficiente para partir uma montanha. 

Mas então... veio a dor. 

Uma dor tão súbita e profunda que nem teve tempo de compreendê-la. Uma ardência cortante atravessou-lhe a barriga. Kenshiro olhou para baixo — e viu o sangue jorrando. Nem percebera que seus braços haviam sido cortados na altura dos cotovelos. As espadas caíram, girando lentamente no ar antes de cravarem-se no chão. 

Mesmo assim, alguns de seus ventos o acompanharam. Atingiram Viktor em cheio, abrindo ferimentos em seu peito e ombros — mas não o suficiente para matá-lo. 

Seu último golpe... ao menos tinha sido efetivado? Ou fora apenas uma ilusão de sua mente em meio ao desespero da derrota? Não importava mais... 

O mundo começou a girar. As forças o abandonavam. Suas pernas cederam, e ele caiu de joelhos, o corpo balançando para frente, sustentado apenas pela própria determinação. A visão turva mostrava Viktor caminhando até ele, passos calmos, quase solenes. 

O guerreiro das Sombras se apressou, temendo que o espadachim morresse antes de ouvir suas palavras. 

— Me perdoe por tê-lo subestimado — disse Viktor, em um tom que era, ao mesmo tempo, firme e pesaroso. — Você é mesmo um espadachim notável, Kenshiro. Forte, habilidoso, e... humano o bastante para ser digno de respeito. Tenho certeza de que, se o tempo o permitisse, se tornaria alguém ainda mais esplêndido. 

Ele ergueu Athena, o fio prateado refletindo o brilho dourado da aura que se dissipava ao redor do homem. 

— Infelizmente — continuou, quase num sussurro —, não tenho a capacidade de transformá-lo em uma Sombra. Por favor, entenda... isso é misericórdia. 

SHINK! 

A lâmina penetrou seu peito com precisão quase cirúrgica. O som metálico soou suave, abafado, como se o mundo tivesse se calado para ouvir aquele instante. 

Kenshiro não sentiu dor. Apenas uma dormência quente, que se espalhou do coração até os dedos. A visão embaçou-se de vez. 

Antes que a consciência o abandonasse, olhou para Viktor. E viu — sim, teve certeza — que lágrimas escorriam por aquele rosto humano. 

— Sinto muito por não ser forte o suficiente para salvá-lo — murmurou Viktor. — Sua força... viverá em mim agora. 

Essas foram as últimas palavras que o espadachim ouviu antes que o mundo se apagasse. 

O som seguinte foi o grito dilacerante de Fox e Ren: 

— KENSHIRO!!! 

A terra tremeu com o eco, e o vento, outrora cortante, agora apenas carregava o cheiro do sangue e da perda. 

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