Volume 2 – Arco 13
Capítulo 131: Mundo Mágico
O grupo avançava pela floresta de Phareon em um silêncio quase ritualístico.
As sombras das árvores altas se entrelaçavam sob a luz fria da manhã, e, finalmente, após longos minutos de caminhada, chegaram a uma região em que a vegetação voltava a mostrar sinais de vida. As folhas tinham cor, o solo exalava um cheiro úmido de terra viva — e, por um instante, havia a ilusão de que o mundo ali ainda respirava.
Mas bastou alguns segundos de observação para perceberem o que faltava: o som.
Nenhum canto de pássaro, nenhum farfalhar de pequenos animais. A floresta estava viva, sim, mas condenada. Sem os animais para espalhar sementes e cuidar de seu próprio ciclo, a vida ali murcharia lentamente.
Ren seguia na dianteira os olhos atentos, mas distantes. Atrás dele, o grupo carregava uma tensão invisível. Cada um tinha perguntas — sobre Phareon, sobre os mortos, sobre o próprio Ren e seus motivos obscuros.
A maioria ainda não confiava nele. Para alguns, Ren era uma ameaça à espreita, uma bomba-relógio prestes a explodir. Outros apenas temiam o desconhecido. Mas ninguém ousava desafiar as decisões de Erina e Kenshiro, os líderes cuja palavra pesava mais que qualquer suspeita.
O silêncio entre eles durava desde que deixaram as fronteiras cinzentas da cidade. Agora, aqueles minutos pareciam ter se estendido por uma eternidade.
— Chegamos — anunciou Ren, sua voz grave cortando o ar imóvel.
O grupo parou.
À frente, não havia sinal de túnel algum como o que haviam usado para entrar em Phareon. Apenas um espelho d’água, cristalino e imóvel, refletindo o céu nublado e os troncos ao redor.
— É mais uma ilusão, Ren? — perguntou Kenshiro, estreitando os olhos.
Ren não respondeu. Apenas caminhou até a beira da lagoa e entrou. Primeiro os pés romperam a superfície; depois os joelhos, o peito, os ombros. Em poucos segundos, ele estava completamente submerso e, de forma inquietante, sua imagem desapareceu por completo sob a água translúcida.
— O que em nome dos Deuses... — murmurou Gurok.
Fox seguiu o mesmo caminho sem hesitar. Mergulhou silenciosamente, sendo engolido pelo lago da mesma forma.
Sebastian coçou o queixo, avaliando.
— É um portal — concluiu. — Mas não temos ideia de para onde leva. Será seguro?
Xin, que observava a água com desconfiança, retrucou:
— Na verdade... Ren é seguro?
O comentário pairou no ar como uma flecha sem alvo. Alguns desviaram o olhar, outros assentiram em silêncio.
Erina respirou fundo, observando cada um de seus subordinados. Esperou que alguém tivesse coragem de questioná-la diretamente — ninguém o fez. Então, respondeu da única maneira possível:
— Se ele quisesse nos matar ou trair, já teria feito.
A capitã avançou decidida em direção à lagoa, e a superfície da água se abriu diante dela como um véu líquido. Um a um, o grupo seguiu atrás.
Por fim, Kaji aproximou-se conduzindo a carruagem. As chamas que corriam por seus braços dançaram inquietas diante do espelho d’água. Ele hesitou por um instante — água e fogo raramente coexistem em paz —, respirou fundo e atravessou. Se fosse magia pura, ele encontraria um meio de resistir.
E então, o lago os engoliu, levando consigo o último lampejo de luz que restava na clareira.
***
A travessia pelo portal foi como ser engolido por uma tempestade silenciosa.
Todos sentiram suas mentes e estômagos revirarem-se, como se o próprio espaço tentasse dobrá-los em direções impossíveis.
Portais sempre tinham efeitos desgostosos para aqueles que não estavam acostumados — e, mesmo para os mais experientes, a sensação era tudo menos agradável.
Viajar através de longas distâncias pela magia era como ter o corpo rasgado em mil fragmentos e remontado do outro lado. Ainda que os encantos antigos tentassem amenizar o impacto, o desconforto sempre permanecia, como um eco persistente.
Quando finalmente se viram livres da vertigem, o chão ainda parecia girar sob seus pés. Alguns cambalearam, outros caíram de joelhos; dois deles vomitaram, enquanto um ou outro despertava de um rápido desmaio. Mas logo, o desconforto deu lugar ao espanto.
O mundo diante deles era… impossível.
A magia não apenas permeava o ar — ela era o ar.
Pequenas centelhas dançavam como poeira viva, se condensando em formas cristalinas que flutuavam a poucos centímetros do chão. Raios azulados serpenteavam entre as árvores, cruzando o ar como constelações pulsantes. Cada passo parecia provocar uma resposta do próprio ambiente, como se a realidade estivesse viva, consciente.
As árvores desafiavam qualquer lógica natural. Troncos de cores distintas brotavam lado a lado, fundindo-se em galhos de texturas diferentes, e cada fruto que pendia deles era uma obra-prima única: uns translúcidos como vidro líquido, outros pulsando em tons de âmbar, outros ainda refletindo o próprio rosto de quem os observava. Eram múltiplas e singulares ao mesmo tempo — uma contradição que apenas a magia podia sustentar.
Os animais que caminhavam entre as clareiras pareciam saídos dos sonhos antigos dos deuses. Criaturas pequenas, feitas de brisa e luz, flutuavam sobre o solo; outras, colossais, se moviam com a serenidade de montanhas ambulantes. Eram as lendárias Feras Místicas — seres que, para a maioria dos presentes, não passavam de lendas. Elementais, espíritos da floresta, e criaturas que a humanidade há séculos acreditava estarem extintas.
E, no entanto, um vazio pairava sobre aquele paraíso.
Nenhum rugido de dragão. Nenhuma sombra imensa cruzando o céu.
Se ainda existiam, os grandes anciões alados haviam se escondido do mundo, temendo talvez a mesma destruição que um dia devastara tudo.
Enquanto o grupo tentava assimilar a grandiosidade do lugar, um som destoou do silêncio admirado: um soluço contido.
— Sebastian? — chamou Erina, virando-se. — Está tudo bem? O que houve?
O vampiro permanecia imóvel, os olhos arregalados, a respiração presa. As lágrimas, discretas, escorriam por seu rosto pálido, e ele nem percebeu quando alguém o tocou no ombro.
Estava mergulhado em lembranças.
Durante séculos, carregara o luto pelas criaturas que vira desaparecer uma a uma — espécies que a ganância humana apagara do mundo, florestas queimadas, rios envenenados, céus silenciados. E agora… diante de seus olhos imortais, tudo aquilo estava de volta. Exatamente como em sua juventude, antes da ruína. Era como se o tempo houvesse se curvado em compaixão para lhe devolver, por um instante, o que lhe fora arrancado.
Enquanto alguns tentavam confortá-lo, os mais atentos notaram movimento à frente. Fox e Ren haviam se afastado sem dizer uma palavra, caminhando até uma pequena cabana de madeira adiante.
A construção era modesta — tão pequena e simples que, de longe, mais parecia um abrigo improvisado, talvez até um banheiro abandonado. No entanto, havia algo estranho nela. Uma quietude. Uma densidade no ar ao seu redor que fazia parecer que o pequeno casebre guardava um segredo.
Sebastian ainda lutava para se recompor, as lágrimas insistindo em cair enquanto ele tentava conter o tremor nas mãos. O grupo, percebendo seu estado, trocou olhares silenciosos — e logo voltaram-se à única outra criatura entre eles que poderia compreender algo daquela magnitude.
— Kaji? — chamou Erina, sua voz firme, serena.
O elemental, que observava o horizonte em silêncio, saiu de seu pequeno transe. O fogo em seus olhos oscilou por um instante, como se o vento tivesse soprado dentro de sua alma.
— O que é isso tudo? — perguntou a capitã, buscando em Kaji uma explicação que nem mesmo ela ousava acreditar possível.
Kaji moveu-se lentamente. Sua armadura metálica — viva e maleável — se abriu, retraindo-se até assumir a forma de um traje mais leve. Abriu os braços, deixando a brisa mágica percorrer sua pele como se sentisse o pulso do mundo.
— É de fato... algo mágico — murmurou. — No entanto... ele sequer existe.
— Como assim, “não existe”? — perguntou Kenshiro, imaginando ter escutado errado.
— Seria outra ilusão? — perguntou Xin, aproximando-se, os olhos atentos a cada nuance da fala do elemental.
Kaji balançou a cabeça.
— Não. O que quero dizer é que este lugar... não pertence ao mundo físico. Se não fosse o portal, jamais poderíamos alcançá-lo.
— Está dizendo que é como a AMA? — disse Vaelis, começando a criar teorias. — Nesse caso...
— Não — interrompeu Kaji, com um tom mais grave. — A AMA ainda ocupa um espaço tangível, mesmo que fora do Continente. Pode ser localizada, alcançada. Mas aqui... — Gesticulou ao redor, o ar tremendo levemente em resposta — ...este lugar não está em lugar algum. Nem no Continente, nem no espaço, nem em qualquer plano conhecido. Por isso digo que... ele não existe.
— Isso não faz muito sentido... — murmurou Xin.
— Muito pelo contrário — interveio Sebastian, com a voz rouca, finalmente recuperando parte da compostura. Suas lágrimas ainda brilhavam. — É a única explicação plausível. Se estivéssemos em um plano físico, esta fauna e flora já teriam desaparecido há séculos... ou evoluído até se tornarem simples animais. O que vemos aqui é uma cápsula imutável, um refúgio fora do tempo.
Vaelis arregalou os olhos.
— Então... se tudo isso é verdade, significa que... que...!
Soren completou a frase, com o tom de quem prefere não acreditar no próprio raciocínio:
— Que uma força capaz de criar e sustentar um domínio fora da realidade exigiria uma energia... infinita. — Ele engoliu seco. — Algo que simplesmente não deveria ser possível.
O grupo mergulhou em silêncio.
E, ainda assim, o impossível estava ali — respirando ao redor deles.
Kenshiro observou a pequena casa de madeira à frente, seus olhos se estreitando.
— Acredito que conheceremos o responsável por tudo isso muito em breve.
Deu o primeiro passo, e o som que veio atrás dele fez todos se virarem ao mesmo tempo.
Um estrondo líquido, semelhante ao mergulho de uma massa colossal na água, ecoou pela clareira.
O lago, de onde haviam emergido minutos antes, começou a se desfazer — a superfície recuou como se drenada por uma força invisível, até que o espelho d’água secou por completo. No lugar, uma nova camada de solo fértil surgiu, pulsante, e em questão de segundos, pequenas mudas brotaram e cresceram, atingindo a maturidade diante de seus olhos.
— Isso... — murmurou Xin, assombrada. — É... Com certeza não é um lugar comum...
Antes que pudessem sequer reagir, a carruagem de Kaji começou a brilhar em tons de azul. O metal que a compunha se fragmentou em milhares de partículas cristalinas, que se dissolveram lentamente no ar, sendo absorvidas pela magia do ambiente.
E então, como se obedecessem a um comando invisível, as armas de cada um começaram a se desvanecer também — lâminas, arcos, escudos, todos se desfazendo em poeira luminosa até desaparecer completamente.
Suas armaduras permaneciam.
— Parece que o anfitrião não quer que partamos antes da hora — comentou Erina, cerrando os punhos.
Nenhum deles ousava pronunciar a palavra que pairava nas mentes de todos: armadilha.
Ainda assim, não havia escolha.
Sem armas, sem rota de fuga, cercados por um poder além da compreensão, eles avançaram em direção à pequena casa.
Cada passo parecia mais pesado que o anterior, e a sensação de que estavam sendo observados crescia a cada metro.
Talvez o combate estivesse por vir. Ou talvez... já tivessem perdido antes mesmo de começar.
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