Volume 1 – Arco 4
Capítulo 36.3: O Governador*
LEIA COM ATENÇÃO:
Caro leitor,
Este é um capítulo especial e opcional. Não é necessário lê-lo para seguir a história principal. Esses capítulos extras têm como objetivo aprofundar determinados temas, como personagens, grupos ou eventos, e em alguns casos, exploram histórias que não são cruciais para a trama central.
Gostaria de destacar que os capítulos extras podem ser mais extensos do que o usual. Em vez de dividir o conteúdo em vários capítulos, optei por reunir tudo em um único.
Neste capítulo, (Capítulo 36*), você verá os últimos acontecimentos em Eldoria e a história de Gurok.
- A Cidade Livre Eldoria
- Justiça do Mais Forte
- O Governador
- Gurok
- Infelix
- Correntes
3 - O Governador
Quasimir nasceu em uma mina. Sua mãe entrou em trabalho de parto repentinamente durante uma de suas escavações. Não havia ninguém capacitado para auxiliar no seu nascimento ou para aliviar as dores de sua mãe, e mesmo assim, seu nascimento foi um sucesso.
Porém, assim que viram seu rosto, todos tiveram a mesma reação: repulsa.
Seus pais foram os primeiros a abandoná-lo, ele era tão asqueroso que não pensavam nem mesmo em tê-lo como alimento. Quasimir foi deixado para morrer nas minhas sujas, enquanto seu choro causava ecos pelas cavernas, mas todos os ignoravam pois não queriam ter nenhuma responsabilidade sobre ele.
Então, uma menina, uma garota que também fora abandonada ao nascer, decidiu adotá-lo. O nome da jovem era Ruby.
Ruby recebeu esse nome por conta de seus olhos castanhos escuros, que quando iluminados pela luz do sal possuíam uma coloração que lembrava o vermelho de uma joia rara.
A garota criou de Quasimir da melhor maneira que pôde. A maioria do que conseguia era medicando ou roubando dos mercadores, era o suficiente para os dois, embora não o bastante que ambos pudessem ter o crescimento adequado.
Quasimir, alguém já nascera abandonada pelo simples conceito de beleza, cresceu com deformações. Seus ossos eram desproporcionais, assim como seus órgãos, parecendo como se ele estivesse inchado ou carregando outro corpo dentro do próprio.
Ele era fraco e lento demais para ajudar Ruby com qualquer coisa, por isso, a única coisa que pôde fazer era estudar.
Rapidamente, Quasimir conseguiu perceber todas as engrenagens que moviam Eldoria, conseguindo até mesmo encontrar uma brecha para se tornar o homem mais poderoso da cidade. Ele só precisava de alguém, forte o suficiente, para que nenhum guarda ousasse desafiá-lo. Apenas um homem veio em sua mente: Justis.
Para chegar até ele, Quasimir precisou escalar sua grande torre; demorou 2 dias para chegar ao topo. Quando chegou, viu o homem mergulhando suas mãos em ferro derretido e quente.
— O QUE ESTÁ FAZENDO?!
Justis sorriu ao saber que sua rotina era algo impressionante para as pessoas comuns.
— As únicas ferramentas que utilizo são minhas mãos. Não se alarme, eu já não sinto mais dor — respondeu Justis, socando uma barra de metal apenas como demonstração — O que faz aqui homenzinho?
— V-você irá me ouvir? Pensei que não se importasse com as pessoas fracas...
— E não me importo. Mas qualquer um que esteja disposto a subir a minha torre é merecedor de uma simples conversa.
— Não estou aqui apenas para conversar. Quero fazer uma aliança!
Curioso com a determinação, e inconveniência, Justis decidiu dar uma chance ao deformado e escutou seu plano.
Quasimir queria desafiar a soberania de Eldoria, se tornando o governador e possuindo Justis como Juiz.
— O que está me pedindo, é algo bastante ousado — disse Justis.
— Pense bem! Como Juiz, você poderá reescrever todas as leis de Eldoria, fazendo dela uma cidade justa igual sua imagem!
— Sim, mas terei que interromper meus trabalhos para salvar a sua pele... Pois, queira me desculpar, sua aparência frágil faz parecer um alvo fácil.
— Por isso você precisa fazer um verdadeiro show! Demonstrar toda a sua força contra o Juiz, para que assim, ninguém ouse desafiar você! — respondeu o corcunda, precisando se recuperar da falta de fôlego. — Você terá que lutar apenas uma única vez!
Após refletir um pouco, Justis comtemplou toda a cidade de sua torre, imaginando o quão perfeito ela seria se seguissem seus fundamentos. Talvez aquela fosse a oportunidade que encontrara para fazer o povo de Eldoria finalmente possuir consciência.
Ele se virou para o deformado e disse:
— Estão vamos!
Justis segurou o corcunda pelo pescoço e pulou da torre, causando um pequeno estrondo ao pousar. Mesmo sendo amortecido por Justis, o corcunda sentiu uma dor profunda pela pressão da queda.
As pessoas ficaram espantadas ao ver Justis andando pela cidade àquela hora, encaravam-no com dúvidas e curiosidade.
Chegando até o centro da cidade, Justis proclamou em alto e bom som:
— EU DESAFIO O GOVERNADOR E SUA SOBERANIA!
Todos estremeceram.
O governador e juiz apareceram pouco tempo depois, escoltados por todos os soldados mercenários.
O governador já era um homem velho, esperava que pudesse se aposentar em pouco anos. O juiz ainda era jovem, mas experiente o suficiente para saber da fragilidade de Eldoria, e ainda do perigo que Justis poderia ser.
— O que você está tentando fazer é ilegal! — disse o Juiz, suando frio.
— Não no meu governo — respondeu Justis. — Irei mostrar para todos como a Lei do mais forte deve ser seguida!
— “A Lei do mais forte?” Não estamos mais em tempos de barbárie! Volte para a sua torre e prometo que esquecerei o que você tentou fazer hoje.
— Nenhuma ovelha pode prometer a um lobo o que ele pode tomar à força!
Justis avançou contra o Juiz, fazendo com que todos os soldados que estivesse à sua frente voassem para os lados. Segurando-o pelo pescoço, Justis o levantou para os céus para que todos pudessem o ver.
— Está bem! A cidade é sua! — disse o Governador.
— Não, ainda não... — respondeu o corcunda.
Justis saltou para os céus, ainda segurando o juiz.
— Quero que todos lembrem-se deste dia — começou o corcunda —, eu sou o novo Governador desta cidade, e Justis é meu Juiz. Desafiem minha autoridade e terão de enfrentá-lo.
Durante sua queda, Justis deixou a cabeça do Juiz abaixo de seu pé. Quando caiu no chão, o impacto fora tão violento que pedaços atingiram as muralhas.
Amedrontados, todos os mercenários se ajoelharam para seus novos patrões.
— Agora — finalizou o corcunda —, vamos fazer algumas mudanças...
***
Ao sentar em sua cadeira, Quasimir olhava pela sua janela mágica, encarando a cidade de Eldoria de cima; ele tinha muitos planos para ela.
Justis adentrou a sala do novo governador com uma pequena folha.
— Aqui estão as novas leis que eu quero no nosso governo — disse o Juiz, com uma voz imponente.
— Ah, claro. Vamos ver isso aqui...
Conforme passava seus olhos pelas palavras, Quasimir começou a ficar cada vez mais amedrontado. Justis estava criando leis que iam contra sua ideologia.
— I-isso é...
— Sim — respondeu Justis, firmemente. — Eu estou criando maneira para as pessoas conseguirem seus direitos. Torça para eles não quiserem tirar você...
Justis partiu sem olhar para trás, com passos firmes e pesados.
Quasimir, esperou até que Justis batesse a porta do final do corredor, então rasgou a lista com fúria. Depois de colar os pedaços e lê-los mais atentamente, Quasimir procurou maneiras de burlá-las.
Quasimir então chamou Ruby para vê-lo.
— Olá, Quasimir! Que bom que deu tudo certo! — disse ela, com um sorriso sincero.
— Sim, tudo está seguindo como eu planejei... — disse Quasimir, virado de costas, com as mãos entrelaçadas também atrás das costas. Sua voz parecia um pouco pesada.
— Então... do que você precisa?
— Ruby... Você foi a única pessoa que me ajudou toda a minha vida. É a única que sabe o quão frágil eu sou. É a única que sabe minha verdadeira personalidade.
Quasimir se virou, e com lágrimas nos olhos, abraçou sua salvadora e mãe de consideração.
— Está tudo bem... Eu estou aqui agora... Eu...
A voz de Ruby foi interrompida quando ela sentiu um rasgo em sua barriga. Ao se afastar viu seu próprio sangue, e Quasimir segurava a faca que a ferira. Sentindo suas forças deixando-a, Ruby caiu e começou a rastejar-se para tentar fugir, mas a maçaneta da porta estava longe demais para ela alcançar.
— Você... — continuou Quasimir. — É a única capaz de me impedir... É a minha única fraqueza!
Segurando a faca com as duas mãos, o deformando matou aquela que o protegera e criara, aquela que dividiu sua pouca comida e se sacrificara por ele. Inúmeras vezes, ele a perfurou até que suas forças já não tinham mais forças para segurar a faca.
Com o serviço feito, dois mercenários abriram a porta. Estavam horrorizados, mas não o suficiente para fazer algo a respeito.
— Tirem esse lixo da minha frente! — disse Quasimir, com lágrimas nos olhos.
Agora não tinha mais nada que pudesse impedi-lo.
***
Nos dias seguintes, o governador colocou o restante do seu plano em prática, assim como as novas leis do seu juiz. Embora as leis pudessem tirá-lo do poder, elas não seriam um problema se a população não tivesse conhecimento sobre elas. E ele não tinha nenhuma obrigação em explaná-las, afinal, bastava as próprias pessoas procurarem por elas para possuírem esse conhecimento; não que alguém tivesse tempo ou disposição para isso.
Utilizando os jornais, ele fez com a imagem de Eldoria fosse bem vista para todos, fazendo com que a grande maioria dos trabalhadores sentissem confortáveis em morar na cidade, assim eles ficaram desinteressados em partir.
Novamente, ele diminuiu os salários e criou novos impostos.
Quasimir, embora estivesse satisfeito com seu próprio governo, sabia que futuramente, Justis poderia se tornar um grande problema, por isso, já estava se preparando para substituí-lo.