Volume 1 – Arco 2

Capítulo 13

O casal seguiu os assassinos pela floresta, adentrando ainda mais naquele mar de sombras e mistérios.

Os galhos das árvores, secos e entrelaçados como dedos esquelético, filtravam a luz do sol, criando imagens sombrias que espiavam em cada tronco, causando a sensação de ameaça constante. O silêncio, interrompido apenas pelo farfalhar de folhas secas sob os pés, ampliava a tensão.

Kenshiro, sempre atento, movia-se com cautela, seus sentidos tão aguçados quanto a lâmina de sua espada. O menor movimento, o mais sutil suspiro da natureza, era captado por sua percepção apurada. Ele sabia que a floresta podia esconder muito mais do que aparentava.

Erina, por sua vez, caminhava ao seu lado, mas com o olhar distante. Seus pensamentos vagavam, perscrutando não apenas o caminho à frente, mas as intenções dos dois assassinos que seguiam à sua frente.

Havia algo de intrigante na dupla, algo que a fazia questionar quais eram seus verdadeiros objetivos. Seus instintos lhe diziam que havia mais por trás daqueles olhos sombrios e passos furtivos do que simples matadores de aluguel.

Apesar de sua natureza mais compassiva e reflexiva, Erina era a verdadeira líder entre os dois. Enquanto Kenshiro se dedicava a proteger o grupo e manter-se atento ao ambiente, era Erina quem traçava as estratégias e tomava as decisões cruciais. Suas mãos não tremiam diante de escolhas difíceis, e ela já havia decidido que, de algum modo, iria recrutar aquela dupla.

Olhando para Kenshiro, ela sabia que ele já estava sobrecarregado. Ele precisava de aliados que o auxiliassem em suas patrulhas e vigílias. Alguém para aliviar o fardo que ele silenciosamente carregava. Além disso, Erina buscava algo mais: um membro que pudesse servir como um alvo em destaque. Alguém forte o suficiente para atrair a atenção dos inimigos, desviar o foco dos outros, mas que também tivesse poder para suportar o peso desse papel. Sabia que não encontraria isso nos assassinos.

Em meio aos seus devaneios, Erina foi interrompida pela figura de Kuroda, que surgira silenciosamente ao seu lado, como uma sombra viva. Seus olhos brilhavam, cheios de uma curiosidade quase infantil, embora sua expressão estivesse oculta pela máscara.

— Está tudo bem? — perguntou Erina, com um leve sorriso nos lábios, embora ainda se sentisse desconfortável com a proximidade inesperada.

— Apenas gostaria de fazer algumas perguntas... — respondeu Kuroda, sua voz suave e inquisitiva.

Erina viu ali uma oportunidade. Se havia algo que pudesse obter daqueles dois, seria por meio da conversa.

— Vamos fazer assim: eu respondo uma pergunta sua e você responde uma minha — sugeriu ela, sua voz firme.

Kuroda assentiu rapidamente, parecendo satisfeito com a troca.

— Combinado! Primeira pergunta: onde vocês estavam todo esse tempo?

— Nos mudamos para o sul. Para um chalé próximo a um lago de águas claras — respondeu Erina, mantendo o tom casual, mas percebendo o olhar desconfiado que Kenshiro lhe lançava, como se achasse perigoso compartilhar tantos detalhes.

— E vocês? — continuou Erina, sem perder tempo. — Como se tornaram assassinos?

Kuroda hesitou por um momento, como se a resposta lhe pesasse, mas logo sorriu.

— Não foi escolha nossa. Fomos adotados e criados pela Irmandade — disse, de forma vaga, mas suficiente para indicar que havia um passado sombrio ali.

Kenshiro franziu o cenho, suas sobrancelhas se juntando em desconfiança.

— Adotados? — ele perguntou, com um tom mais cortante.

— Ei, calma aí! É a minha vez de perguntar! — Kuroda retrucou, levantando a mão como quem quer manter o controle do jogo. — Como vocês conseguiram sobreviver e permanecer escondidos por tanto tempo? A província de Aeterna não é exatamente um lugar fácil de se desaparecer.

Erina sorriu diante da curiosidade crescente, mas foi Kenshiro quem respondeu, sua voz grave.

— O chalé fica em uma floresta cercada por montanhas. Não há vilarejos ou rotas comerciais por perto. Não há nada de especial lá — ele parou por um momento, refletindo. — Caçamos, pescamos. Sobrevivemos, como todos os outros.

Nesse instante, Takashi, que até então se mantinha em silêncio, observando tudo com olhos atentos, finalmente se virou para trás, como se quisesse verificar algo no caminho que haviam percorrido.

— Como vocês foram descobertos? — Takashi perguntou, sua voz baixa, mas carregada de uma seriedade que fez o grupo se calar.

Kenshiro e Erina se entreolharam. Aquele era um assunto delicado.

— Não sabemos ao certo — começou Erina, a hesitação em sua voz clara. — Uma mulher entrou na floresta naquela noite. Reiji foi o primeiro a notá-la. Ele foi ao seu encontro, suspeitando de algo, e... acabou morto.

— E como vocês sobreviveram?

Os olhos de Takashi fixaram-se em Erina, buscando ver alguma verdade oculta em suas palavras; também estava buscando respostas para suas próprias dúvidas. Kenshiro, sentindo um pequeno desconforto, não entregaria todas as respostas facilmente, apenas respondeu:

— Tivemos sorte.

O silêncio que se seguiu foi quase palpável, carregado com as perguntas que ficaram por dizer. Então, Kuroda, como que para dissipar a tensão, voltou ao seu tom mais leve.

— Você é mesmo uma maga de cura? — perguntou, seu tom agora mais curioso do que provocador.

Erina assentiu, mas não pôde evitar o peso em suas palavras.

— Sou, mas... não fui treinada adequadamente. Dominei a habilidade por conta própria, mas não sou capaz dos milagres que meus ancestrais faziam.

O grupo seguia em frente, mas Kenshiro parou de repente, seus sentidos captando algo além do que os outros podiam perceber.

— Estamos sendo seguidos — ele murmurou, a mão já repousando sobre o cabo de sua espada.

Os outros pararam imediatamente.

Takashi lançou um olhar desconfiado a Kenshiro, mas ao seguir a direção que ele indicara, avistou alguém tentando se esconder atrás de uma árvore.

— Como você percebeu? — perguntou Takashi.

— E como você não? — revidou Kenshiro.

— O que devemos fazer? Não estamos tão distantes da irmandade! — disse Kuroda, apreensivo.

— Não vamos conseguir despistá-lo a tempo. Temos que interceptá-lo e descobrir o que ele quer — afirmou Kenshiro, com serenidade.

— Parece que nossa volta trouxe alguns admiradores... — comentou Erina, em tom irônico.

Imediatamente, ela começou a traçar um plano.

***

A uma distância considerável, uma jovem observava o grupo em silêncio, espreitando-os. A mulher tinha um rosto juvenil, embora seus traços fossem mais maduros, e era ligeiramente mais alta que Kuroda. Seus cabelos curtos e escuros davam-lhe uma aparência andrógina, mas o contorno de seus seios, mesmo que pouco desenvolvidos, revelava sua feminilidade. Sua pele era bronzeada, e ela trajava um uniforme militar incomum, com aberturas nas costas e na região do abdômen.

Ela observava Erina conversar com Kuroda, quando de repente percebeu a ausência dos outros dois membros do grupo. Porém, quando notou, já era tarde demais.

Kenshiro e Takashi surgiram de cima de uma árvore, prendendo-a rapidamente. Em poucos instantes, a jovem estava amarrada e fora levada até Erina, ajoelhada, com os braços firmemente atados ao corpo.

— O que acha? — perguntou Kuroda, lançando um olhar ameaçador. — Deixamos ela para os animais ou a matamos agora mesmo?

— Primeiro, precisamos saber as verdadeiras intenções dela — interveio Takashi, tentando manter a razão.

Enquanto discutiam o destino da jovem, Erina observou algo curioso: a expressão dela permanecia inabalável, completamente apática.

— Qual o problema dela? — perguntou Erina, intrigada.

— Talvez esteja tentando se fazer de durona — sugeriu Kuroda, puxando uma adaga. — Um ou dois cortes podem fazê-la falar.

— Nada de cortes! — advertiu Takashi, firme.

— Seja quem for, ela veio até nós por algum motivo — ponderou Kenshiro, pensativo. — Ela nos encontrou, afinal.

No meio das especulações, Erina notou que a jovem olhava repetidamente para suas mãos amarradas. Sem hesitar, Erina tomou uma decisão inesperada: libertou-a.

— O que você está fazendo? — questionou Kenshiro, surpreso.

— Ela pode tentar escapar! — exclamou Takashi.

Mas para surpresa de todos, a jovem não fugiu. Ela apenas se esticou, estalou os dedos e começou a se comunicar em Signês, a antiga língua de sinais.

Em uma era mais antiga, diversas cidades e reinos tinham seus próprios idiomas, até que o Império unificou a todos. Contudo, antes disso, Signês já era a língua universal, por sua simplicidade e fácil aprendizado. Até hoje, é ensinado nas academias imperiais, sendo desconhecido apenas por nobres e bandidos.

A jovem se apresentou como “Xin”, uma agente de Zudao, governador da cidade livre de Shenxi.

— O que faz aqui? — perguntou Erina.

Xin explicou que fora enviada em uma missão para encontrá-los, pois, segundo seu mestre, eles eram os únicos capazes de chegar até um grande Herói que havia se isolado em um templo próximo à cidade.

— Isso é impossível... Todos os Heróis foram mortos! — exclamou Kenshiro, incrédulo.

— Como sabe disso? — questionou Takashi. — Essa informação é confidencial. O Império se esforçou muito para evitar pânico.

— Sabemos que na noite em que Reiji foi assassinado, ele não era o único alvo... — respondeu Kenshiro, sombrio. — Digamos apenas que tivemos uma fonte privilegiada.

Os assassinos se mostraram curiosos sobre essa fonte misteriosa, mas antes que pudessem pressionar Kenshiro por respostas, Erina lembrou que ainda precisavam decidir o destino de Xin.

— Por que você não fala? Suas cordas vocais parecem normais — observou Erina.

Xin explicou que havia feito um voto de servidão a Zudao. Esse voto a impedia de revelar os planos ou intenções de seu mestre. Mesmo que tentasse falar em Signês, não conseguiria traí-lo.

— Podemos confiar em você? — perguntou Erina, cerrando os punhos.

Xin, ainda com sua expressão apática, respondeu que não havia motivo para se preocuparem com uma traição. Ela fora ordenada a servi-los até chegarem à cidade de Shenxi.

Intrigada, Erina decidiu testar a lealdade de Xin, dando-lhe ordens absurdas, quase como se a tratasse como um animal.

Xin obedeceu sem hesitação, independentemente da humilhação envolvida. Cansada e irritada, Erina deu uma última ordem cruel.

— Corte sua própria garganta. Quero que seja fatal.

Antes que Kenshiro, Takashi ou Kuroda pudessem detê-la, Xin agarrou a adaga de Kuroda e, sem vacilar, rasgou sua própria garganta.

Por alguns segundos, Xin se manteve de pé, até que, sem forças, caiu de joelhos, ainda encarando Erina com seus olhos vazios.

Nojo e raiva se misturaram no rosto de Erina. Ela se agachou, aproximando-se de Xin, que começava a tremer.

— Por que você é tão fiel ao seu mestre? — indagou Erina, olhando diretamente nos olhos da jovem moribunda.

Com dificuldade, Xin revelou que não era uma questão de lealdade, mas de submissão. Seu voto era tão forte que apagava seus sentimentos e pensamentos. Ela era mais uma escrava do que uma serva. Zudao a havia torturado até que, por acidente, esse voto de servidão foi estabelecido. Ainda assim, ele prometera libertá-la ao final da missão. Uma promessa que ele não poderia quebrar.

Ao ver lágrimas tímidas surgirem nos olhos de Xin, Erina, com um misto de piedade e frustração, usou seus poderes para curá-la.

Assim que a ferida de Xin cicatrizou por completo, ela se ergueu e, sem hesitar, aguardou a próxima ordem de Erina.

— Vamos andando — ordenou Erina, seca.

Xin imediatamente obedeceu, caminhando ao lado do grupo.

— Você vai mesmo confiar nela?! — perguntou Kuroda, indignado.

— E por que não? Ela é uma ferramenta sem vontade própria. Não há como nos trair.

— A menos que façamos algo que interfira na missão dela — alertou Kenshiro, ponderando.

— Eu sei disso — respondeu Erina, sem vacilar.

O grupo continuou sua jornada rumo ao covil dos assassinos, com Xin ao seu lado, sempre sob o olhar desconfiado de Kuroda e Takashi. Kenshiro, por outro lado, parecia não se importar tanto.



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