Volume 1 – Arco 1

Capítulo 9.1: Infância em Aeterna*

LEIA COM ATENÇÃO:

Caro leitor,

Este é um capítulo especial e opcional. Não é necessário lê-lo para seguir a história principal. Esses capítulos extras têm como objetivo aprofundar determinados temas como: personagens, grupos ou eventos, e em alguns casos, exploram histórias que não são cruciais para a trama central.

Neste capítulo (Capítulo 9*), você acompanhará a infância de Kenshiro Torison até o "Incidente dos Descendentes."

  • 1 - Infância em Aeterna
  • 2 - Família Waltz
  • 3 - Convidada
  • 4 - A Capital
  • 5 - Incidente

1 - Infância em Aeterna

Aos oito anos, Kenshiro foi enviado à Academia de Aeterna, onde permaneceria até concluir seus estudos e treinamento para se tornar um reservista imperial.

Apesar de nem ele nem sua família desejarem tal destino, o título de Reiji como um herói imperial, o Melhor Espadachim do Império, impunha deveres e obrigações. Uma dessas obrigações era o alistamento das crianças de sua família.

Felizmente, Ren não precisaria passar por isso.

A existência de Ren era um segredo guardado a sete chaves, principalmente do Império. Não havia documentos ou registros que atestassem sua existência, e Reiji se recusava a revelar a razão por trás disso.

Para garantir sua dispensa e retorno à sua família, Kenshiro decidiu não se destacar na academia, esforçando-se para ser apenas um aluno medíocre. No entanto, essa tarefa se mostrou mais desafiadora do que ele imaginava.

Um dia, a representante de sua turma o chamou para uma conversa.

Anna, a representante, tinha cabelos e olhos azuis. Apesar de sua aparência meiga, era conhecida por sua atitude rígida, sempre exigindo o melhor desempenho de seus colegas.

Ela havia convocado também outro aluno para a reunião: Oliver.

Oliver tinha olhos verdes e cabelos escuros espetados. Sua aparência era mediana, quase despercebida pelos demais. Kenshiro só notou sua presença naquela ocasião.

Oliver sempre terminava suas tarefas antes dos outros, mas suas notas eram tão medianas quanto de Kenshiro. Ele era visto frequentemente cochilando.

No corredor, a caminho da diretoria, Anna iniciou o interrogatório.

— Sei o que vocês dois estão fazendo — disse Anna, cruzando os braços.

— E o que seria? — perguntou Oliver, relaxado, com os braços atrás da cabeça.

— Observei vocês por vários dias e percebi que são mais inteligentes do que aparentam. Se continuarem assim, terei que denunciá-los!

— Calma, não é necessário tanto — disse Oliver, desfazendo sua pose. — Tenho certeza de que podemos chegar a um acordo...

Oliver sabia que nem sua melhor atuação conseguiria convencer Anna, muito menos os professores caso Anna relatasse contra ele.

Anna, como representante, desfrutava de incentivos e benefícios dos professores. Ela possuía tanto poder que poderia até mudar os professores de sua turma, se desejasse.

— Antes de decidir o que farei, quero saber seus motivos — respondeu Anna, afastando Oliver com um dedo.

Oliver começou a morder o canto de seu polegar, relutante em revelar seu motivo.

Um pouco frustrado, Kenshiro respondeu:

— Só quero ser dispensado e voltar para minha família.

— Só isso? Simples assim? O exército está lotado, só serve quem quer hoje em dia, independente das notas...

— Pode ser, mas se algum oficial se interessar minimamente por mim, posso acabar sendo obrigado a servir.

— Bem, vou pensar sobre o que farei com você. E você, Oliver?

Temendo o desfecho, Oliver respirou fundo e revelou seu plano.

— Não quero me destacar porque... assim... me tornarei um oficial.

Kenshiro e Anna ficaram confusos.

— Então você não quer um salário decente, ou uma cama confortável? Quer fazer só o serviço braçal? — questionou Anna, sem acreditar totalmente na história. — A vida de um soldado comum não é mil maravilhas...

— Quero começar de baixo, como um simples soldado. Assim, quando me tornar um oficial, será por mérito!

— Há mérito em se tornar um oficial por meio dos estudos! — retrucou Anna, ofendida pela visão de Oliver.

— Se me tornasse oficial pela academia ou recomendação, estaria preso a servir a algum general por toda a carreira. Mas se eu começar como soldado, ninguém poderá me impedir quando eu começar a subir!

Anna ainda estava cética, por isso levou os garotos até uma sala onde inúmeros documentos ficavam guardados. Ela pegou um grande livro onde continha os registros dos melhores alunos e suas conquistas.

Ao analisá-lo friamente, Anna se espantou ao ver que Oliver falava a verdade. Aqueles que se destacaram tornaram-se oficiais, mas suas carreiras estagnaram. Em contraste, alguns oficiais que começaram como soldados simples, embora fossem a minoria, conseguiram títulos e reconhecimento superiores.

Abalada, Anna se desculpou com Oliver, curvando-se com alta velocidade para não demonstrar sua vergonha. Acabou batendo a cabeça na prateleira de registros, deixando alguns livros e folhas caírem no chão.

Enquanto os três limpavam a bagunça, Anna pegou uma folha e ao lê-la, viu um detalhe chocante.

— VOCÊ É SOBRINHO DO REIJI TORISON?! — exclamou Anna.

— O QUÊ?! — gritou Oliver, espantado.

Kenshiro tentou abafar o alarde, cobrindo a boca dos dois.

— Fiquem quietos! Se alguém descobrir, serei enviado para a Capital!

Anna mordeu a mão de Kenshiro, voltando a questioná-lo.

— Mas isso seria ótimo! Melhor educação, oportunidades, uma chance de conhecer os heróis... Estamos falando da Capital!

— VOCÊ É UM DESCENDENTE?! — gritou Oliver, depois de ler mais o registro.

Anna ficou ainda mais surpresa. Ser parente de um herói e, ainda por cima, um Descendente, concedia a Kenshiro o direito de se tornar um nobre facilmente.

Os Descendentes eram considerados as famílias mais importantes da humanidade. O Império lhes concedeu títulos, terras e tesouros para incentivá-los a permanecer em seu território. Não havia razão para que não fizessem o mesmo com a família Torison.

A história dos Descendentes é extensa e considerada uma lenda por muitos, mas todos os reconhecem como heróis por direito de nascimento, cujos ancestrais salvaram a humanidade em seus momentos mais sombrios.

Oliver e Anna tentavam convencer Kenshiro das vantagens que isso lhe traria, mas ele se enfureceu.

— EU NÃO QUERO SERVIR AO IMPÉRIO! — exclamou Kenshiro. — Por que meu sangue deveria ditar meu destino? Tenho meus próprios objetivos e opiniões, não preciso que o Império me diga como devo agir ou o que fazer!

— Calma, Kenshiro... Não falamos por mal — explicou Oliver.

— Sim, só pensamos que você gostaria de aproveitar essas vantagens — disse Anna.

Então Kenshiro percebeu algo.

— Entendo... Vocês dois querem se aproveitar de mim para ir à Capital...

— O quê? Não! — protestaram os dois.

— Pois bem, façam o que acharem melhor... — disse Kenshiro, virando as costas e deixando-os sozinhos.

Tanto Oliver quanto Anna desejavam muito ir para a Capital, mas nunca haviam pensado em utilizar Kenshiro para atingir seus objetivos. Os dois eram apenas crianças, sem malícia ou intenções egoístas.

***

Kenshiro estava no alojamento de sua turma, arrumando suas malas, quando Oliver apareceu.

— Podemos conversar? — perguntou Oliver, encostado na parede. Anna estava ao seu lado.

— Claro — respondeu Kenshiro, indiferente.

Oliver se jogou na cama de Kenshiro, impedindo-o de continuar a arrumar suas coisas. Irritado, Kenshiro se sentou para ouvi-los.

Não havia mais ninguém no alojamento, pois Anna os havia tirado de uma aula, e demoraria alguns minutos até que os outros alunos voltassem.

— Vou contar a vocês por que quero tanto me destacar — começou Anna. — Meu pai é um herói imperial conhecido como Noah, “a Mancha.”

Kenshiro não conhecia o herói imperial, mas pela expressão de Oliver, ele deveria ser muito famoso e reconhecido.

— Meu irmão Gideon — continuou Anna — está na Capital, mas é um aluno problemático. Meu pai me mandou para cá para evitar que eu sofresse alguma influência negativa dele, mas me garantiu que, se eu me destacasse o suficiente, poderia voltar para a Capital.

Kenshiro ainda estava processando a história quando Oliver resolveu contar um pouco mais sobre si.

— Sou órfão. Não tenho para onde ir nem a quem recorrer. O pouco que sei sobre meus pais é que foram perseguidos pelo Império por algum crime muito grave, ao ponto de o Império querer até me matar por isso...

— Como assim? — perguntou Kenshiro.

— Eu forjei meus documentos para me alistarem. Paguei a um homem para se passar por meu pai, e assim consegui entrar na academia.

Kenshiro e Anna ficaram surpresos com a inteligência de Oliver, mas perceberam que ele não a usava para benefício próprio.

— Está vendo, Kenshiro? — perguntou Anna, chamando a atenção de Kenshiro. — Nenhum de nós dois quer ou planeja usar você para ir à Capital. Meu pai não me enviaria para lá só porque um colega é especial...

— E eu posso acabar sendo investigado! — acrescentou Oliver.

— Vocês estão certos... — disse Kenshiro, envergonhado por sua desconfiança. — Mas eu realmente não quero ser enviado para a Capital.

Mais calmos, e percebendo que não havia motivo para inimizades, Anna declarou:

— Parece que vou deixar vocês dois continuarem como estão...

— Sério? — perguntaram os garotos.

— Sou a representante de vocês. Como um oficial, não posso escolher a dedo meus soldados... Não reportarei nada sobre a família de Oliver, nem sobre você, Kenshiro.

Os dois garotos comemoraram, aliviados.

— PORÉM... — acrescentou Anna — vocês precisam melhorar suas notas. O suficiente para que nossa turma se destaque, mas não os alunos em específico. Pode ser?

— Sim, senhora! — responderam os dois.

***

A partir daquele dia, Anna, Oliver e Kenshiro começaram a desenvolver uma amizade. Os garotos obedeceram à representante, e sua turma se destacou entre as demais. Todo o crédito foi para Anna, que foi considerada uma excelente líder.

A cada cinco dias na academia, os cadetes tinham direito a dois dias de folga, durante os quais podiam fazer o que quisessem.

— Oi, Kenshiro. O que você vai fazer nesses dois dias? — perguntou Anna, um pouco envergonhada.

— Vou ficar com a minha família. Você quer conhecê-los?

— Não, não. Pode ir, aproveite! — respondeu Anna, desviando o olhar.

— Obrigado. Nos vemos de novo na academia!

Por algum motivo que ela não conseguia entender, Anna sentiu-se triste por não poder ficar ao lado de Kenshiro.

Enquanto isso, Oliver desaparecia e reaparecia misteriosamente entre as folgas, sem nunca se despedir ou cumprimentar os dois.

Essa rotina continuou se repetindo. Anna nunca encontrou coragem para conhecer a família de Kenshiro ou para pedir que ele ficasse com ela durante os dias de folga. E o paradeiro de Oliver, assim como o que ele fazia nesses dias, permanecia um mistério.



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