Volume 1 – Arco 1

Capítulo 5

A noite chegou rapidamente, e Reiji estava quase terminando de contar sua última história.

— E, por último, temos “Zeruz, o Herói”, e meu mestre...

— Desculpe interromper, mestre Reiji... — disse Kaji, com um tom debochado. — Mas o senhor poderia... FECHAR O DEPÓSITO?! Alguns esquilos acabaram de entrar e estão mexendo no meu corpo!

Reiji olhou para o relógio de parede e se assustou ao ver o horário, e mais uma vez ao notar a escuridão do lado de fora.

Antes de sair, ele pegou sua espada.

— Vou aproveitar e fazer uma patrulha. E quanto a vocês dois... se comportem... — disse Reiji, deixando Erina e Kenshiro a sós.

Pela luz fraca da cabana, Reiji deduziu que Kaji havia diminuído o próprio fogo para deixá-los mais a vontade. Com um sorriso no rosto, Reiji caminhou até o depósito para fechá-lo, planejando uma caminhada longa e tranquila naquela noite.

Reiji possuía um conhecimento íntimo da floresta, sabia a localização de cada árvore e pedra como a palma de sua mão. Sua audição aguçada permitia-lhe ouvir cada criatura que habitava aquele lugar. Nada passava despercebido por ele.

Naquela noite, ele não estava interessado em prestar muita atenção, não queria escutar algo indevido vindo da cabana. Contudo, algo o forçou a ficar mais alerta: alguém havia entrado na floresta.

Era comum algumas pessoas adentrarem a floresta para caçar ou colher plantas, ninguém jamais se aproximara de sua cabana antes. O estranho, era uma pessoa adentrar a floresta àquela hora da noite.

“Não há nada de interessante nesta floresta... nada, exceto...”, pensou Reiji, analisando todas as possibilidades.

O indivíduo havia acabado de chegar à primeira pista: o pinheiro caído. Parou por alguns instantes, e então seguiu na direção certa para a cabana.

“Ele encontrou as pistas!”, percebeu Reiji.

Reiji colocou a mão sobre sua espada e deixou a barreira o mais rápido que pôde. Começou a correr na direção daquele que se aproximava de sua família.

No caminho, tentou distinguir o invasor apenas pelo som de seus passos.

“Passos leves... ou ao menos é bom em furtividade. Um dos pés está quebrado, mas a dor não parece incomodá-lo... poderia ser um Renascido?”, analisou Reiji.

Quando finalmente avistou o invasor, ficou surpreso ao ver que se tratava de uma mulher ferida.

A mulher tinha cabelo chanel tingido de um azul vibrante. Sua pele também apresentava uma tonalidade azulada, talvez pela iluminação da lua naquela noite. Seu corpo parecia fraco e desnutrido, exibindo inúmeros ferimentos. Ela não vestia roupas, apenas uma faixa branca cobria algumas partes do corpo, e seu pé estava visivelmente quebrado.

— Socorro... — murmurou a mulher, tentando caminhar.

Quando seu pé finalmente cedeu, Reiji foi rápido e a pegou antes que caísse. Segurando-a pelas costas, ele confirmou que a mulher era tão leve quanto uma criança; ela deveria ter passado por muitas dificuldades para chegar até ali.

— O que aconteceu com você? — perguntou Reiji, preocupado.

A mulher permaneceu com os olhos fechados. Com a mão esquerda, ela tocou o rosto de Reiji gentilmente, como se ele fosse a primeira boa pessoa que surgiu em seu caminho. Finalmente ela falou, ainda com dificuldades:

— Eram seis homens... Eles invadiram nossa casa e nos prenderam...

Enquanto prestava atenção na história, Reiji não percebeu que o braço direito da mulher estava estendido atrás dele. A faixa em seu antebraço escondia um buraco em sua própria carne, onde guardava uma adaga.

Ela sutilmente retirou a adaga de seu antebraço, com a própria mão direita, e segurou-a a poucos centímetros da nuca do espadachim.

A mulher finalmente abriu os olhos, revelando o vermelho intenso e hipnotizante de sua íris. Ela queria ver o rosto do homem que iria matar.

E finalmente, ela atacou.

— Como imaginei... Um inimigo! — disse Reiji, segurando o braço da mulher a tempo.

Sua expressão de compaixão deu lugar à raiva. Estava determinado a matar aquela mulher, lutando internamente entre a vingança pessoal e a busca por respostas.

Utilizando apenas seu esforço, ela tentou finalizar seu ataque. Porém, Reiji segurava seu braço com tamanha força que o mesmo começou a necrosar; seu estado realmente estava comprometido.

A mulher retirou outra adaga, desta vez de sua barriga, e tentou perfurar o coração de Reiji. O espadachim a afastou, lançando-a contra um pinheiro apenas com a força da palma de sua mão.

Enquanto a agressora tentava se recompor, Reiji flexionou os joelhos e colocou a mão sobre o cabo de sua espada ainda embainhada, deixando-a levemente inclinada para trás.

Aquela era sua posição natural de combate, onde poderia efetuar um saque rápido, realizando um ataque ou defesa à sua escolha. Desta maneira, o inimigo não conseguiria prever seu movimento.

— Saiba que o único motivo de eu não ter lhe matado é porque preciso de respostas. Fale o que preciso saber, e prometo lhe dar uma morte rápida e indolor.

A mulher levantou-se com dificuldade.

Ainda estava encarando o chão quando soltou uma pequena risada, que logo se transformou em uma gargalhada. Erguendo seu rosto para encarar Reiji, ela exibiu uma expressão de empolgação, com os olhos arregalados e um sorriso largo que mostrava todos os dentes.

— Finalmente! Um adversário que promete uma verdadeira “boa morte” ao invés de uma falsa “piedade.” Gosto quando meus alvos são honestos... — disse ela, com uma voz estranhamente sedutora.

Reiji ouviu um ruído agudo e irritante vindo de trás dele. Quando se virou, teve que desviar sua cabeça rapidamente para não ser perfurada por uma adaga voadora, escapando por pouco.

A mulher voltou a rir enquanto suas duas adagas flutuavam ao seu redor. Ela possuía poderes telecinéticos, e aquele ruído era o motivo pelo qual ela não havia o utilizado antes para atacar.

O espadachim não queria acreditar que enfrentava apenas uma louca ou psicótica. Observando o que a mulher fazia, viu ela fazendo um pequeno corte em sua própria bochecha, e logo em seguida apontou para o ferimento com seu dedo, ao mesmo tempo que deu uma piscadela.

Sentindo uma pequena queimação em sua bochecha, Reiji passou o dedo e se assustou ao ver seu sangue. A adaga que desviara havia lhe arranhado. Sua adversária singular foi a primeira a feri-lo em batalha; e ela sabia disso.

— Por ter sido honesto comigo, irei retribuir...

A mulher retirou a faixa, revelando seu corpo completamente nu. Ela tinha diversos ferimentos, alguns estavam cicatrizando, outros foram fechados por meio de pontos, e alguns ainda sangravam levemente.

— Tenho mais quatro adagas dentro do meu corpo; consegue identificar de onde surgirão? — sua voz estava um pouco eufórica.

Reiji assumiu novamente sua postura de combate e fez sua primeira pergunta:

— Como vocês me encontraram?! — exigiu ele.

— Isso foi fácil... Eu senti um pulso de energia se deslocar até essa floresta. Pensei que fosse alguma luta, mas você só usou uma técnica de combate para cortar tempo... — disse a mulher, com um sorriso malicioso nos lábios, sua voz aveludada e envolvente flutuando no ar como um convite implícito. — Admito que estou desapontada, esperava que você não fosse cometer o mesmo erro que seu irm...

A mulher foi interrompida, com Reiji exemplificando tal técnica em um ataque, denonimado “Impulso.”

O espadachim surgiu atrás da mulher em menos de um instante, causando seis cortes precisos: um em cada membro, e dois cortes cruzados no centro do corpo. Após a demonstração de tamanha velocidade, sua espada ainda permanecia embainhada.

A mulher segurou a boca para não vomitar seu sangue escasso, percebendo que subestimar seu alvo lhe causaria uma derrota amarga.

Reiji voltou a encarar a mulher e fez sua segunda pergunta:

— Você matou Kenzou Torison?!

A mulher permaneceu em silêncio e começou a respirar profundamente, várias vezes. Embora fosse o momento perfeito para atacá-la, Reiji não queria ser desonroso. Além disso, estava em busca de respostas; sabia que não perderia aquela luta.

A postura da mulher se endireitou, como se outra pessoa tivesse assumido o controle de seu corpo, e, mais calma, ela disse:

— Peço desculpas pelo meu comportamento, Reiji Torison — sua voz, ainda seduzente, agora falava de maneira calma e respeitosa. — Meu nome é Kara. Meu... “companheiro” foi responsável pela morte de seu irmão. Mas espero que acredite em mim, eu não queria que ele morresse.

— Obrigado... Prometo que sua morte será rápida, na medida do possível.

— Não posso prometer o mesmo, mas farei sua morte ser agradável...

Ambos assumiram suas posições para o embate.



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