Bom Demônio Brasileira

Autor(a): Trajano


Volume 1 – Arco 2

Capítulo 35: Chegando ao clímax!

— Huh...?

Sua mente estava em colapso.

O que tinha  lhe acertado? Uma flecha? Impossível, era a única palavra que vinha à mente. O arco de Elias estava nas árvores. Suas flechas, mesmo que no solo, estavam  distantes e de uma posição contrária. Era possível, mas de chance mínima que ele as tivesse recuperado.

Um arco e flecha escondidos no corpo? A mera possbilidade disso chegava a ser ridícula. O arco teria de ser dobrável, e a flecha escondida em alguma parte do corpo. Ambos atrapalhariam seu movimento e, com certeza, Limit perceberia.

Sendo assim, o quê...?

— Hur...

Caiu, sustentando-se apenas com um joelho. Para responder sua dúvida era mais simples simplesmente visualizar o ferimento, visto que o projétil estava em seu corpo. Porém, apenas imaginar isso lhe causava angústia.

Desesperou-se ainda mais. Como tinha sido acertada pelas costas, não sabia onde estava Elias. Se ele estivesse em forma, poderia acabar com ela a qualquer instante. Se isso ainda não tinha acontecido, pensou ele estivesse indisposto.

Não, estava mentindo para si mesmo. Não achava que fosse algo factual. Queria acreditar que fosse assim pois seria mais simples.

De qualquer forma, era um obstáculo que podia ser superado. Para tal precisava de uma mente calma. Por esse motivo tinha de sair de onde havia sido acertada. Ainda com o “elemento X” fincado em suas costas, rastejou até a árvore mais próxima e deitou contra o outro lado do tronco.

Devido a falta de força, bateu de forma desajeitada. O pouco ar que estava conseguindo reunir foi expelido no instante em que suas costas entraram em contato com a madeira. Limit até se questionou se não havia piorado o ferimento.

— Arf... Arf...

Sua respiração era pesada. Se o pulmão houvesse sido atingido, seria um problema.

“Eu ao menos deveria estar viva...?” — Tinha muito conhecimento, mas biologia nunca foi um dos maiores interesses de Sea, então não sabia muito sobre isso.

Deitou de forma que o ferimento não piorasse. A cabeça foi erguida e os dentes rangeram de tanta pressão que a mandíbula transmitia. Isso tudo proveniente da dor que esse movimento ordinário proporcionou.

— Foco...

Era isso que necessitava. Foco. A ideia de Elias impotente cresceu em sua cabeça. Era muito tempo para não tê-la finalizado. Tinha de cuidar de seus ferimentos de imediato.

Levou sua mão trêmula até as costas, tentando encontrar o que lhe havia acertado. Havia um cabo cheio de lascas, deixando claro o péssimo acabamento. Sinceramente, era até difícil de acreditar que algo tão rígido estava dentro de si. Queria gritar, mas se segurou.

Sentiu algo parecido com a pena — onde se colocam o dedo indicador e médio para ajustar à corda — e confirmou ser uma flecha.

Não fazia sentido isso. Não conseguia imaginar como isso fora possível. Havia esquecido de algo, deixado algo passar? Seria isso tão óbvio?

Na realidade, uma série de fatores acarretaram nisso. Em seus dois meses de treino contínuos lhe foi ensinado apenas uma magia: reforço. Então, achou lógico que o leque de habilidades de Elias não fosse muito mais vasto que isso. Até porque, as magias também precisavam de uma afinidade de nascença.

O teletransporte e reforço haviam sido o limite disso. Quando uma habilidade a mais que a sua foi mostrada ela relaxou. Também tinha o fator desespero. Não estava agindo como o normal devido as circunstâncias. Se não fosse por apenas um desses motivos, deduziria que Elias possuía a habilidade de criar objetos. Magia espacial: criação.

Enfim, agora não importava.

— Eu não consigo fazer nada se não... tirar... hur...!!! — tentou puxar a flecha para fora, mas não conseguiu. Uma dor ainda maior se alastrou pelo corpo. Tinha de cuidar disso antes.

O primeiro passo era acalmar a mente.

Mesmo passando por uma aflição gigantesca, pôs em uso o motivo para trocar de lugar com Sea.

Suas pupilas estavam extremamente dilatas devido a falta de oxigenação do cérebro. Mas após ativar sua habilidade, comprimiram bastante. Estava se concentrando tanto que a entrada da luz foi negada em seus olhos.

O sangue correu mais rápido. As células se reagruparam, formando algo impossível por meios normais. Organelas, órgãos, células, tecidos e nutrientes desafiavam as leis naturalmente estabelecidas para cumprir as vontades da garota.

Logo acima dos rins, nas glândulas suprarrenais. O órgão por si só já trabalhava intensamente para contornar a situação. No entanto foi além. Uma quantidade exarcebada de demanda foi feita a ele, fazendo-o trabalhar a mais de 100%. Uma quantidade inimaginável de endorfina — também conhecida como adrenalina — corria por suas veias.

Alguns instantes depois a dor foi pouco a pouco cessando. A outrora sensação angustiante foi desaparecendo. O ferimento não estava melhorando, muito pelo contrário. Mas agora Limit conseguia pensar com calma.

— Ah... — soltou um suspiro de alívio. — Humhum! — contudo, em seguida remexeu a cabeça. Não era hora para isso.

Queria retirar a flecha logo, assim poderia curar o ferimento. Porém, ainda não tinha certeza de onde havia sido ferida. Na correria esquecera de olhar isso.

De qualquer forma, agora sem medo podia olhar sem problemas. Virou o pescoço e viu a flecha encravada em seu corpo pelo lado direito, pouco acima da cintura.

Queria tirar, mas haviam dois problemas: não sabia se era a melhor ideia, afinal, estava tampando o sangue de sair; também tinha a questão de que se, por acaso, ela quebrasse no meio — visto seu péssimo acabamento — seria quase impossível retirar.

Sendo assim, restava-lhe uma opção: Atlas.

A bênção junto de suas habilidades regenerativas naturais mais a proteção de seu bisavô teriam de ser mais que o suficiente.

Agora, a questão era encontrar água. Teria de escolher uma direção de forma aleatória, afinal, se não havia encontrado pistas até o momento, não era agora que iria descobrir.

Muito possivelmente Atlas seria capaz de ajudar, todavia era impossível.

Foi quando... sua visão pausou para um lado.

— ...

Não sabia explicar o que era. Não era uma direção diferente das demais, porém... parecia diferente.

Como se seu corpo fosse atraído. O lamúrio de algo o convidando para perto, sinalizando...

Ficou pensativa sobre, mas resolveu escolher ir por esse lado. Além de ser onde seus “instinto” apontava, era também a direção contrária a de onde Elias deveria estar.

— Hum.

Parando para pensar, havia percorrido uma boa distância para trás. Ir diretamente ao lado contrário aumentaria suas chances. Tanto sobrenatural quanto realidade colaboravam. Levantou-se decidida.

Devido a falta de sensação de dor não podia cordenar os movimentos com perfeição. Vez ou outra tropeçaria sem sequer perceber. Outras caminharia para o lugar errado. O ferimento por sorte não havia afetado diretamente a metade inferior.

Essa sequência se manteve por um tempo...

...

— Argh... Ah...!

No meio da trilha um som conhecido ressoou pelo seus ouvidos. Algo como centenas de milhões de partículas entrelaçadas estatelando-se entre si e contra outros objetos... límpido e claro, igual a....

— Água!

Como uum peixe que há muito não via sua casa, Limit deixou de lado os problemas de mobilidade e avançou contra o riacho.

Onde estava era consideravelmente diferente. A vegetação escura e densa da floresta foi sendo deixada de lado, dando lugar para um ambiente claro e aberto.

Um córrego de alguns metros de largura passava por ali. Parecia estar descendo, por mais que em um grau diminuto. Seu contorno era cercado por um terreno pedregoso cheio de areia. Isso explicava o porquê de não ter árvores grandes por ali.

Essa área distanciava o rio da floresta por mais de duas dezenas de metros. Por estar machucado Limit demorou alguns minutos, mas logo alcançou o riacho.

A água era límpida e esguia. Sua superfície azul-clara refletia com esplendor a imensidão de luz que vinha do sol. Era tão limpa que se podia ver seu fundo com extrema facilidade, por mais que sua profundidade não chegasse a ser avassaladora, não chegando nem a meio metro.

Estava cheio de pequenas pedras. Provavelmente diminuíram a altura com o acúmulo do passar do tempo.

Limit não ligava para isso, não agora. Deixou de lado e se jogou de barriga para cima no lago. Lá aproveitou um pouco da sensação da água, imaginou se esse breve tempo não lhe podia ser concedido.

No entanto isso durou pouco. Logo depois pôs ambas mãos para trás e agarrou a flecha, só que quando ia puxar, pensou em outro empecilho...

— E se... — “não for suficiente?”, ela pensou.

Ela não tinha medo de morrer. Era impossível que morresse graças ao seu bisavô, mas...

Caso o ferimento ficasse muito grave, daria tempo para Elias alcançá-la e acabar com isso.... Não, não podia se preocupar com isso.

— Hur....

Mesmo não sentindo dor, a sensação de ter algo retirado de dentro de si era extremamente desprazerosa.

De imediato concentrou-se em curar o ferimento. Os órgãos, células etc se reajustaram para produzir o necessário para tal. Um grande número de plaquetas, glóbulos brancos dentre outros componentes do corpo fizeram parte disso. Um sistema perfeitamente controlado.

Também, claro, a bênção de Atlas fazia seu trabalho. A água que passava pelo ferimento o regenerava, por mais que a passos curtos.

Limit aproveitou a oportunidade para beber um pouco do líquido em sua frente, afinal, retiraria um pouco de seu cansaço. Era preciso uma quantidade exorbitante para ser recuperar o fôlego por completo, mas quanto mais, melhor.

Mesmo com a situação indo bem, não podia relaxar. Assim que estava mais curada, virou-se em 180 graus, encarando atentamente a floresta por onde Elias estava.

Estava vulnerável a tiror de arco e flecha. Se pego desprevenido, sem dúvidas seria seu fim de verdade.

O sangue escorría pelo riacho, sendo levado pelo fluxo da água. Com o tempo a concentração foi diminuindo, então Limit entendeu que estava curando até mais rápido que o normal. Pelos seus cálculos, dez minutos lhe curariam até uma taxa aceitável.

Refletindo agora, percebeu que o ponto em que fora acertado não era realmente tão crítico. Por isso uma regeneração tão “rápida” estava sendo possível. Sentiu alívio com isso.

Ficou feliz, mas não durou muito... cinco minutos depois, enquanto pensava no seu próximo passo, um brilho passou pelo seu olho.

Como estava atenta, depositou toda sua magia nos olhos para uma visão mais apurada. Não conseguia distinguir com exatidão o que ocorria na floresta, mas ajudava a se prevenir de movimentos súbitos.

E por isso notou um ínfimo brilho com o canto dos olhos.

A flecha fez um arco imenso devido a distância, o que deu tempo mais que o suficiente para desviar. Sequer precisou se esforçar.

Não conseguia ver as expressões de Elias do topo da árvore, com sua tentativa tendo dado errado, mas imaginou que não fosse boa.

— Mais... cinco minutos... — era o que achava necessário.

Se bem lembrava, com a flecha lançada momentos atrás, Elias só tinha mais dois tiros. Se levando em conta que estava em um espaço aberto extenso, flechas não eram motivos para preocupação.

Contanto que conseguisse manter distância, estaria a salvo para se recompor.

Todavia, não foi o que aconteceu...

— Ah....

Pouco depois da flecha ter sido disparada, talvez num intervalo de dois minutos, Elias desceu da copa das árvores e observou com cautela. Estava analisando o solo, provavelmente.

Limit não tinha um bom pressentimento.

E, como imaginado, não era coisa boa.

Elias estava completamente restaurado avançando contra ela.

...

Era bem simples. Após ser derrubado dos galhos, usou do teleporte para não fazer barulho e, além disso, distanciar-se de onde deveria cair. Posteriormente criou um arco e flecha fajuto — no limite que suas habilidades permitiam — para preparar uma emboscada. Funcionou, sim, mas o esgotou de energia.

Ficou em um estado semi desmaiado por um tempo, e depois, ao recobrar a consciência, esgueirou-se até um ponto luminoso. Agradeceu a tudo que era mais sagrado por Limit não ter finalizado ele. Teria sido seu fim se pego nesse momento de fraqueza.

Com o título de Apolo, suas capacidades sob a luz do sol aumentavam bastante. Não estava machucado, então bastou repor seu fôlego.

Assim que pôde se mover foi até as copas, onde tinha um sol melhor, e em poucos minutos estava quase como novo. Procurou pelos seu arco e flechas. Encontrou-os, por mais que houvesse perdido um dos projéteis, restando-lhe mais dois.

Com o rastro de sangue não foi complicado encontrar Sea no riacho. Queria investir, mas não estava confiante. Sua magia estava esgotada, e sua bênção não acelerava sua recarga. Se estava bem lembrado, Limit não tinha usado nem de perto o mesmo nível de magia que ele.

Atirou uma flecha como forma de teste. Queria saber as capacidades de sua presa. Limit desviou com a facilidade devida, então supôs que realmente estava em uma condição razoável.

Esperou até o cansaço se esvair por completo e o mínimo necessário de magia voltar para que pudesse iniciar o combate final.

Claro, existia a possibilidade de simplesmente esperar até que Limit fosse até a floresta e se aproveitar do terreno, porém, negou essa hipótese.

Isso por dois motivoss: não teria o mesmo efeito que de iníci, afinal, Limit estava acostumada com a habilidades de voz e iria com uma atenção elevada; também por sua magia demorar bem mais para renovar, enquanto Limit a tinha em abundância. Se algo desse errado, não se salvaria com o teletransporte ou criação mais uma vez..

E foi assim que tudo se sucedeu.

Elias rumou em direção a Limit.

...

— Droga...

O mundo estava em câmera lenta.

O duelo seria decidido em menos de cinco minutos. Parecia irreal pensar nisso.

Elias estava a menos de um minuto de distância de Limit. E, nesse meio tempo, devia fazer uma decisão.

Odiava essa palavra e a ação. Temia errar pois não só ela se feriria com isso. Estava arriscando mais do que si. Sua vida não importava. Era irrelevante. Seu único objetivo era ajudar seu pai.

Cerrou o punho.

Faria tudo para derrotar Elias, salvar Safira e conversar com seu pai.

— Sendo assim...

Ergueu-se.

O ferimento não estava 100%, mas era o suficiente. Não precisava de mais.

Na verdade, sabia que mesmo estando à beira da morte, venceria essa batalha. No entanto, não queria que fosse desse jeito.

Tinha medo que se descontrolasse... mas tinha de ser assim.

Era um meio até mais piedoso, parou para pensar.

0,1%... 

Subitamente sua pessoa mudou ao dizer esse número.

Claro, não foram as palavras, e sim o que ela desencadeou dentro de si enquanto as proferia. Não era algo simples de se explicar.

Lágrimas escorreram de seus olhos. Sabia que teria de usar essa característica de nascença. Ainda assim, odiava essa atitude.

Algo eclodiu dentro de si.

Ficou meio agachada, como se segurasse um peso enorme.

Um sentimento indescritível aflorou do peito. Como uma besta enjaulada deixada sem comer por dia e, ao ser liberta, tudo que mais queria era saciar sua fome.

O sentimento escuro e selado preencheu cada átomo de seu corpo. Parecia que cada centímetro estava sendo estirado e contraído. Destruído e recriado, adaptando-se a nova forma recebida. E a magia não estava fora disso. Sua magia outro branca foi ficando mais densa, como se lenha fosse adicionada ao fogo.

A cor negra preencheu sua “capa protetora.” Algo temível. Não parecia humano, nem proveniente deles... era... um sentimento puro. Extremamente limpo.

Seus olhos perderam por completo a claridade, dando lugar apenas ao mais terno, imensurável e perfeito...

Ódio

Limit avançou.

O duelo chegava ao seu clímax!



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