Bom Demônio Brasileira

Autor(a): Trajano


Volume 1 – Arco 1

Capítulo 13: Retrospectiva

Capítulo 13: Retrospectiva

—Uaah...

O sol estava aparecendo no horizonte, indicando que estava perto das cinco da manhã.

Nesse ambiente, uma moça de cabelo curto, vermelho; com olhos verdes, cobertos de lentes azuis, abria a janela, deixando a luz entrar.

—Não...! Luz, não!

—Acorda logo.

Contraditoriamente, a serva responsável de acordar cedo para avisar o invocado estava na cama, e sua companheira de quarto, ao lado, sem nada pra fazer, levantava.

—Vou te bater.—Um travesseiro é jogado, enquanto colocava outro para cobrir os olhos pela luz

—Vai nada.—Como resposta, a de cabelo curto rebate com a mão, e assim, uma incessante troca se inciava!

Após alguns segundos de briga, a sonolenta ascende rapidamente, segurando 2 travesseiros e arremessando com toda sua força em sua compatriota, que desvia. Ainda assim, o impacto foi suficiente para quebrar a parte superior da janela, fazendo o objeto acolchoado precipitar por vários andares.

—Sua maluca! Para de quebrar a casa!

—Você que jogou o travesseiro!!!!

Sinceramente, elas detinham uma relação de aminimigas.

—Você vai ver só!

—Vem tranquilo!

Tendo um desafio aceito por ambas, elas começaram a lutar como se suas vidas dependessem disso. Uma enorme bola de poeira se formava. A luta balançava todo o cômodo, deixando o barulho transparecer para os quartos vizinhos.

—Nessa hora da manhã...?

De repente, da porta, aparece uma idosa, com cabelos já grisalhos, pequenos óculos; uma roupa de serva, mas um pouco mais formal.

—Rurrrrr

—Rraaar

—...

Com a súbita chegada, elas se distanciaram, mas continuavam rangindo os dentes como bestas preparadas pro ataque.

—237, explicações.

—Eu tava dormindo, ela me acordou!5 da manhã!

—546, explicações.

—Essa maluca é responsável por acordar o invocado! E o trabalho dela exige acordar às 5!

—Ahh...—Com as acusações infantis, a idosa nada mais pode fazer do que suspirar, visto a criancice das duas—Bom, 237, tá errada. Vai se preparar logo. 546, não tá errada, mas também tá de castigo.

—O-o quê!?

—Hehe. Bem feito.

—Olha ela!

Sendo a única injustiçada na história, 546 protesta, mas como uma outra intriga estava prestes a começar, ela preferiu sair, dizendo:

—Você vai ver só, ele é meu.

—Bléehh.

—!!!!!—Um rosto horroroso é posto em sua face antes de bater a porta com força.

237 simplesmente a deixava puta da vida.

—Tsk. Que jeito de acordar. Por que tem de ser eu?Esse castelo têm centenas de servas.

—Porque você é a mais bonita.

—A-ah... se você diz assim...—Ser bajulada era seu ponto fraco.

Realmente, o único motivo de ser aquela a acompanhar os convidados era o ar a sua volta. Todos que a conheciam diziam desfrutar de sua companhia.

Sendo completamente convencida, a serva ruiva puxou uma toalha do armário, e perto de entrar, a velha fala:

—Então, vai com ele?

—Eu... vou ver isso.

—Bom—A serva-chefe, olhando para um relógio dourado, com um símbolo do inifinito e reencarnação marcado na capa, anuncia:—5 e 15, vai logo.

—É, é. Eu sei. A propósito, Mingau fica bravo com vocês duas—Ela mostrou o gatinho de pelúcia antes de entrar no banheiro e fecha a porta, para, finalmente, ficar a sós.

Ela dormiu no banho.

...

—Sua idiota!

—T-tchau!

Já às 6:30, ela foi encontrada na banheira, dormindo calmamente na água quente, cercada de bolhas e gatos de pelúcias. Tendo mais uma discussão com sua colega, teve de se arrumar rápido. Agora, enquanto corria em direção ao quarto de Sea, já faltavam 15 minutos até a chegada da princesa.

Sua velocidade era incrivelmente rápida, e, se não fosse por ter se perdido várias vezes pelos corredores, teria chegado em menos de dois minutos.

No entanto, já eram 6:57. Três minutos faltantes.

—Ahh...!—Antes de entrar, soltou um suspiro, tanto para liberar o estresse quanto como de pena por ter acordado cedo. Ainda, antes de entrar, apertou com força seu gatinho preto de pelúcia, e após colocá-lo ao lado da porta, entrou.—Com licença...

A abertura da porta fez um rangido de lugar velho, preocupando a garota, já que poderia ter acordado seu superior, mas ao vê-lo continuar dormindo, alegrou-se.

No entanto, ao chegar mais perto, logo viu que seu rosto estava um pouco pálido, o suor escorria de maneira extensiva, e até uma pequena tremedeira podia ser sentida apenas de tocar na cama.

—Hum... Ei, amigo...? Sea, acorda aí...—Ao mesmo tempo que queria acordá-lo, não era o que desejava. Ela entendia bem o quão sono é importante, ainda mais por ser preguiçosa, então não queria perturbá-lo.—Ah...—Tendo sido vencida pela compaixão, ela apenas pôde suspirar.

Todavia, ao vê-lo daquela forma, medíocre, um sentimento de pena veio à tona. E, quando estava prestes a tocá-lo para ver se podia fazer algo para ajudar...

—Cadê ele?

A princesa chegou. Precisamente, por ter deixado a porta aberta, a serva não sentiu a filha do rei chegando, o que a fez pular de susto, mesmo que pequeno.

—Pr-princesa... será que vo-

—Por que ele está dormindo?Vamos, acorde ele, logo.

Forçadamente sendo interrompida, ainda mais com uma ordem tão direta, uma gota de suor de medo passou pela sua testa, enquanto pensava em como resolver a situação, com ambos os lados ganhando.

—O-olha só... o invocado disse que estava um pouco cansado, e por isso pe-

—Eu não falei por favor, foi uma ordem, acorde-o, agora. Imagino ter sido bem clara.

—...—Com o receio de seguir ordens, a serva apenas ouviu o mando da princesa, mas não o fez.

—Tsk.

Deixando de lado a peça descartável na sua frente, a própria princesa toma iniciativa, dando um passo a frente, ficando lado a lado com a serva, enquanto erguia sua mão para tocar no invocado, ameaçou:

—Isso terá volta.

—...!—Como se estivesse tentando proteger a vítima, com bastante força, a serva segura o braço da princesa.

Pela princesa, essa ação já era esperada, ainda assim, lhe causou um certo estranhamento.

Soltando-se do agarrão, e ficando de frente para a serva, a segurou pela gola do uniforme, e mais uma vez ameaçou:

—Olha aqui, não pense que por ter um status um pouco mais elevado que a maioria das servas, pode fazer o que bem entender.—Seus olhos eram frios, mas, mesmo que pudesse ser uma acusação nefasta, não deixava de ser verdade.

Respondendo com os olhos equivalentes à situação, a serva perde, por um breve momento, seu brilho gentil, respondendo a altura:

—Pensamos de forma igual,—Como resposta, ela ergue com muita facilidade a princesa, que mantém-se inexpressiva,

Calmamente, ela responde:

—E agora, vai me bater?

—Que nada. Vou te matar lentamente, esconder o corpo, colocar a culpa no coitado aqui do lado, e sair de boa,

—Acha que isso vai dar certo?

—Não, mas nas duas situações, você sai perdendo,

—...

As duas se encararam rapidamente, entretanto, mesmo que fosse pouco, para ambas, parecia uma eternidade,

—Ah....—Quando percebeu a ridícula ameaça que fez, a serva soltou a princesa, e tentou se redimir—Q-que tal a gente esquecer isso? Eu... acordei com o pé esquerdo hoje, então...-

—Silêncio

—...

A moça da realeza, incomodada com o pedido de desculpas excessivo,  pediu... não, exigiu silêncio. E vendo a forma como a serva se preocupou com a palavra forte, enquanto limpava as partes de suas roupas tocadas pela mesma, ela disse:

—Não seja idiota. Você não faria isso.—Slack. Um tapa com força é desferido—Não faça de novo, entendeu?

A jovem, ao receber tal golpe, imediatamente ficou transtornada. Nunca nos dez anos em que esteve aqui, havia recebido um ataque, pelo menos, não um sério. Em primeira análise, ela queria, ali mesmo, pegar a princesa e socá-la até não poder mais. No entanto, dado o regime de status do reino, não podia fazer isso. Só causaria mais problemas. Era um limite que nem ela passaria.

—Sim... Por favor, perdoe-me.

—Humpf... Eu sou sua princesa, futura rainha, esse tipo de comportamento dos que vêm de baixo é inaceitável.

—... Entendido.

Agora, para ela, toda a situação havia perdido o sentido. Por isso, ela deu-se de braços, e virou, indo em direção à porta.

—O-o invocado...

—Não quero mais saber. O problema não é meu. E apenas para deixar claro, não faço coisa pior com você, exatamente por ser demasiado irrelevante perante meus afazeres. Mas, não pense que eu tolerarei qualquer desrespeito além disso.

Colocando sua mão sobre a bochecha vermelha, e segurando bastante para não deixar uma lágrima escorrer, a serva apenas assentiu com a cabeça.

Por fim, a princesa, antes de sair do aposento, diz:

—Não importa se você está certa ou errada. Não há chance de escolherem a serva em troca da princesa, mesmo que seja uma discípula daquela velha.—Finalmente, a porta é fechada .

Esperando por um longo minuto, a sequência de ações da serva foi: Correr para a janela, abri-la com tamanha força que podia quebrá-la e gritar bem alto todo tipo de xingamento.

Concluindo, ela sentou-se com a cabeça nos joelhos, e pôs-se a chorar, mesmo que fosse pouco. Não é como se sentisse medo, apenas tinha irritação de ser tratada como inferior e não poder fazer nada.

—Tche. Sou muito mais bonita que você...

Limpando as lágrimas, ela se levantou, e sentou na cadeira, olhando para o garoto, que apenas escutava a “conversa”. Tudo havia sido culpa dele.

—Inútil... e ainda tá dormindo...

Também lançando xingamento ao culpado por ter sido repreendida, ela apenas suspira, afinal, ele não pediu por nada. Ela, por livre-arbítrio, quis protegê-lo.

Voltando ao motivo, ela logo notou que toda a ocasião apenas havia piorado a situação dele, que estava tão mal quanto antes.

—E-ei...—Rapidamente, os sentimentos negativos foram apagados, dando espaço para sua bondade e gentileza de sempre.

Ela lembrava que, quando era criança, e tinha pesadelos, sua mãe segurava sua mão. Apenas não dormia junto com o invocado por ser impróprio.

E, como em um passe de mágica, ele para. O tremor cessa, a palidez recua, e o suor, ainda que pouco, retraía.

—Heh...—Com o simples toque, ele já possuía um sorriso, e como se quisesse acrescentar a proximidade dos dois, ele levou sua outra mão ao encontro—Ahh... Não dá pra ficar com raiva disso.

...

Quando a situação melhorou por completo, ela o soltou a mão, e pegou uma toalha do armário. Também, pegou o gatinho de pelúcia( à prova d’água), que estava do lado de fora da porta, e o trouxe para dentro. Sim, ela ia tomar um banho.

—Humpf. Isso é a retribuição pelo que fiz. Hehe... as banheiras dos invocados têm hidromassagem...!

Já colocando a toalha por entre seu pescoço, e saindo com um sorriso alegre, como se toda a intriga anterior não tivesse acontecido, ela se dirigia ao banheiro, mas parou... a situação dele já estava ficando pior, teria de ficar lá até ele acordar espontaneamente.

—Ahh... não estraga minha calmaria...! Pensa um pouco mais nos outros...—Mesmo que reclamasse, sem pestanejar, ela segurou a mão dele, agora, com bastante força.

Outra coisa que ajudava-a bastante a dormir, eram canções. Por isso, ela resolveu cantar a que sua mãe cantava, quando ela estava doente:

—Sonho e preguiça, de mãos dadas, ambos vão. Não tenha medo, e se tiver, segure minha mão. Fique calmo, fique tranquilo, pois eu estou aqui, não se preocupe, pois eu estou aqui. Sono, preguiça, tudo isso é muito bom. Fique calmo, tranquilo e adormeça com minha mão.

Após sua “apresentação”, ela pegou uma pastilha do bolso, pôs na boca, e assistiu o garoto enquanto começava a chorar.

Inicialmente, ela se assustou, teria sido tão ruim? Mas logo ela percebeu que ele havia gostado, e se acalmou. Para vê-lo de mais perto, repousou seu queixo em sua mão aberta, a qual o respectivo cotovelo se encontrava apoiado na coxa.

Vendo tal cena, ela sequer podia sentir raiva dele, apenas sorrir. Felizmente, ela entendeu que tinha feito o certo. E isso a alegrou.

Ainda assim, ela ainda quis brincar um pouco com o invocado, e brincou um pouco com sua franja, alisando-a. Era engraçado ver o pré-adulto grunhindo como uma criança ao ser tocado.

No entanto, a próxima frase, dita por ele perto da sua mão, foi um tanto quanto desastrosa:

—Eu... amo você.

—...

Como em um baque, ela recuou. Apenas de leve tocava o garoto, e deixou-se apenas a olhar para frente. Esperando-o acordar.

—Ah... Por que sempre assim...?

Infelizmente, Sea não era diferente de qualquer outro. Essa simples frase tinha um impacto muito maior, e não era positivo...

 



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