Bom Demônio Brasileira

Autor(a): Trajano


Volume 1 – Arco 1

Capítulo 10: Safira

—Humm...

Como um choque, de uma hora para a outra, Sea acordou. Mesmo que seu processamento continuasse sonolento, ele poderia facilmente indentificar onde estava: Em uma bela cama.

Assim que a luz chegou aos seus olhos, ele ergueu um dos braços e coçou, na tentativa de acostumar sua visão. Não demorou até que tudo normalizasse.

Repentinamente, todos os acontecimentos recentes vieram à tona, ou seja, os títulos; invocados, conversa e goblin, que causara seu atual estado.

Ele até pensou em ficar irritado, mas apenas ficou sentado na cama. Sabia muito bem que fez merda na frente de algo poderoso, na verdade, foi sorte não ter tido alguma penitência.

O invocado estava prestes a se levantar, no intuito de saber como chegara até aqui, mas se deparou com seu corpo preso. Tentava se mover, mas não conseguia.

Quando finalmente entendeu o motivo, seus instintos despertaram completamente. Ao seu lado, coberta apenas com um lençol até metade do corpo, estava a garota que havia o acompanhado até agora.

Seus cabelos ruivos, banhados de luz branca, o deixavam com um tom prateado, enquanto eram deixados para trás, com algumas poucas mechas cobrindo seu rosto. Um singelo ronco reprimido conseguia ser ouvido vindo dela, mas, ao invés de incomodar, produzia um sentimento reconfortante.

Além do mais, voltando ao motivo do porque Sea estava sendo restringido, era pelo braço da garota o envolvendo com força, e sempre que ele tentasse sair, apenas seria respondido com mais rigidez.

Ele estava perplexo. Das duas uma: Magicamente, a menina se apaixonou, e veio dormir com ele; ou, ele perdeu todo o controle sobre si e algo muito errado aconteceu.

Sea preferia acreditar na primeira, mas não dispensou a segunda.

Ao tentar retirar o braço dela, ele foi respondido com raiva: a menina pôs um rosto irritado na face, então continuou reprimindo-o com mais força, enquanto colocava sua cabeça sobre a barriga dele, na intenção de não deixá-lo sair.

O garoto não conseguia entender como ela possuía tanta força, mas reteve o pensamento.

—Que pena.

Infelizmente, com essa situação caótica, não havia nada a se fazer. Em forma de desistência, o invocado apenas encontrou uma posição mais confortável. Independentemente do motivo de estar nessa situação, ele iria se aproveitar até o último segundo.

—Você realmente não vai fazer nada...?—Ponderou a serva-mor, que estava em uma cadeira, ao lado da cama.

—...!

Seus olhos abriram de forma frenética, da mesma forma foi a ação de sua cabeça ao virar, e se deparar com a figura da velha de cabelo grisalho, que sorria, devido a situação.

—Eu não fiz nada. Eu juro!

—Sim, sim. Eu sei, eu mesma a pus aí.—Dizia assentindo com a cabeça.

—A-ah...

Por sorte, a segunda opção, anteriormente citada, não ocorrera. Entretanto, ele também ficou triste por saber que a primeira alternativa não foi a certa.

Soltando um suspiro, ele olhou para a beldade sobre si, e suspirou novamente. Infelizmente, esse ainda não foi o início de seu harém.

—Bom. Não vim atrapalhar muito. Só quero avisar que a 546 irá acompanhar você pelos próximos 6 anos.

—Heh... É. Faz sentido. Já esperava por essa.

Assim que suas preces foram atendidas, ele analisou mais uma vez a garota. Observando melhor, ela possui um semblante cansado, até algumas gotas de suor podiam ser vistas saindo do seu rosto. No entanto, seu sorriso continua.

—Sabe, eu não vou deixar você ficar sozinho com ela... Ainda mais, com ela dormindo.

—Ahh...!

Sea realmente esperava que ele pudesse aproveitar mais um pouco do conforto, mas seus sonhos foram destruídos.

A velha sabia que o garoto não faria besteira, mas já é noite. A jovem precisa ser acordada.

Lentamente, ela levantou a mão, e a direcionou para o queixo da serva. Com alguns movimentos, o sorriso dela alargou ainda mais, fazendo-a revirar sua cabeça algumas vezes, ela também fez um som parecido com um ronronar. Então, com uma chacoalhada leve, a garota acordou.

Desprendendo o braço usado como corrente, ela se ergueu com o respectivo membro, deixando o outro para aliviar seu bocejo. O lençol caiu para seu colo, seus olhos abriram, a luz prateada se diluiu sobre sua pele, deixando uma visão nada mais que majestosa.

Com tudo isso, Sea não pôde deixar de se sentir maravilhado. E isso só piorou...

—Psiu.

—E-eh?

Enquanto tudo isso ocorria, a serva-chefe falou em seu ouvido “Ela disse que queria dormir com você”. Isso, por si só, o deixou estranho.

Claramente, a idosa havia mudado a palavra “ver” por “dormir”, mas, para ela, esses dois já estavam destinados a se amar.

A ruiva, após coçar um pouco os olhos, mudou seu olhar para o moço ao seu lado, que respondeu com um ato de receio, deixando a mão para trás.

—Sea...

—Oi...

Assim, o incrível harém de Sea Scalding começou!

Ao ver o garoto, uma brilho passou pelos olhos da garota que, sem pestanejar, aproximou-se dele. Não precisava dizer muito, seu sentimento por ele é claro e forte.

A velha viu tudo com um sorriso no rosto. Assim como foi em sua juventude, sua pupila cairia em amor com o-

—Seu filho da puta!!!

—Ugyah!

O sentimento que ela nutria era ódio.

Com a potência do soco, Sea foi levado voando pelo quarto, até bater com a cabeça na escrivaninha, e desmaiar completamente.

Garotas normais sairiam no tapa. Ela era diferente. Se estava com brava, ia no soco, sem dó.

Mami não esperava por essa reação.

546, com o rosto todo curvado de raiva, deu um pulo de gato, quase planando até a posição de Sea, ela não havia acabado. Por sorte, a sua superiora a interrompeu, pegando-a em pleno ar.

—A culpa é toda sua...! Seu inútil! Iááá

Assim, o incrível harém de Sea Scalding terminou!!

...

—Humpf...!

Algumas horas depois do incidente, Sea acordou. Inicialmente, ele começou a chorar bastante. O soco foi forte o suficiente para fazê-lo desmaiar, não chorar seria idiotice.

Também, a agressora foi repreendida. Enquanto Sea não acordava, a serva foi advertida centenas de vezes. Isso chegou a ser um atentado de tão brutal que foi.

Agora, como tudo já estava quase “resolvido”, a serva-mor saiu do quarto. Ela se amaldiçoou por ter entendido errado. Quando a ruiva disse “Quero ver Sea”, estava indicando que realmente iria matá-lo, não amor.

—Vamos. Pede desculpa.

—...

Quando o chororô acabou, foi a serva quem começou o assunto. Ou melhor, exigiu. Sea até ponderou, inclinado a se desculpar, mas se conteve. Ele não iria se desculpar depois de ter quase sido morto.

Ele negou com a cabeça.

—...!—A garota, em resposta, ficou irritada. Ainda assim, ela não fez mais nada. Também estava errada por tentar brutalmente assassiná-lo, isso fez pesar sua consciência—Tá... Desculpa pelo soco... Mas como você...!—Ela quase tentou acusá-lo novamente, mas reprimiu esse desejo. Se suas emoções fossem postas a fora agora, iria partir pra cima no ato.

—...—Silêncio veio dele.

 Antes de tirar quaisquer conclusões precipitadas, ele chamou a atenção da garota e pediu para que explicasse o que aconteceu enquanto dormia.

Assim, Toda a confusão da escolha do acompanhante foi explicada. Ao notar que a serva tinha possibilidade real de ser morta, ele entendeu que era culpa dele. Até o soco podia ser justificado.

Como ela havia se desculpado primeiro, ele também se curvou e pediu desculpas. Então, após isso, eles começaram a se entender melhor.

Como bons jovens, os problemas foram logo esquecidos. Em pouco tempo, ela começou a novamente considerá-lo um amigo, e ele, idem.

—Bom, então podemos começar a nomeação?—Indagava a moça, sentada na cama, lançando um olhar para seu companheiro.

—Como assim... exatamente?

—Bom, né?

É literalmente o que significa, alguém é nomeado para guiar o invocado. Mas no caso, o invocado deve dar um nome para essa pessoa, e esse é o verdadeiro significado de “nomeação”

—Ah... Entendo agora. Que falta de criatividade...

Então, simplificando: o nome dado por um invocado é um “pacto” mágico. O invocado pode fazer 2 pactos, o pacto do jogo, com um limite para 3 pessoas, e um pacto de nomeclatura, onde se tem um limite para 6 pessoas. Para a companheira inicial, ambos os pactos devem ser utilizados.

—Certo, então com licença...

—Ai!

—Foi só uma agulhinha...

Para fazer o pacto do jogo, a pessoa que se tornará companheiro do invocado deve ingerir seu sangue, a quantidade não importa. Obviamente, isso só funciona se o invocado e a pessoa quiserem.

—Sabe... Se em alguns anos você adquirir alguma doença estranha... Me desculpe.

—Hum...

A serva trouxe a agulha para perto da boca e ponderou. Esse pacto viria a definir seu futuro pelos próximos 6 anos, e ao pensar nisso, ela suspirou. Ela sempre quis acompanhar um invocado, mas não necessariamente esse

Entretanto, vendo o que aconteceu em poucos dias, ela pelo menos pensou, corretamente, que essa aventura não seria chata. Sendo assim, ela relativizou o fato do invocado, e até começou a gostar da ideia.

A forma como o sangue é ingerido não importa, então ela foi até a cômoda, pegou um jarro de água, um copo, e o encheu. Sem demorar muito, a gota de sangue foi jogada lá e diluída com uma colherzinha. Dado a baixa quantidade de hemoglobina, a água apenas ficou um pouco turva. Todavia, continuava nojenta

—Você não vai... beber?

—Eek... vai saber por onde seu sangue andou...—Isso machucou os sentimentos de Sea.

O copo, várias vezes, foi levado à boca e negado. Era como uma criancinha tentando tomar  remédio, mas a contradição seria pela moça já ser uma quase adulta. Sea não pôde deixar de achar a negação um pouco fofa.

Porém, depois de bastante enrolação, Sea se cansou. Com um gesto de mãos, e com a cara séria, pediu-a repetidamente para beber logo.

Ela engoliu seco e foi com tudo. Rapidamente, gole por gole, todo o líquido nojento foi ingerido. Ela teve uma ânsia de vômito forte, mas a restringiu.

Observando a garota segurar o próprio pescoço enquanto o rosto estava todo verde, Sea ponderou o motivo dela não ter bebido uma gota apenas da água. Afinal, se a quantidade não importa, 0,1% de 1% não faria diferença alguma.

No entanto, ele não gostava da ideia de ser novamente agredido, então omitiu a informação.

Para melhorar, ela ficou com um balde sob os braços, e abriu a janela. Ela ficou sentada na varanda, aproveitando o vento. Diga-se de passagem, a altura do quarto não é pequena, qualquer deslize causaria danos severos.

Por fim, assim que o mal-estar passou, ela teve de voltar à outra nomeação, mesmo que a contragosto. Por sorte, o pacto da nomeclatura é menos nojento, isso a acalmou.

O pacto de nomeclatura, basicamente, o invocado deve dizer “Nomeio-te” e o nome que quiser para a pessoa... Aparentemente, se a pessoa já tiver um nome ele será substituído.

Já preparada para receber seu nome, a garota se apoia na cama, deixando os braços sobre o colo. Essa pequena sequência de gestos fizeram os olhos de Sea brilhar. Ele não podia compreender como algo tão costumeiro podia se revelar de uma forma tão elegante.

Infelizmente, sua parada no mundo da lua foi interrompida com os constantes estalos provindos da moça, já incomodada por estar sendo ignorada.

—Qualquer que seja o nome que me der, saiba que eu ficarei extremamente feliz. Mas, claro, se eu não gostar, vou te ignorar pelo resto da minha vida.

—Para onde foi o “Qualquer que seja”... Mas claro, eu nunca faria piada com um nome que eu mesmo criei.—Mentira.

Realmente, um nome não é de grande relevância. Um nome não te define, ou seja, quebrar a cuca com isso não deve ser um problema.

E, mesmo não sendo, ele já tinha um nome em mente. Isso o remetia a sua infância, e quando viu a garota, logo lembrou desse lugar.

Por um breve momento, ele fechou os olhos, nessa curta janela de tempo ele relembrou o seu local preferido para se acalmar em sua  pequena cidade: uma caverna. E com isso, o nome da garota foi imediatamente decidido.

Sea se levanta e olha firme para a garota, que pronta para receber seu nome, fecha os olhos. Ele fica de frente para ela e diz:

—Você é bochechuda, ein...

—Obri-...! Do que você me chamou...?

—U-uaah!

Com a serva tendo a mesma cara raivosa de quando deu um soco, ele recuou. Por sorte, ela estava mais cabeça fria, e mesmo que suas mãos tremulassem para não serem erguidas, ela se acalmou.

O invocado não entendeu exatamente o porque das bochechas grandes serem problema, mas não insistiu, afinal, algum dia ela se apaixonaria por ele, e isso se tornaria normal.

Já com o nome em mente, o invocado se ajoelha sob o pé direito, pega a mão direita de sua companheira, e com uma voz convicta, diz:

—Eu nomeio-te de Safira Scalding.

—E eu recebo com alegria esse nome...-...? o quê?

Repentinamente, os olhos de “Safira” começaram a ficar opacos, ficndo por terminarem em completamente brancos. Uma cor impossível de existir para um olho. No fim, ela apenas caiu dura na cama.

—S-safira!?

Segurando-a em seus braços, Sea apenas ajustou a posição dela para que não caísse. Desesperado, ele abriu a porta gritando:

—REEEEEEEEEEEEEEEEI!

...

Alguns minutos se passaram após o estranho fenômeno e Sea conseguia ver o monarca do estado caminhando junto com sua família.

—Papai, um ataque.

—Não querida, não comece.

—Hunf!

Deixando a richa pessoal da garota de lado, Predo questionou o garoto:

—Sea, o que foi?

O pobre coitado chegou ofegante, e até se interessou sobre o assunto que o rei estava tratando, mas negou. Sua situação é um pouco mais crítica se comparado a qualquer outra coisa.

—A-a... a serva, ela desmaiou...!

—Espera...—Não era o primeiro jogo que o rei participava. Se a nomeação estava sendo concluída...—Me leve até ela, agora! Você não fez isso...

—T-tá—Devido a forma agressiva a qual foi ordenado, o invocado até estremeceu. Em seguida ele os levou até o quarto.

...

Poucos minutos e eles chegaram em frente a porta, deixando destaque ao rei desesperado, até mais do que o causador disso tudo.

—Onde está ela!?

—Na cama!

Ele imediatamente olhou para a cama, apenas para se deparar com a serva sentada na cama, abraçada ao travesseiro, encostando sua cabeça e joelhos nele. Uma cena um tanto quanto deprimente. Ela já tinha acordado.

O rei, ao vê-la, correu em sua direção e exclama:

—O que ele fez?

—E-ele...Se ajoelhou e segurou minha mão...e-e-e...Me deu o sobrenome dele...—Dizia a garota prestes a chorar.

—Ah... Entendo...

A acompanhante, tendo dito isso, frustrou-se e pressionou o travesseiro contra seu rosto; a rainha lançou um olhar desconcertante, mas não falou nada; o rei ficou apenas estático, com os olhos mortos. Quem explicou a situação foi a primogênita. Apoiada na parede, com a sustentação apenas em um pé, e deixando seus braços cruzados, disse com um olhar rancoroso:

—Parabéns pelo casamento.

—O-o que?

E assim, o rei começou a me explicar mais detalhadamente sobre o pacto de nomeclatura. Basicamente, dar um nome aumenta as capacidades físicas e mágicas da pessoa, dar seu sobrenome a torna parte da família, e dependendo de como ocorrer ela pode se tornar coisas diferentes:pai,mãe,irmã,irmão,filha,filho... Aparentemente, ajoelhar-se e segurar a mão da pessoa a torna esposa. Esse é um ritual mais complexo, utilizado apenas pelo 5˚, ou 4˚ ano, pois serve para multiplicar os poderes da pessoa. E Sea gastou no primeiro dia.

—E-então... Estou casado?—Sim, ele se preocupou com isso, não na oportunidade perdida.

—Sim... Bem... eu... Ah... Deixa—O rei, em um ato incrível de pena, curvou-se para a serva, como se estivesse pedindo desculpas por isso tudo acontecer—Ele não merece você....

E assim, o rei saiu do quarto, junto a sua família.

E, com isso,  o casal ficou mais uma vez a sós, ainda que a ruiva estivesse segurando um gatinho de pelúcia. Pensando na melhor forma de continuar a situação, Sea se sentou ao lado dela.

—Huh... Sinceramente não sei muito bem o que falar nessas horas.

—... Que tal começar se matando?

—Ah, certo... não, pera, isso é impo-... Ai, ai!

Logo, ele é recebido com várias “travesseiradas” no corpo. E com razão.

—Ai. Ai. Ai!Para de me bater!

—Você pensou mesmo que era só pedir desculpas?—Dizia a garota que continuava a bater.

Mais alguns minutos de constante espancamento e a garota para

—arf...arf...arf...Certo, acho que a raiva já passou agora.—Diz ela se sentando novamente na cama. Quem mais saiu perdendo foi o travesseiro, que não sobrou nada. Nem uma pena.

—C-como você é tão forte?Aquilo era só um travesseiro mas meu corpo tá todo doído.

—...—Ela não ia se desculpar. Não por isso.

Ele não sabia como começar a se redimir. Normalmente, ele apenas faria uma piada e evitaria a situação, mas isso estava caminhando para algo bastante sério. Ele não iria começar a conversa.

—Certo, comece a se explicar.—Disse ela, desviando o olhar

—hum...?

—Foi culpa minha por não ter explicado tudo. Em minha desculpa, não é nem um pouco comum se dar o sobrenome para outra pessoa... apenas em casamento. Ainda assim, não vejo motivo para ter feito isso. Explique-se imediatamente.

—...

Seus argumentos eram perfeitamente plausíveis, ele não tinha ideia que se ajoelhar e a dar seu sobrenome teria esse resultado...  Mas bem no fundo, ele sabia o que estava por trás disso.

—No meu mundo, esse é o nosso “pacto” para casamento... Lá, você seria minha noiva no momento, mas acho que aqui deve funcionar diferente...—Respondeu, completamente constrangido.

—E... Por que você fez o pacto do seu mundo de casamento,  se sabia o que significava?

—Porque era exatamente isso que eu pretendia.—Disse se levantando calmamente da cama.

A garota solta um olhar duvidoso como se não entendesse o contexto de tudo. Sea, vendo essa confusão em seus olhos, solta uma leve risada.

—V-você tá rindo de mim?

—Não... Não tô

Ele já tinha começado. Agora, era ir até o final.

—Você está com raiva?

—O-o quê?

—Perguntei se você está com raiva de mim por ser minha esposa

—...

Ela respondeu com silêncio, além de desviar o olhar. Não iria responder a isso .

—Está?

—Raiva... Não é a palavra certa. Você simplesmente me casou, e sequer pediu a minha mão... Só quero que você me explique o porque disso. Sem joguinhos.

Suas palavras traziam alegria e tristeza ao mesmo tempo. Ela claramente não têm sentimentos por ele, mas também não rejeitou a ideia como a pior coisa do mundo.

Sea se levanta, e se afasta um pouco de Safira. De costas, ele começa a falar um pouco sobre sua vida.

—Sabe, quando eu tinha 5 anos meus pais morreram...—Apenas essas palavras fizeram o semblante da garota mudar para surpresa—Meus familiares não me queriam, e o único que me deu alguma coisa foi o meu vô, que passava o tempo comigo e me deu um lugar para morar, não era nada incrível, mas era algo.

—Eu... Sinto muito pelo seu passado, mas isso não é justificativa pra fazer o que bem entender com os outros...—Ela podia ter mudado um pouco seu pensamento sobre ele, mas isso não respondia nada.—O quanto você sofreu não justifica suas ações.

—Sabe, por alguns motivos pessoais, desde pequeno, eu nunca tive amigos, ou alguém que realmente tenha lutado por mim. E quando eu soube que você optou por me proteger da princesa apenas por saber que eu estava cansado... Despertou uma chama em mim, e sinceramente, acho que foi a primeira vez que comecei a pensar “Essa pessoa é alguém com quem quero estar”

O rosto da garota começa a ficar mais estranho, deixando-o com uma cor próxima ao do seu cabelo.

Notando isso, a cena pré-nomeação é recriada, e Sea continua:

—Mesmo que você não sinta nada por mim, e mesmo que não goste de mim, você poderia me dar uma chance?Porque eu...—Mesmo hesitante com suas palavras, ele ainda as conclui— amo... você...—As últimas palavras saíram quase como um sussurro. Ele nunca pensou que seria tão difícil dizer isso. Dizer três palavras.

—Nós nem nos encontramos direito... e... Não é como se eu te odiasse, mas também não é como se eu gostasse de você a ponto de ser amor... Sério, nem três dias direito...—Ela buscou ser a mais sincera possível. Mentir em uma situação dessas não iria trazer nada de bom.

—Eu sei.—Assente ele com a cabeça—Não é como se eu fosse te forçar a isso, mas eu apenas estou pedindo para que me dê uma chance. Temos um bom tempo até o que quer que venha a acontecer.

Com essas palavras, ele apertou suas mãos com mais força e esperava por uma resposta. Nunca em sua vida tinha sentido um medo tão grande, ele tremia apenas de pensar em uma resposta como um “não”

E, finalmente, a garota deu o veredito:

—Eu... Sendo sincera, realmente não gosto de você a ponto de te amar, mas...—Soltando suas mãos, ela finaliza—Acho que é impossível não interagirmos daqui pra frente... Até lá, você tem chance de nos conhecermos melhor. Não quero fazer uma escolha precipitada, até porque, não acho que três dias sejam suficiente para decidir com quem vou passar o resto da minha vida... É algo importante para mim.

—Isso... é um sim?

—Uhum...—Ela confirmou com a cabeça. Para continuar, ela enrolou seu dedo no cabelo, para tentar desabafar a frustração.—Mas fique sabendo que eu tenho padrões bem altos, entendeu? Sou linda e tenho uma ótima personalidade. Você tem de tentar conseguir ser ao menos 1% disso. Não quero alguém ridículo ao meu lado.

—Certo...!

Inesperadamente, a garota pegou a cabeça de Sea e colocou contra seu joelho.

—E-ei!

—Você pretendia me abraçar e chorar no meu uniforme de novo, né? Se você vai começar a me cortejar, saiba que só pode chorar quando for algo importante, entendeu?

—S-sim!

—Se você começar a chorar agora, perde todas suas chances.

—C-certo!

E utilizando todas suas forças biológicas e mentais, ele parou seus instintos humanos. Isso com certeza não faz bem para a saúde.

—Mas, sabe, seu cabelo é bem fofinho...—Ela gosta de coisas fofinhas e macias.

—Eu posso dizer o mesmo, acho que nunca senti algo tão macio me-

—Por favor, não estrague o clima.

—Certo, certo...

...

Em torno de 2 horas e meia se passam. Um tempo bastante absurdo, por sinal.

—Ei... Eu realmente estou desfrutando desse carinho interminável, mas não acha que já pode se soltar?

—Não... Seu cabelo é muito fofinho...

—Ah, rei!

Rapidamente a garota se levantou e assumiu sua posição costumeira de serva, quase como se tivesse prestes a ter um infarto. Ao perceber ter sido enganada, seu rosto antes de prazer se volta em um de raiva.

—Não tem porque ficar tensa... relaxa...

—Ah...—Um pouco triste, ela se sentou na cama, puxou o seu gato e começa a abraçá-lo novamente.—Ei, sabe o nome dele? É Mingau.

—Ah...—Isso o lembrou de um gatinho de revistinhas que ele colecionava quando menor, ainda tinha, na verdade.

—Sabe, eu não gosto de dormir sozinha, e meio que eu espanquei minha amiga e devo tê-la hospitalizado... Tem problema eu dormir com você hoje?

De uma hora para a outra, sua atitude tinha ficado muito mais meiga e dócil. Suas palavras estavam calmas e suaves, até mesmo sua forma de falar era fofa.

—Uhum... ahã... hãn...?

A reação confusa dele a fez desacreditar um pouco, então ela virou a face, pensando se tinha dito algo indelicado.

—Se não quiser, tudo bem...

—Não, não. Eu quero!

De repente, Safira põe sua cabeça no ombro de seu companheiro, e segurou seu braço.

Seu cérebro entrou em confusão. Ou ele sempre foi um partidaço, que pra encantar as garotas só precisava do toque, ou é o clichê de “sou um invocado, todas se apaixonam por mim”

*Pft, “todas se apaixonam” Que trouxa*

Uma voz começa a ecoar em sua mente. Era, claramente, o título defeituoso de mais cedo.

“Atlas?”

*Sim, olá. Vejo que procedeu rápido... foi simples, até*

“Você não ia ficar em coma? Por que voltou?”

*Eu disse, não foi?Quando você adquirisse algum dos meus poderes eu viria te explicar o que são. Também, coma é uma palavra forte demais... Sou teu brô*

“Poderes?Que poder eu ganhei?”

*Não é óbvio?A maior parte dos títulos mitológicos têm esse poder, não é nada incrível, mas você adquire certos...Artíficios*

“Artíficios?Meu corpo fofo?”

*Claro, só funciona com alguém que você ama, seu corpo começa a emanar uma boa sensação para aqueles que você ama. No caso, ela parece gostar de coisas fofinhas...*

“Pera, eu tenho um poder para fazer as garotas se apaixonarem por mim!?”

*Não, apenas aqueles que você ama...Tem ideia do tamanho do harém que um invocado poderia ter se não tivesse restrições?*

Se as pessoas que são invocadas para cá tivessem esse poder, sem dúvidas teriam enormes haréns... Principalmente as pessoas que leêm novels de isekai em ótimos sites da internet.

*Bem, não é nada incrível. Ela não se apaixonou ou algo do tipo. Também não é um vício. Se ela vier a desenvolver algo, mérito seu, blz? Tudo na paz, irmão. Relaxa o facho. Enfim, percebe como sou um título incrível agora?*

“Bicho, tu é foda. Meu ‘bbb’ pra sempre”—Best friend forever.

*Fufu, mas é claro!Sou um título extremamente poderoso, agora vou voltar ao trabalho... Lembre-se, momentos críticos, de ajuda, ou quando descobrir novos poderes*

“Certo, espero te ver logo, Atlas”

*Não digo que é recíproco, mas treine bem. Até*

E assim, a voz na  mente logo começa a distoar, até sumir completamente.

—Sea, algum problema? Está olhando pro nada há um tempo...

—Não... só pensando em algumas coisas.

Deixando de lado a estranheza dele, ela se levanta, pega uma toalha qualquer jogada pela cadeira e entrega ao seu amigo. Com seu polegar, ela indica para o banheiro.

—Você está bem ridículo depois de tanto suor e choro. Vou me despedir de uns amigos, então vai se limpar.

—H-huur...—Ele não esperava que uma serva fosse ser tão orgulhosa para não ser visto com um invocado sujo. Ele até pensou em negar, mas ao focar em seu cheiro, notou que ela estava certa.

Segurando a toalha, ele foi até o quarto, mas antes de entrar, ele ainda ouve, do lado de fora da porta:

—A propósito, Safira é um nome lindo. Obrigada. Hehe... Safira...—Ela ficou cantarolando seu próprio nome até chegar onde devia—Safira...



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