A Saga de Tanya, a Maligna Japonesa

Tradução: Matheus Hensley

Revisão: Rose Kethen


Volume 1

Capítulo 2.1: O Orbe Operacional Elíneo 95

 

ESPAÇO AÉREO SOBRE O LABORATÓRIO DE TESTE DA UNIDADE AÉREA DO EXÉRCITO CRUSCOS.

 

Como de costume, os céus acima do Laboratório de Teste da Unidade Aérea do Exército Cruscos, situado a sudoeste da capital imperial, estão barulhentos.

Orbes e cetros certa vez conjuraram milagres que foram registrados apenas em lendas. Agora, graças à investigação científica desses mitos, replicar tais maravilhas não ficou só na teoria, o que propeliu o nascimento da magicologia moderna. O campo foi responsável por descobrir um método de modificar o mundo por meio do uso de orbes operacionais. Em um mundo físico de três dimensões, a tecnologia realiza determinado fenômeno aplicando uma quantidade adequada de estímulos no lugar certo. Por exemplo, com as mãos, uma pessoa é capaz de girar a roda de metal contra a pederneira de um isqueiro e acendê-lo, da mesma forma, isto pode ser feito com o poder da magia. Uma vez entendido seu funcionamento, é possível reproduzir inúmeras maravilhas mágicas. Sim, magia virou uma tecnologia.

Claro, os princípios dos elementos fundamentais — como a mana e as fórmulas de interferência — ainda não são ao todo compreendidos. A engenharia mágica foi impulsionada pelo objetivo de alcançar um progresso marcante para garantir maior vantagem militar e estabelecida como área acadêmica após uma descoberta decisiva no Império. Ao combinar mana com um aparelho aritmético analógico, os orbes operacionais foram criados. Diferente da era das lendas, nos dias atuais é nítido quais lugares, métodos e níveis de poder são necessários para conjurar feitiços.

A quintessência dessa tecnologia provavelmente seria a sua aplicação prática em fórmulas de aviação, as quais permitem que um feiticeiro levite sem ajuda de um aeromóvel. Gerando propulsão, seu operador é lançado para o ar com o equilíbrio mantido. Se quiserem, os feiticeiros podem até imitar bruxas voando em suas vassouras. Rifles com baionetas fixadas à frente são mais convenientes do que cetros como enfoque para conjurações. Bem, armas de fogo também são ótimas para disparar fórmulas de batalha em combate a longo alcance.

De qualquer maneira, os engenheiros replicaram milagres usando tecnologia. Uma enorme variedade de aplicações militares também foi reconhecida. Já fazia um bom tempo desde que a importância dos orbes havia se tornado conhecimento geral, motivo pelo qual a corrida tecnológica entre as potências mundiais aumentou tanto.

Como pioneiro no campo, a participação do Império nesta corrida era óbvia.

Hoje é um dia com céu claro e ventos fortes. Minha altitude é de um quilômetro e duzentos metros. Mais ou menos metade dos testes agendados para este dia já foram feitos. A situação em que me encontro está bem melhor do que a da última vez, quando quase morri depois do meu paraquedas falhar em abrir por conta da umidade, mas não estou com vontade de tocar no assunto... Sobretudo se for nessas condições tão exigentes, onde o mínimo deslize na concentração pode levar a um erro nos cálculos e fazer o motor do orbe pegar fogo.

Lutando para impedir que meu rosto se contraia, com cuidado, mantenho uma velocidade constante de subida com a ajuda da velocidade de solo conforme o plano. Desde que eu finalize os testes sem incidentes acontecendo, não posso parar. E isso significa ascender.

Sim, preciso continuar a subir utilizando o "novo modelo"; um protótipo de orbe nem um pouco confiável e terrivelmente defeituoso.

É esse o prazer de ter o mundo em suas mãos? O acesso às leis do mundo que o orbe simboliza é uma operação elaborada que demanda sutileza. Sob ordens de supervisionar esse processo — usar uma coisa que carece de tolerância requer o máximo de cuidado — Tanya está tendo sua mão feita em pedaços.

Se não fosse pelos avanços da ciência médica, ela teria que passar o resto da vida só com seu braço esquerdo.

Agarrar um orbe de nenhuma confiança não difere muito de segurar uma granada. O resultado final é óbvio. Por isso que a Segunda-Tenente Degurechaff é tão adversa a fazer algo assim. Ela solta um suspiro enquanto voa.

— O motor explodiu! Está pegando fogo! Abortar o teste! Abortar o teste!

Mais um dia de gritos penetrantes do Controle e os gemidos agonizantes de Tanya ecoando pelo céu.

Como acabei no meio dessa bagunça? Aconteceu quando fui enviada para a retaguarda depois de ser ferida no norte.

Na época, a Segunda-Tenente Degurechaff ainda estava se recuperando e considerava o local onde seria reintegrada como uma questão de vida ou morte. Havia dado tudo de si, criando uma espécie de recorde só seu, e até mesmo recebeu uma medalha... Isso poderia ser vantajoso para minha futura promoção, porém envolvia um sério problema em potencial de deixá-la presa nas linhas de frente.

— Vou revê-lo agora.

Então, quando recebi um envelope e o abri, o pensamento que me veio à cabeça foi: tomara que não me mandem para a fronte. Porém meus receios foram sem fundamentos. O envelope continha um documento do Departamento de Pessoal com ordens sem data de serviço doméstico. Em outras palavras, as ordens não eram oficiais, mas entrariam em vigor assim que datadas e assinadas por um oficial superior. Era a chamada oferta informal de emprego pelos padrões do exército.

— Aproveite. É uma nota não-oficial do seu trabalho doméstico com a unidade de instrução de combate, junto de um pedido para que você seja enviada ao quartel-general como pessoal de inspeção tecnológica.

Em suma, a proposta não foi ruim. Na verdade, foi perfeita; uma posição doméstica que era, para todos os propósitos, um serviço na retaguarda. Mas a unidade de instrução e as posições de testador ainda estavam associadas a uma carreira promissora. Ela podia dizer que a viam com bons olhos.

Mais importante, ser encaminhada à unidade doméstica de instrução de combate tinha diversos benefícios. Sendo um grupo de elite do Exército Imperial, seus membros não somente recebiam o melhor equipamento, como também era uma terra sagrada para pesquisas de combate. A unidade era o lugar excelente para eu aprimorar minhas habilidades — um ótimo ambiente a fim de aumentar ao máximo as chances de sobrevivência. Mesmo que Tanya precisasse ensinar, era a posição perfeita para roubar as técnicas de outras pessoas. Para completar, vincular-se à unidade de instrução não seria mancha alguma em seu registro militar.

O vago pedido de transferência temporária para servir como pessoal de inspeção tecnológica sob o quartel-general também não era nada mal. O QG era praticamente o epítome dos serviços de retaguarda. Contanto que eu cumprisse o meu papel de verificadora de tecnologia lá, poderia me esconder na retaguarda com a desculpa de estar conduzindo testes.

Se tivesse algo para criticar, uma posição no Departamento de Ferrovia ou no Estado-Maior seria ainda melhor, por causa das baixas probabilidades de acidentes ocorrerem. Só que era uma diferença tão pequena que esse meio-termo parecia mais do que aceitável.

— Eu pretendo respeitar sua vontade dentro do possível, mas suponho que não tenha nenhuma objeção?

Talvez o comandante respeitasse o desejo de Tanya por formalidade, contudo, na realidade, a decisão já fora tomada. Não havia qualquer expectativa que ela rejeitasse a oferta. Seria imperdoável recusar essas posições após terem sido entregues de mão beijada. As únicas três opções eram "sim", "oui" e "ja".

— Sim, não tenho reclamações. Aceito humildemente minhas ordens de transferência.

— Excelente. Você vai testar um novo modelo no Quartel-General de Suprimentos e Logística. Como formalidade, será transferida da unidade de instrução para lá — disse o comandante antes de rabiscar minha admissão no documento. Ele prosseguiu a assinar os pedidos e devolvê-los; no papel, minha transferência já estava concluída. Quanta eficiência. Quiçá toda essa história de "uma nota não-oficial" fosse por si só uma formalidade.

— Bom, creio que você queira me fazer perguntas. Permissão concedida.

Sempre gostei de um superior sensato. Ele merecia a minha admiração.

— Fico agradecida. Nesse caso, primeiro gostaria de saber por que o senhor se deu o trabalho de me nomear para a unidade de instrução.

O normal não seria apenas me indicar para uma posição no quartel-general? Não pude deixar de pensar nisso.

Claro, estava muito feliz por ter uma carreira na unidade de instrução, entretanto desejava descobrir as políticas e circunstâncias que levaram ao Departamento de Pessoal a dar a Tanya não uma, mas duas ótimas posições. Eu não queria cair acidentalmente em um monte de problemas mais tarde e me dar mal. Porém a resposta à pergunta de Tanya foi até que simples, senão exasperante.

— Ás ou não, enviar uma criança para a fronte seria ruim à nossa imagem.

Tinha noção de que os superiores eram meio lentos… mas demorou todo esse tempo para eles perceberem? Eu sou tecnicamente uma criança. O que quer dizer que deveriam cuidar de mim. Pelo visto os mandachuvas enfim despertaram seus sensos comuns.

— Então, está me dizendo que um ás deveria servir de decoração na retaguarda?

Obviamente, demonstrar muito entusiasmo em se afastar das linhas de frente não seria bom, porém precisava confirmar a situação. Se as coisas estavam caminhando na direção que eu esperava, teria as melhores condições para seu plano de sobrevivência. Maravilhoso. Realmente wunderbar. Naquela hora, senti como se pudesse chegar a um entendimento com todas as pessoas do mundo. Estava tão emocionada por trás da expressão fria de Tanya que temi transparecer ideias estranhas.

— Uma opinião curiosa, Tenente. Nunca teria passado pela minha cabeça.

Com essas palavras, Tanya tinha confiança de que suas previsões estavam corretas. Eu não sabia o que aqueles das altas-patentes queriam, mas pelo menos o oficial superior à sua frente não havia negado sua conjectura. Isso significava que ela decerto estava limpa. A segurança do serviço na retaguarda era de fato maravilhosa.

— Peço perdão.

— Os superiores estão de olho em ti, Tenente. Por esta razão que a colocaram como responsável pelo desenvolvimento do novo modelo.

Na realidade, estava dentro das considerações comuns do Departamento de Pessoal nomear um feiticeiro competente da fronte para instrução ou desenvolvimento de tecnologia. Nesse sentido, transferir um jovem soldado da fronte era um motivo plausível. Provavelmente, qualquer pessoa no exército aceitaria sem problemas.

Tive sorte, mas ainda assim, um novo modelo? Eu tinha minhas dúvidas que usariam Tanya como cobaia, no entanto ao menos seria reconfortante saber qual tipo de tecnologia ela estaria inspecionando.

— Posso perguntar sobre esse novo modelo?

Se ele afirmasse que era confidencial, eu teria que desistir da pergunta. Todavia, precisava de um certo nível de preparação. Você recebe bem menos dano quando há um aviso antes de lhe atingirem, ao invés de um soco repentino. No intuito de me preparar para o que estava por vir, queria saber no que Tanya estava se metendo.

Sem falar que eu estava bastante curiosa.

Hmm. Só me disseram que é um protótipo de orbe operacional.

— Entendido. Obrigada.

Tudo isso acabou se tornando, sem dúvidas, verdade. Tanya está na segurança da retaguarda conduzindo vários testes em um novo orbe operacional. Seu comandante nem sequer demorou para responder. Mas também não mencionou que este objeto é tão confiável quanto um "Diabo Vermelho" Italiano¹.

E é por isso que agora estou sofrendo desse jeito.

Estando a mais de três mil e seiscentos metros no espaço aéreo a sudoeste da capital imperial Berun, eu já ultrapassei a altitude máxima de operação dos orbes que existem atualmente. Sem um que não fosse feito para quebrar recordes de altitudes, operar tão alto assim não deveria ser possível. A concentração de oxigênio é inquietante e, como se não bastasse, a temperatura do meu corpo é baixíssima.

Ter levado tempo demais para se adaptar na altura de dois quilômetros acabou me ferrando. Humanos não foram preparados para sobreviver por tanto tempo no alto.

— Tenente Degurechaff, está consciente? Tenente Degurechaff?

Com a cabeça e o corpo lento e pesado feito chumbo, até responder o Controle pelo rádio me passa uma horrível sensação de incômodo. Mesmo vestindo roupas para o frio, só posso conduzir experimentos nesta altitude carregando um tanque de oxigênio, um rádio aéreo e um paraquedas de emergência.

Um único pensamento passa pela mente de Tanya: Seja lá quem teve a ideia de enviar um humano desprotegido a essa altura devia muito bem vir aqui ver como é.

— Um pouco eu diria, mas não vou aguentar muito. Para ser sincera, não acho que seja possível ir mais alto que isso sem proteções.

Deve estar uns bons 21,6 graus mais frio do que no solo. A concentração de oxigênio está logo abaixo de 63%. É incerto se alguém consegue ou não suportar temporariamente essa altitude para executar manobras de combate aéreo, mas decerto não é um espaço feito para seres humanos. Em primeiro lugar, o orbe operacional comum possui uma altura máxima de mil e oitocentos metros. Mais alto que isso e ele perde a capacidade de produzir a propulsão necessária para se livrar da gravidade.

É por isso que Tanya estima que os feiticeiros têm cerca do mesmo nível de superioridade aérea de um helicóptero de assalto. Na verdade, a diferença de altitude chegou até a convencer o Império que o confronto entre feiticeiros e aeronaves não era nada realista. Tal empecilho é praticamente insuperável.

Claro, se o problema for apenas a altitude e eu tiver um orbe especial projetado para alcançar alturas recordes, o resultado pode ser diferente; entretanto, o que Tanya está testando não é um objeto com essas habilidades, mas sim uma ferramenta militar, posta como o "novo modelo", criada em busca de versatilidade.

Contudo, apesar deste novo modelo — protótipo de orbe operacional da Armamento Elíneo, Arquétipo 95 — ser destinado ao exército, ele está gerando propulsões ridículas que geralmente nem são possíveis. O verdadeiro método utilizado para realizar isso é simples e clichê, seguindo o esquema usual de desenvolvimento de motores: se um não prestar, use dois. Se dois não resolverem, use quatro.

No final, sem o selo de "pesquisa tecnológica" para indicar que é de fato um protótipo, o orbe não parece muito diferente dos outros. A nível de design, continua sendo uma peça de maquinaria esférica do tamanho de um orbe operacional, lotada de inúmeras geringonças.

Mas o que realmente importa está no seu interior.

— Para piorar, isso consome muita mana. E a eficiência da conversão de magia é horrível.

Em vez de gasolina, os orbes operacionais utilizam mana; uma peça de engrenagem com quatro motores consumiria quatro vezes a quantidade normal de mana. Mas expandir a reserva mágica de um humano não é tão fácil quanto adicionar mais tanques de combustível, ou seja, o operador ficará exausto muito mais rápido. Talvez este protótipo tenha capacidades revolucionárias de acordo com suas características, porém a praticidade de um orbe que requer o impossível e deixa o feiticeiro esgotado é no mínimo questionável. Este não só consome quatro vezes a mana de um orbe convencional, como também é atormentado pelo problema técnico de sincronizar seus quatro núcleos.

Dado que os desenvolvedores obtiveram sucesso em miniaturizar os núcleos, o orbe quase não é maior do que seus semelhantes. Para a surpresa de muitos, seu tamanho compacto se manteve o mesmo dos orbes comuns e pode caber no bolso de um feiticeiro a despeito do conteúdo. É bem simples de manusear.

Tenho que respeitar a tecnologia pela qual permitiu aos pesquisadores diminuir os núcleos a esse ponto, mas sendo a pessoa a manuseá-lo, tudo que posso falar é o quão detestável isso é. Miniaturizar um aparelho delicado significa perder seja qual for as tolerâncias que o original tinha. Se ajustar a ativação da sincronia quádrupla de núcleos não for ruim o bastante, o tamanho reduzido deles ainda contribuem para um sistema não confiável e de estabilidade péssima.

Assim, embora na teoria o consumo de mana desse novo modelo deveria ser quatro vezes o normal, na prática precisava de muito mais. Incluindo a perda de mana, mesmo uma estimativa conservadora põe o gasto em seis vezes o usual. Eu não estar acostumada a permanecer nesta altura provavelmente é um fator importante, porém só o teste de altitude já me deixa esgotada, como se tivesse jogado fora toda a minha energia em manobras de combate aéreo. Conforme me canso cada vez mais rápido, também fica mais difícil de respirar.

Mas ao receber o relatório fatigado de Tanya, o rádio retruca com a voz completamente indiferente de um engenheiro.

— Não consegue ir um pouco mais alto, Tenente? Em tese, era para você ser capaz de chegar aos cinco mil e quatrocentos metros.

Tanya segreda em seu coração as palavras: "maldito seja esse cientista maluco". E faz uma carranca de forma espontânea para onde o homem maligno que acabou de falar no rádio se encontra na aeronave de reconhecimento. Posso apenas imaginar como seria revigorante alvejá-la. Tanya deixa escapar um suspiro enquanto se segura para não tentar fazer isso.

A voz pertence a Adelheid von Schugel. O engenheiro-chefe que supervisiona o protótipo, bem como um legítimo cientista maluco. É frustrante ter que me conter para não atirar nele pelo fato disso só criar mais problemas e resolver nenhum. Tudo o que Tanya pode fazer é lamentar essa situação absurda. E ficar presa testando a invenção desse engenheiro é um ótimo exemplo disso.

— Doutor von Schugel, por favor, não seja insensato.

Para uma pessoa ir mais alto, ela precisaria de roupas aquecidas, não somente aquelas com isolamento. E baseado em minha experiência de combate, o orbe ficaria inviável no momento em que eu precisasse voar com um tanque de oxigênio amarrado nas minhas costas. É óbvio que bastaria um único disparo no suprimento de ar para dar a todos menos Tanya um incrível espetáculo.

Partindo-se do pressuposto que um feiticeiro use uma fórmula para gerar ar e consiga aguentar este reino das alturas sem roupas aquecidas ou um tanque de oxigênio, se esse rendimento depende do orbe operacional, o aparelho já ineficiente queimaria mana ainda mais rápido. A possibilidade de manter operações de combate torna-se extremamente incerta com o nível antecipado do consumo de magia se comparado aos orbes existentes e, por causa de problemas como a baixa concentração de oxigênio, há grande risco de perder a consciência no decorrer das movimentações.

Portanto, um paraquedas é essencial e, apesar de ser o bastante para conduzir testes de voo em nosso próprio território, um feiticeiro imóvel e quase inconsciente descendo devagar é um alvo fácil no meio do combate. Mesmo se o operador chegasse no solo, sua segurança não estaria garantida. Caso pousasse em território inimigo, com certeza seria tomado como prisioneiro.

Sem falar do pequeno risco de o paraquedas pegar fogo ou não abrir por conta da umidade. A Tanya mesma passou sufoco só para encontrar um que fosse de confiança.

— Você ainda deve ter mana sobrando. Além disso, a pressão no orbe está dentro dos parâmetros aceitáveis.

Para a minha infelicidade, ao que tudo indica este engenheiro — o tipo de excêntrico interessado apenas em suas invenções — acredita que os parâmetros teoricamente aceitáveis são as únicas coisas importantes.

— Mas doutor, esse treco não tem durabilidade o suficiente! Quem sabe quando essa porcaria defeituosa vai explodir?!

Para um soldado com experiência em confrontos de vida ou morte, a prática é sempre mais importante do que a teoria. Pelo menos para Tanya, sequer relembrar o último teste de altitude a deixava revoltada de novo.

Aquilo foi terrível. Quando estava a mil e oitocentos metros, perdi o equilíbrio no instante em que os núcleos dessincronizaram um pouco. Supostamente, isso aconteceu devido a uma pequena disparidade na velocidade de condução dos circuitos de desvio mágico. Esses circuitos, destinados à pesquisa, foram construídos com uma precisão bem maior do que aqueles usados para combate; e ainda assim não conseguiram consertar a disparidade? Quando eu soube da causa aparente, juro que tive vontade de sair gritando. Que precisão sem noção é essa?!

Qualquer mana que não possa ser dominada pelos mecanismos internos do orbe operacional acaba ficando fora de controle. Por consequência, os núcleos, incapazes de suportar a sobrecarga, estouram em uma série de explosões mágicas. Felizmente, fui rápida o bastante para contê-los com a ajuda de um orbe extra que eu tinha pegado por precaução.

Mas só fui capaz de resolver o problema porque aconteceu a cerca de mil e duzentos metros de altura. A três mil e seiscentos, onde a temperatura ambiente é fria demais para se mover — e acima de tudo o ar é rarefeito — não tenho muita certeza se conseguiria manter a consciência. No caso de o protótipo de orbe pegar fogo a esta altura, se eu não conseguir controlá-lo, vou terminar compartilhando um beijo intenso com o chão.

Mesmo Tanya não tendo nenhum apego ao seu primeiro beijo como uma garota, duvido que alguém iria querer um assim. Não é senso comum, no entendimento totalmente normal da palavra, se livrar de uma coisa quando ela não pode ser controlada? Mas a vida não é tão fácil para quem possui obrigações profissionais.

Se pudesse, jogaria isso fora num segundo, porém esse protótipo de orbe operacional é um amontoado de segredos. Jamais sairia impune disso. No momento em que eu o perdesse, um monte de medidas preventivas seria tomado para garantir o sigilo.

E, afinal de contas, era dever do testador recuperar o protótipo se possível com segurança… Razão pela qual preciso ter cuidado para controlá-lo de uma maneira que ocorra o mínimo de acidentes. Usar este orbe nada confiável é algo difícil de descrever, mas se eu tiver que comparar com alguma coisa, seria como andar de monociclo através de uma corda bamba passando por um círculo de fogo e ao mesmo tempo fazendo malabarismo com facas.

A pessoa teria que ser estúpida ou suicida para continuar ascendendo com um protótipo tão imprevisível. Claro, uma combinação das duas também é uma possibilidade.

No entanto, aparentemente, minha sincera opinião como testadora é deveras desagradável para o engenheiro-chefe.

— Como ousa chamar minha maior obra-prima de "porcaria"?!

Sendo honesta, até Tanya reconhecia as especificações excepcionais da máquina.

Um sistema com sincronização quádrupla de núcleos ficava apenas na teoria, então o simples fato de o engenheiro-chefe realizar tal feito, ainda que em parte, é uma prova de suas habilidades assustadoras. Depois ele conseguiu encolher os núcleos ao tamanho atual, mantendo a funcionalidade dos modelos convencionais. De uma perspectiva puramente histórica, isso é de fato genial. Estou disposta a aplaudir como a maior descoberta tecnológica desde a identificação da ligação entre o orbe e o cetro.

Então, eu imploro, poderia por gentileza levar em consideração os usuários quando estiver fazendo essas coisas? No que me diz respeito, não importa o quão alto é o desempenho, as pessoas não devem ser forçadas a se conformar com as invenções de um doutor. É possível dar ordens para alguém se adaptar a um uniforme modificando seu físico, porém, para começar, isso só funciona se o tamanho não estiver longe do ideal.

— Olhe para a aplicação, não para as especificações! Ao menos dê um pouco mais de consideração à redundância!

A premissa geral é de que o equipamento militar será utilizado durante as intensas circunstâncias de guerra. O exército quer um dienstpferd, não cavalos de puro-sangue.

— Que conversa é essa?! Sua intenção é dessincronizar o orbe já otimizado?!

— Doutor von Schugel, por favor, não grite no rádio.

— Silêncio! Primeiro retire aquele insulto!

A explosiva troca de abusos verbais ecoa pelo espaço aéreo de teste, apesar de ter soado pelo rádio. Aaaah, ele não só é um fanático por sua área, como também tem a mente de um pirralho. Quero segurar a minha cabeça de tanta frustração. Sério mesmo que esse cara, entre todas as pessoas, é logo o chefe? Se eu estivesse no comando dos assuntos pessoais, teria pelo menos me assegurado de que um oficial administrativo, capaz de controlar esse maníaco, fosse indicado ao cargo de chefe para freá-lo.

Mas a realidade é outra, esse homem é o chefe e eu a testadora principal. Não tenho nada contra o sistema de avaliação meritocrático do Império, entretanto, desejo com toda sinceridade que no mínimo levem em conta as habilidades administrativas. Só o que eu quero é gritar: "Já passou da hora de vocês perceberem a distinção entre funções técnicas e administrativas!"

— É como eu disse…

Eu estar insatisfeita em relação à administração do Império se deu da minha experiência de tempos atrás como administrador. Ao mesmo tempo, enquanto for uma soldada forçada a obedecer determinadas condições, não há escolha senão suportar em silêncio. No entanto, por ter me distraído, a discussão de dar enxaqueca é interrompida.

— A temperatura do motor está subindo rapidamente!

Tsk! Ahhh, que merda! A forma como o problema veio de uma irregularidade tão insignificante quase me fez soltar um gemido. Os núcleos do orbe estão à beira do colapso. Quando a sincronização falhou, perdi o controle deles. Sem desperdiçar tempo, corto de imediato o suprimento de mana e realizo uma descarga de emergência da energia dentro do orbe operacional. É possível executar essas ações com um único movimento.

Felizmente, os mecanismos de segurança foram implementados em consequência da lição aprendida da última vez e se mostraram mais eficazes do que o previsto. Durante aquele teste anterior, houve uma explosão e o motor pegou fogo, mas dessa vez consegui estabilizar os circuitos por pouco. Ainda assim, isso não significa que a mana no interior do orbe vai apenas descarregar sem causar nenhum dano.

Os núcleos dessincronizados do orbe operacional chocam mana atrás da outra de todas as direções e os circuitos explodem num instante. Mas eu dei sorte! O revestimento reforçado que pedi várias vezes foi finalizado a tempo para esse teste, então consegui evitar quaisquer danos reais.

Portanto, uma expressão de alívio aparece no belo rosto de Tanya conforme ela se comunica com o controlador pelo rádio para seguir o procedimento de descida, soando irritada.

— Controle, está ciente da situação? Vou abrir meu paraquedas.

Tenho muita altitude, e aqui é perto da capital imperial, uma zona fora de combate localizada na retaguarda. Sob essas condições, é mais seguro abrir o paraquedas do que se matar para ativar um orbe operacional extra em plena queda.

Na capital, posso flutuar para baixo tranquila sem me preocupar em levar um tiro. Nesse caso, tudo que preciso fazer enquanto desço é aguentar firme e me preparar para o pouso. Mas assim que meu paraquedas abre e eu começo a planar devagar…

— Receb… Calma, doutor, pare com isso! Por favor, me dê licença! Com licen....!

Após captar o som de uma discussão estúpida no rádio, Tanya se vira para o céu e desperdiça um pouco de oxigênio em um longo suspiro. Com certeza é o barulho de uma disputa pelo aparelho de rádio. Pelo jeito, um certo alguém está tendo um ataque, tentando arrancá-lo à força das mãos do controlador.

O engenheiro-chefe Adelheid von Schugel adquiriu genialidade em troca de bom senso? Embora haja muitos casos pelos quais o caráter de um indivíduo não esteja correlacionado às suas capacidades, eu nunca esperei encontrar alguém nesse nível.

Ou o mundo me odeia ou estou amaldiçoada pelo Diabo. Bem, visto que algo pouco científico como magia existe, vou de Diabo mesmo — ou melhor, Existência X.

— De novo, Tenente Degurechaff?!

Aparentemente, a nobre batalha do outro homem foi em vão e o cientista maligno roubou o aparelho de rádio. Mesmo assim, devo reconhecer que ele lutou com bravura para defendê-lo do doutor. Mas já que a batalha fracassou, não me restam escolhas a não ser exercer meu direito de legítima defesa contra esse gênio maluco. Jamais sonhei que o mundo em que vivo se tornaria um lugar onde eu precisaria me salvar.

Se eu tiver que pôr em palavras: "Onde está, repito, onde está a lei e a ordem? O mundo quer saber."

Neste momento, sinto o maior respeito e admiração pelos juristas. Quem me dera aparecer alguém para restituir a ordem legal, até um formalista serve.

— Se me for permitido falar isso, eu é que pergunto!

Afinal, o sistema intrincado de forma bizarra impede que até mesmo fórmulas mágicas de explosão sejam ativadas corretamente. Para falar a verdade, o número de ocorrências desse sistema defeituoso explodindo fora de controle supera a quantidade de vezes que eu consegui conjurar uma explosão.

Quando me disseram que faria voos de teste, nunca pensei que acabaria reconhecendo a grandeza e a dificuldade de voar mais uma vez. Não sou um dos irmãos Wright, porém isso me fez perceber de novo como a busca da tecnologia de voo está diretamente ligada ao risco de um acidente fatal. Ao menos eles próprios voaram, arcando com as consequências.

O engenheiro-chefe Adelheid von Schugel, por outro lado, obriga os outros a fazer. E ainda por cima, é tão indulgente consigo mesmo que não acreditei no que ouvi quando ele alegou haver falta de elegância funcional nos recursos de segurança.

No momento em que finalmente pude realizar alguma avaliação decente, embora quase nada, ele acrescentou uns itens de testes e tarefas estranhas. Ali foi quando eu agi por impulso e enviei um pedido de transferência. Que, infelizmente, foi negado. Por quê? Por mais injusto que pareça, aconteceu porque fui a única capaz de fazer pelo menos um teste. Aliás, meu contato no Departamento de Assuntos Pessoais chegou até a me repreender falando para eu "seguir em frente sobre os cadáveres de meus predecessores caídos".

Presumi que ele quis dizer isso no sentido figurado, mas talvez eu esteja errada. As linhas de frente estão parecendo mais promissoras em termos de sobrevivência. Um dia desses, ouvi dizer que agora estou qualificada para receber a Insígnia da Cruz Ferida.

— É a sua falta de concentração a culpada por todos esses problemas! E ainda se diz soldado?

Eu aturei os insultos de Schugel e segurei meu desejo interior para não dar um escândalo de xingamentos. Certamente não me alistei ao exército porque queria, e isso aqui não é uma profissão lá muito divertida, mas eu entrei né.

— Pois eu lhe garanto que sou um soldado imperial! E o dever de um soldado é usar armas, não perder tempo tentando fazer porcaria cheia de defeitos funcionar!

No início, considerei que o trabalho de um soldado imperial fosse guerrear com um orbe operacional na mão e um rifle no ombro. De forma alguma pensei que isso implicava portar aparelhos defeituosos e sair explodindo sem avisos. Os soldados também possuem o direito de reclamar se receberem um orbe descontrolado ou uma arma quebrada. Ao menos, é assim que funciona no Exército Imperial.

Ademais, credibilidade e durabilidade são indispensáveis para o equipamento de um feiticeiro presente no severo ambiente que é a guerra moderna. O que não passa de senso comum, inclusive entre novos oficiais. E vai além de apenas feiticeiros — era para estabilidade e confiança serem tomadas em primeiro lugar na construção de qualquer equipamento militar. Sendo direta, um objeto desenvolvido de modo bizarro e inédito não é adequado para combate.

Igual a como um carro de corrida projetado exclusivamente para um alto desempenho é incapaz de suportar o desgaste do uso cotidiano. Uma arma delicada e intrincada que não tolera o manuseio errado dos soldados torna-se irrelevante no campo de batalha.

 

 

— Como é? Você chamou de "porcaria" de novo?!

Naturalmente, é do entendimento do exército a necessidade de inspecionar tecnologias. E às vezes, no intuito de exibir seu poderio tecnológico para propaganda, o Império produzia equipamentos experimentais especializados em uma única área visando quebrar recordes. Se estivessem numa corrida dessas, aí tudo bem, mas o protótipo de orbe atribuído a Tanya é conhecido como o "principal candidato de última geração", então é imprescindível que haja versatilidade.

Esse cientista maluco sequer leva a sério o desenvolvimento de armas? Não parece mais um hobby para ele? Enquanto Tanya questiona o juízo do engenheiro-chefe, ela também se pergunta como que o Quartel-General de Suprimentos e Logística aceitou uma coisa dessas.

O mundo de fato é um lugar estranho.

— Qual parte de um orbe operacional que quebra do nada, e nesta altitude, pode ser chamado de arma legítima?!

Caso os motores de uma aeronave parassem de repente, todos a chamariam de "máquina assassina".

Se os defeitos fossem particularmente severos, ela chegaria até a adquirir notoriedade como "fabricante de viúvas". No entanto, este orbe tem problemas ainda piores que isso. Afinal de contas, para fazer a coisa funcionar requer quase um milagre.

Não só é suscetível a quebras e maus funcionamentos, mas também possui uma saída instável e, no geral, não é nem um pouco confiável. É óbvio que eu pensaria que esse treco jamais deveria ser chamado de arma.

— Isso é porque vocês imbecis vivem manuseando ele de forma errada! Como conseguem quebrar meus instrumentos de precisão tão rápido assim?!

— Você que os constrói frágeis demais. Já ouviu falar em "uso militar"?

Esse cientista maluco decerto não conhece o significado desse termo. Entretanto, sem dúvida que ele conseguiu satisfazer todas as especificações que o exército solicitou.

Embora seja apenas verdade no papel — e, inclusive, só até certo ponto — o protótipo tem uma altitude funcional onde é possível interceptar bombardeiros. Esta é uma qualidade que mais uma vez aumentaria o valor estratégico dos feiticeiros. Na teoria, a aplicação do poder de fogo imediato iria quadruplicar. O potencial de ataque dos feiticeiros literalmente decolaria.

Mas isso é se partimos do pressuposto que esse treco maldito funcione direito. Apesar de óbvio, francamente, um orbe tido como obra de arte ou que exige manutenção laboratorial só pode ser um objeto inútil. Me sinto tentada a perguntar se o maior desejo do engenheiro-chefe é criar um cavalo de puro-sangue cuja única necessidade é oferecer desempenho máximo por breves instantes durante uma corrida.

Em geral, os orbes operacionais são instrumentos de precisão que funcionam bem se receberem manutenção básica uma vez por mês. Mobilizar a equipe técnica inteira para trabalhar em um orbe toda vez que o usam é absurdo — e com isso quero dizer toda a equipe técnica da instituição de pesquisa, equipada com os recursos mais substanciais de apoio da retaguarda. Isto é, o Quartel-General de Suprimentos e Logística. O doutor deve ter esquecido o significado de manutenção.

Ele além de falhar em cumprir os padrões de manutenção que são desejados na fronte, não chegou nem perto, na verdade. O fato disso ser um protótipo avançado dá a entender que se espera que Tanya realize um determinado grau de certificação. Mas não canso de me surpreender com a quantidade de problemas de aplicação que podem ser resolvidos.

— Eu quero saber porque não entra nessa sua cabeça o quão revolucionária a tecnologia por trás da sincronização de quatro motores é!

— Até reconheço que seja revolucionária. E por isso mesmo que digo e repito: crie algo funcional.

— Em tese, funciona! Por que você não consegue usá-lo do jeito certo? — Ele está mais para um estudioso acadêmico do que um dos melhores engenheiros da área. Berra idiotices exasperantes com uma cara séria.

Baseado nas opiniões pessoais de Tanya e na sua teoria — um tanto enviesada — sobre gestão de recursos humanos, quando aparecer um cientista em seu local de trabalho no futuro, só haverá uma coisa pela qual ela precisará tomar cuidado; em poucas palavras, se a pessoa é ou não maluca. Antes de sequer vir a se preocupar com as habilidades administrativas, o que interessa é: essa pessoa tem a capacidade básica de comunicação necessária para trabalhar em equipe? Apenas isso.

Por sinal, dizem existir uma linha tênue que separa o gênio de um louco, mas agora vejo que é até fácil distingui-los. Se no final de uma conversa sua única vontade é descarregar um cartucho inteiro de munição em alguém, essa pessoa em questão é maluca. Se você conseguir manter uma conversa amigável, ela é um gênio.

— Doutor von Schugel, é preciso um nível adequado para uso prático!

— É justamente para isso que estamos conduzindo esses experimentos! Nunca ouviu falar do Ciclo PDCA?

Seria tão maravilhoso derrubar esse infeliz dali de cima com meu orbe reserva… Qualquer um que faz os outros pensarem dessa forma é um cientista maluco. Se a voz da razão não estivesse me segurando, tenho certeza que teria sujado minhas mãos.

Fora isso, é claro que conheço o Ciclo PDCA. Planejar (plan), executar (do), checar os resultados (check) e implementar melhorias onde for necessário (act); um processo bastante conhecido. Não é como se eu tivesse alguma coisa contra o uso desse método comum.

Na realidade, faria questão de seguir com procedimentos ainda mais rígidos. Estou desesperada para dizer a este homem para que ele pelo menos dê uma olhada melhor em suas criações.

Sendo eu quem está usando o orbe, posso afirmar que seus defeitos não são do tipo que podem ser corrigidos com pequenas melhorias. Tem uma série de erros, problemas e falhas graves. Apesar da minha responsabilidade de manter sigilo, esse treco é tão cagado que eu jogaria fora se não fosse pelos mecanismos de segurança embutidos nele.

Para piorar, esses mesmos mecanismos não são lá essas coisas. O orbe parou de funcionar sem problemas, e Tanya conseguiu evitar o pior resultado. Porém ele não é capaz de conter totalmente a mana dentro. Se os circuitos explodirem, esse treco vai virar um monte de sucata, portanto preciso sempre ter em mente o pior cenário possível.

E este seria se uma explosão incendiasse meu tanque de oxigênio; o que não seria nada legal. Com base no progresso anterior, me deram alguns paraquedas aprimorados feitos a partir de tecidos à prova de fogo e resistentes a rasgos. Mas nem isso garante cem por cento de segurança.

Caso Tanya fique inconsciente, há sempre a preocupação de que o paraquedas não abra automaticamente. Dependendo do tamanho da explosão, também existe o risco de ficar presa pelas cordas e morrer asfixiada antes mesmo de aterrissar.

Os humanos aprenderam com a experiência que, conforme referido pela Lei de Murphy, se algo pode dar errado, dará. Se um funcionário de escritório tem aptidão em causar problemas, então problemas acontecerão. Por exemplo, é conhecimento geral na gestão de recursos humanos não manter um funcionário sem grana em um departamento que trata de finanças. Da mesma forma, voar com um orbe que pode explodir a qualquer hora é como se sentar à espera de uma explosão acontecer.

Ao pousar, decido enviar uma solicitação de transferência, dessa vez a sério. Um aceno de cabeça enérgico demonstra o nível da determinação de Tanya. Ainda que o pior aconteça e isso passe uma impressão negativa aos meus superiores, juro que negocio até o fim com o Departamento de Pessoal.

Do jeito que as coisas estão indo, cem vidas não seriam suficientes para ela sobreviver. O serviço na unidade de instrução é a sua única esperança. Tinha tentado usar minha afiliação a eles como escudo e implorado para assumir minhas funções lá, mas não adiantou. Há grandes chances de eu me tornar um sacrifício humano em um dos experimentos daquele cientista maluco, a menos que desista dessas tentativas não oficiais e apresente logo um pedido oficial de transferência.

Preciso enviar essa solicitação… E o mais rápido possível.

Assim, imediatamente após aterrissar e cumprir minhas obrigações, pego minha caneta.


Nota:

1 – Consiste de um bloco de explosivo, no qual é inserido um tubo de metal de cerca de 7 cm, contendo uma granada de mão OTO Mod. 35. Essas granadas italianas, famigeradas por falhas em sua ignição e explosões acidentais, eram temidas tanto pelos inimigos quanto pelos aliados.



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