Volume Único

Capítulo 2: Cosmonauta

A água ofuscava sob o sol nascente. O céu estava azul e meu corpo se sentia leve na água que parecia quente contra minha pele. Eu era a única que flutuava no mar de luzes. Em momentos como esses me sentia como se fosse especial e isso me fazia um pouco mais feliz. Os problemas que me preocupavam não podiam me incomodar.

Continuei a remar com toda a minha energia onda após onda enquanto pensava comigo mesma que talvez a causa das minhas preocupações fosse porque eu estava tão otimista e fiquei feliz tão facilmente. O mar da manhã era lindo. Era muito difícil descrever as cores das ondas enquanto elas se chocavam pouco a pouco. Foi o suficiente para chamar minha atenção enquanto a prancha que eu estava deslizou para a face da próxima onda. Senti que estava pronta para me levantar na prancha, mas perdi meu equilíbrio e caí sob as ondas. Falhei novamente. Engoli um pouco de água do mar e entrou um pouco no meu olho.

 

Minha primeira preocupação: nunca consegui ficar de pé sobre a minha prancha de surf nos últimos seis meses.

 

Fiz meu caminho de volta até o estacionamento na costa (era apenas um campo aberto cheio de ervas daninhas crescendo) e usando a grama alta de cobertura, tirei o wetsuit¹ que se encaixava perfeitamente contra a minha pele então reguei meu corpo nu com água e troquei para o meu uniforme escolar. O lugar estava deserto. Os fortes ventos do mar eram muito confortáveis depois de me aquecer com o exercício. Meu cabelo curto, quase no ombro, secou em um piscar de olho. O sol nascente lançava as longas sombras tortuosas das ervas daninhas sobre o meu uniforme seifuku branco. Eu amo o mar, mas o amo especialmente durante essa estação. Se fosse inverno, teria sido muito desconfortável me trocar assim.

Enquanto eu colocava um pouco de hidratante em meus lábios secos, ouvi a van da minha irmã mais velha chegar, então levei minha prancha de surf e minha mochila esportiva comigo e fui até ela. Ela estava vestindo um conjunto vermelho de corrida e regulando a janela do assento do motorista quando chamou por mim.

— Kanae, como foi hoje?

Minha irmã era linda. Seu cabelo era longo e reto, ela sempre manteve a compostura e era professora do ensino médio. Oito anos mais velha do que eu e há um tempo atrás não gostava dela. Talvez tivesse um complexo onde sempre me comparava e me analisava contra a minha irmã brilhante. Mas gosto dela agora. Antes que soubesse, passei a respeitá-la depois que ela se formou na universidade e voltou para a ilha. Se ela não usasse esse conjunto de corrida velho ela ficaria muito mais bonita do que agora. Mas talvez ela esteja assim por não querer se destacar muito nesta pequena ilha.

— Hoje também não consegui. O vento estava para o mar o tempo todo — respondi enquanto colocava a prancha no porta-malas.

— Não se preocupe com isso, leve seu tempo. Vai vir praticar depois da escola também?

— Sim, eu quero. Tudo bem para você, irmã?

— Tudo bem. Mas não se esqueça de estudar também.

— Ok ok.

Respondi em um tom sarcástico e segui para uma scooter estacionada em um canto do parque. A Honda Super Cub² foi da minha irmã durante seu tempo de escola. Nossa ilha não tem nenhum carro e quase nenhum ônibus por isso a maioria de estudantes têm que obter sua licença para moto quando completam dezesseis. Viajar na scooter era muito conveniente e confortável, mas cada vez que vou para o mar, a minha irmã leva a van até o parque de estacionamento já que a scooter não pode levar a prancha de surf. Era hora de ir para a escola agora. Estava indo para minhas aulas e minha irmã ia ensinar a dela. Quando virei a chave para ligar o motor, verifiquei a hora em meu relógio. Eram sete e quarenta e cinco. Sim, ainda tinha tempo. Ele ainda deve estar praticando. Segui minha irmã na Cub e nós deixamos o litoral para trás.

 

Comecei bodyboarding³ no primeiro ano do ensino médio porque fui influenciada pela minha irmã e no primeiro dia fui contagiada pela alegria do esporte. Minha irmã estava no clube de surf durante a universidade. Não era muito moderno e laborioso (nos primeiros três meses tudo o que eles fizeram foi um treinamento básico para se preparar para o mar. Eles passaram seu tempo remando e treinando mergulho de pato todos os dias até o pôr do sol!) e eu não entendia por que eles queriam ir contra algo tão incrivelmente grande como o mar, mas pensei que era uma coisa linda de se fazer. Então, em um dia ensolarado no meu segundo ano de ensino médio, de repente pensei que também queria deslizar nas ondas em algum momento. Para fazer isso tive que aprender a ficar de pé em uma prancha curta ou longa e, já que sou aventureira precisava ser a prancha curta para que eu pudesse girar e virar e, quando comecei a aprender, consegui deslizar nas ondas várias vezes por pura sorte, mas desde então, por algum motivo, nunca mais fui capaz de me levantar novamente. Tinha começado a pensar que talvez devesse abandonar a prancha curta que é difícil de usar, mas não tinha certeza se deveria desistir tão facilmente em algo que tinha decidido para mim e, com essa hesitação em mente, já era o terceiro ano de escola secundária e em um piscar de olhos já era verão novamente.

 

Thump! O pequeno som agradável podia ser ouvido misturado com o cantar dos pássaros na manhã. Era o som de uma flecha que perfurava um pedaço de papel em uma tábua sendo usada como alvo. Eram oito e dez e eu estava na sombra do prédio da escola me sentindo muito nervosa. Dei uma olhada para trás e, como de costume, ele estava lá na área de de tiro com arco praticando.

Todas as manhãs ele sempre praticava e essa foi realmente uma das razões pela qual eu estava praticando surf todas as manhãs. Se ele parecia cheio de energia na parte da manhã, de alguma forma, isso me fez querer estar cheia de energia também. Foi maravilhoso vê-lo atirar uma flecha com aquele olhar sério em seu rosto. Eu estava muito envergonhada para vê-lo de perto, então sempre mantive cerca de cem metros de distância ao assistir. Até mesmo espiar.

Por alguma razão, endireitei minha saia, arrumei meu uniforme e respirei profundamente. Bem! Apenas seja natural, disse a mim mesma e então comecei a caminhar em direção a área de tiro com arco.

— Ei, bom dia.

Ele cumprimentou como todas as manhãs, parando sua prática quando me viu chegar. Aaah! Ele é tão legal! Ele tem uma voz tão profunda e fria!

Meu coração batia rápido, mas continuei caminhando em sua direção, fingindo estar calma. Fingia estar apenas de passagem. Respondi, tomando cuidado para que minha voz não me entregasse.

— Bom dia, Tohno-kun. Você chegou cedo de novo.

— Você também, Kanae. Estava no mar, certo?

— Sim.

— Você treina duro, não é?

— Eu — ele me surpreendeu ao me elogiar assim. Oh não, isso não é bom. Meu rosto provavelmente está ficando vermelho vivo!

— Não... na verdade não... Eheheh, vejo você mais tarde, Tohno-kun! —Fugi rapidamente, envergonhada e feliz ao mesmo tempo. — Sim, vejo você mais tarde. — Ouvi sua voz gentil atrás de mim.

Meu segundo problema: tinha um amor não correspondido por Tohno-kun. Na verdade, tem sido assim por cinco anos. Eu o chamo de “Takaki Tohno-kun”. Eu só poderia estar com Tohno-kun por mais seis meses antes da formatura no ensino médio.

 

E meu terceiro problema: o papel na minha mesa resumiu tudo. Eram agora oito e trinta e cinco e estávamos no meio da nossa aula. Eu mal ouvia o Sr. Matsuno. Ele estava dizendo “Ouçam. É hora de vocês tomarem uma decisão por vocês mesmos. Discutam com suas famílias...” ou algo assim. No pedaço de papel foi escrito o título, “Questionário Guia Para Três Carreiras”. Eu só consegui responder metade do papel.

 

Meio-dia e meia. Era hora do almoço e estavam tocando música clássica na sala de aula, e eu tinha certeza de que já ouvi em algum lugar antes. Por alguma razão, fiquei imaginando um pinguim patinando enquanto escutava a melodia. A que lembranças essa música que se ligava na minha memória? Desisti de tentar lembrar o nome da melodia e me concentrei nos ovos fritos que minha mãe tinha feito para o meu obentou. Eles estavam deliciosos. Podia sentir o gosto se espalhando, me enchendo de felicidade. Me sentei junto com Yukko e Saki-chan que estavam falando sobre suas opções de carreira.

— Ouvi que Sasaki-san vai fazer um exame de admissão na Universidade de Tóquio.

— Sasaki-san? Você quer dizer Kyoko?

— Não, não. Eu quero dizer o Sasaki-san do grupo um.

— Oh, o Sasaki-san do clube da literatura. Não me surpreende!

Ouvir sobre o grupo um me deixou nervosa. Era o grupo do Tohno-kun. A cada ano, os estudantes são divididos em três grupos em minha escola secundária. O primeiro e segundo grupos que são ensinados os assuntos comuns, mas as pessoas que estão no primeiro são aquelas que querem ir para a universidade. O terceiro grupo é ensinado sobre a indústria e muitos dos alunos vão para uma escola dedicada ou direto para o trabalho, a maioria permanecendo na ilha. Eu estava no terceiro grupo. Não tinha perguntado ao Tohno-kun ainda, mas ele provavelmente estava planejando ir para a universidade. De alguma forma, tive a sensação de que ele queria voltar para Tóquio. O ovo frito que eu estava comendo de repente perdeu seu gosto enquanto pensava sobre isso.

— E você, Kanae? — Perguntou de repente Yukko, mas eu não estava pronta para responder.

— Você não disse que estava planejando ir direto para o trabalho? — Saki-chan continuou. Fiz uma pausa... sem saber o que dizer. Só não sabia o que eu ia fazer ainda.

— Você realmente não pensou nisso, não é? — Disse Saki-chan parecendo chocada. — Tudo o que ela pensa é Tohno-kun — disse Yukko. — Mas ele provavelmente já tem uma namorada em Tóquio. — Saki seguiu em frente.

— De jeito nenhum! — Gritei a sério.

As duas riram. Elas sabiam tudo sobre os sentimentos que tentei esconder.

— Ah, eu não me importo mais. Vou pegar um iogurte da máquina de vendas. — Disse quando me levantei do meu assento irritada. Eu sabia que elas estavam apenas brincando, mas “A História da Namorada de Takaki Tohno” era demais para mim.

— O que! Você vai pegar outro? Já é o segundo!

— E daí? Estou com sede.

— Essa é a nossa garota surfista!

Eu deixei suas piadas para trás e caminhei para o corredor sozinha onde a brisa leve estava soprando. Caminhei olhando os quadros pendurados na parede. Eram fotos de foguetes lançando-se ao céu com uma enorme nuvem de fumaça. “H2 Rocket Nº 4 Lançamento - Heisei 9º Ano (2001), 17 de agosto 10:53”, “H2 Rocket Nº 6 Lançamento - Heisei 9º Ano (2001), 28 de novembro 6:27”... Havia rumores de que cada vez houvesse um lançamento bem-sucedido, alguém da NASDA viria tirar uma foto.

Vi muitos lançamentos de foguetes. Você pode ver claramente os foguetes subindo para o céu com uma pluma de fumaça branca, não importa onde você esteja na ilha. Agora que penso sobre isso, parece que não tivemos um lançamento já faz alguns anos. Tohno-kun só esteve na ilha por cinco anos, mas me pergunto se ele já viu um lançamento de foguete. Espero que um dia nós possamos ver juntos. Se for a primeira vez para ele, acho que ficaria muito emocionado e se pudéssemos assistir um a sós, acho que vamos nos aproximar bastante. Mas falta apenas seis meses antes de nossas vidas no colégio chegarem ao fim. Gostaria de saber se seremos capazes de ver um antes disso. Ah, e será que até lá eu também seria capaz de ficar de pé na minha prancha de surf? Um dia, quero que Tohno-kun me veja surfar, mas não quero fazer feio. Eu quero que ele sempre veja o meu melhor. Falta apenas seis meses... Não, há uma chance de Tohno-kun decidir ficar na ilha também. Se isso acontecer, então vou ter muitas chances de mostrar para ele e então também posso decidir trabalhar na ilha depois do ensino médio. Mas de alguma forma, não imagino ele ficando. Ele não parece ser o tipo de pessoa que viveria em uma ilha. Suspiro…

...E assim, todos os meus problemas estão centrados em volta de Tohno-kun. Mesmo sabendo que não posso ficar tão preocupada assim, sempre me preocupo.

 

Foi por isso que decidi que confessaria meu amor a Tohno-kun no dia que eu pudesse deslizar nas ondas.

 

✻ ✻ ✻

 

Eram sete e dez da tarde. O som das cigarras japonesas mudou de repente para o das cigarras mais comuns. Provavelmente não demorará muito para que os grilos possam ser ouvidos. Já estava um pouco escuro, mas a luz do pôr-do-sol ainda permanecia e as nuvens altas brilhavam douradas. Se ficasse olhando para elas, poderia dizer que elas estavam fluindo para o oeste. Há pouco tempo atrás, o vento soprava para a terra - o vento vindo do mar significa que as ondas não são boas, mas agora pode ser um bom momento para deslizar nas ondas. No entanto, isso não muda o fato de que eu não estava confiante de que conseguiria surfar.

Fiquei na sombra do prédio da escola e olhei para o estacionamento. Não havia muitas scooters sobrando e não havia sinais de outros estudantes nas proximidades dos portões. Todas as atividades dos clubes tinham encerrado. Em outras palavras, voltei para a escola depois que terminei de surfar e estava escondida, à espera de que Tohno-kun chegasse ao estacionamento (é um pouco assustador quando penso no que eu estava fazendo), mas talvez ele já tivesse ido para casa. Decidi esperar um pouco mais e desejei que pudesse deslizar nas ondas logo.

 

Estava preocupada se eu poderia surfar corretamente ou não, sobre o meu relacionamento com Tohno-kun e sobre o meu futuro. Claro, provavelmente tenho muitos outros problemas em minha cabeça, mas aqueles foram os meus três maiores. Por exemplo, um dos meus outros pequenos problemas foi o meu bronzeado. Eu realmente não tenho uma pele escura (talvez), mas não importa o quanto protetor eu coloque sempre acabo com um bronzeado mais escuro do que meus colegas. Minha irmã me diz que é natural porque eu surfo, minhas amigas Yukko e Saki-chan dizem que me deixa bonita, mas sinto que é ruim minha pele ser mais escura do que a do cara que eu gosto. A pele de Tohno-kun é tão branca e bonita.

Minhas outras preocupações incluíam como meus seios não estavam crescendo (eu tenho o mesmo DNA que minha irmã, então por que seu busto cresce bem e o meu não!), meus resultados escolares não são devastadoramente bons, talvez eu não tenha bom gosto para roupas, talvez eu seja muito saudável e não consigo pegar o resfriado (o que me deixa um pouco menos atraente do que outras garotas), etc. Tive uma montanha inteira de problemas para me preocupar.

Espiei o estacionamento novamente dizendo para mim mesma que enumerar os meus problemas não iria ajudar. Eu podia ver uma silhueta familiar se aproximando à distância lentamente. Sim! Eu sabia que devia ter esperado! Nossa, eu sou boa! Rapidamente respirei fundo e casualmente caminhei em direção ao estacionamento.

— Ei, Sumida. Está indo para casa agora? — Ele tem uma voz tão agradável. Logo pude vê-lo claramente sob as luzes do estacionamento. Tinha um corpo esguio, cabelos longos que cobriam um pouco dos seus olhos e andava de um jeito muito calmo.

— Sim... E você, Tohno-kun? — Podia sentir minha voz tremendo. Ah cara! Eu gostaria de me abraçar agora mesmo.

— Sim. Quer ir para casa juntos?

Se eu tivesse uma cauda como a de um cachorro, tenho certeza de que estaria abanando felizmente agora. Ah, estou tão feliz por não ser um cachorro já que pensei seriamente que ele teria me mandado embora, mas também fiquei contente já que a sorte nos deixou ir para casa juntos.

Fomos juntos por um longo de um caminho estreito cercado por campos de cana-de-açúcar. Enquanto eu olhava para as costas de Tohno-kun, ele dirigia na minha frente, podia realmente sentir como a sorte estava sorrindo para mim. Me senti aquecida por dentro e assim como quando falhei no surf, podia sentir minhas narinas tensas. Não sei por que, mas a sensação de felicidade e tristeza pareciam iguais.

 

Eu pensei comigo mesma que Tohno-kun era diferente de outros caras quando pus meus olhos nele. Ele se transferiu para Tanegashima de Tóquio durante o segundo ano do ensino secundário na primavera. Ainda posso me lembrar claramente de como ele se parecia no dia da cerimônia de abertura do novo semestre. Lá em pé na frente do quadro-negro estava um cara que eu não conhecia. Ele não parecia tímido ou nervoso e tinha um sorriso calmo em seu belo rosto.

— Eu sou Takaki Tohno. Me mudei de Tóquio há três dias por causa do trabalho do meu pai. Estou acostumado a transferir de escolas, mas ainda não estou familiarizado com esta ilha. É um prazer conhecê-los.

Ele não falava muito rápido ou muito devagar, não estava nervoso, soava calmo com um sotaque perfeito e entonação. Era como se ele fosse um apresentador de televisão. Se fosse eu - teria me comportado de maneira completamente oposta por ter mudado de uma cidade supergrande para um lugar rural supergrande (bem, é realmente uma ilha) - meu rosto ficaria vermelho brilhante, minha cabeça em branco e eu, sem dúvida, seria incomodada por ter um sotaque diferente de todos os outros. No entanto, lá estava ele e, embora estivéssemos em torno da mesma idade, eu me perguntava como ele poderia ainda estar tão calmo e falar em uma voz clara como se não houvesse ninguém na frente dele? Que tipo de vida ele leva e o que este indivíduo vestido em um uniforme preto tem? Era a primeira vez em minha vida que queria saber tanto sobre alguém, e naquele momento, o destino me deixou apaixonada.

Desde então, minha vida mudou. Sempre vi tudo à sua maneira, fosse a cidade, a escola ou a realidade. Não importa onde eu estivesse, na aula, depois da escola ou se estava passeando com meu cachorro, sempre estaria olhando para ele pelo canto dos olhos. Ele pode parecer legal demais, mas ele era sociável e fez muitos amigos rapidamente, todos os caras, mas como eles não saiam como um grupo consegui alcançá-lo várias vezes no momento certo.

Quando chegamos no ensino médio, acabamos em diferentes classes, mas era um milagre que ainda estivéssemos na mesma escola. Digo isso, mas não havia realmente muitas escolas para escolher nesta ilha, mas com suas notas acho que ele poderia ter escolhido qualquer escola que quisesse. Em vez disso, ele simplesmente escolheu a que estava mais próxima. Mesmo na escola secundária, ainda estava apaixonada por ele e durante aqueles cinco anos desde o dia em que ele chegou, esses sentimentos nunca enfraqueceram, ficaram mais fortes com o passar dos dias. Claro, queria me tornar a pessoa mais especial para ele, mas abraçar meu amor sozinha era mais do que suficiente. Eu nunca imaginei que seria capaz de sair com ele. Toda vez que eu o via na escola ou na cidade, meu amor por ele crescia mais forte e todos os dias me fazia sofrer, mas ao mesmo tempo estava feliz e me sentia um pouco indefesa.

Eram sete e meia da noite. Estávamos comprando algo em uma loja de conveniência chamada “Ai Shop”. Tohno-kun vinha aqui de zero a sete vezes na semana – se eu tivesse sorte, poderia ir mais vezes para casa com ele, ou se eu tivesse azar, uma vez a cada quinzena. Mas sem perceber, se tornou um hábito para mim visitar o Ai Shop no caminho para casa também. Mesmo se parecendo com uma loja de jardinagem onde uma senhora venderia sementes de plantas cultivadas em casa, aqui tinha uma grande variedade de lanches. Pode se ouvir um J-pop tocando em algum fone de ouvido. Lâmpadas longas brilhavam firmemente ao longo do teto e iluminavam o interior da pequena loja.

Tohno-kun sempre comprar a mesma coisa toda vez. Ele sempre pegava uma caixa de papel de Dairy Coffee sem hesitação. E toda vez, eu não sabia o que comprar. O que eu deveria comprar para parecer bonita. Se comprasse o mesmo café que ele, ficaria muito óbvio o que eu estava fazendo (apesar de estar querendo sua atenção), o leite parecia muito grosseiro, a caixa amarela da bebida Daily Fruits parecia bonita, mas eu não gostei do sabor e eu queria experimentar alguns Dairy Black Vinegar mas pareciam difíceis de beber.

E assim, enquanto eu estava muito ocupada decidindo o que comprar, cada vez o Tohno-kun me dizia: “Sumida, eu espero por você lá fora”, antes de me deixar e ir para o balcão. Era uma pena, porque eu gostava de estar ao lado dele. Assim, me apressei e escolhi o Dairy Yogurt outra vez. Quantos já tomei hoje? Eu tinha comprado um na escola, em seguida, na hora do almoço tomei mais dois, então este já seria o meu quarto. Acho que um vigésimo do meu corpo é feito de Dairy Yogurt.

Saí da loja e, quando estava a ponto de virar a esquina, vi Tohno-kun encostado na scooter escrevendo e-mails no telefone. Sem querer, rapidamente me encolhi nas sombras. O céu era azul escuro e somente as nuvens que se moviam com o vento, ainda tinham algum do vermelho do sol. Logo seria noite na ilha. O som dos insetos e da cana-de-açúcar balançando no vento encheu o ar ao nosso redor. Havia um aroma do jantar de alguém. Estava tão escuro que não conseguia entender sua expressão. Apenas a luz do LCD de seu celular podia ser vista.

Olhei alegremente e caminhei na direção dele. Ele naturalmente colocou seu celular no bolso quando percebeu que me aproximava e disse em sua voz amável, “Hey Sumida. O que você comprou?”

— Eu não sabia o que comprar, mas acabei pegando outro iogurte. Sabe, esta é o quarto hoje. Incrível, não é?

— O que? Você deve estar brincando. Mas agora que falou, você sempre bebe ela Sumida.

Enquanto conversávamos, minha atenção se voltou para o meu próprio telefone que estava dentro da bolsa de esportes que eu estava carregando nas costas. Já desejei milhares de vezes que fosse para mim que Tohno-kun estivesse escrevendo. Mas nunca recebi nenhum e-mail dele. Por isso também nunca pude escrever nenhum para ele. Pensei comigo mesma que, não importa quem eu namore no futuro, vou pensar apenas sobre essa pessoa e o tempo que passamos juntos. Nunca vou olhar para o meu celular para que ele não pense que estou pensando em outra pessoa enquanto estamos juntos.

Enquanto as estrelas começavam a brilhar no céu noturno, continuei falando com o cara que eu gostava, mas não pude me confessar. Senti vontade de chorar, mas estava determinada a me declarar em algum momento no futuro.

 


Hoje as ondas eram muitas e altas. Mas o vento parecia soprar para a praia, logo, muitas ondas também quebravam rapidamente. Eram cinco e quarenta. Já tinha tentado desafiar várias ondas desde que vim para o mar depois da escola, mas nem uma vez consegui me levantar. Qualquer um pode deslizar na espuma branca que aparece depois que uma onda se quebrou, mas eu quero surfar corretamente, deslizar no pico e seguir surfando sobre a superfície.

Lutei desesperadamente contra as ondas, mas minha atenção sempre acaba sendo pega pelo mar e pelo céu. Estava muito nublado hoje então por que o céu ainda parece tão alto? A cor do mar e a espessura das nuvens estavam mudando a cada momento. Enquanto lutava contra o mar, minha linha de visão variava entre alguns centímetros de diferença e o mar em constante mudança era como minhas emoções. Quero ser capaz de me levantar em breve. Quero saber como é o mar quando estou deslizando na minha altura máxima de cento e cinquenta e quatro centímetros. Não importa o quão bom alguém seja na pintura, tinha certeza de que nunca seriam capazes de capturar a beleza do mar que eu estava vendo agora. Nem mesmo uma foto ou talvez até um vídeo poderia fazer isso. Nos disseram como a tecnologia “High Definition” do século XXI tinha mil novecentos e vinte pixels de largura, o que permite que muitos detalhes sejam capturados. Mesmo assim, não é suficiente para capturar a beleza do mar em sua totalidade. Apenas não era possível para uma resolução de mil novecentos e vinte por mil e oitenta pixels capturar o que eu vi diante de mim. Era bonito em seu direito, mas me pergunto se o inventor ou produtor de filmes de tal tecnologia estava ciente disso também? Rezei para que ainda pudesse ver este cenário de uma maneira tão bonita, mesmo à distância. Eu queria que Tohno-kun também visse e de repente, comecei a pensar sobre o que aconteceu na escola hoje.

Enquanto estava almoçando como de costume com Yukko e Saki-chan, uma transmissão foi feita solicitando Kanae Sumida do terceiro ano, classe três. Me pediram para ir à sala de consulta de carreiras. Eu sabia por que estava sendo convocada, mas ao mesmo tempo estava mais preocupado com o quão embaraçoso seria de Tohno-kun ouvisse a transmissão. E minha irmã também.

Quando cheguei à sala dos conselheiros, o Sr. Itou estava lá sentado com um único pedaço de papel na frente dele. Era o formulário do questionário de orientação de carreira que tinha escrito meu nome. O barulho de cigarras podia ser ouvido das janelas abertas como se para deixar todos saberem que era verão, mas a sala estava agradavelmente fresca. As nuvens se moviam rapidamente pelo céu e os raios de sol estavam desaparecendo e reaparecendo através das rachaduras. Era um vento oriental. Fiquei sentada de frente para o professor, pensando que haveria muitas ondas hoje.

— Você é a única no terceiro ano que ainda precisa decidir o que fazer, Sumida — ele disse suspirando como se de propósito, parecendo irritado.

— Desculpe... — respondi e fiquei em silêncio sem saber mais o que dizer. O professor também ficou em silêncio. Ficamos assim por um tempo.

O formulário tinha “Por favor, selecione uma das seguintes opções” impresso nele de forma ordenada e eu estava olhando para a outra metade desamparadamente.

1: Ir para o ensino superior, universidade (A: Um curso de 4 anos, B: Um curso de curto prazo);

2: Uma escola técnica;

3: Ir para o trabalho (A: Por área, B: Por tipo de trabalho).

Ao lado da escolha da universidade havia também a opção de uma instituição privada ou pública e imediatamente depois, havia também uma lista de faculdades - medicina, odontologia, farmácia, física, engenharia, agricultura, vida marinha, negócio, literatura, economia, línguas estrangeiras e educação. Era algo semelhante se escolhesse ir para uma escola técnica ou participar de um curso de curto prazo - música, arte, creche, nutricionista, moda, computação, enfermagem, cozinha, cosméticos, estudos de mídia ou trabalhador do setor público... Já estava tendo vertigem lendo todas as palavras. Quanto à escolha de entrar em um trabalho e em que área na ilha, poderia estar dentro da região de Kogashima, Kyushuu, Kansai, Kantou ou outros.

Eu olhei entre as opções “dentro da ilha” e “Kantou”. Então “Tokyo” veio à mente, um lugar que eu nunca tinha ido e nunca tinha pensado em ir. Minha imagem da atual Tóquio de 1999 era que ela deveria ser lotada de gangsters (!) Em Shibuya, meninas que se parecem com estudantes do ensino médio vendendo roupas íntimas, vinte e quatro horas de emergências e crimes e, a bola gigante erguida em cima da insanamente muito grande torre da TV Fuji para sabe-se lá que propósito. Então imaginei Tohno-kun de camisa andando de mãos dadas com uma menina em meias vermelhas que tinha cabelo tingido de marrom. Rapidamente cortei minha imaginação. Pude ouvir o ruidoso suspiro do Sr. Itou novamente.

— Sabe. Você realmente não precisa pensar muito nisso. Com seus resultados pode ir para uma escola dedicada ou fazer um curso de curta duração na universidade. Se seus pais deixarem, você pode frequentar um em Kyushuu ou se não, pode apenas ficar em Kagoshima para encontrar um emprego. Isso não é bom o suficiente? Já tentou conversar com sua irmã, Sumida-san sobre isso?

— Não, eu não falei... — disse em voz baixa e voltei a ficar em silêncio. Minhas emoções estavam girando embaralhadas. Por que ele tinha que me chamar aqui e trazer minha irmã para isso? Por que ele cresceu uma barba? Por que ele está usando sandálias? Apenas desejei que o horário de almoço terminasse em breve.

— Sumida. Não sei o que está pensando se não disser nada.

— Sim senhor. Desculpe, senhor...

— Fale sobre isso com sua irmã esta noite. Vou avisá-la com antecedência.

Continuei a pensar comigo mesma, por que ele estava continuando a fazer coisas que eu não gostava?

 

Enquanto lutava com o mar, vi uma grande onda diante de mim. O tubo surgiu das ondas brancas, se fechando como um rolo e pouco antes do impacto, remei minha prancha com todas as minhas forças para passar. Havia realmente várias ondas hoje e continuei a mergulhar para que pudesse ir mais longe para o mar.

Eu pensei comigo mesma, “Este não é o lugar”.

Eu não estava no lugar certo... continuei repetindo a frase para mim mesma como um canto.

E então percebi que essas palavras eram algo que tinha se ligado a Tohno-kun todo esse tempo.

Tive tais momentos de vez em quando. Momentos em que de repente percebia algo como se tivesse poderes especiais. Se era na loja de conveniência que íamos depois da escola, o estacionamento deserto, atrás da escola na parte da manhã ou quando Tohno-kun estava digitando um e-mail no seu celular, posso ouvir as palavras, “Este não é o lugar" dele. Eu sei disso, Tohno-kun. Me sinto da mesma maneira. Você não é o único a pensar que este não é o lugar certo, Tohno-kun. Tohno-kun, Tohnokun, Tohno-kun... Comecei a me levantar na prancha enquanto repetia o nome dele, mas apenas quando estava prestes a me levantar fui derrubada no mar. Engoli um pouco de água e em pânico, agarrei na minha prancha que surgiu na água e comecei a remar com força. Lágrimas e muco estavam escorrendo como se estivesse realmente chorando.

Mais tarde, eu estava sentada na van junto à minha irmã enquanto voltávamos para a escola, mas não consegui falar sobre os meus planos futuros.

 

Era noite, sete e quarenta e cinco. Eu estava agachada em uma das prateleiras da loja. Estava sozinha hoje. Esperei por um tempo no estacionamento, mas Tohno-kun não apareceu. O dia parecia ter sido desperdiçado. No final, comprei outro Dairy Yogurt. Fiz o meu caminho de volta para o estacionamento, bebi o iogurte de uma vez só, coloquei meu capacete e saí com a minha scooter.

A scooter estava correndo ao longo das planícies quando olhei para o horizonte mal iluminado no Oeste. Podia ver a cidade inteira de relance na minha esquerda e a costa também podia ser vista acima de toda a vegetação. À minha direita haviam campos estreitos com algumas colinas. Nessa ilha, este provavelmente era o lugar com a melhor vista e também era o caminho que Tohno-kun usava para retornar para casa. Se ele estivesse dirigindo lentamente talvez eu conseguisse alcança-lo. Ou talvez ele tenha ido para casa há muito tempo atrás? O motor repentinamente fez um barulho e parou por um breve momento, mas logo voltou ao normal. Esta Cub ia se aposentar logo. Quando eu estava para perguntar à Cub se estava tudo bem, uma scooter estacionada ao lado do caminho chamou minha atenção. É a scooter dele! Me senti tão confiante pela primeira vez e estacionei a minha próxima a ele.

 

Inconscientemente comecei a subir a encosta íngreme. A grama de verão parecia suave enquanto seguia meu caminho. Ah não. O que estou fazendo? De repente estava calma novamente. Tinha certeza que a scooter que vi pertencia ao Tohno-kun, mas por que eu estava indo até ele em um momento como este? Era óbvio que não deveria vê-lo neste tipo de situação. Pelo meu próprio bem. Mesmo assim, continuei a subir o declive gramado e quando o campo de visão se abriu, lá estava ele. Estava sentado lá no alto com as costas contra o céu noturno estrelado, digitando em seu celular como eu esperava.

O vento bateu em mim como se tivesse movido meu coração, passando pelo meu cabelo e uniforme, enchendo o ambiente com o som da grama balançando. Como se em resposta pudesse começar a ouvir o bater do meu coração que continuou a aumentar pois eu não queria ouvi-lo.

— Ei, Tohno-kun!

— Ei, Sumida. Como sabia que eu estava aqui? — Tohno-kun respondeu em uma voz alta e um pouco surpreso.

— Heheheh... Vi sua scooter então acabei te procurando por aqui! Se importa? — Disse caminhando rapidamente para ele. Eu continuava dizendo a mim mesma que não tinha motivo para ficar nervosa.

— Oh, entendo. Estou muito feliz já que não te vi no estacionamento hoje.

— Eu também! — disse o mais alegremente que pude e tirando minha mochila esportiva, me sentei ao lado dele. Feliz? Você está realmente feliz em me ver, Tohno-kun? Eu podia sentir meu coração pulsando muito forte. Sempre era assim quando eu estava perto dele. As palavras, “Este não é o lugar” fariam meu coração pulsar. O horizonte no oeste tinha sido envolto na escuridão antes que eu percebesse.

 

O vento se fazia mais forte de vez em quando, balançando as luzes da cidade espalhadas abaixo de nós. A escola parecia muito pequena e ainda tinha luzes acesas. Sob as luzes amarelas na rodovia, um único carro estava dirigindo longitudinalmente e o moinho de vento gigante na zona esportiva estava girando firmemente. Havia muitas nuvens flutuando no céu e quando elas se separaram, você às vezes podia ver a Via Láctea ou o Triângulo de Verão - Vega, Altair e Deneb. O vento uivava pelas nossas orelhas, misturado com o som dos insetos entre as árvores e a grama. O vento forte me ajudou a me acalmar novamente. Podia sentir o aroma forte da vegetação que enchia o ar.

Tohno-kun e eu sentamos lá lado a lado olhando para a paisagem. Meu batimento se tornou silencioso agora, mas eu estava encantada por estar tão perto que perceber a altura de seus ombros.

— Ei, Tohno-kun. Você vai fazer vestibular?

— Sim, vou fazer um para a Universidade de Tóquio.

— Tóquio, hein... pensei que fosse isso mesmo.

— Por quê?

— Apenas pensei que é o tipo de lugar que você gostaria de ir — respondi surpresa por ainda estar calma. Pensei que desmaiaria se ouisse a resposta diretamente dele. Depois de um breve momento de silêncio, ele disse com sua voz amável.

— …Entendo. E você, Sumida?

— Oh eu? Bem, não sei realmente. Simplesmente não sei sobre o futuro — respondi francamente e pensei que ele ficaria surpreso.

— Todo mundo se sente da mesma maneira, provavelmente.

— De jeito nenhum! Você também se sente assim, Tohno-kun!?

— Claro.

— Você parecia o tipo de cara que não teria preocupações!

— Não — ele sorriu calmamente antes de continuar. — Estou preocupado há muito tempo. Só fiz o que pude. Realmente não tenho muita escolha.

Eu podia ouvir meu coração pulsando novamente. Estava tão feliz por estar sentada ao lado dele e eu era a única ouvindo seus pensamentos em voz alta.

— …Entendo. Então é assim que você se sente.

Por um momento, olhei em seus olhos. Ele estava olhando para as luzes distantes. Parecia uma criança pequena e indefesa. Mesmo agora, podia sentir fortemente que estava apaixonada por ele.

Sim. Estava claro que o amava e que era a coisa mais importante para mim. Foi por isso que suas palavras me deram força. Senti que tinha que agradecer a alguém em algum lugar por sua existência.

Talvez seus pais, talvez Deus. Tirei o questionário de aconselhamento de carreiras da minha mochila e comecei a dobrá-lo. O vento havia parado antes que eu pudesse perceber e o som da relva e dos insetos também se calara.

— ...Você está fazendo um avião de papel?

— Sim!

Terminei de dobrar o avião e o joguei na direção da cidade. Quase me surpreendeu o quão longe ele foi, o vento de repente o levou muito mais alto no céu até que desapareceu na escuridão e não pôde mais ser visto. Através das lacunas entre as nuvens, a Via Láctea ficou claramente visível.

 

✻ ✻ ✻

 

O que você estava fazendo, tão tarde! Se apresse e tome um banho para não pegar um resfriado, minha irmã disse para mim antes que eu entrasse no banho com um pulo. Havia espaço suficiente para mover meus braços ao redor. Meus dois braços eram musculosos. Acho que eles eram um pouco largos em comparação com o braço de uma menina normal. Meio que queria que eles fossem macios como marshmallows, mas eu estava bem com a minha pele. Me senti aliviada com o meu corpo. Senti como se ainda pudesse ouvir as palavras que Tohno-kun me disse em sua voz calma enquanto conversávamos nas planícies e quando nos separamos. Quando penso em suas palavras, uma sensação reconfortante se espalha por todo o meu corpo e você poderia adivinhar como me sentia pelo sorriso no meu rosto. De alguma forma acho que estava um pouco animada demais. Sussurrei “Tohno-kun” sem querer. Seu nome ecoou suavemente no banheiro antes de desaparecer no vapor. Que dia excitante, pensei alegre.

 

Depois dessa conversa nas planícies, encontramos um enorme reboque passando lentamente no nosso caminho para casa. Um pneu sozinho era tão alto quanto eu e o trator estava puxando um longo container branco tão grande quanto a piscina da escola com as palavras “NASDA, agência de desenvolvimento espacial” orgulhosamente impressas. Havia dois desses containers e entre eles havia vários carros e pessoas carregando luzes vermelhas liderando o caminho. Um foguete estava sendo transportado. Ouvi sobre como eles eram transportados antes, mas era a primeira vez que via isso acontecer com meus próprios olhos. Tinha certeza que o foguete foi transportado aqui para a ilha de navio para as docas e, em seguida, lentamente e com cuidado, eles vão movê-lo para o sul da noite para o dia.

— Ouvi que eles têm que dirigir a cinco quilômetros por hora — disse, algo que tinha ouvido uma vez e Tohno-kun respondeu “Sim” como se estivesse perplexo com a visão e por um tempo, ficamos lá assistindo o transporte. Foi uma visão muito rara e nunca pensei que seria capaz de vê-la junto com Tohno-kun.

Estava chovendo por um tempo, o que era comum durante esta estação, a chuva caiu forte como se alguém tivesse derrubado um balde de água sobre nós. Rapidamente fomos para casa em nossas scooters. Podia sentir Tohno-kun mais perto de mim do que antes, quando o farol de minha scooter brilhou sobre ele encharcado na chuva. Minha casa era mais próxima do que a dele, então nós sempre nos separamos nos portões.

— Sumida — ele disse enquanto levantava a viseira em seu capacete. A chuva estava ficando mais pesada e uma parte da luz dourada da minha casa iluminava seu corpo encharcado. Podia sentir meu coração batendo quando vi sua camisa molhada contra sua pele delineando sua figura bem tonificada. Queria saber se ele podia ver meu corpo da mesma maneira.

— Sinto muito que você teve que ficar encharcada assim hoje.

— Não se preocupe com isso, Tohno-kun! Não é sua culpa. No fim das contas fui eu que decidi parar.

— Mas estou feliz por podermos conversar assim. Bem, vejo você amanhã e tome cuidado para não pegar um resfriado. Boa noite.

— Vejo você amanhã e boa noite, Tohno-kun.

Boa noite Tohno-kun, sussurrei enquanto estava no banho.

 

Após o banho, tive ensopado, porgy frito e kanpachi sashimi no jantar que estava tão delicioso que pedi três tigelas de arroz para a minha mãe.

— Você realmente come muito não é? — ela disse enquanto entregava a tigela recheada de arroz para mim.

— Não acho que há outra garota do ensino médio que possa comer três tigelas de arroz assim — minha irmã disse surpresa.

— Isso é porque estou com fome... Oh, e nee-chan — disse enquanto colocava porgy em minha boca e mastigava. É gostoso.

— Itou-san disse algo a você hoje, não?

— Oh sim, ele disse.

— Desculpe.

— Não é nada para se desculpar. Apenas leve seu tempo e decida o que quer fazer.

— Kanae, você fez algo para perturbar o professor? — Mamãe disse enquanto enchia a xícara de chá da minha irmã.

— Não é nada sério. Seu professor é apenas um pouco mais sensível, isso é tudo — respondeu minha irmã séria e com calma. Mais uma vez, estava tão feliz por ter uma irmã tão legal.

 

Naquela noite, tive um sonho.

Sonhei com a época em que ganhei o Cub e não me refiro à minha scooter da Honda, me refiro ao meu cachorro Cub. O encontrei à beira-mar quando estava na sexta série. Tinha inveja da Cub minha irmã (sua scooter) e foi por isso que decidi chamá-lo assim.

Mas no sonho, eu não era uma criança. Tinha dezessete anos, exatamente como agora. Tinha o Cub ainda jovem em meus braços e estava caminhando ao longo da costa arenosa que tinha uma luz misteriosa. Quando olhei para o céu, não vi o sol. Vi o espaço cheio de estrelas. Elas estavam piscando em vermelho, verde, amarelo e todas as outras cores, todas mantidas juntos pelo fluxo gigante de uma galáxia atravessando o espaço. Me perguntava se já estive aqui antes. De repente notei alguém andando ao longe. Senti como se conhecesse aquela figura de algum lugar.

Antes que percebesse, tinha me tornado uma criança e estava pensando que um dia, essa pessoa seria alguém muito importante para mim.

No momento seguinte, de repente, me tornei uma adulta com a mesma idade da minha irmã e achei que ele tinha sido alguém muito importante para mim.

 

Quando acordei, esqueci o que sonhei.

 


— Onee, quando você conseguiu sua habilitação?

— Durante meu segundo ano na universidade, então acho que quando tinha dezenove anos. Sabe, quando eu estava em Shizuoka.

Sei que ela é minha irmã, mas de alguma forma, acho que ela parece muito sexy quando está dirigindo - seus dedos esbeltos segurando no volante, seus longos cabelos pretos cintilando no sol da manhã, a maneira que ela olha para o retrovisor e a forma como ela muda de marcha. Podia sentir o cheiro do seu perfume enquanto o vento soprava através da janela aberta. Nós duas usamos o mesmo xampu mas parece fazer parece que o cabelo dela é muito mais bonito que o meu. Puxei minha saia um pouco.

— Ei, nee-san — disse enquanto olhava para ela do lado do banco do motorista. Ela tem cílios tão longos!

— Faz quanto tempo desde a última vez que trouxe um homem para casa com você? Sabe, aquele Sr. Kibayashi, era esse o nome?

— Oh, você quer dizer Kobayashi-kun.

— O que aconteceu com ele? Vocês dois não estavam saindo?

— Por que você está perguntando isso de repente? — Ela respondeu um pouco surpresa. — Nós terminamos faz muito tempo.

— Você estava planejando se casar com o Kobayashi-san?

— Pensei em me casar com ele uma vez. Mas depois mudei de ideia — ela disse sorrindo com um olhar nostálgico.

— É mesmo…

Por que ela mudou de ideia? Eu queria perguntar a ela, mas falar outra coisa. — Você ficou triste?

— Fiquei. Nós estávamos juntos há muitos anos, afinal. Até vivemos juntos.

O sol da manhã brilhou diretamente no carro quando giramos à esquerda em um caminho estreito que leva ao mar. Não havia uma única nuvem no céu azul. Ela estreitou os olhos e puxou a viseira. Mesmo aquela pequena ação parecia sexy para mim.

— Mas você sabe, agora que olho para trás, não acho que nenhum de nós queria mesmo se casar. Com um relacionamento como esse, não íamos chegar a lugar algum. O que quero dizer é... nós não tínhamos um objetivo comum.

— Entendo — balancei a cabeça mesmo não entendendo o que ela falou.

— Todo mundo pode ter seu próprio objetivo, mas um casal deve ter algo em comum. Acho que estava desesperadamente tentando fazer com que nós dois tivéssemos o mesmo objetivo na época.

Ah...

Um objetivo... as palavras continuaram a se repetir dentro da minha mente. Olhei para o final da estrada e vi várias Wild Easter Lilies e Tagetes em plena floração. Elas eram uma mistura brilhante de branco e amarelo, assim como meu bodysuit. Pareciam tão bonitas. Até as flores podem parecer grandiosas.

— Então, por que você me perguntou isso de repente? — Minha irmã se virou para me perguntar.

— Hmmm... por nada — respondi.

Então perguntei o que mais queria saber. — Ei, onee. Você teve um namorado no colegial?

— Não, assim como você — ela sorriu como se achasse a pergunta engraçada. — Você é como eu quando estava no colégio, Kanae.

 

Fazia duas semanas desde aquele dia chuvoso quando voltei para casa com Tohno-kun e o tufão já passou pela a ilha. O vento que soprava as canas-de-açúcar agora estava mais frio, o céu estava um pouco mais alto, as nuvens pareciam mais suaves e os estudantes que andavam em suas scooters agora estiam casacos leves. Durante essas duas semanas, não fui capaz de voltar para casa com Tohno-kun como de costume, não fui capaz de deslizar nas ondas. Mesmo assim, sinto como estivesse curtindo surfar mais do que antes.

— Ei, onee — gritei para ela enquanto estava encerando minha prancha e ela estava lendo um livro no banco do motorista. A van estava estacionada pela área de estacionamento e eu estava mudando para o meu bodysuit. Eram seis e meia da manhã e ainda havia mais uma hora até a escola, para que eu pudesse ir até o mar.

— Hmmm?

— Sobre o que eu quero para o meu futuro...

— Sim?

A parte de trás da van estava aberta e eu estava sentada lá de costas para minha irmã. Nós podíamos ver uma forma cinzenta longa que se assemelhava a um navio de guerra situado distante no mar. Era um dos navios da NASDA.

— Ainda não sei o que quero fazer agora. Mas acho que estou ok — disse quando terminei de encerar e colocar o bloco de sabão ao lado da minha cintura e continuei.

— Eu vou fazer o que eu puder, uma coisa de cada vez. Estou indo!

Levantei minha prancha de surf e corri para o mar, me sentindo completamente revigorada quando me lembrei de como Tohno-kun me disse que ele estava fazendo o que podia. Essa era a única maneira que eu podia seguir e eu realmente acreditava que era melhor assim.

O céu e o mar eram da mesma cor azul e senti como se estivesse flutuando no espaço vazio. Enquanto remava e repetidamente mergulhava no mar, podia sentir a barreira entre o meu corpo e mente se encolher no mar. Eu remei, sem saber o quão longe eu estava da próxima onda e quando decidi que era impossível para mim desafiar, empurrava meu corpo e a prancha através da onda. Quando houve uma onda que parecia que eu poderia desafiar me virei e esperei por ela. Não demorou muito para que eu sentisse a onda me elevar. Estava animada sabendo que era o momento de me levantar. Quando a tábua começou a deslizar pela superfície da onda me levantei, mas ainda com as pernas curvadas, me equilibrando. Comecei a tentar completamente em pé. Olhei para cima e por um momento vi o mundo secreto deslumbrante dentro do mar.

Já sabia que no momento seguinte seria engolida pela onda.

Mas sabia que este grande mundo não estava lá para me negar. Apenas de longe parecia que eu estava sendo engolida pelo mar - mesmo do ponto de vista da minha irmã. Continuei tentando e batendo contra o mar. De novo e de novo. Em pouco tempo, esqueci que estava tentando.

 

E naquela manhã finalmente consegui deslizar nas ondas. Era tão repentino que era como um sonho - tão perfeito que era quase irreal.

 

Se você pudesse chamar dezessete anos de uma vida então, eu poderia dizer que este era realmente o momento pelo qual vivi.

 

✻ ✻ ✻

 

Eu conheço essa melodia. Era uma das Serenatas de Mozart. Tínhamos tocado durante um concerto em nosso primeiro ano na escola secundária e eu estava tocando a gaita. Gostava de instrumentos onde você tinha que usar sua própria respiração como se estivesse fazendo os sons sozinho. Naquela época, Tohno-kun ainda não fazia parte do meu mundo. Ainda não estava surfando, e agora que penso nisso, era um mundo tão simples em que vivia.

A melodia era chamada "A Little Night Music", Eine kleine Nachtmusik em alemão. Gostaria de saber o que realmente significa. Sempre que ia para casa com Tohno-kun as noites pareciam curtas. Parece que eles tocaram essa melodia apenas para nós dois hoje. Estou me sentindo excitada. Tohno-kun. Nós tivemos que ir para casa juntos hoje. Talvez eu não devesse ir ao mar hoje e apenas esperaria por ele. De qualquer maneira só seria depois do sexto período, com os exames acontecendo, as atividades do clube não duravam muito tempo.

— ...nae...

 

Hmmm?

— Kanae. Está ouvindo?

Saki-chan estava tentando falar comigo. Eram doze e quinze, hora do almoço. Alguma música clássica estava sendo tocada e Saki-chan, Yukko e eu estávamos juntas sentadas comendo nossos obentos como de costume.

— Oh, desculpe. Disse alguma coisa?

— Nós realmente não nos importamos que você fique voando desse jeito, mas, você só colocar um pouco do almoço na boca congelou — disse Saki-chan.

— Você parecia terrivelmente feliz com alguma coisa — disse Yukko.

Rapidamente comecei a mastigar o ovo que tinha na boca. Munch, munch. Tão gostoso! Engole.

— Sinto muito! Então sobre o que vocês estavam falando?

— Estávamos dizendo como outro cara se declarou para Sasaki-san.

— Sério? Bem, ela é linda — disse colocando um rolo de bacon na minha boca. Minha mãe faz os melhores obentos.

— Mas não se preocupe com isso. Você parece muito mais feliz do que o normal hoje, Kanae — disse Saki-chan.

— Sim. É meio assustador na verdade. Se Tohno-kun a visse, ele se afastaria de você — disse Yukko.

Suas brincadeiras não me atingiram hoje. Eu apenas disse “Sério?” e deixei para lá.

— Ela realmente está estranha hoje, essa menina.

— É... Algo aconteceu entre você e Tohno-kun?

Sorri e respondi com um grande “Mmmhmmm”. Estava realmente feliz com o que ia acontecer.

— De jeito nenhum! — as duas gritaram surpresas. Elas não estavam tão surpresas assim.

Não queria que nosso relacionamento ficasse no estágio de amor não correspondido. O dia em que eu consegui deslizar nas ondas era o mesmo dia em que eu poderia finalmente confessar meu amor por ele.

 

Sim. Se não pudesse dizer isso hoje quando finalmente consegui surfar, então tenho certeza que nunca seria capaz.

 

Eram quatro e quarenta da tarde. Eu estava me olhando no espelho no banheiro ao longo do corredor. Quando o sexto período terminou às três e meia, não fui ao mar e fiquei na biblioteca. Claro que não consegui estudar. Em vez disso, só segurei minha cabeça entre minhas mãos e olhei para o cenário lá fora pela janela. O ar dentro do banheiro me trouxe de volta aos sentidos. Olhei no espelho pensando que meu cabelo tinha crescido. O cabelo na parte de trás estava tocando um pouco meus ombros. Era muito mais longo antigamente, mas quando comecei a surfar decidi cortar. Talvez fosse porque descobri que minha irmã ia ensinar na escola em que eu estava. Ficava tão envergonhada ao ser comparada a minha linda irmã de cabelos compridos. Mas agora, de alguma forma, senti vontade de deixá-lo crescer.

No espelho vi meu rosto bronzeado, as bochechas ligeiramente vermelhas. Me pergunto como Tohno-kun me viu. Uma sensação familiar de desapontamento me invadiu, mas eu olhei por cima das minhas feições uma por uma - o tamanho dos meus olhos, a forma das minhas sobrancelhas, o quão alto era a ponta do meu nariz, o brilho dos meus lábios. Então minha altura, a qualidade do meu cabelo, meu tamanho de busto. Até olhei para meus dentes e unhas e esperava que houvesse apenas uma parte de mim que Tohno-kun gostasse, pelo menos uma.

Eram cinco e meia da tarde. Eu estava de pé no local habitual atrás do prédio da escola, perto do estacionamento. A maior parte da luz do dia tinha mudado para o oeste e uma sombra longa foi projetada no chão, um limite claro entre sombra e luz. Eu estava perto dessa fronteira, mas dentro das sombras. Eu olhei para o céu que ainda estava brilhante e azul, mas sua cor tinha desbotado em comparação com o dia. Todas as cigarras nas árvores ficaram em silêncio e agora só os insetos na grama aos meus pés podiam ser ouvidos. Meu coração estava batendo alto, quase tão alto quanto os insetos. Eu sabia que o sangue estava bombeando rapidamente pelo meu corpo. Respirei profundamente para me acalmar um pouco, mas estava tão nervosa que esquecia de respirar de vez em quando. Quando finalmente percebi isso, soltei uma respiração profunda, mas sua naturalidade fez meu coração bater ainda mais. Tinha que dizer para ele hoje. Precisava dizer. Não sabia quantas vezes eu tinha espiado o estacionamento por trás da parede.

Quando Tohno-kun finalmente chamou “Kanae” eu fiquei mais em pânico do que feliz e senti um pouco de desconforto. Desesperadamente, segurei aquele pequeno grito.

— Você vai para casa agora? — Ele disse com sua voz calma habitual quando se aproximou de mim no estacionamento, embora tivesse notado que eu espiava ele da parede. Respondi “sim” enquanto seguia para o estacionamento sentindo que fui pega fazendo algo ruim. “Entendo” ele disse em sua voz gentil. — Então vamos para casa juntos.

Eram seis horas da tarde. O pôr-do-sol estava brilhando diretamente através das janelas no ocidente enquanto estávamos dentro da loja de conveniência. Estava mais escuro do que o comum e isso me fez sentir desconfortável porque parecia uma loja completamente diferente. Senti o calor dos raios de sol na minha bochecha esquerda e pensei que isto não era de forma alguma "A Little Night Music”. Ainda estava claro lá fora. Eu já tinha decidido o que ia comprar hoje. Ia pegar o mesmo Dairy Coffee do Tohno-kun. Peguei a caixa de papel sem hesitação e Tohno-kun virou para mim surpreso e disse, “Já escolheu algo Kanae?” respondi “sim” sem olhar para ele. Tinha que dizer que gosto dele antes de chegarmos à minha casa. Meu coração parecia que bateria forte eternamente. Eu esperava que a música pop tocando na loja ajudasse a esconder o som do meu batimento cardíaco.

 

Fora da loja, o mundo também estava dividido em luz e sombra pelo sol poente. Estávamos na luz no momento em que saímos pelas portas automáticas. O pequeno estacionamento depois da esquina onde nossas motos estavam estacionadas estava nas sombras. Obserava as costas de Tohno-kun enquanto ele caminhava para as sombras, sua mão segurando a caixa de papel de café. Suas costas largas cobertas em sua camisa branca. Apenas olhar para isso fez meu coração se apertar. Eu estava realmente muito nervosa. Estava a quarenta centímetros de distância dele, mas me aproximei de repente até que ficamos a apenas cinco centímetros de distância. Uma súbita onda de solidão me invadiu. Espere, pensei. Imediatamente estendi a mão para pegar o fundo de sua camisa. Ah não. Agora era o momento em que eu lhe diria que gostava dele.

Ele parou. Tomando o seu tempo, lentamente se virou para mim... “Este não é o lugar” pensei ter ouvido e dei para trás.

— …Qual é o problema?

Em algum lugar dentro de mim, pude me sentir encolhendo, tremendo. Sua voz era calma, gentil mas fria. Fiquei ali, olhando para o rosto dele. Ele não estava sorrindo. Seus olhos pareciam silenciosos e estavam cheios de uma forte vontade.

 

No final, não foi porque não pude dizer a ele.

Foi porque ele me rejeitou com aquele olhar dizendo para não falar nada.

 

✻ ✻ ✻

 

O som de cigarras ecoou pela ilha. Das florestas distantes, as pequenas vozes agudas dos pássaros podiam ser ouvidas prontas para dar boas-vindas à noite. O sol estava para se pôr e iluminou nosso caminho com vários tons de púrpura.

Tohno-kun e eu estávamos andando por um caminho cercado por campos de cana-de-açúcar e batata-doce. Não falamos uma palavra desde então. Apenas os passos de nossos sapatos duros podiam ser ouvidos. Eu estava a meio passo dele e estava desesperada para não me aproximar muito. Seus passos eram longos. Pensei que ele estava com raiva, então olhei para ele, mas, ele estava olhando para o céu com sua expressão habitual. Escondi meu rosto, olhando para as sombras que meus sapatos faziam enquanto caminhava no asfalto. De repente pensei por que nós deixamos nossas bicicletas na loja de conveniência. Eu não abandonei a minha moto, mas senti como se estivesse lamentando ter feito algo terrível.

 

Depois de desistir de dizer a Tohno-kun que gostava dele, minha Cub se recusou a ligar como se entendesse como eu me sentia. Não importa como dava o arranque, ela não ligava de jeito nenhum. Tohno-kun realmente é um cara legal. Quando ele viu o quão perturbada eu parecia, ele deu uma olhada nela. Era como se aquela expressão fria que vi em seu rosto fosse uma completa mentira. Isso me deixou tão confuso.

— A vela de ignição provavelmente se desgastou — ele disse depois de testar a próprio Cub. — Alguém te deu ela?

— Sim, pertencia à minha irmã.

— Ela já falhou quando você tentou acelerar?

— Acho que sim... — respondi. Teve algumas vezes em que era difícil ligar a Cub agora que pensei nisso.

— Apenas deixe ela aqui por hoje e peça para sua família pegar para você amanhã. Vamos apenas caminhar hoje.

— Ah não! Posso voltar sozinha! Você pode ir em frente, Tohno-kun, — disse rapidamente. Não queria incomodá-lo, mas ele era gentil.

— Minha casa não é tão longe daqui. Além disso, quero dar uma pequena caminhada de qualquer maneira.

Eu não sei por que, mas queria chorar. Olhei para as duas caixas de papel de Dairy Coffee no banco. Pensei para mim mesma que talvez a grande sensação de rejeição que senti há pouco era apenas minha imaginação.

 

Mas esse sentimento não poderia ter sido minha imaginação. Me pergunto por que andamos juntos em silêncio. Tohno-kun ainda soava como quando se ofereceu para andar comigo. Por que ele não estava dizendo nada? Por que ele era sempre bom comigo? Por que você apareceu na minha vida? Por que eu gosto tanto de você?

Porque, porque…?

Meus pés começaram a se sentir mais pesados ​​enquanto andava ao longo do caminho brilhando ao sol poente... Por favor. Por favor, Tohno-kun. Eu simplesmente não aguentava mais. Simplesmente não podia. Lágrimas caíam dos meus olhos. Não importa quantas vezes eu as enxugava, elas continuaram vindo. Tinha que parar de chorar antes que ele percebesse. Tentei desesperadamente suprimir meus soluços, mas tinha certeza que ele ia notar. Então ele me falou com sua voz gentil. Entende?

— ...Sumida! Qual é o problema!?

Eu sinto muito. Eu sei que não é culpa sua. Vou tentar dizer algo.

— Desculpe... Não é nada. Realmente sinto muito…

Eu ainda estava escondendo meu rosto, ainda chorando. Não conseguia mais parar. Eu podia ouvir Tohno-kun dizendo meu nome com sua voz amável. Estava sempre tão cheio de emoção. Agora soava triste e isso me deixava triste também. O som das cigarras que encheram o ar soou mais alto do que antes. Meu coração estava chorando. Tohno-kun... Tohno-kun. Eu te imploro…

 

Por favor, não seja mais tão legal comigo...

 

Naquele instante, as cigarras ficaram em silêncio como se fosse uma onda se retirando no mar. Podia sentir o silêncio solitário da ilha ao meu redor.

 

Então, no instante seguinte, um barulhento ruído sacudiu o ar. Surpreendida, olhei para cima e sobre as colinas distantes vi uma bola de fogo subindo aos céus.

Um foguete foi lançado. A luz de seus propulsores era tão brilhante que cegou nossa vista quando começou a se levantar. O ar inteiro em torno da ilha tremeu enquanto a chama do foguete disparava para cima, iluminando as nuvens, mais brilhante do que o sol poente. Logo atrás havia uma torre de fumaça branca que parecia se erguer para sempre. O pôr-do-sol foi bloqueado pela fumaça, dividindo o mundo em luz e sombra. A luz e a torre se estendiam por toda parte. O som retumbante ecoou enquanto se esticava até o céu, balançando as partículas de ar como se o céu estivesse gritando enquanto era rasgado.

 

Acho que passamos cerca de meio minuto de pé assistindo até que o foguete desapareceu nas nuvens.

Nem Tohno-kun nem eu dissemos uma palavra enquanto estávamos ali, um ao lado do outro, olhando para o céu até que o vento limpou a torre de fumaça. Logo, o som dos pássaros, dos insetos e do vento lentamente pôde ser ouvido de novo e antes que o soubéssemos, o pôr-do-sol já havia se afundado no horizonte.

O azul no céu estava ficando mais escuro e, pouco a pouco, as estrelas podiam ser vistas piscando, o ar parecia mais frio na nossa pele. Foi então que vim a perceber algo. Mesmo que ambos estivéssemos olhando para o céu, estávamos olhando para coisas diferentes. Percebi que Tohno-kun nunca olhava para mim.

Tohno-kun era agradável. Ele era muito legal e sempre andava ao meu lado, mas ele estava sempre olhando para algo distante, muito distante. E eu não poderia conceder o que ele desejou. Como se eu tivesse poderes, tudo ficou claro para mim. Compreendi claramente que nunca poderíamos estar juntos no futuro.

 

✻ ✻ ✻

 

Enquanto caminhávamos juntos para casa, uma lua cheia redonda pendia no céu noturno brilhando em uma cor pálida, as nuvens foram carregadas pelo vento. Nossas sombras eram lançadas no asfalto. Olhei para cima e vi um fio através da lua, cortando-a ao meio, que parecia como o dia foi para mim. O eu antes de conseguir surfar as ondas e o eu depois de conseguir surfar nas ondas. O eu antes de saber o que Tohno-kun estava pensando e o eu depois. O mundo de ontem e de amanhã definitivamente não seriam o mesmo para mim. A partir de amanhã, viveria em um mundo diferente.

 

Enquanto eu estava deitada enrolada no futon do meu quarto com as luzes apagadas, olhei para a lua cuja luz entrava em meu quarto como água. Minhas lágrimas começaram a voltar e lentamente começaram a cair. Gota a gota, minhas lágrimas fluíam e comecei a ouvir minha própria voz chorando. Minhas lágrimas cresciam em volume e meu nariz estava pingando, mas já não tentava segurar. Me deixei chorar.

Sei que sempre amarei Tohno-kun, não importa quanto tempo passe. Eu simplesmente não podia deixar de me apaixonar por ele. Tohno-kun, Tohno-kun... Eu te amo.

Com apenas ele nos meus pensamentos, chorei até dormir.


Notas:

1 Roupa de mergulho

2 Modelo de scooter da Honda.

3 Bodyboarding é um esporte praticado na superfície das ondas em que o surfista usa sua prancha para deslizar pela crista, face ou curva de uma onda em direção à areia.

4 National Space Development Agency, agência espacial japonesa.

5 Durante o verão japonês, o sol se põe em torno das 19:00

6 Uma pequena música noturna

7 Tipo de colchão usado na tradicional cama japonesa.

 



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