Um Alquimista Preguiçoso Brasileira

Volume 1

Capítulo 67: Sempre lave as hortaliças

Não foi necessário o gasto de um grande tempo para Xiao Shui cumprir sua tarefa. Embora tenha se tornado mais branda, a sensação de entrar na antiga sala de treinamento de sua mãe permanecia. E quando entrou, surpreendeu-se ao se deparar com uma Camila ofegante, abanando as mãos em frente a boca, conforme os olhos verdes, cujas escleras haviam adquirido um profundo tom de vermelho, lacrimejavam.

A jovem empregada dava bufadas irregulares, apresentando dificuldades em manter a respiração. E do outro lado, Xiao Ning rolava pelo chão, gargalhando alto e apontando um dedo.

― O que aconteceu aqui? ― Xiao Shui largou o balde sobre o piso de qualquer jeito e correu em socorro da empregada. Usando uma mão, apoiou Camila pelas costas e com a outra, imitou o movimento de ventilação, tentando gerar algum alívio.

― O... o... o Mestre Xiao Ning... me falou... para provar uma das... ― Camila estava tendo dificuldades para falar e no final da frase, tudo o que conseguiu fazer foi apontar o dedo, indicando as frutinhas.

E com isso, Xiao Shui conseguiu entender bem o que tinha acontecido.

Parecendo raivosa, ela se levantou e marchou em direção ao travesso preguiçoso, que gargalhava e gargalhava mais um pouco, quase perdendo o ar como sua vítima.

― Seu maldito vagabundo! ― ralhou. E sem demonstrar o menor sinal de piedade, deu-lhe um beliscão, usando toda a força.

― Ai! Ai! Ai! ― Xiao Ning pulou de lado, quase se jogando em cima da pilha de Bútus. ― O que você está fazendo, sua pirralha louca?

― Eu é que te pergunto? Não tem vergonha de fazer isso com ela não? ― Xiao Shui parecia irada. Não era a primeira vez dele aprontando tal brincadeira desavergonhada e se deixasse passar, isso sairia de controle. Ela tentou avançar para dar outro beliscão, mas Xiao Ning estava atento e conseguiu se esquivar.

― Eu só estava me divertindo. ― resmungou ele baixinho, perdendo o bom humor.

― Isso não é divertido. ― declarou Xiao Shui, antes de ir ajudar Camila.  Ela se abaixou ao lado da jovem empregada e ficou massageando suas costas até passar a horrível sensação de frescor extremo. ― Você deveria gritar com ele e lhe dar uns cascudos. ― sugeriu, por fim.

― Eu... estou bem. ― Por medo de acabar sendo expulsa, Camila preferiu guardar suas reclamações para si, embora achasse que tenha sido uma pegadinha de muito mau gosto. Durante um breve segundo, pensou que iria morrer sufocada.

Xiao Shui, por outro lado, lançou mais um olhar de repreensão para Ning, antes de voltar até a entrada da câmara e pegar o balde d’água.

E Xiao Ning, que não queria correr o risco de levar outro daqueles beliscões ou ser repreendido, logo tratou de mudar o rumo dos acontecimentos e agindo como se não tivesse acontecido nada demais, pediu:

― Pequena Shui, enquanto Camila e eu estamos separando as Bútus, você cuida da parte da lavagem e coloca as frutas limpas no balde que está sem água, tudo bem? ― instruiu.

― Eu só tenho que mergulhar elas na água? ― questionou Xiao Shui, ainda com a voz áspera e o olhar afiado.

― Sim. ― confirmou ele, assentindo com a cabeça. ― O ideal seria fazer isso em água corrente, mas daria muito trabalho. Então, quando for lavá-la, agite-as na água e tome cuidado para não danificá-las. Depois, coloque todas no outro balde.

Compreendendo com perfeição o que deveria ser feito ― afinal não era lá tão difícil ―, Xiao Shui organizou os baldes e começou o trabalho, iniciando pelas frutinhas acumuladas pela empregada, apesar da pilha reunida por Ning ser maior.

― Qual a diferença de lavar na água corrente e no balde? ― perguntou Camila, cuja voz não denunciava nenhum tipo de ressentimento, querendo entender um pouco mais o motivo por trás de tal decisão.

E Xiao Ning, que adorava falar de Alquimia e seus por menores, foi logo respondendo com toda a empolgação de um mentor:

― O tipo de Composição Alquímica que eu farei a seguir é uma Cocção básica, não muito diferente de um cozimento normal e o ingrediente que irei usar estava num lugar exposto, ficando ao alcance de excrementos e fluidos de insetos, pássaros e outras coisas voadoras. Obviamente, a despeito da baixa efetividade, a água é para limpar. Porém, por estar represada no balde, toda a sujeira irá se acumular e o resultado final não fará muita diferença.

― Mas se você irá cozinhar isso, então, para quê limpar? ― continuou inquerindo. Mesmo as respostas sendo das mais evidentes, do tipo que poderia prever sem a necessidade de iniciar um interrogatório, desejava ter uma confirmação dos pequenos detalhes.

Mas desta vez, Xiao Ning usou um tom brincalhão para responder, deixando escapar um sorriso divertido:

― Então você gosta de comer cocô junto da comida? Hehe! ― soltou um sorrisinho travesso. Mas logo acrescentou, ao reparar o olhar de repreensão de Xiao Shui. ― Pode parecer um simples cozimento, porém, ainda assim, é uma Composição Alquímica. Por se tratar de Cocção, mesmo impurezas externas afetam a qualidade, o que exige um melhor trato no momento de preparar os ingredientes. Se fosse um Refinamento, tais cuidados poderiam ser dispensados, contudo, como não é, quanto mais limpo estiver, melhor.

Camila não se sentiu ofendida pela brincadeira ― sequer deu atenção. Porém, escutou todo o resto com a máxima concentração, como se fosse a primeira vez ouvindo aquilo. Ela era uma das principais responsáveis por preparar a comida na residência do 9ª Ancião, portanto já conhecia muito bem a importância de lavar as hortaliças, do contrário, poderia ser a culpada por causar uma moléstia desagradável não apenas ao seu mestre, mas também a todos os outros que viesse a se alimentar de tal refeição.

No entanto, mesmo sabendo de tudo aquilo, não menosprezou os ensinamentos. Afinal, Alquimia era um campo inteiramente novo.

― É claro que ― Xiao Ning continuou a falar ―, dependendo de todos os ingredientes usados (por se tratar de uma Erva Espiritual), e do tipo de Cocção a ser feita, alguns cuidados podem ser ignorados. Mas é sempre bom ter isso em mente.

Enquanto os dois conversavam, Xiao Shui continuou fazendo o trabalho para o qual fora atribuída. No começo, jogava apenas uma pequena porção de frutinhas por vez no balde e as lavava com toda a delicadeza, esfregando as mãos na casca, para tirar a sujeira. Entretanto, depois de algum tempo, percebendo o progresso lento, começou a jogar uma grande quantidade na água e, por fim, apenas esfregava as Bútus de qualquer maneira, antes de transferi-las para o próximo balde.

Seguindo o segundo método, seu trabalho foi tão rápido que logo alcançou Xiao Ning e Camila, sendo obrigada a esperá-los a cortar algumas Bútus, antes de fazer tudo de novo. Era evidente que sua execução mais ou menos não escaparia dos olhos de Ning, que em duas ocasiões se viu dizendo a ela para ser mais cuidadosa.

O processo de separar todas aquelas Bútus foi lento e repetitivo, de modo que o sol se pôs sem deixar qualquer vestígio de já ter reinado sobre o céu. Conforme a noite se aprofundou, uma visita pouco familiar se aproximou da câmara. Trazia consigo os Frascos de Jade que ficara a cargo dos subordinados da 2ª Anciã adquirir.

Quem pegou os Artefatos Mágicos foi Xiao Shui, que se viu em um de seus momentos de espera, quando foi abordada pelo entregador.

Frascos de Jade poderiam ser feitos em diversos tamanhos e possuir formatos distintos, embora a funcionalidade continuava a ser a mesma: guardar objetos dotados de Energia Espiritual no intuito de preservação da mesma. Aqueles trazido pelo subordinado da 2ª Anciã ― seis ao todo ―, seguindo as instruções de Xiao Ning, possuía uma base arredondada, cujo diâmetro era em torno de quarenta centímetros, com um topo afunilado de vinte centímetros de comprimento, no qual a boca ― contendo aproximados três centímetros de amplitude ― se via coberta por uma peça cristalina lindamente lapidada, que se encaixava com perfeição, de modo a bloquear a passagem de qualquer coisa.

O material era de um verde translúcido, semelhante a um vidro muito bem fabricado por artesãos de mãos hábeis, embora o tilintar único e sonoramente distinto indicasse uma origem cristalina mais pura.

Quando enfim terminaram todo o trabalho com as Bútus, Xiao Shui possuía uma aparência exaurida, nem tanto pelo desgaste físico, mas o trabalho foi muito repetitivo e sem grandes emoções. Ficar passando as frutinhas de um balde para o outro era chato, sem falar no tempo que demorou.

Em contrapartida, Camila ganhou um novo ânimo, pois encarou a coisa toda como uma preparação ― o que era verdade ― para o verdadeiro espetáculo que viria a seguir. Estava tão animada para deslumbrar a Composição Alquímica, que começou a andar sem parar, rodeando o balde cheio de Bútus recém lavadas e espiando o caldeirão parado logo ali, ao lado.

― Pequena Shui, enche esse jarro com água limpa para mim? ― pediu Xiao Ning, passando um jarro de barro cozido para Xiao Shui; um dos itens solicitados por ele.

E ela não recusou o pedido quando foi logo deixando a câmara e indo procurar uma fonte de água. Estava feliz por poder fugir do trabalho enfadonho e fazer alguma coisa mais ativa.

Quando ela saiu, Xiao Ning começou a aquecer o caldeirão. Jogou suas Chamas Carmesins para dentro da boca de Genbu, que tragou o fogo como se fosse um aperitivo saboroso e irresistível. Hipnotizada pela cena, Camila parou ao lado da cabeça espichada do animal, cuja, graças às mãos hábeis de um artesão, exprimia vivacidade e realidade, através das rugas na pele esverdeada de aparência flácida, muito embora, esculpida num material robusto e rígido.

Os olhos da empregada refletiram o brilho carmesim do fogo, que fazia seu cabelo avermelhado parecer pálido, insalubre. Sem se dar conta das próprias ações, aproximou-se ainda mais do pescoço da tartaruga ― conseguia sentir o calor desprendido esquentando o rosto. Queria tocar na pele endurecida do animal e sentir nas pontas dos dedos o quanto aquelas chamas conseguiam aquecer o exterior do material duro que constituía o corpo no qual o caldeirão estava apoiado. Porém, mesmo estando fascinada, sabia que essa seria uma atitude tola, portanto se conteve ― não queria ter a mão queimada e ser obrigada a se retirar tão cedo.

Xiao Ning lançava suas Chamas da Essência sem parar. Mesmo quando os olhos opacos da tartaruga ganharam um tom incandescente, continuou jogando fogo, acendendo ainda mais sua alma. Balançou os braços e aumentou a intensidade do fogo. Para a Composição Alquímica que faria logo a seguir, não bastava o cobre estar apenas aquecido, o metal necessitava atingir um ponto no qual o aquecimento se desprendesse do fundo e contagiasse a camada de ar logo acima.

Ao mesmo tempo, Camila decidiu se desatar do medo e começou a estudar o corpo do réptil. Suas mãos tateavam a base de pedra, sentindo os entalhes muito bem trabalhados diretamente na pele. Era um trabalho primordial, que parecia carregar uma herança distante e profunda; diferente dos itens encontrados no mercado local, cuja constituição ― cada vez mais moderna ― apresentavam aspectos de fragilidade e desleixo, pouco trabalhado na aparência externa e moldado seguindo um determinado padrão.

Olhando mais de perto, era possível notar o que parecia ser arabescos místicos, ou quem sabe palavras distintas, porém desgastadas, cinzelados ao redor do corpo de pedra. Representavam símbolos peculiares de traços contínuos, alguns retilíneos e outros curvilíneos, desconhecidos por ela em sua totalidade. Sua curiosidade era tamanha que sem se importar em estar parecendo uma enxerida, abaixou-se ao lado da tartaruga e estudou a região da barriga. Foi lá que encontrou duas ventas estreitas, de onde lufadas de ar quente escapavam.

Entretanto, o mais intrigante para ela, residia no fato de que, a despeito de estar sendo derramado uma grande quantidade de chamas furiosas e ao mesmo tempo, deslumbrantes, o gigante animal de pedra não parecia estar sendo afetado pela quentura, visto que a superfície permanecia fria e distante, igual a um bloco de pedra resguardado nas sombras.

― O que acha, quer me ajudar nesta Cocção? ― Notando o grande interesse da jovem empregada, Xiao Ning decidiu estender o convite, chamando-a para participar da composição. A Cocção em questão não era nada complicada e poderia ser auxiliada por alguém inexperiente.

Camila, que se encontrava quase agachada de bruços no chão, ao lado de Genbu, no mesmo instante levantou a cabeça, demonstrando uma profunda expressão de surpresa. Já acreditava ser um grande abuso de sua parte desejar permanecer até o fim da Composição Alquímica conduzida por um ilustre Alquimista, em cuja pouca idade e o talento excedente bastavam para espantar esse império no qual residia. Contudo, em seu estado de deslumbre e intriga atual, poder participar de todo o desfecho, não era apenas uma honra, mas um ato de petulância de sua parte.

― Tem certeza? ― Porém, sua curiosidade ultrapassava qualquer bom senso que alguém feito ela, uma empregada, era obrigada a apresentar perante uma pessoa de classe superior.

― É claro! ―  Xiao Ning deu um sorriso de aprovação. ― Mas não fique muito empolgada, pois tudo o que fará é colocar aquelas Bútus no caldeirão e me avisar quando estiver no ponto.

Apenas isso já era o suficiente para fazer Camila estremecer de emoção. Seus olhos brilharam ao mirar o topo do caldeirão, cuja altura máxima ultrapassava sua cabeça. Ainda não tinha tido a oportunidade de estudar seu interior, contudo, ao que tudo indica, isso logo mudaria.

Não demorou muito para Xiao Shui retornar carregando o jarro; agora com água. A sensação estranha de entrar na antiga sala de treinamento de sua mãe permanecia, fazendo seus ossos gelarem e estremecerem sempre que os pés tocavam o assoalho. Mas isso não a impediu de cruzar o portal e completar seu objetivo.

Embora estivesse um pouco intrigada para saber o que Ning pretendia fazer para evoluir as Chamas da Essência, não estava tão animada quanto Camila, portanto, apenas repousou o jarro no chão próximo ao balde contendo as Frutas Espirituais já lavadas e esperou pelo comando seguinte.

A primeira ordem de Xiao Ning, nada teve a ver com Alquimia. Ele pediu para que Camila se certificasse de abrir bem todas as janelas ― as duas únicas existentes naquele lugar ―, bem como a porta de entrada. Precisava do local ventilado da melhor maneira.

Xiao Shui contra-argumentou, usando a razão, alegando que permitir a porta e as janelas a permanecerem escancaradas por um longo período de tempo poderia facilitar o trabalho de olhares curiosos e obstinados, que muito bem seriam capazes de estarem fazendo vigília do lado de fora. Após o ataque de mais cedo, toda a cautela se fazia necessária. Além do mais, não estava tão quente assim, a ponto de precisar deixar tudo aberto.

Contudo, foi dissuadida a aprovar a abertura das passagens para o vento quando Xiao Ning informou que, durante o processo de composição, aquela câmara seria tomada por um odor sufocante, muito parecido, porém mais intenso, com o gosto que ela sentiu ao experimentar a Bútu pela primeira vez. Aquele ardor refrescante ainda fazia sua língua pinicar e seus olhos lacrimejarem.

Dessa forma, Camila, a qual ainda não tinha se recuperado da última experimentação, não tardou a cumprir com suas ordens, garantindo que todas as passagens permanecessem abertas, mesmo no caso de serem assaltadas por uma brisa externa mais intensa.

Xiao Ning continuou lançando suas Chamas da Essência, esquentando o metal até se dar por satisfeito. À medida que o calor aumentava, os olhos de Genbu se tornavam inegavelmente vivos, carregados de mistérios, luzindo um alaranjado incandescente que cintilava com intensidade, ferocidade, exalando uma presença mística única. Quando enfim ficou agradado pelo resultado, falou:

― Coloque toda a água do jarro no caldeirão. ― disse à Camila.

E assim ela fez. Usando um banquinho, que se encontrava parado num canto, para subir, aproximou-se da boca do caldeirão enquanto segurava o jarro de barro, tomando extremo cuidado para não tocar no metal; não queria se queimar, afinal. Antes de jogar a água dentro do utensílio, espichou a cabeça sobre a borda, na expectativa de espiar a parte interna, pois quando derramasse o líquido, o vapor se desprendendo tornaria difícil o estudo do fundo desconhecido.

Mas, para a sua decepção, o núcleo do Caldeirão Encantado era como qualquer outra panela, com exceção do castanho do cobre, que se fazia mais intenso e acentuado do que qualquer outro já visto por ela.

Entretanto, havia sim uma peculiaridade chamativa em tudo aquilo. A despeito de todo o fogo usado por Xiao Ning, a peça de cobre não parecia ter sido afetada, de modo que do lugar no qual estava, não conseguia sentir qualquer traço de aquecimento; nem mesmo uma lufada cálida ou um esbaforir febril. Diante dessa resolução, pensou que não fosse o momento adequado de dar início, então resolveu questionar:

― Tem certeza que já posso colocar a água? ― Xiao Ning parecia desejar, antes de começar a parte principal, aquecer o metal, uma vez que lançava labaredas atrás de labaredas para dentro da boca da tartaruga. Não queria ser a responsável por estragar tudo. ― Quero dizer, ainda parece estar frio.

― Ah, não se preocupe. ― O Alquimista esboçou um sorriso amigável e cheio de compreensão para ela. ― Caldeirões Encantados, quando estão em boas condições, preservam a propriedade das Chamas da Essência; no caso, o calor. Toque na parte externa do caldeirão e você perceberá. ― instruiu.

Camila, que devorava cada palavra de ensinamento de Xiao Ning, como Genbu devorava as Chamas da Essência, não titubeou sequer por um segundo e foi logo tacando a mão no metal. Nem ao menos passou por sua cabeça a possibilidade de ser outra pegadinha. No instante em que sua pele tocou o cobre, sentiu o frio que era de se esperar de uma peça constituída por aquele tipo de material; algo distante e solitário, desprovido de um calor pulsante de vida.

― Agora, jogue a água do lado de dentro e você verá a diferença. ― aconselhou Xiao Ning, assumindo total responsabilidade para um possível fracasso.

Desta vez, sem medo de tocar na borda do caldeirão, Camila se aproximou um pouco mais e começou a derramar a água. No instante em que as primeiras gotas tocaram o fundo de metal, um chiado sibilante ecoou, conforme uma nuvem densa de vapor começou a subir, denunciando a alta temperatura que o núcleo apresentava. A água evaporou instantaneamente; porém, esse primeiro estado logo diminuiu, quando uma poça se formou no fundo, usurpando parte do calor.

A jovem empregada ficou fascinada. Sua boca se abriu de uma maneira exagerada, seguindo o exemplo de seus olhos, que se arregalaram de encanto perante a descoberta, expressando a condição maravilhada na qual se encontrava. Todo o espetáculo, embora tão simplório, era de uma beleza indescritível, que só a fazia cobiçar por saber mais.

E para ela, tão deslumbrante quanto o vapor subindo, foi constatar que a água no fungo do caldeirão já começava a borbulhar, apresentando os primeiros sinais de fervura. Foi uma mudança quase instantânea.

― Um Caldeirão Encantado que deixa escapar as propriedades das Chamas da Essência é um Artefato defeituoso. ― acrescentou Xiao Ning, usando um tom de sabedoria, fazendo pose de quem está dando uma dica valiosa.

E como era de se esperar, Camila ouviu e memorizou cada palavra.

― Muito bem, agora, vamos adicionar as Bútus, antes que a água evapore.

 

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