Alma Imaculada
Capítulo 76: Retroceder Ás Virtudes
[Incis]
Merda!
Eu havia me esquecido disso, que o meu Vitalis estava praticamente no limite, depois de usar o vampirismo eu costumo realmente ficar acabada, mas acabei usando de uma forma que gastou toda a minha energia lutando contra aquela aranha da caverna.
O corpo estremecendo, a morte eminente emanando do homem diante de mim.
Com as pernas tremendo pra sustentarem meu próprio peso eu levei uma das mãos aos lábios, o sangue escorrendo entre meus dedos.
— Ughn... — Fiz sons de desconforto com a garganta ardendo, Grim levantando sua Katana em minha direção.
— Pelo jeito não vou ter que me esforçar tanto pra te matar, que lástima, quem diria que a filha de Kaylleon Katulis terminaria de forma tão patética.
“Não, ainda deve ter um jeito, ainda posso lutar.”, acompanhando minha mente eu relutantemente levantei a mão novamente pra conjurar qualquer arma de fogo que fosse possível, mas...
Vush!
Os ventos se quebraram ao redor de meus dedos enquanto os flocos reluzindo em um tom carmesim se despedaçaram como vidro.
[Energia Vitalis está no limite!]
[HP: 300/2200]
— Nhgh! Ah... — Mais sangue escorreu, dessa vez das minhas narinas, o amontoado de líquido carmesim fresco pintando minha roupa desgastada e o chão cinzento.
Uma dormência súbita tomou conta do meu corpo enquanto minhas veias pulsaram com um ardor tão insuportável que quase perdi a consciência cambaleando pra trás.
Passos. Passos. Passos.
O espadachim com um cabelo longo amarrado atrás da cabeça caminhou lentamente em minha direção enquanto sua voz ressoou.
— Alguém como eu, Grim Shandoriaz um dos membros mais antigos dessa guilda eliminar uma vida tão inferior assim.
Meus olhos ardendo se reviraram para todas as direções.
Zakio caído e tremendo sob o chão, a luz pulsante da arvore carmesim no centro da sala, o eco dos passos cautelosos de Grim.
Era minha culpa, absolutamente minha culpa.
Porque eu era um monstro no final, eu tinha o sangue de um ser que foi instinto a milhares de anos em minhas veias, seres mórbidos que se alimentavam do sangue dos inocentes, foi por causa desse poder que eu pude destruir o monstro que matou o senhor Nidrik lá na caverna, mas... também foi por causa dele que eu terminei nesse estado.
“Uma pessoa como eu, realmente deveria ser filha de alguém tão virtuoso e corajoso como meu pai?”, rangi os dentes tentando aguentar o calor febril tomando conta de mim.
Até mesmo o meu longo cabelo negro parecia pesado como chumbo.
A silhueta de Grim caminhou até mim enquanto seu sobretudo escuro ondulou levemente.
A grande lâmina em sua mão exalava uma pressão capaz de fazer qualquer um se ajoelhar, mas eu realmente só consegui sentir tal coisa porque sabia do seu poder, seu Vitalis que poderia dilacerar até a pior das bestas Aether de Tier 2.
Pensei em voz alta estreitando meus olhos dourados. — Autosave.
Passo.
Grim sessou seu caminhar antes de chegar tão que poderia me tocar com a ponta de sua Katana negra.
Suas pupilas esverdeadas como duas esmeraldas serpentearam meu corpo dos pés até a cabeça. — Como sabe o nome do meu Vitalis? Quem te contou isso? — Indagou com uma voz dominante.
Foi então que... diante disso tudo, dessas dúvidas, do temor e desse inimigo quase que implacável... meus lábios se curvaram, abrindo um sorriso manchado de sangue.
— É óbvio que eu sei disso. Sou filha do líder da guilda, portanto tenho informações que alguém como você desmaiaria se soubesse, você não é nada rabinho de cavalo.
Grim deu um passo para trás arregalando os olhos em uma expressão de nojo. — Sua pirralha, eu vou te decapitar!
Nos olhos dele eu pude saber que ficou tão irritado assim porque viu meu pai em mim, talvez eu estivesse finalmente amadurecendo e me tornando alguém como ele.
Sim, eu era uma cavaleira da justiça eminente, a líder dessa guilda, se alguém tivesse que suportar esse fardo não teria ninguém melhor do que eu!
“Chega de mentir pra mim mesma.”
Um dia de céus cinzentos, as terras áridas do continente Thera clamavam por uma forte chuva enquanto as nuvens escuras se juntavam nas alturas.
Em uma longa estrada que cruzava as montanhas de areia um veículo negro com grande capacidade de carga levantava poeira em alta velocidade.
A placa metálica sob a superfície escura do meio de transporte tinha suas especificações escritas com letras douradas.
‘Modelo Zyk XZ Vyer’.
Obvio que qualquer coisa que remetesse ao império Zykron seria mal vista por todos da Guilda R.O.U.N.D.S e esse grande risco em cima do ‘Zyk’ era prova disso, que bobo, não é?
— A chuva se aproxima e vai ser uma das pesadas. — A voz jovial de um dos soldados sentados dentro do compartimento de passageiros levantou a atenção de alguns dos outros ali presentes.
Uma entonação misteriosa quase como um sussurro respondeu o garoto: — Sim, mas estejam cientes de que essa vai ser a nossa primeira operação, não temos tantos membros ou recursos, porém é vital que mantenham-se como figuras anônimas até lá.
O homem que dizia isso estava recostado na parede metálica de ao lado do banco de passageiros, seu sobretudo negro era como um manto que engolia quaisquer traços de sua feição somada a escuridão de um capuz rasgado.
Outro jovem, que por ventura tinha como característica uma careca e olhos carmesins levantou a voz.
— Tenente Grim, por que não pega um dos acentos?
O homem misterioso se encolheu em seu sobretudo negro e levou sua mão para uma grande espada que estava encostada ao seu lado durante toda a viagem.
— Isso é algo que alguém como você não precisa saber, recruta Osmoldt.
O piso metálico vibrava cada vez mais que os soldados dentro do veículo Vyer balançavam com o som dos pneus traçando a terra árida.
“Que cara estranho, ele não é nada parecido com o mestre Kaylleon.”, pensou Osmoldt passando a mão na sua careca.
Os trajes negros com pequenas placas metálicas nos ombros e peito de cada um dos soldados exalavam a mais pura essência da guilda R.O.U.N.D.S.
— Aquela espada, não quer tentar saber o que ela esconde? — Cochichou uma voz ao lado de Osmoldt que apenas redirecionou os olhos do jovem para a garota ao seu lado.
— Se tirar ela da bainha pra mim, eu posso... te fazer um pequeno agrado. — Disse a garota de olhos prateados e um cabelo azulado que se sentara ao lado de Osmoldt, ela sorria de forma maliciosa.
O pobre recruta levou a mão para trás da nuca envergonhado com tal proposta, mas não poderia negar que a curiosidade lhe matava perante a longa bainha prateada dessa espada que o tenente Grim carregava.
— N-Não sei, Iku, talvez seja melhor perguntarmos ao capitão Kaylleon sobre isso.
Iku deu um suspiro entre os dentes, as pupilas brancas como neve se desviando do rosto de Osmoldt. — Humm... você é um covarde no final das contas.
Osmoldt franziu as sobrancelhas respondendo: — Covarde é uma palavra forte, eu penso antes de tentar fazer algo impróprio, senhorita Iku Thanata.
Bam! Bam!
Uma batida forte ressoou pela parede metálica do veículo, chamando a atenção não só de Osmoldt e Iku como também dos outros 4 soldados presentes ali.
— Quanto tempo isso vai durar, pai? É sériooo, eu tô intendiada.
Outra voz jovem, porém dessa vez feminina permeou o local abafado.
Uma garota com longos cabelos negros e lindas pupilas douradas batia na grade de metal que separava a cabine pro piloto do compartimento pra passageiros.
“Essa garota, é tão irritante, porque diabos o capitão Kaylleon tinha que trazer a própria filha?”, Iku pensou com uma face de desanimo antes de recostar a cabeça pro lado sob o ombro de Osmoldt.
— Aaah... que viagem longa.
— Perto demais. — Osmoldt afastou a cabeça dela com a mão.
— Senhorita Incis, o capitão Kaylleon não pode tirar a atenção do volante agora, sabe disso.
“Lá vai ela, mimando a Incis de novo.”, Iku rangeu os dentes levemente enquanto observava uma mulher com um lindo traje de fibra avermelhado e um peitoral de metal prateado se levantar do acento, e casualmente ir em direção da garotinha de cabelos escuros agarrada na janela do motorista.
— Aquela armadura é muito maneira. — Os olhos do recruta careca brilharam diante das luzes Neon na pontas do peitoral branco, que por ventura cobria o busto da mulher que começara a brincar com Incis.
Vuuuum!
A estrada começou a ficar húmida, o grande Vyer vibrou ainda mais com as sensíveis rodas rasgando a estrada de terra.
— A tenente Ilka realmente sabe cuidar de crianças ou talvez ela só esteja fazendo isso por interesse no capitão Kaylleon. — Iku murmurou com um sorriso de escárnio ao cruzar as pernas antes de balançar o cabelo azulado com a mão.
— Ei, se vai vomitar vomite pela janela, Kaylleon já está tendo que dirigir e ainda terá que cuidar da limpeza e manutenção do veículo depois!
A voz do tenente Grim perfurou toda a fileira de soldados até um garoto ruivo com cabelos um pouco espetados para trás da cabeça.
Zakio se apoiou com a cabeça pra fora do compartimento de passageiros e começou a despejar pela estrada todo o seu almoço com um som horrendo saindo de sua garganta.
Os cabelos ruivos balançando sob a ventania enquanto as gotas de água começaram a cair das alturas.
As costas do peitoral metálico de cor carmesim que ele trajava serviram apenas para escorrer toda a água ao seu redor e lentamente descer pelo seu quadril e pernas até as grandes botas serem preenchidas de água, molhando o piso.
— Merda! Capitão Kaylleon o subtenente Zakio está vomitando! — Um dos meros admiradores de Zakio gritou enquanto tentava socorrê-lo com uma mão no ombro.
Foi então que uma inesperada e espalhafatosa gargalhada ressoou da janela do motorista.
— Fhuahahahahah! Aha-ahahahaha!
O veículo acelerou no que a janela do motorista se abriu revelando cabelos brancos e um único olho dourado observando todos os passageiros a bordo.
— Deixa ele! Incis também precisa ver que até mesmo seu futuro marido passa por perrengues as vezes. — Disse o homem dirigindo enquanto gargalhou sem parar olhando Zakio vomitar.
— C-Capitão Kaylleon, olhe pra estrada! — Ilka alertou tapando os olhos amarelos de Incis e fechando a janela do motorista. — E pare de falar besteiras sobre a própria filha, Zakio tem 5 anos de diferença dela.
A 8 anos atrás a primeira operação da guilda R.O.U.N.D.S se iniciava.