Trovão Infinito Brasileira

Autor(a): Halk


Volume 1

Capítulo 30: A Direção É Mais Importante Do Que A Velocidade (2)

 

 

❧ AMOR ☙

 

A ruiva não aceitava uma ofensa. Era por isso que nunca se segurava em qualquer trabalho que fizesse. Era uma pessoa extremamente linguaruda, o que só significava que se alguém a ofendesse, essa pessoa deveria estar preparada para ouvir o pior em retribuição.

O pior disso tudo era que fora Ermo e seu grupo quem começou a brigar com ela por nenhum motivo. Quer dizer, é claro que havia um motivo. Para Ermo, a simples razão de fazer uma pessoa sofrer era mais que motivo suficiente para briga.

Só que Ermo tinha de tomar cuidado com quem estava gritando. Não era uma pessoa que aceitaria calado, tampouco uma pessoa que estava sozinha. Enquanto Amor discutia com os garotos do Distrito 5 e também com a Chefe Dos Recrutas, Solares, as suas amigas se agruparam ao seu redor como uma espécie de apoio moral.

Ora, tampouco era necessario tal apoio, já que Amor era suficientemente capaz de se virar por conta própria. Para falar a verdade, até considerava uma vergonha que ela não conseguisse se defender sozinha. Porém não ficou chateada com a atitude das amigas. Continuaram, juntas, fazendo cada vez mais confusão.

— Não me chame desse nome, sua lacraia do deserto — xingou Amor. — Meu assunto aqui é com a Solares e o sistema podre que ela vem promovendo desde que chegamos aqui!

— Fique sabendo que você é a lacraia aqui — rebateu Ermo, sem muito jeito com as palavras afrontosas. Era uma pessoa de ofender, porém, raramente sabia lidar com ofensas. — A Chefe é quem manda aqui e é ela quem decide as coisas. Se você não está satisfeita, por que não pede para sair da classe S?

— Pede para sair você! Eu vou ficar aqui e endireitar tudo, nem que eu tenha que sacrificar minha vida. Esse sistema tem que mudar! Até um Condutor, que não tinha nada a ver com a classe S, na verdade até representava uma ameaça, concorda que a maneira que as coisas estão se desenrolando está ruim.

Ela não poderia ter jogado dessa forma. Suas palavras saíram sem querer, no meio da emoção. Porém, resultaram em um efeito interessante. 

Silêncio. As pessoas ficaram em silêncio diante das palavras dela. Isso significava que algumas discordavam e outras concordavam, sem de fato apoiar por meio de sons. Tudo que recebia naquele momento era o silêncio como resposta. 

Mas aquilo era mais do que o suficiente. Ora, se não protestam, significam que ao menos toleram. E se toleram novas ideias, são capazes de aceitá-las. Ao menos era assim que sua mente processava toda aquela informação, que não passava de silêncio.

— Está dizendo que o Condutor é melhor do que a Chefe? — confrontou Ermo. 

— Se ele é melhor que ela em tudo, eu não sei, mas pelo menos ele tem visão suficiente para enxergar que isso daqui não tem futuro.

Mais silêncio. Solares ficou apenas observando as coisas de longe. Entretanto, Amor uma hora se virou para ela, a encarando com repugnância. Aquela atitude tocou o coração da Chefe, que ficou enfurecida com a atitude. Porém, o que poderia fazer? Tinha de manter a neutralidade na situação. Era o que a Comandante Negra faria. Resolveria tudo na calma.

O problema era que usar a calma naquele momento era uma má ideia. Amor continuou dizendo para todos que o Condutor de Eletricidade, Kaike, tinha pensamentos muito mais progressistas e corretos em comparação com a Chefe. Isso entrou na mente e nos corações das pessoas ao redor.

Uma ou duas pessoas concordaram totalmente, enquanto a maioria ficou tentada a concordar e a minoria não concordou em nada. Era a primeira vez que concordavam que um Condutor tinha qualidades, logo, convencer a todos de uma vez só seria tarefa difícil. Mas o trabalho ali estava feito, e muito bem feito.

Depois de brigar mais um pouco e fazer mais alarde, Amor saiu desrespeitando todas as autoridades que podia. Ela disse que sairia dali, não ficaria no meio de pessoas de mentalidade tão fraca. Mas a verdade era que agora, Amor iria em busca de Kaike, para ver se o que falavam dele era de fato tudo isso.

Isso se conseguisse acha-lo.

 

ϟ KAIKE ϟ

 

Quando menos espero, já estou correndo em disparada para meu próximo objetivo. Depois desse finalmente sairei daqui.

Corro virando uma esquina e depois outra de corredores de pedras, sempre olhando para trás, preocupado com a coisa que está me perseguindo.

Toda vez viro uma esquina olho para trás e vejo uma criatura grande se esbarrando na parede com toda a velocidade, e outra pequena criatura logo atrás, me perseguindo também.

Cara, com eu queria que esse negócio batesse tão forte em uma parede que virasse pó.

— No próximo lugar que a gente vai tem alguma arma, Remi? — grito enquanto continuo correndo.

— Perdão. Não tenho dados suficientes para uma resposta significativa.

— Bom saber.

O jeito vai ser descobrir por mim mesmo. Continuo correndo virando os corredores aqui e ali até finalmente chegar no local marcado no mapa. Essa é a próxima caverna.

Tomara que não tenha nenhuma outra dessas criaturas aqui querendo o meu sangue. Já tenho que lidar com essa Fúria gigante e seu irmão mais novo, os dois com vontade de arrancar até as minhas tripas.

Antes de poder continuar, eu percebo melhor onde estou me metendo. O local onde estou é um grande abismo. A única maneira de passar por ele é passando pelas pontes que não me parecem nem um pouco confiáveis.

São rochas que formam um caminho por cima da escuridão e chegam até o outro lado da caverna, onde posso continuar seguindo em direção ao meu destino final, a saída.

Olho para trás mais uma vez e constato que realmente aquela criatura não vai se cansar de me perseguir. De fato, nenhuma se cansa de mim.

Ando rapidamente pela pequena ponte de pedras à minha frente, a que o mapa indica que é para eu atravessar e pegar o meu caminho em direção a saída. 

Tenho que fazer isso com calma porque qualquer deslize que eu dê pode resultar em um escorregão e escorregar na beirada de uma ponte sem corrimão que passa por cima de um abismo não é o que quero agora.

Por mais cauteloso que seja, a criatura atrás de mim não parece ter cérebro suficiente para identificar uma situação que pode matar ela; isso explicaria como ela estava se esbarrando nas paredes com tudo.

Enquanto o seu irmãozinho mais novo detecta o perigo e vem devagar, a Fúria gigante vem correndo em minha direção. É um caminho reto, não tem como ela me errar.

Ela dá um salto para frente, um dash, e tenta me acertar. Eu prevejo o movimento e salto da ponte para uma outra ponte mais ao lado, que daria para outro caminho.

Aterrisso com o maior cuidado do mundo. Doí um pouco porque eu literalmente caí de cara no chão, me agarrando com as mãos e com os pés no chão de rocha da ponte.

O solo nunca foi tão bom. Aqueles momentos em que estive em pleno ar por cima do abismo fez o meu estômago revirar e a vida passar diante dos meus olhos como um filme. Que drama.

Levanto com as pernas bambas e observo o próximo movimento da Fúria. Ela nem hesita. Dá um grito enfurecido por não ter conseguido me pegar e pula em minha direção.

Corro para frente desviando de ser esmagado pelo peso desse cretino. Torço para ele escorregar e caia, mas embora esse monstrengo seja ridiculamente burro e sem apego a própria vida, ele é ótimo em se manter de pé. 

Continuo correndo pelo caminho alternativo, procurando outras pontes que eu possa estar…

De repente sinto uma pancada forte nas minhas costas. Um ardor e sangue. Sou arremessado para o lado. Tento me agarrar em uma ponte, porém não tem jeito, acabo caindo na escuridão.

Penso que vou morrer, que vou cair eternamente, que minha vida já era a partir dali. Porém, para minha surpresa eu caio em uma outra ponte, uma que estava mais abaixo e que eu não tinha visto anteriormente.

Quando me levanto e olho para os lados, percebo que existem várias dessas pontes escondidas mais a baixo. Tenho certeza que dá para sair daqui se eu der um salto e ponte em ponte, ou só se achar um caminho alternativo, porém quero dar um jeito naquela coisa desgraçada.

Ele pensa que venceu. Está andando calmamente para lá e para cá, tentando me achar e não vai conseguir porque estou distante demais. Eu quero muito acabar com a raça dessa criatura imunda.

Aponto o meu braço em direção a ela e começo a concentrar minha energia na palma da mão. Um relâmpago deve bastar para eu conseguir acertar ela e fazê-la cair no abismo…

— Kaike, a essa distância você não vai conseguir — fala Remi. — O seu relâmpago atualmente tem um alcance limitado. 

— Alcance limitado? É um raio! Ele vai até onde quiser!

— Sinto informar que esse não é seu caso. — Então me explica: — Um raio normal de 30,000 ampères percorreria quilômetros. Entretanto o seu raio tem menos de 50 miliamperes, o que significa que a distância é relativamente mais baixa também.

— Droga.

Faz sentido. Meu pai uma vez explicou que para matar uma pessoa era preciso por volta de uns 150 miliamperes. E talvez a pessoa sobrevivesse, com muita, muita sorte. 

Isso explica o motivo de eu não conseguir matar nenhuma daquelas criaturas musculosas com um único relâmpago. O que eu posso fazer? 

De repente uma lâmpada acende na minha cabeça. Se é necessário mais voltagem para dar uma descarga mais potente, o que vai acontecer se eu acumular essa voltagem e depois liberar ela?

Junto as duas mãos como se segurasse uma bola imaginária. Concentro toda a minha energia entre as minhas mãos. Sinto a energia passando pelo meu braço e se acumulando naquele ponto.

Vejo uma pequena esfera de raios se formando e tomando forma, até caber na palma da minha mão. 

É uma esfera mesmo, sinto o peso dela em meu braço. Como isso é possível?

— Deixe-me analisar isso.

Remi usa um pequeno laser para fazer alguns dados malucos e então me solta a notícia:

— Kaike, isso é energia instável. Jogue isso o mais longe possível. Vai explodir.

— Espera, como assim vai explodir?

— Kaike, jogue isso o mais longe possível.

Ele tem razão, sinto a esfera se descontrolando, como se a energia que acumulei quisesse se espalhar a todo custo.

Penso em arremessar a esfera em direção ao abismo, mas tenho uma ideia melhor.

Lanço a esfera em direção a criatura, com toda a força que tenho e com todo o meu conhecimento em lançamento, que aprendi com o meu irmão quando jogávamos beisebol a muitos anos atrás.

A esfera atinge a mão da criatura e gruda. Ela leva um leve choque e então fica se remoendo de dor, tentando tirar a esfera de si. Entretanto, no momento seguinte…

B
  O
      O
        M
             !

A esfera explode, jogando a criatura um pouco para cima e fazendo a ponte desabar. A criatura cai soltando um grito de desespero. 

Dou um viva de alegria enquanto Remi me apresenta um holograma com um relatório novo.

 

ϟ [NOVA HABILIDADE: GRANADA ELETRICA (I)] ϟ

[Ao concentrar sua energia em um única ponto e jogá-la em seus alvos o usuário cria uma explosão após alguns segundos. A explosão acontece devido a instabilidade elétrica e a necessidade da energia de se dispersar.]

[Granadas grudam em seres vivos se tocarem diretamente.]

Ótimo, essa daqui é bem útil. 

Olho para cima e vejo que aquela outra Fúria, a que estava junto de seu irmãozão, me observa com raiva e depois vai embora. Espero nunca mais ter que ver essa coisa de novo.

Continuo meu caminho indo para frente e me sentindo um pouco fraco. Canalizar esses raios em um único ponto me consumiu mais energia do que eu esperava.

Abro o mapa e peço para que Remi trace um novo caminho. Afinal de contas ainda estou preso nessa ponte aqui de baixo, mais próximo do abismo escuro.

Ele traça uma nova rota, dessa vez mais rápida do que das vezes anteriores em que pedi para ele fazer isso, e sigo. 

Finalmente já estou perto da última caverna que vai dar acesso a saída…

De repente ouço uma voz pedindo ajuda:

— Socorro!

Reconheço a voz no mesmo instante. Saio correndo em sua direção, não posso negar ajuda. Meu pai jamais negaria. 

Afinal de contas a voz é de Thomas.



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