Trovão Infinito Brasileira

Autor(a): Halk


Volume 1

Capítulo 18: Liderar Não É Mandar, É Despertar O Desejo De Fazer

Todos me encaram como se eu fosse um prato de comida delicioso. Ei! Ei! Essa história de me matar não deve ser sério. O capitão deve estar brincando, não é? 

— O-oi? — Engulo em seco.

— Respondendo à segunda pergunta. — Ele me ignora. — Solares não está na primeira fase do torneio. Ela irá lutar contra os finalistas. E você, Recruta Kaike, não está na lista porque seria injusto por um condutor para lutar contra um Recruta.

— Ei! Como assim me matar?

Ele dá uma risada e acende um charuto.

— Você vai ser o objetivo de todos aqueles que perderem no torneio. As pessoas vão ter uma chance de ganhar pontos lutando contra você. Agora, é claro que seria uma desvantagem enorme você contra um recruta. Por isso serão três, ao invés de um.

— Três pessoas contra mim? Justo?

— E elas terão autorização para te matar — completa ele, totalmente satisfeito. — O ideal é que não o matem, mas podem usar as táticas que quiserem para fazê-lo. Obviamente nem você e nem elas vão estar armadas. Terão de dar um jeito em você com as ferramentas disponíveis na hora.

— E se eu não quiser lutar com elas? Se eu só me desviar e nunca deixar que me acertem?

— Aí elas não ganham pontos e no final do treinamento estarão todos mortos. 

Ele solta fumaça pela boca casualmente, como se suas palavras não tivessem peso algum. Ei, essa história de “ser morto” e “matar” está começando a me assustar. Quer dizer que ele estava mesmo falando sério sobre matar quem fracassa? 

Isso me lembra a informação que recebi anteriormente, de que 1 terço dos recrutas do ano anterior morreram. Eles morreram porque fracassaram e foram punidos com a morte?

— Ei cara, você tá legal? — pergunta Ash.

Provavelmente eu devo estar branco de tão assustado com a situação. 

O que me assusta não é a possibilidade de morrer, mas sim a de ver todos esses recrutas morrendo. Embora não conheça quase ninguém, não é como se eu quisesse eles mortos.

Balanço a cabeça positivamente e tento dar um leve sorriso, embora a cara de preocupação continue.

Olho para Vida e vejo que ela está chocada. Bia está um pouco apreensiva também. Me aproximo das duas por trás e ponho minha mão em seus ombros, como forma de mostrar que tudo vai dar certo.

Em resposta, Vida coloca a mão por cima da minha. Bia me olha e dá um aceno positivo com a cabeça. Ao menos esse sinal eu consigo entender.

— Solares vai ser a treinadora de todos vocês. Sobe aqui, garota. — Ele ordena e Sol obedece. — Obviamente, vai dar muito trabalho uma única pessoa treinar todos. Então ela vai escolher mais alguns outros para ajudarem ela, serão os auxiliares. Ela e esses outros vão ficar responsáveis pelo treinamento de vocês. Mas os auxiliares não terão o privilégio de não participar da primeira fase, assim como Solares tem.

Sol está pálida, mas mantém o olhar determinado. Está com os braços atrás do corpo e analisa a todos, procurando por possíveis candidatos.

Essa decisão é difícil. Ela não pode escolher qualquer pessoa, já que eles vão ser os treinadores. Tem que ser recrutas que com certeza vão passar na primeira fase.

Imagina que vergonha seria para um auxiliar perder logo na primeira fase? Isso iria tirar toda a credibilidade do tutor. E claro, também tiraria a credibilidade da Sol também, afinal foi ela que colocou aquele recruta como auxiliar.

— Clio, Ítrio, Lavra e Leona — diz Sol em alta voz, convocando os recrutas para subirem na arena junto com ela.

Demora um pouco, mas finalmente os quatro sobem. Já vi alguns conversando com Sol, outros estou vendo só agora.

Não sei quem é quem, exceto por Leona, essa já ouvi falar. É uma das que vive conversando com a Solares. Ela é do Distrito 3 e chama muita atenção. 

Leona é a garota ao lado de Sol, alta e musculosa, com o cabelo preto amarrado em um rabo de cavalo. Ela com certeza não vai perder a primeira fase. Tem quase o dobro do meu tamanho.

Vega pega uns cartões do bolso e passa para Solares. Por sua vez, a Chefe passa os cartões para os auxiliares e assim que eles prendem as lapelas em suas roupas, letras se formam na tela branca e vazia.

Agora consigo ler o nome de cada um. Logo acima do cartão está escrito: Auxiliar e abaixo o nome do sujeito.

Fora Leona, nenhum outro chama minha atenção. Com exceção do rapaz chamado Clio. Ele tem cara de quem nunca vai conseguir ser capaz de treinar ninguém.

Clio é um garoto de óculos, magrelo e com cara de perdedor. Não tenho outras palavras para descrevê-lo em minha mente. Vai ser um milagre se esse daí sobreviver à primeira fase. O que me faz pensar no motivo da Solares ter o chamado.

Já o vi conversando com ela anteriormente. Será que ele tem algo de diferente que eu não saiba? Meu pai dizia para nunca julgar pela aparência, mas olha só aquele cabelo de tigela…

Ouço cochichos:

— Que absurdo, como que ele escolheu aqueles caras ao invés do…

— É lógico que ela ia escolher a Leona, só andam coladas…

— Mas porque escolheu justo aquele magricela do D6…? 

— Pelo que eu sei, aquele cara só é bom com números…

Parece que não é só eu que ando duvidando das escolhas da nossa líder. Mas se estão todos duvidando tanto, o que custa eu ter um pouco de fé nela? 

Afinal de contas, não quero ser só um “reclamão”. E tenho certeza que Sol tem muita pressão nos ombros. Vou tentar ajudar ela da melhor maneira que eu conseguir encontrar.

— Então, podem começar os treinos — fala Vega. — Qualquer coisa eu estou ali, vendo tudo.

O capitão vai até um canto da sala e se senta em uma cadeira que eu tenho quase certeza que não estava ali. Ele cruza os braços e fica observando tudo, de pernas abertas, bem relaxado.

Solares e os seus 4 auxiliares vão mais adiante da espaçosa sala e separam filas de espera para treinamento. Cada um fica com mais ou menos 10 recrutas para treinar.

Nenhuma instrução foi dada com relação ao método de treinamento. Solares até foi perguntar isso ao capitão, porém tudo que ele respondeu foi:

— Elabore o treino que você quiser. Eu só estou aqui para avaliar a performance dos que estão sendo treinados.

Ela saiu, mas sem perguntar como seria a avaliação dos pontos dos auxiliares. Afinal de contas, eles não estavam treinando e sim ensinando. 

Fiquei tentado a ir lá perguntar, mas Vega não parecia muito receptível, e eu sinceramente quero distância desse velho caolho.

No final, Solares começa a exemplificar para os seus auxiliares como serão os treinamentos. Basicamente ela vai fazer uma fila e cada aluno vai ter um tempo para treinar combate corpo-a-corpo.

A primeira pessoa da fila é, por algum motivo misterioso, mas com certeza curioso, Leona, uma das auxiliares. Ela quer ser a cobaia do teste.

As duas começam a brigar. Leona diversas vezes consegue desferir golpes em Sol, porém a Chefe não é Chefe por acaso, e sua velocidade supera a da grandalhona.

No fim a luta termina com nenhuma das duas caindo, apenas ficando cansadas. E aquela foi a demonstração.

Minha opinião? Achei uma merda. O método de ensino é: você vai lutar comigo e te darei dicas de como me acertar. Só que em uma briga existe mais do que bater e apanhar. Tem a previsão de movimentos e pensar além do oponente.

Posso dizer com certeza que a qualidade dos classe S é horrível. Eu consegui acabar com todo o preparo deles naquela vez, na cratera do meu distrito. Os caras pareciam que seguiam um roteiro de movimentos. Isso é muito mole de prever.

Observo as filas para ver onde andam os meus amigos. Ash na fila do auxiliar Clio. Olhando os dois de perto, até parece que eles combinam um pouco. Vida ficou com a Leona e a Bia ficou com a Lavra. 

Espero que esses caras saibam adaptar o seu estilo de luta para a necessidade de cada pessoa. 

Não me entenda mal, não é como se duvidasse do potencial dos meus amigos, nem nada, mas não acho que Vida foi feita para bater e apanhar.

No fim das contas só sobra eu, o excluído. Até os que não querem participar são obrigados, já eu, fico aqui.

A vontade de ir até o Vega perguntar se vou treinar ou não é gigantesca, mas não vou fazer. Aquele velho não vai ter a satisfação de falar comigo, ou, no caso, de tentar me humilhar em público mais uma vez.

Espero uma das lutas da Sol acabar. Foi a coisa mais humilhante que eu já vi. O garoto mal teve tempo de respirar e no fim ela só disse: “Próximo.”

Irritado com a situação e a falta de ação na minha vida nesse exato momento, me aproximo de Solares e entro na frente de um recruta. Ele parece dar “Glória ao Rei” por ter atrasado um pouco mais a sua sessão de porrada. Solares me olha aborrecida. 

Ela está suada da testa até os pés. Bom, não posso ver seus pés, mas tenho certeza que ela está suada. Até tirou a camisa de mangas longas preta e está agora só com uma regata, também preta. 

Fico um pouco triste por não mostrar a barriga, queria ver se ela era mais branca por baixo… Por não tomar sol… Espera, o que eu vim fazer aqui mesmo?

Tomo uma pancada na cabeça, o que me faz acordar para a realidade. É ela batendo na minha testa.

— O que você quer? — pergunta.

Por algum motivo, estou sentindo que vou arrumar um problema com ela.



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