Volume 2

Capítulo 177: Bajulação

 

Qin Xa abriu os olhos e viu que na sua frente estava Han Lining, de olhos arregalados enquanto a encarava. Com certeza essa era uma expressão que ela não esperava ver naquele rosto deslumbrante.

"Por que ela está me olhando assim? Eu tenho alguma coisa no rosto?" Qin Xa passou a mão na cara mas não sentiu nada. Pelo menos nada além da maciez incrível da sua pele. "É, eu tenho realmente uma pele incrível. Talvez ela esteja me admirando..."

— O que você fez? — Han Lining perguntou, atordoada. Porém, sua voz soou com uma sonoridade tão celeste que era sobrenatural. Que voz maravilhosa! — pensou Qin Xa.

Han Lining estava bem na frente de Qin Xa quando aquele pulso de energia avassalador se espalhou aos 4 ventos.

Naquele momento Han Lining sentiu como se o mundo estivesse definhando pouco a pouco na velocidade da luz, mas estranhamente isso não causava dano algum a ela. Se poderia ser descrito assim, sentiu como se aquela coisa lhe fizesse cócegas. 

— Eu não fiz nada! Eu só estava alucinando quietamente aqui... — balançou a cabeça como um cachorro molhado. — Aliás eu passei no teste? Ah, sim, quanto tempo se passou desde que eu comecei a dormir?

Qin Xa ficou alarmada por ser acusada de fazer alguma coisa assim que abriu os olhos. E não era para menos. Mas como a boa sem noção que estava acostumada a ser, ela rapidamente se recompôs. 

Agora era hora de suas dúvidas serem respondidas! E quanto as dúvidas de Han Lining? Ela não fazia ideia de quais eram...

Han Lining olhou para a garota com um brilho peculiar no olhar. Uma curiosidade misturada com cautela. 

"O que foi aquilo? É possível que ela seja um especialista oculto? Não, por que um especialista praticaria o Dao do Entretenimento? Será que a Ligação da Alma fez a alma de algum ser aterrorizante do passado despertar nela? É possível, dado ao quão comum é a reencarnação... Mas ela também pode ser uma criatura Original e está passando por seu próprio despertar... ou pode ser que estão atrás da chave e usaram ela?"

Possibilidades infinitas estavam girando na mente de Han Lining, mas por fora nem meio segundo se passou. Ela nunca viu nenhuma vez algum de seus discípulos liberar nenhum pulso de energia depois que terminaram o teste.

Isso era uma coisa apenas dessa garota. Mas por quê? 

Antes de mais nada... será que essa coisa aconteceu realmente por causa do seu teste? Além disso... como que Qin Xa parecia mais inocente do que se realmente fosse inocente? Essa criatura não sabe o que é medo? 

Não que ela fosse culpada de nada.

— Vamos ver se você passou no teste mais tarde. Quanto ao tempo, eu também não sei. Afinal estive com você deste o início, e ninguém tinha permissão para entrar dentro dessa sala até o teste acabar. 

Han Lining se levantou e bateu levemente em suas roupas, como se para tirar alguma sujeira. Apesar de não haver nenhuma. Claramente era um costume mortal, afinal a poeira não tocava a pele de artistas marciais se eles não quisessem. 

— Espero que aqui fora não tenha se passado tanto tempo quanto foi lá dentro...

Qin Xa tentou se levantar também, mas assim que ela se pôs de pé, seus joelhos estalaram como se fosse um biscoito seco quebrando e cederam, fazendo Qin Xa cair de cara no chão.

TRUB! 

— Au! — seu grito foi genuíno, assim como a dor, até porque depois de tanto tempo nenhuma de suas barreiras estavam mais ativas.

— Oh, você não deveria tentar se mover sozinha! Você passou bastante tempo sem comer ou beber nada, e não está acostumada a se alimentar da energia natural, então seu corpo ficou bastante fraco.

Han Lining ajudou ela a se levantar e a levou para um dos quartos que ficava no pavilhão. Provavelmente o que seria o quarto dela por muito tempo.

Apesar de ser uma trupe, esse pavilhão era bastante luxuoso. "Não, bastante é pouco. Mesmo se juntasse toda a riqueza da família Liu e multiplicasse por 10, ainda não seria comparável à esse lugar... talvez eu tenha me juntado a um grupo de pessoas muito excepcionais?"

As paredes do lugar eram imaculadamente brancas, feitas de uma pedra que foi polida e lustrada o suficiente para quase se ver o reflexo — mas não tanto ao ponto de tirar a atenção e o foco de quem caminhava. Afinal, quem queria viver numa casa de espelhos?

Os pilares laterais do pavilhão, por onde Qin Xa passou, eram tirados de uma madeira de cor azul profunda, e suas bases assim como a maioria das construções desse mundo, também tinham gravuras. Só que não eram as gravuras e desenhos comuns de se ver, como bestas mitológicas e criaturas que representavam alguma boa sorte, ou história. 

Os desenhos alí eram de flores, mais de 1000 tipos diferentes. Gente dançando e festejando, ou então outras representações da natureza. Sol, cachoeiras, florestas, grutas. Sem dúvidas o povo do Pavilhão das Flores Sorridentes eram gente que presava pela natureza.

"Talvez eu tenha me juntado a uma tribo de indígenas imortais..."

Ao colocar Qin Xa no quarto — ela foi trazida sendo erguida pelo Sentido Astral da mulher — disse que iria mandar a cozinheira preparar uma refeição e que alguém iria trazer para ela. 

— Obrigado, Mestra.

Han Lining saiu sorrindo e pensando no que era aquele pulso de energia. Não parecia que Qin Xa iria falar para ela o que foi aquilo, sequer tinha noção, então ela mesma não tocou mais no assunto. 

No entanto, ela ficou um pouco em guarda contra Qin Xa. Apenas um pouco, até porque Qin Xa era fraca demais. Mas ela tinha um Qi refinado demais e denso ao ponto de ser fora do comum. Essa garota não era normal.

"Mas é estranho, eu não sinto nenhuma intenção maliciosa vindo dela." Esse foi o motivo de Han Lining não fazer nada contra Qin Xa, mesmo ela tendo um bom motivo.

Não era saudável fazer inimigos, em todos os lugares. Além disso se Qin Xa não tinha intenções maliciosas, não era Han Lining quem teria. Cada um tinha suas próprias histórias e razões, suspeitar da índole da garota apenas por causa de um pulso de energia era ridículo. 

Deixe ela com suas razões. Enquanto seus discípulos estivessem bem estava tudo ótimo. 

Mas quem poderia imaginar que Qin Xa não fazia ideia de que ela havia feito algo? 

Qin Xa sentou-se na cadeira que havia no centro do quarto, que era bem grande, e olhou para sua mão. Ainda era tão delgada e magra como sempre foi... magra era uma palavra muito forte. Estava com um aspecto saudável o suficiente para não mostrar as articulações, e bonita o suficiente para ela se sentir muito bem apenas por olhar.

Mas apertando a mão, sentiu que não tinha nem um terço da sua força. 

"Por que eu estou tão fraca? Achei que poderia passar vários meses sem precisar comer nada nem dormir. Será que isso é semelhante a acordar cansado depois de dormir muito?"

Enquanto pensava na vida das inúmeras pessoas que sofriam com insônia e ansiedade, Qin Xa ouviu a porta correr, sendo aberta por uma garotinha de grandes olhos negros e cabelos rosa, rosas como a cor das flores pálidas, e curtos na altura do ombro. 

A garota estava carregando uma bandeja com uma tigela, de mais ou menos 1 litro de sopa. Uma tigela de carne vermelha, cozida e mergulhada num molho escuro e grosso. Mais de 2 quilos de carne. E alguns potes pequenos com bebidas. Talvez sucos, talvez outras coisas. Ela colocou a bandeja sobre uma mesa de madeira negra que estava disposta no centro do quarto.

— Aqui está sua comida. 

"Que fofa. Mas por que ela corta o cabelo? Achei que quanto maior o cabelo de uma mulher nesse mundo, mais bonita ela era considerada."

Pensando nisso Qin Xa olhou para baixo e viu que seu cabelo já passava de um metro. "Eu sou linda! Maravilhosa! Encantadora!"

— Obrigado, irmã mais velha. — a boca de Qin Xa já estava cheia de água vendo aquela bandeija chamar seu nome, sussurrando palavras melosas e convidando a garota para devorar até a louça.

— Não precisa me bajular para ser bem tratada aqui, nós não desmerecemos aqueles que tem menos talento. — a garota disse de forma áspera.

— Bajulando? Eu? — Qin Xa não achava que seu nome e "bajuladora" pudessem se encaixar na mesma frase. — Não, não, não! Você já era discípula de Han Lining antes de eu chegar aqui, é claro que eu te chamarei de irmã mais velha!

Qin Xa acenou com as mãos em protesto.

— Hunf, pelo menos você sabe falar. Mas não adianta mesmo assim, apenas o seu esforço será compensado aqui.

— Eu já disse que não estou bajulando a irmã mais velha, por que não acredita em mim? — Qin Xa estava atordoada. Ela até parou de salivar.

O que há de errado com essa garota? Ela parecia bem simpática antes, mas agora parece alguém que acabou de levar uma surra da mãe. Como se estivesse com raiva de tudo e todos, e quisesse que o mundo explodisse em mil pedaços! 

"Hmm, será que isso é uma atuação? Ela quer que eu entre no personagem também?" Como ela estava em uma trupe, era lógico ela pensar que isso era uma atuação. 

Na verdade, as pessoas desse mundo gostavam bastante de testar os outros naqueles que eles eram melhores.

Pensando nisso Qin Xa ficou um pouco mais determinada. Se essa irmã mais velha queria que ela entrasse no personagem, isso ela faria! Faria com gosto! Ela entraria no personagem com vontade!

No final isso era um teste para os iniciantes, pensou Qin Xa. E a garotinha de olhos negros a encarou.

...

"Por que a mestra ainda está sendo gentil com ela mesmo sendo claro que ela é uma das piores de nós? Nem mesmo o pior de nós demorou tanto quanto ela para passar no teste. Não adianta aceitar uma discípula que nem sequer tem o que é preciso para herdar o Dao do Entretenimento!"

...

— Por que eu acreditaria em você? Se eu estivesse no seu lugar provavelmente estaria fazendo a mesma coisa.

Qin Xa sorriu sem jeito para isso. — Parece que a irmã mais velha me pegou. A sabedoria da irmã mais velha é tão grande quanto o monte mais alto do mundo, — Qin Xa não conhecia de ditados envolvendo montes. — eu só posso sentir vergonha de mim mesma por fazer algo assim. Mas por favor, irmã mais velha, cuide bem de mim enquanto eu estiver aqui. Aqui estão algumas ervas capazes de aumentar a purificação de Qi, pílulas de fortalecimento de Qi e uma arte marcial!

Com um sorriso adorável na cara, Qin Xa ofereceu os materiais para a garotinha, quase descendo da cadeira para se ajoelhar. 

"Vamos irmã mais velha, admita que não existe nenhuma lambe-botas igual eu nessas terras! ME ADMIRE!"

Um olhar azedo cruzou o semblante da garota e ela bateu o pé.

— Sem vergonha! Fique com isso você mesma, eu não preciso dessas coisas! — ela saiu do quarto com pressa, bufando e com o rosto vermelho.

Qin Xa ficou sem expressão. A cena ia mesmo acabar assim?

"Irmã mais velha, você não deveria pelo menos ter alguma coerência no personagem? Por que ficar tão irritada do nada? Não era para eu fazer o papel de bajuladora? Parece que cultivar esse Dao é bem mais complicado do que eu imaginei."

Qin Xa colocou a mão no queixo e pensou no que havia feito de errado. Na opinião dela era assim que um lambe-botas fazia as coisas. De uma forma humilde, humilhada, e nojenta. 

Será que ela não ofereceu coisas o suficiente? 

"Da próxima vez eu ofereço algum recurso da alma, assim ela não ficará tão decepcionada comigo, não é?" Sim, com certeza era isso! "Pessoas corruptas sempre vão fingir ser justas no primeiro momento!"

Mas a comida — como se estivesse brava — enviou seu cheiro delicioso contra o nariz de Qin Xa, cujos olhos brilharam. — Hehe, desculpe por ignorar você...

Mais tarde ela pensaria em como passar nesse teste, agora a prioridade mais importante era comer até se fartar!

*****

Logo após Qin Xa ter terminado sua refeição, e quando estava palitando os dentes, Han Lining voltou para o quarto com uma expressão complicada. Um pouco desconfortável também. 

O que será que aconteceu de ruim? Esse foi o primeiro pensamento de Qin Xa quando ela viu isso. Ela até ajeitou a postura e fez o palito sumir.

Apesar de ter um cultivo colossal, Han Lining — que dizia não ter emoções — era bastante expressiva. E isso fez Qin Xa se sentir um pouco desconfortável. Saber ler as emoções dos outros era legal, apenas quando eles estavam confortáveis. 

— Eu acho que você está com problemas com a sua seita. — Han Lining falou isso com um tom de desculpas, ficando de pé ao lado da mesa. Qin Xa franziu a testa.

"O que eu fiz de ruim? Eu vim a essa cidade, fui para as florestas, voltei, e estou aqui novamente. Tem alguma coisa de errado nisso? Por que eu estou com problemas? Quais são esses problemas? Eu não me lembro de ter causado problemas para ninguém... Será que Xin Can ainda me persegue porque eu sou pobre?! Espera, acho que ele não faz parte da minha seita..."

— Do que se trata, Mestra? Não lembro de ter descumprido nenhuma regra. Hmm? Será que me tornar sua discípula realmente vai contra as regras da seita? Entendo... — Qin Xa ficou um pouco ansiosa agora.

"O que você entende?" Han Lining quase deixou essa pergunta escapar. 

— Ah, não. Não é isso. — a mulher balançou a cabeça. — É que se passaram mais de 6 meses desde que você iniciou o teste, e eu sei que seitas não deixam que seus discípulos fiquem tanto tempo assim sem cumprir com suas obrigações.

— 6 meses! Por que se passou tanto tempo assim? E agora, o que eu faço? Se eles quiserem uma compensação por isso, eu não tenho nada para pagar! — mordeu a unha do dedão. — Então serei forçada a trabalho escravo! Eu não quero isso! 

Qin Xa sabia o quanto esse mundo era cruel, e escravos eram o que não faltavam por aqui como forma de "punição". Mas a escravidão nesse mundo era muito mais cruel do que em sua vida passada. Por mais que parecesse impossível uma coisa dessas.

Aqui as pessoas eram submetidas a uma subjugação da alma que forçava a mente dos escravos a obedecerem qualquer ordem de seus mestres, não importa qual seja! Não era apenas uma corrente nos tornozelos e um chicote nas costas! 

Qin Xa não queria ter que passar por uma experiência dessa apenas por algo tão pequeno quanto se atrasar. 

Parece que vai ser o jeito se tornar uma fugitiva... 

"Como que ela chegou a conclusão de que iria ser forçada a escravidão apenas por não cumprir com uma de suas tarefas?" Mentalmente Han Lining encarou Qin Xa com um olhar de puro julgamento.

Essa garota era peculiar. Não de um jeito bom.

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