Transcendendo a Existência Brasileira

Volume 2

Capítulo 123: A Peça; Perguntas

 

Assim que as cortinas vermelhas se abriram, Qin Xa lembrou que nesse mundo havia muitos ditados, gloriosos e cheios de sabedoria — muitos deles, outros, nem tanto — porém, havia um que lhe chamou um pouco de atenção. 

Provérbios são a sabedoria do povo, mas nem por isso eles estão certos.

Engraçado, porém, que esse ditado era inútil nesse mundo. Afinal, por aqui havia uma sabedoria de milhares de anos, logo, um outro provérbio que ela ouviu da professora que a ensinou a falar, possuía muito mais significados com a situação atual. 

A dor é para aqueles que podem sentí-la.

...

Na grande cama de lençóis brancos, no meio da noite silenciosa, a plateia foi engolida por murmúrios espantados, enquanto Lin Xi cobria seu corpo nu, e lentamente se levantava do lado de Zhao Piao — que dormia agarrado com um dos travesseiros.

Ela observou o rapaz, antes de se levantar e ir caminhando devagar até a penteadeira. Ficando frente ao espelho, a moça se encarou. Levou a mão até a virilha, por alguns segundos. 

Mordeu os lábios vermelhos e apertou os panos contra o próprio corpo. Levantou de súbito, com uma ânsia doentia dominando seu rosto que ficou pálido, e correu até uma sala lateral ao quarto, onde os sons de engulho foram ouvidos um após o outro. Junto com fracos gemidos, sua garganta sofreu ao se livrar do que quer que ela sentisse.

Enquanto Zhao Piao dormia profundamente, os barulhos molhados e agonizados ecoaram pelo quarto, abafados pela parede que havia entre os dois. Porém, mais do que altos para a plateia.

Minutos depois, Lin Xi voltou ao quarto, se escorando brevemente na parede — sua pele brilhou com uma camada molhada de água, enquanto as pontas de seus cabelos pareciam pesadas. Ao voltar a cama, encarou novamente Zhao Piao. 

— Pai... por que eu fiz uma coisa dessas? — o silêncio da noite engoliu suas palavras mal pronunciadas, e as cortinas se fecharam, enquanto ela voltava a se deitar. Seu olhar se fixando no homem cujos cabelos se enroscaram em seus delicados dedos finos. 

Queria saber porquê vomitou? Queria saber porquê compartilhava a cama com um homem? Queria saber a origem do seu desgosto? 

Queria. Respostas, porém, não teria.

"Eu sabia... realmente escolheram esse desenvolvimento..." Qin Xa abaixou os olhos enquanto as cortinas voltaram a se abrir, e olhou para a barriga. Lugar onde acreditava estar seu Mar de Qi.

Estava selado, definitivamente estava, afinal nada saía ou entrava sem sua ordem. Porém, por que seu corpo estava tão recheado de Qi?

Por baixo da sua pele, sobre ela, impregnado em seu sangue, cercando seu suor. Exalado em sua respiração, e circulando junto com seus pensamentos. Ela estava transbordando de Qi! 

"Maldito, eu já mandei ficar quieto! Agora não é hora para suas brincadeiras! Se eu disse para ficar preso, então faça isso quietinho!" Suas energias congelaram rapidamente, mais rápido do que Lin Xi conseguia reagir ao ver suas irmãs entrarem no quarto com sorrisos inocentes.

Todo o controle de Qin Xa quase desapareceu quando as 3 garotas olharam para sua irmã, na cama com um homem. Lin Xi olhou de volta para elas, deixando a expressão de Qin Xa pálida de horror. Elas estavam paralisadas. "Merda! Tinha que ser justo agora?! Fica quieto! Fica quieto! Fica quieto!”

…

— Lin Xi... — Lin Chaoyan começou, mas Lin Ji de repente pegou ela e a irmã pelo braço e arrastou as duas pra fora do quarto, com a mesma intensidade com que Lin Xi pulava da cama.

— Espera! Meninas! Venham aqui! Esperem! — Lin Xi quase chegou a abrir a porta na carreira que deu, mas vendo seu estado nu, correu para o armário, sob o olhar sonolento de Zhao Piao que levantou assustado da cama. — O que aconteceu?

— Minhas irmãs nos viram! — batendo de mão a uma roupa simples, se vestiu com rapidez e desespero na voz. — Mas são suas irmãs, por que ficar tão preocupada? Nós não iríamos revelar isso para elas mais tarde?

Lin Xi o encarou, movendo suas asas brancas para se ajustar a roupa, e parou. — Mas elas não sabem que é você! Quanto tempo faz que elas te viram por aqui? E eu não deveria estar com você na minha cama!

Correndo, sua figura deixou o seminu embasbacado... ele se vestiu também, com movimentos ainda mais rápidos. E com o fechar e abrir das cortinas, as irmãs Lin se trancaram no quarto, ofegantes da corrida.

— Lin Ji, por que você puxou a gente?! — Lin Ning indagou procurando saliva para molhar a garganta, com metade do fôlego recuperado, mas tão cansada quanto sua vizinha que também encarou a irmã do meio.

— Não sei... – sob os olhares enraivecidos, Lin Ji cruzou os braços. — Por que vocês queriam ver a Lin Xi com aquele homem?

— Eu não queria! — Lin Chaoyan retrucou de imediato, mas sua caçula não fazia ideia do assunto em questão. — Por que Lin Xi estava dormindo com aquele homem? 

As duas garotas mais velhas em uma pergunta silenciosa voltaram seus rostos para a mais nova, que ficou surpresa ao se ver encarada. 

— Lin Ning, você sabe. — Lin Chaoyan falou sem jeito, como se esperasse que a garota soubesse algo do assunto, enquanto sua irmã mais nova balançava cabeça. — Eu sei o que? Eu vou perguntar a Lin Xi! — virou-se de costas em um giro rápido, já querendo abrir a porta.

— Não!

— Não! 

Segurada pelos ombros, as vozes alarmadas de suas irmãs fizeram a pequena parar. — Lin Xi está ocupada. Você não pode atrapalhar ela de...

Benk!

— Me atrapalhar de quê? — Lin Xi questionou, abrindo a porta com força, dando um susto nas três. — Lin Xi... oi...

Lin Chaoyan começou a dar passos curtos para trás, arrastando Lin Ning, que tentou se soltar. E Lin Ji, essa não se deu ao trabalho de fazer nada. Apenas olhou para a irmã mal vestida, que também não estava com tanto fôlego para uma frase longa.

Lin Xi suspirou, e começou a abrir a boca, apenas para ficar calada quando Lin Ji fez sua pergunta.

— Lin Xi, por que você estava com um homem na sua cama!? E quem era ele? — Reta, dura e sem nenhuma enrolação, a pergunta matou as palavras que Lin Xi estava formando.

As 4 garotas se entreolharam, com Lin Xi começando a ficar vermelha. E sem nem uma dúvida querendo negar aquilo, seus lábios se abriram e se fecharam várias vezes, querendo falar algo, ficar calada, gritar e se esconder ao mesmo tempo. Ela realmente não queria falar nada e apenas negar.

Fechando a porta atrás de si com cisma, Lin Xi respirou fundo. Encarou as irmãs pronta para explicar tudo da melhor forma possível, certa de que teria que proteger a inocência delas. 

Sua postura trêmula, mas ereta disse que ela iria explicar tudo e qualquer coisa ali e naquele momento! Seu rosto estava sério, com suas sobrancelhas unidas em uma carranca preocupada. Ela iria fazer isso para não causar problemas!

— Olha a hora, a gente precisa tomar o desejum depois dos 3 dias de luto. Vamos para a mesa que os serviçais já prepararam tudo para nós comermos. Vamos...

Confusa, ela abriu a porta e saiu na frente, sem nem olhar para trás. 

Sua coragem desapareceu sem deixar vestígios, tanto que ela apressou o passo, mesmo chamando as garotinhas. As irmãs mais velhas se encararam, enquanto a mais nova acompanhou com a cabeça baixa, parecendo não entender nada do que estava acontecendo e mandando Lin Xi esperar por ela, uma tristeza ecoando junto com sua voz aguda. Falar do luto tirou um bocado da sua animação.

— Por que ela fechou a porta se ia abrir de novo? — Lin Chaoyan deu um passo para fora do quarto, e atrás dela Lin Ji só conseguiu murmurar: — Não sei. Mas ela fez alguma coisa errada! Olha como ela está andando rápido. Nós temos que fazer ela falar!

As cortinas se conectaram, preparando os atores para o próximo ato, e enquanto o pequeno intervalo de descanso que os olhos da plateia tinha ocorria, Qin Xa se mordeu.

Finalmente mandando seu Qi para as profundezas mais obscuras do seu corpo, trancado por seus meridianos que agora estavam mais do que nunca fechados. Qin Xa já estava exausta de ter que repetir isso uma vez após a outra, e mesmo assim o Qi ficar maluco e sair do seu controle. Que maldição era essa que essa peça possuía?! 

"Seus desgraçados, eu sempre brinquei com vocês e nunca precisei agarrar, capturar vocês da natureza e trancar dentro do meu corpo! Se quer sair então saia, mas faça isso sem me matar!" Ela reclamou, querendo saber se a energia toda poderosa e onipotente reconheceria suas ordens.

E pelo visto não, porque assim que ela abriu um dos meridianos, ele estourou, fazendo ela gemer e trancar ele novamente. Seu braço ficou roxo, mas sua regeneração fez a cor voltar ao normal em instantes.

O Qi ainda estava furioso e querendo sair do seu corpo, enquanto causava destruição e desvios. Se ela deixasse ele livre, sua fundação ser destruída era uma realidade que se aproximava a passos largos. E ver seu braço inteiro mudar de cor apenas porque um dos meridianos estourou, fez suor frio cobrir seu corpo enquanto ela tremia de pavor, pensando no que aconteceria se isso fosse em seu corpo inteiro.

Cansada, coisa que era estranha para quem estava parada, Qin Xa tentou pensar sobre a última cena, porém, as cortinas revelaram a mesa de refeições, com Lin Xi sentada no lugar de sempre, ao lado de suas irmãs, enquanto a cabeceira ficava vazia.

Aquele era o lugar de seu pai, ele sempre sentou ali e nunca comeu em outro lugar que não fosse aquele. Mas ele permaneceu vazio desde que Branco foi para a guerra, e mesmo que agora ela fosse a dona legítima de tudo, que falta de respeito seria sentar no lugar de seu pai.

Nenhuma das irmãs ousavam ocupar aquele acento. Nunca na vida!

Mas agora a atenção delas não estava na cadeira vazia, mas sim na presença do homem estranho que deixou as mãos por baixo da mesa, sentado de frente para as quatro, enquanto olhava brevemente para cada uma antes de abaixar os olhos e focar nas refeições. 

Pigarreando levemente para quebrar o silêncio, o homem teve vontade de iniciar a conversa, mas Lin Chaoyan foi mais rápida.

— Por que você está aqui!?