Transcendendo a Existência Brasileira

Volume 2

Capítulo 122: A Peça; Promessas de Horrores

 

Lin Xi limpou suas lágrimas e não se levantou. Encarando Zhao Piao, ela tentou suprimir seus sentimentos e foi diretamente ao ponto, ao ponto mais doloroso. 

— Pedir desculpas não me faz ter meu pai de volta. Não vai acabar com a minha dor... e nem irá mudar o fato de você não ter me contatado nem uma vez nos últimos meses. Nunca nem mesmo enviou qualquer sinal de que ainda me considerasse sua noiva...

— Eu considero! — Zhao Piao caiu de joelhos aos pés dela, segurando suas mãos sobre o Coelho Crepúsculo. — Não teve um dia em que eu não pensei em ti... de verdade. Todos os meus pensamentos estavam em você, todos os dias, nos últimos meses... mas não havia nada que eu pudesse fazer. Meu pai me aprisionou, me obrigando a sofrer nas mãos de um torturador que se dizia ser um mestre marcial... Eu fui um homem fraco demais em minha vida e até mesmo minha liberdade foi tirada de mim... porém, eu sempre encontrei forças ao pensar em você. Foram meus breves momentos ao seu lado que me deram forças... 

Lin Xi afastou as mãos dele após algum tempo. E Zhao Piao abaixou a cabeça, escondendo seu rosto.

— Sim... eu sei que se eu fosse forte desde o início, isso não teria acontecido... se eu tivesse treinado desde jovem nunca passaria por isso, se eu percebesse as intenções do meu pai, não iria ficar trancado em casa... O que aconteceu comigo é somente culpa minha...

Zhao Piao ergueu o rosto, encarando Lin Xi nos olhos com intensidade fervente.

— Por isso eu prometo. Nunca mais algo assim irá acontecer! Eu juro nunca mais ser fraco o suficiente para ser trancado em minha própria casa, ou serei lento para deixar suas lágrimas caírem por minha culpa novamente! 

Lin Xi mordeu os lábios. — Mentiroso...

— Não é mentira. Enquanto o céu estiver sobre a minha cabeça, eu serei o homem que protegerá você. E mesmo que ele caia, eu ainda não sairei do seu lado. Nem hoje, nem nunca enquanto vida eu possuir...!

As palavras de Zhao Piao foram altas e fortes, fazendo o ar reverberar e Lin Xi chorar silenciosamente com as promessas, enquanto apertava suas mãos.

...

E na plateia, Qin Xa estava abismada, apertando os punhos com ódio. "Não. Não. Não. Não! Não é assim que se resolve o problema, seu imundo! Por que alguém iria seguir esse desenvolvimento nessa altura da peça?! Pare! Tem que parar aqui!"

A horrível e desgastante sensação de que algo muito ruim estava prestes a acontecer rastejava por baixo da pele dela, mais incômoda que seu Qi enlouquecendo. Qin Xa tinha certeza absoluta que Zhao Piao iria fazer uma coisa horrível nessa cena, e toda essa desgraça iria tornar a situação ainda pior!

Não precisava continuar desenvolvendo o relacionamento deles, bastava que eles tivessem uma briga, e se separassen! Apenas isso, Qin Xa implorou em sua mente. Esse era o desenvolvimento perfeito!

Se esse relacionamento maldito não continuasse, essa ansiedade horrorosa iria desaparecer de uma vez! Já havia desgraças demais nessa peça, não precisava continuar fazendo Lin Xi afundar mais nesse mar de tormentos!

E não era apenas Qin Xa que pensava que esse seria um bom desenvolvimento! Por todos os lados, os espectadores tinham expressões incomodadas quando olhavam para os olhos sintilantes e chorosos de Lin Xi. Aqueles lindos olhos estavam repletos de... confiança! 

Por que essa confiança causava tanto horror em seus corações?! Por que o discurso de Zhao Piao era tão intenso, lindo... e ao mesmo tempo imundo? Grotesco...

Qin Xa respirou fundo para se acalmar, mas as palavras de Lin Xi trouxeram para ela uma onda intensa de horror. Essa atriz... quem foi o amaldiçoado que ensinou ela a atuar tão bem? Estava boa até demais! Por favor, essa peça deveria parar de ser tão horrendamente boa!

Qin Xa encarou, desgostosa, o desenvolvimento maldito desse relacionamento. 

— Zhao Piao... por que o General Vermelho matou meu pai? — ela chorou, enquanto Zhao Piao começou a secar suas lágrimas com um cuidado gentil. — Eles eram amigos... todos éramos família... por que o seu pai tirou o meu de mim...

Lin Xi não conseguiu conter o choro e desabou, e Zhao Piao em uma ação desajeitada e atrapalhada envolveu ela em um abraço. — Eu não sei... eu não reconheço mais aquele homem...

Com seu rosto enterrado no peito do rapaz, a jovem apertou suas roupas, se expondo em voz trêmula, com uma súplica cortante, dolorida. — Não era para ser assim... meu pai não merecia morrer desse jeito...

— Por que isso aconteceu com a minha família? Eu sinto falta dele quando vou jantar... eu escuto sua voz quando entro no escritório... O que eu vou fazer sem o meu pai? Isso não é justo... eu não quero ficar sozinha... minhas irmãs ficam sorrindo perto de mim, mas eu sei que todas as noites elas vão dormir só depois de chorar muito! Zhao Piao... por quê?

Em meio aos choros e ações desconfortáveis, o narrador entrou em cena com sua voz agora solene. E com isso, um teatro de marionetes se levantou, com os personagens entrando em cena imediatamente.

— Naquele momento Zhao Piao só abraçou ela, tentando confortar a garota que aos poucos desmoronava em seus braços, sem ter chão para pisar e céu para se apoiar. Verdade seja dita, ele não tinha noção do que dizer ou fazer nesse tipo de situação. Não fazia ideia do que ela estava passando em seu coração ao viver o luto do próprio pai, que foi morto nas mãos do homem que era para ser seu sogro... tal situação deixaria qualquer um incapaz de agir.

Quando a mãe dele morreu, Zhao Piao era jovem demais para perceber o quão doloroso era aquilo, e ele não recordava como se sentiu. Ele nem lembrava de verdade da sua mãe, mas seus empregados mais velhos e velhos conhecidos dela sempre falavam de sua figura e personalidade. Lembrar do que fizeram por ele quando sua mãe partiu era muito impossível, e agora Zhao Piao precisava apoiar sua mulher de algum jeito... 

Sem dúvida alguma, Zhao Piao estava travando uma batalha interna muito extenuante..." o narrador completou, e Qin Xa quase cuspiu.

Essa atuação... era de dar ódio ver o quão sutil eram cada uma das micro expressões que faziam de tudo para causar desconforto nela...

Essa atuação definitivamente era uma das coisas mais destrutivas que Qin Xa já viu. "Se uma pessoa que domina a sedução já é capaz de deixar um desavisado completamente perdido... com essa atuação derrubar países e instaurar o caos na sociedade é como estalar os dedos... até eu quero consolar a garota e esmurrar esse cafajeste, o que um inocente não iria querer fazer?"

Por que odiar tanto Zhao Piao? Ela não sabia. Mas odiava ele e isso não iria mudar! Se ela odiava, havia um motivo. E se havia um motivo, ele merecia ser odiado! Ver Lin Xi naquele estado, e vê-lo não fazer nada além de usar palavras para tentar confortar ela...

Era repulsivo!

Mas Qin Xa sabia que isso era apenas uma peça! Tudo aquilo não passava de uma atuação, uma atuação realista demais, e com detalhes demais nas cenas! Então não fazia sentido querer levantar e ir xingar o ator.

Ela só poderia tentar relaxar e guardar seus pensamentos violentos. 

Ao cair do teatro de marionetes, as duas figuras, solitárias, naquele pátio pintado com panos brancos foram reveladas.

— Você não vai ficar sozinha... — Zhao Piao consolou. — Eu vou estar aqui por você e não vou te deixar sozinha nunca, Lin Xi. Se o seu pai não está mais aqui, então eu irei fazer de tudo para te dar carinho e amor... 

Lin Xi não respondeu de imediato, apenas seu lamento era ouvido. E com isso as cortinas ameaçaram se fechar... dando ao público um pouco de tempo para absorver essa cena. 

— Carinho e amor... como você vai me dar isso se quando eu precisei, você nem estava aqui? Você sabe quantas vezes eu chorei, quando vi minha casa vazia? Você não pode me amar como meu pai me amava... — as cortinas pararam, e o público se remoeu.

Zhao Piao paralisou por um momento antes de responder. — Eu te amo. Eu me arrependo profundamente de não ter estado ao seu lado... mas eu vou estar com você daqui em diante. Eu juro fazer isso... se você me permitir. 

Lin Xi o encarou nos olhos, enquanto os seus se derretiam em lágrimas e assentiu fracamente. Se entregando ao sentimento, ela abraçou ele com força, num abraço muito apertado, querendo nunca mais soltá-lo! Tanta força que fez Zhao Piao ficar um pouco desconfortável. 

Mas ele não a afastou. Suportou o aperto dela e alizou seus cabelos longos, lisos e finos. Passando os dedos por entre seus fios, ouviu sua voz fraca.

— Promete que não vai me deixar... 

— Prometo.

— Promete que vai me amar para sempre...

— Eu prometo. E eu já te amo há muito tempo. E eu sei que vou continuar te amando por toda essa vida. E na próxima também...

Lin Xi não sorriu, mas parou de chorar e fez um último pedido.

— Se isso é verdade... então prove... prove que você me ama de verdade...— Zhao Piao ao ouvir isso pareceu pensar. Hesitou. 

— Sim. Se eu te amo, não tem nada que eu não possa provar para você...

Zhao Piao, ao mesmo tempo que as cortinas se fechavam com pressa, baixou sua cabeça e diante do público, beijou a mulher em luto. Com ela em seus braços, os dois uniram seus corpos.

As cortinas se fecharam, trazendo um silêncio mórbido ao teatro. E nesse momento, como um sussurro do demônio, o narrador se manifestou mais uma vez com sua voz encantadora.

E isso quase causou náuseas em Qin Xa, que por pouco não conseguiu segurar seu Qi prestes a explodir dentro dela! Vermelhas e estranhas, aquelas cortinas pareciam esconder algo macabro além da conta.

E um resquício dessa monstruosidade escapou, na forma de uma voz!

— Com essa ação, a fortuna lavou as mãos para o casal... e o Destino começou seu trabalho. No primeiro ato rumo ao final dessa peça patética, teremos o Choro de Sangue. Sejam bem-vindas todas as dores e desgraças que todos irão sofrer por suas ações!

Nas zombarias do narrador, o silêncio envolveu o palco como uma mortalha.

Essa atuação transcendia a atuação como Qin Xa conhecia com uma facilidade imensa. Na sua primeira vida todos que tinham meio cérebro sabiam que uma atuação era uma atuação, e havia um distanciamento entre o público e o personagem. 

Era o natural, afinal não era possível gostar de um personagem verdadeiramente como se gosta de uma pessoa real... "Bem, tem aqueles doentes mentais que acham que personagens são pessoas reais, mas acho que eles são a exceção da exceção. Ninguém deveria gostar de um personagem!"

Mas essa atuação ultrapassou esse nível... assistir isso, era pior do que assistir uma pessoa realmente sofrendo. Tão medonho era ver o desejo de ajudar, ser sobrepujado e derrotado pela curiosidade de saber o desfecho disso...

E Qin Xa se viu presa ao acento em que estava pela sua própria curiosidade em saber — saber o que viria em seguida nesse espetáculo inconfortável. 

Ao abrir das cortinas, Qin Xa iria entrar num ponto dessa peça, em que iria se arrepender profundamente de ter começado a assistí-la em primeiro lugar. E ela já começou a sentir isso...