Volume 2

Capítulo 113: A Peça; Irmãos, Filho e Pai

 

— Meu Irmão... por que você fez uma coisa dessas? — guardando o pergaminho real, Branco suspirou e se abateu, procurando encontrar uma posição confortável em sua cadeira e não achando.

Seus olhos pousaram no Coelho Crepúsculo que recebeu de presente, que levantou as orelhas e observou a porta ser aberta. E de lá, uma jovem de pele clara, possuindo asas completamente brancas surgiu.

— Pai... posso saber como está a situação? — Lin Xi indagou, um pouco mais pálida do que o normal para sua pele já muito branca.

Branco ficou incomodado com essa visão. Sua filha que semanas atrás era radiante e corada, sofreu duas tentativas de assassinato... e aos poucos também emagreceu e perdeu um pouco da sua graça e encanto inocente.

— Você passou a noite em claro mais uma vez? 

Lin Xi não respondeu, e inconscientemente buscou o animal que sempre estava em seus braços. Mas agora aquele espaço preenchido por uma presença quente estava vazio.

— Eu dormi um pouco... — Branco encarou ela e suspirou.

— Sente-se... nós precisamos ter uma conversa importante minha filha. — Ao levantar e puxar a cadeira, Branco viu a garota assentar-se, confusa.

— Sobre o quê-

— O seu casamento com Zhao Piao foi cancelado. Eu decidi isso.

Lin Xi ficou muda. Encarou o pai. Abriu a boca e não encontrou palavras... passou-se segundos em silêncio até que os nós de seu dedos ficassem brancos, e lentamente pequenas lágrimas brotaram em seus olhos.

— Certo... — O General Branco parou por um momento, e confuso, sentou-se também. 

— Eu sei que isso é cruel, minha filha. — ele começou, com tom rouco e cuidadoso, uma luta para falar. — Mas a decisão do General Vermelho condenou toda a sua família... mesmo que ela pare agora... certamente haverão consequências terríveis. Eu não posso entregar você para um noivo que tem um alvo nas costas...

Lin Xi fungou, não escondendo suas lágrimas. Ela assentiu, fazendo o coração do pai sangrar. Todos que prezavam por suas filhas sabiam como era horrível a sensação de ver elas chorando por conta de casamentos infrutíferos, que deveriam acontecer mas o destino não quis.

Não havia esperança em lutar por esse casamento... e fazer isso era o mesmo que escolher morrer. 

...

Qin Xa não conseguia entender a dor de um pai... A última vez que ela viu uma garota chorar... bem, não importa mais. Não era a mesma situação.

Ela observou Lin Xi levantar o rosto, uma lasca de esperança ameaçando brilhar em seus olhos. E isso... foi o início dos horrores na vida de Lin Xi.

— Eu posso pelo menos ver ele? Apenas uma vez...

— Não! — ao contrário da voz rasa e insegura da garota, seu pai manteve o tom duro, fazendo ela morder os lábios e se levantar, caminhando para fora da sala com passos rápidos e leves.

Ela não poupou forças ao bater a porta. Sua figura desapareceu do palco.

General Branco pegou o pergaminho real e o leu em voz alta... como se tentasse se convencer de que aquilo era tanto seu dever como general, como sua obrigação como homem.

A ordem era para negociar com seu velho e antigo amigo... 

Ele enrolou o pergaminho e pegou sua espada, assim como sua armadura branca. — Meu Irmão... veremos o que você tem a dizer sobre suas ações...

As cortinas se fecharam, e os tambores vibraram, com sons estrondosos. A plateia inteira pulou de susto quando uma intensão de morte pesada dominou o palco. A plateia. 

O cheiro de sangue e o gosto do medo e desespero preencheram as bocas. Uma camada de suor cobriu seus corpos trêmulos e pálidos. 

O som das espadas se chocando reverberou, e as cortinas se abriram, revelando um cenário caótico, com guerreiros espalhados por todos os lados, engajados em lutas ferozes e sangrentas.

E entre eles, no meio do campo do que parecia ser o cenário onde uma guerra aberta iria acontecer, duas figuras se mantinham dignas acima de suas montarias.

Não havia qualquer aura de Qi vazando deles, mas suas presenças eram sufocantes. Era apenas homens comuns, mas que carregavam a presença de um guerreiro que viveu mil anos.

— Meu velho amigo, em nome do rei eu vim lhe entregar uma mensagem! — vossiferou Branco. — O rei ordena que você pare esse movimento de revolta imprudente que coloca em risco a soberania do nosso reino! Ele está disposto a aliviar sua punição por essas ações, caso se renda agora e mande esse exército recuar!

A tensão entre os dois exércitos, que no palco eram uma pintura borrada e ao mesmo tempo macabramente realista, se tornou mais densa.

Na plateia, Qin Xa entendeu pela aura do campo de batalha que eles não estavam preparados para lutar. Mas se lutassem, o General Branco seria brutalmente derrotado. Que situação...

Vermelho manteve os olhos fixos no outro general. Sua voz ecoou, nem calma nem nervosa. Complexa. Mas havia uma pitada de frieza e raiva em seu tom.

— Branco, eu não irei mais baixar a cabeça para um rei sem visão. Você passa pela mesma humilhação que eu, sabe das minhas razões melhor que ninguém... junte-se a mim nessa batalha! Como antigamente, podemos dominar esse campo de batalha... e eventualmente, o reino inteiro!

— Uma rebelião não é a solução que nosso reino precisa! Eu não irei sacrificar minha família por essa luta, para isso há nossos ministros na cidade real, eles que lutarão usando as leis para impedir que nosso reino se torne ainda mais pobre. 

— Então me responda, onde está o fruto de toda a luta desses ministros? — Vermelho balançou a cabeça. — Eu mesmo irei tomar o poder real em minhas mãos e colocar um rei digno no trono! Não há o que negociar com um rei incompetente e nobres imbecis e gananciosos, que preferem sacrificar o próprio reino à perder sua riqueza!

A lança do Vermelho brilhou sob a luz do sol, quando ele a empunhou, e erguendo ela em direção do Branco — um sinal de desafio irremediável... o homem tomou sua decisão. 

— Mesmo que eu morra, mesmo que eu falhe, o que não vai acontecer, eu irei lutar! Não haverá negociações...

Branco também desembainhou sua espada, fazendo o fio da lâmina parecer ainda mais frio ao ser tirado da bainha.

— Parece que não teremos mais nada entre nós além de boas lembranças... Homens! Não permitam que eles recuem ilesos!

Com as armas erguidas, uma batalha estourou num ponto ainda mais caótico do que já estava, fazendo imediatamente dezenas de soldados se perfurarem com suas armas.

Uma espada decepou um braço, enquanto uma garganta era cortada.

Um coração foi perfurado e os Generais não se moveram, os dois distribuíram ordens enquanto Vermelho recuava para sua fortaleza. 

O palco ficou coberto de sangue, flechas, espadas, membros decepados... corpos empalados, vidas jogadas ao nada. 

...

Qin Xa quase vomitou vendo essa brutalidade mais uma vez... não, era sua primeira vez vendo algo nesse nível! 

Grotesco, nojento, injusto e maldoso ao extremo. Essa era a arte da guerra. Repulsiva!

Pintando o chão com lágrimas e o líquido da vida.

Impregnando o ar com o cheiro macabro do sangue.

E dentro de corações, fazendo amor se transformar em ódio. 

Os gritos fizeram ela se remexer. "A apresentação teve atuação, música, pintura, poesia, contação de histórias... mas nesse mundo a arte é muito mais macabra. Aqui há beleza até na morte... A arte da guerra é a pior das artes."

...

Enquanto os dois lados se matavam, as cortinas se fecharam e a música intensa se transformou em uma muito mais pesada e sombria. 

Zhao Piao se esgueirou na penumbra noturna, ao que os panos vermelhos revelavam seu pátio escuro.

A plateia soltou um suspiro de admiração ao perceber a magnificência das pinturas que a cada poucos passos de Zhao Piao, mundavam de forma sutil o cenário atrás dele.

Parece que ele estava tentando fugir de casa. Luzes apagadas queriam dizer que estava de noite, enquanto seus movimentos suspeitos indicavam seu pavor de ser capturado. E sabendo da última cena, a última coisa que Zhao Piao precisava era ser capturado por seu pai...

Zhao Piao escalou, suando e respirando com dificuldade, o muro de casa, e ao pular do outro lado, escorregou a mão e caiu de cara, mas em um movimento fluído rolou no chão.

Correndo com agilidade, ele atravessou ruas, se ocultando das patrulhas, que conversavam entre si, para passar o tempo. O garoto estava dando o seu melhor para não respirar alto demais.

— É questão de dias para sermos convocados também...

— Não me admira que o general tenha levado tão poucas tropas para o encontro, ele já estava preparado para lutar e recuar para a fortaleza...

Zhao Piao que estava escondido colocou a mão no peito ao ouvir aquilo. Ao que parece seu pai já estava pronto para uma luta e previu isso com perfeição.

Além de ter recuado para sua fortaleza e vencido o primeiro confronto. 

— Não pense nisso. Tudo o que eu preciso fazer é deixar os muros da propriedade... — depois da partida dos guardas, seus passos se tornaram ainda mais cautelosos e depois de dar várias voltas, ele chegou aos muros da casa dos Zhao.

O garoto estava olhando para todos os lados, em busca de qualquer coisa que pudesse atrapalhar seu caminho, suor frio escorria pelo seu pescoço e testa.

— Pronto... depois daqui eu posso relaxar. — tomando forças, ele correu um pouco e pulou contra o muro, usando todas as forças do seu corpo magro, suas mãos esticadas para se segurar no topo.

Aquele era um pulo simples e brusco, mas que fez Zhao Piao ficar completamente paralisado quando... assim que ele se apoiou e estava prestes a usar as pernas, um barulho alto irrompeu a noite.

O rapaz imediatamente viu sombras surgirem de todos os lados, enquanto uma luz forte cobriu ele, como um castigo dos céus que revelava sua pobre e desesperada figura.

Em instantes uma espada estava contra seu pescoço. 

— Você... — uma voz fria por baixo de um capuz expressou espanto. — Jovem mestre... parece que o general tinha razão mais uma vez.

...

Qin Xa franziu os lábios e balançou a cabeça, sentindo que isso não teria um bom final. Que tipo de general não espera por uma traição? E principalmente vinda do noivo da filha do seu inimigo...

Esse garoto era inteligente... mas deixar uma coisa dessas passar não ajudava em nada ele. Era sua vida que estava em jogo, por que não pensar em toda a situação com calma e frieza?

...

— Por quê?! Não havia alarmes nos muros! — esbravejou o moço, desesperado, enquanto era contido por dois guerreiros que agarraram seus braços.

Uma das figuras negras, vestidas de preto, respondeu, após mandar levarem seu mestre de volta ao seus aposentos.

— O General Vermelho nos ordenou a fazer isso dias antes da sua partida... jovem mestres Piao, você é ingênuo se pensa que pode deixar a propriedade e entregar informações ao inimigo!

Zhao Piao ficou branco ao ver uma mão ligeira entrar nas suas roupas e pegar uma carta. — Devolva isso! É uma ordem! 

— Fique calmo, jovem mestre. Eu não posso obedecer suas ordens depois do que acabei de ver... — a música tensa e agitada parou, enquanto o homem de preto abria a carta, Zhao Piao ficava ainda mas horrorizado, e as cortinas ocultavam o restante da peça.

O ambiente da peça estava silencioso. Um silêncio estranho e mórbido, causando aversão em Qin Xa. Ela nunca se sentiu tão incomodada, tão tensa, com um ambiente que nem estava sentindo nessas últimas horas.

E por razões incompreensíveis, os mais velhos eram quem intensificavam esse incômodo em 10 vezes! Experiência de vida? Talvez reconhecimento por essa ser uma situação sem solução? Ou o pior... eles já conheciam essa história?

Qin Xa tinha certeza que havia centenas de pessoas suando frio de nervosismo. Era como assistir uma briga de perto. Ninguém conseguia ficar calmo de verdade, e ela podia apostar que muitos estavam com os pés e mãos molhadas. 

Ela observou como as cortinas se abriram mais uma vez, a única coisa que parecia ser óbvia nessa peça, e não houve música. 

CLANG! CLANG! CLENG! GLANT!

Porém, o barulho que Zhao Piao estava fazendo ao tentar romper as grades da sua sela, ecoavam mais do que o som de um tambor.

Ele se mexia, se sacudia, e sacudia as barras de metal que continham sua liberdade. Era selvagem e bruto em suas ações. 

Porém, tudo era inútil. 

Zhao Piao suspirou. Sentou-se emburrado na cama simples da cela.

— Parece que eu não fui claro o suficiente com você... meu filho, o que fez você pensar em fugir de mim?

Raiva, desprazer e uma intenção assassina densa misturada com nojo surgiu na cela. E junto disso, a voz baixa e pesada do General Vermelho...

Zhao Piao levantou de supetão, encarando a porta da prisão que ao abrir, revelou a figura irada do General Vermelho. Com passos rápidos a figura dele atravessou a cadeia e chegou em frente a cela.

— Pai...

— POR QUÊ?! POR QUE VOCÊ NÃO ACREDITA NO SEU PAI, ZHAO PIAO?! 

Zhao Piao se encolheu diante o berro estridente, e para seu horror, a sela da cadeia foi aberta por seu pai que em sua fúria, estava quase arrancando a tranca nos dentes. Mas em segundos o cadeado caiu no piso de madeira... e o monstro entrou na jaula. 

Zhao Piao cambaleou contra a cama e caiu, mas se levantou com urgência, sem saber para onde ir. Se encostando na parede e engolindo seco, encarou o homem cujo rosto era uma máscara de escuridão.

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