Torture Princess Japonesa

Tradução: MatheusPD

Revisão: MatheusPD


Volume 1

Capítulo 2: Um Jogo Infernal

Tendo se acostumado ao seu novo mundo e sua nova situação, Kaito se deu conta de várias coisas.

Para manter a estabilidade de sua alma, o corpo de golem que Elisabeth criou para ele automaticamente traduzia as coisas em palavras as quais ele já estava familiarizado. Como resultado, ele podia não só ler e falar a lingua deste estranho mundo, mas também entender a grande maioria também, entretanto a tradução nem sempre funcionava na perfeição.

Algumas vezes Elisabeth se referia a coisas não como seus nomes são pronunciados na língua desse mundo, mas sim em uma forma de dialeto arcaico. Quando isso acontecia, Kaito escutava estas palavras como se fossem em outro idioma. Além disso, alguns objetos possuíam nomes familiares com os quais estava acostumado, mas eram completamente diferentes, por exemplo, com exceção ao sal, pimenta e açúcar, a maioria das especiarias tinham gostos completamente diferentes de seu antigo mundo. Quando ele tentava usá-los do mesmo modo, o resultado era desastroso.

— ...E é por isso que minha comida é tão ruim.

— Aaaah, mas não tem como isso ser o único motivo. Sua técnica também é miserável.

Kaito fez seu apelo enquanto seus pulsos estavam amarrados por correntes que saiam do teto da sala de jantar, como os de um prisioneiro. Elisabeth estava sentada em uma cadeira antiga com suas pernas cruzadas, balançando a cabeça de um lado para outro como se dissesse que ainda era culpa de Kaito.

Os restos de seu rim de porco grelhado, com sua salada verde recém colhida, estavam no chão, presos por um único e afiado espeto. Se as correntes que o seguravam fossem afrouxadas, mesmo que um pouco, seu pé direito encontraria o mesmo destino.

Esta era uma forma de tortura simples, ainda sim bastante efetiva. Kaito esperneou e gritou sobre seu desprazer.

— Não me venha com essa cara de desapontada, droga! Você é o lixo que descide se eu vivo ou morro! Para com isso de uma vez. Eu faço oque você quiser!

— Eu não consigo dizer quando você está sendo rebelde ou subserviente...E você é bastante inútil. Seu purin é a única razão para a sua tortura ser leve. Se não fosse por isso já teria me livrado de você a muito tempo.

— Calma ai. Tá me dizendo que meu purin é tudo que me mantém vivo?

— De fato. De sua gratidão ao purin.

Essa revelação deixou o rosto de Kaito pálido. Elisabeth balançou a cabeça quando Kaito finalmente entendeu sua posição.

Foi quando ele se deu conta: Mesmo nas melhores horas, a vestimenta de Elisabeth funcionava no seu limite. Os cintos de couro, envoltos em seu busto, deixavam somente um pouco para a imaginação. A altura e o ângulo que ele atualmente estava apenas escancarou o fato. De onde se encontrava ele tinha uma visão mais clara sobre seus seios que já não eram mais discretos.

— Elisabeth...éee...Senhorita Elisabeth. Eu não pude evitar perceber que sua roupa é um pouco...sensual demais...?

— Como? Do que está falando? Eu… Ó, já entendi. Estas foram suas ultimas palavras?

— Mas é você que sai balançando as jóias da coroa por aí! Me culpar por isso é tirania! É isso mesmo, tirania! No que diz respeito a minha comida, você disse que o prato que eu fiz depois que voltamos da vila estava bom, não disse? Você sabe, aquele rin que eu grelhei, cortei, espetei e coloquei sal e pimenta!

— Por acaso você acha que uma exceção faz a regra?

— Será que não?

— Não.

Elisabeth se mexeu lentamente para estalar os dedos. Kaito fez um olhar de cachorro abandonado e freneticamente suplicou, mas ela apenas riu em sua cara. Ele se preparou para o pior.

— hum? Ora, se não é o açougueiro.

— Quem!?

Subitamente Elisabeth libertou Kaito das correntes. Ao invés de dor, ele apenas sentiu o chão gelado. A estaca que estava embaixo dele desapareceu. Enquanto apalpava suas costas, Elisabeth se virou elegantemente e foi cumprimentar alguém. Kaito olhou para a entrada da sala e ficou pasmo com o que viu.

Ali estava um homem, coberto da cabeça aos pés por um manto negro e carregando um saco sujo de sangue. Nas frentes de onde saiam seus membros, Kaito conseguiu perceber que ele possuía garras e escamas.

Elisabeth abriu seus braços para apresentar o homem para Kaito, que só agora conseguiu se levantar.

— É falta de educação disciplinar um servo na presença de um convidado. Agradeça ao açougueiro pela gentileza, Kaito. Açougueiro, este é meu servo estúpido, Kaito, cujo qual é aquele que desrespeita sua amável carne.

— É um prazer senhor Servo Estupido. Eu sou seu humilde açougueiro, amigo igualmente de gulosos e vagabundos. Eu sou grato por madame Elisabeth continuar me patrocinando. Posso procurar qualquer carne que desejar, qualquer uma. Estou a seu dispor.

— É...prazer em conhecer você também.

Kaito respondeu com modos, embora seu rosto estivesse um pouco carrancudo. O tom de voz do açougueiro era tão perturbador quanto sua aparência. Ao adivinhar os pensamentos de Kaito o açougueiro tocou sua bochecha por cima da roupa.

— Bem...É verdade que sou bem miscigenado, mesmo para um demi-humano, e minha aparência torna difícil de qual linhagem descendo, mas não sou diferente dos outros demi-humanos os quais você está familiarizado, então não precisa se preocupar.

— Demi-humanos… Ah, você quer dizer aquelas raças dos video games e essas coisas?

— Ah, então quer dizer que no seu mundo não existem demi-humanos. Não se importe, açougueiro. Ele vem de outro mundo. Ele é uma alma perdida, literalmente. é melhor deixa as crianças com seus brinquedos.

— Entendo. Então poderia fazer a checagem das iguarias como sempre?

O açougueiro puxou um punhado de órgãos de seu saco. Ele mostrou todos para Elisabeth e daí os colocou de volta no saco.

— Fígado de galinha e pombo, intestinos de porco, lingua e coração de gado. Se está tudo de seu agrado, eu posso carregá-los para o seu freezer de espíritos de gelo pra você.

— Certo, bom trabalho. Deixo o resto com você.

— Ao contrário do que aparenta, você não come pessoas, não é?

— Morda sua língua! Carne humana tem um gosto horrível. Porque eu deveria pagar preços exorbitantes por algo que nem vale a pena ser comido?

— ah, então seu problema é o gosto...

Kaito deixou escapar um suspiro. Para começo de conversa o fato de que carne humana pode ser comprada e vendida já era perturbador. Após ver sua reação, o açougueiro saltitou enquanto fazia um apelo.

— É verdade que carne humana é bastante amarga e também que tem que aprender a gostar, mas há várias pessoas que acham deliciosa, sabia? Se quiser provar, o senhor açougueiro aqui está com um desconto no momento. Talvez isso abra novas portas culinárias para você.

— Tenho certeza que não é uma dessas portas que eu quero abrir.

— Ah, mas tem certeza?

— Absoluta.

— Absoluta?

— Hum...Você disse barata? Eu não ouvi nenhuma batalha nesta região, então da onde vem o seu estoque?

— Ah, de fato. Existe uma vila com um cemitério e um castelo perto de um rio, ambos transbordando de corpos. Me dói dizer como açougueiro que alguns corpos foram recuperados com cortes selecionados já tendo sido feitos, mas de resto a aquisição é bem fácil. Estaria interessado em um pouco? As costelas fazem um excelente assado.

— Me diga açougueiro: Não será isso obra de algum demônio?

— Bem, como açougueiro, eu me preocupo apenas com a qualidade da carne.

— Já entendi. Você é tão diligente em seus interesses que acaba negligenciando o resto. Já conhecia outras pessoas como você, quando estava vivo.

Os olhos de Kaito estavam tristes e por alguma razão, o açougueiro coçava seu rosto como se estivesse envergonhado.

De todo modo, depois de perguntar o nome do lugar para o açougueiro, Elisabeth e Kaito saíram.

— // — // —

— Pensar que eu iria me lembrar de uma cidade remota como esta. Maravilhe-se com minha impecável memória!

— Antes disso, estou surpreso que você teve noção do quão inapropriada suas roupas de costume seriam neste lugar.

Eles se teleportam para um beco na cidade onde o castelo mencionado estava. Elisabeth colocou suas mãos na cintura enquanto se autopromovia. Para a surpresa de Kaito, sua roupa havia se transformado em um vestido normal.

Sua cintura fina vestia um espartilho. A saia de seu vestido longo era adornado por vários laços. Ela havia amarrado seu cabelo e até mesmo colocou uma flor nele para completar.

Kaito quase sucumbiu à vontade de chamar o vestido branco como a neve e o rosto lindo, somente do lado de fora, de falsos.

Elisabeth, a qual agora ostentava a imagem de uma jovem nobre, encheu o peito de orgulho.

— De fato, eu sou bastante sensata. Como o demônio ainda não fez sua apresentação, eu compreendo a necessidade de usar uma roupa típica dos habitantes, ainda sim, mesmo com todo o trabalho que eu tive para me estilizar como a filha inocente de um nobre, o seu uniforme ainda faz você parecer um vagabundo. Hehehehehe.

— Ah, cala a boca! Se isso é um problema, basta me dar uma roupa melhor pra usar...Opa, Elisabeth!

Ignorando a reclamação de Kaito, Elisabeth seguiu andando pelo beco escuro, se aproximando da estrada principal no processo. Kaito se apressou atrás dela. Não tardou e ele foi atingido pelo som bem distinto de pessoas andando e tagarelando sobre negócios e vendendo mercadorias.

Quando saiu do beco, Kaito se encontro em uma cidade de um país estrangeiro.

Mesmo que tecnicamente este era um mundo estrangeiro, o vívido espetáculo de vozes da multidão, assim como os diversos aromas, todos lembravam de uma terra exótica que ele havia visto na televisão a muito tempo.

Enquanto observava com um olhar desnorteado, Elisabeth girou a flor de seu cabelo e sorriu.

— E agora o momento o qual você estava esperando. Bem vindo...Ao outro mundo!

Os pedestres eram de todas as formas e cores. Um homem que vestia camisa com suspensórios passou por uma mulher com um xale sobre ela. Uma garota vestindo um enorme vestido franzido vendia flores, com um homem vestindo uma sobre cassada e fumando um cachimbo.

Junto às lojas podia-se encontrar vários produtos à venda, com alguns sendo familiares para Kaito, mas a maioria não o era. Havia um frasco de poção semi-transparente com um formato artístico. Uma folha rosa com um aroma excessivamente doce, embalada com oque parecia ser tabaco. Por fim ele observou uma fruta em formato oval sendo vendida ao lado de algumas maçãs.

Um gongo gigante estava balançando e uma jovem de cabelos negros com braços de homem-lagarto pegava com uma concha porções de arroz frito, com alguns pedaços de carne para servir aos seus famintos clientes. Mesmo parecendo apetitoso, possuía um odor forte e a maioria dos clientes que estavam comendo tinham orelhas e rabos de cachorro.

— Espera ai. Braços de lagarto e orelhas de cachorro?

— Mestiços de Demi-humanos e homens-besta. Não é uma visão particularmente incomum, visto que quantidade dessas raças são altas em cidades mais pobres. Eles equivalem a 30% do total de pessoas morando em favelas e no norte este número chega a 40%. Demi-humanos e homens-besta puro-sangue são geralmente pertencentes à nobreza, entretanto são difícilmente vistos em assentamentos humanos. É melhor já ir se acostumando. É incômodo você fazer um escândalo por qualquer coisinha.

— Nossa...Esse é mesmo outro mundo, não é?

— Ah, as frutas não tem amostra grátis, então não aceite.

Frustrado, Kaito devolveu as uvas conservadas em mel que uma velha senhora lhe ofereceu. Elisabeth, entretanto, pegou uma suculenta framboesa e pôs em sua boca, depois jogou uma moeda para o vendedor.

Ela continuou abrindo caminho através da multidão. Em meio a uma multidão de mascates chamando para conferir as mercadorias, fregueses pechinchavam como se suas vidas dependessem disso, com vários cachorros de rua e ratos andando entre suas pernas. Seu vestido luxuoso branco como neve se destacava como uma estrela solitária no meio do céu, mas ela pareceu dar pouco importância para isso, assim como a multidão a sua volta.

— Ei, Elisabeth. Onde estamos indo?

— Não precisa se preocupar com isso, apenas fique quieto e me siga.

Kaito continuou ao seu lado obedientemente. Justamente quando ele começou a suspeitar que ela estava andando sem rumo, a forma dos prédios ao redor começou a mudar.

Não havia mais lojas ou comerciantes ou sequer um carrinho de comida. O que estava agora à sua volta eram pequenas cabanas. A natureza do que era vendido começou a ficar legalmente questionável. Parecia que aquela área distante da rua principal era onde você podia comprar espólios, drogas e só Deus sabe mais oque.

Ao encontrar um grupo de pessoas comendo uma sopa de origem duvidosa entre alguns depósitos de pedra, Elisabeth parou. Kaito ficou escutando a conversa junto dela.

— Estão dizendo que o Marquês sangrento está procurando por empregados de novo.

Com essas palavras, Kaito observou uma mulher velha de cabelos grisalhos. Ela estava conversando com um grupo de amigos, com uma caixa de ervas medicinais ao seu lado, provavelmente para vender.

— Não tem ninguém mais lhe vendendo crianças, certo? Eles dizem que existe um canibal no castelo.

— Eu fiquei sabendo que a Anna, ali da esquina, fez isso. Me contaram que ela vendeu seu quarto filho por uma moeda de prata.

— Parece que ela tentou negociar, mas mesmo assim, para vender seu próprio filho desse jeito...É isso o que eu chamo de uma puta. Aposta que ela consegue uma moeda de ouro pelo quinto.

— Eu digo que é melhor do que fazê-los se prostituir. Dizem que aquele capacho do Marquês está comprando até crianças de aristocratas falidos para usar como servos. Eu passo se for pra virar comida, mas se for apenas pra trocar lençóis, até poderia me arriscar se for para comer um bom prato de sopa quente.

— A senhora responsável por coletar pessoas deve vir em sua carruagem hoje. Se eu fosse um pouco mais nova...

— Você tem a aparência de um monstro e ainda deve ter o gosto de um também. Quem iria pagar uma moeda por você?

A mais jovem das 2 mulheres riu fervorosamente, com suas longas orelhas tremendo e seus dentes amarelados a plena vista

Elisabeth acenou, antes de continuar andando. Ao ouvir o som do seu salto alto, ambas olharam em direção a ela. Seus olhares penetraram Elisabeth como se estivessem olhando algo monstruoso. Sentindo sua hostilidade, Kaito rapidamente se aproximou dela.

— Espere Elisabeth. Eu quero saber onde estamos indo.

— Os corpos estão se empilhando, ainda sim esta cidade não está em pânico. Para encurtar a história, digamos que isso significa que os pobres compõem a maior parte das vítimas, afinal, eles já têm a tendência de aparecerem mortos por aí, seja por causa do frio, da fome ou doenças. Mais alguns dificilmente iriam levantar suspeitas.

— Você não mede suas palavra, em...?

— Haha. Se eu meço ou se deixo de medir não faz diferença alguma. Eu vim para cá em busca de informação, e bem como suspeitei, um passarinho veio me contar. Se bem que seria melhor ter algo mais substancial...ah.

Elisabeth parou na esquina. Em frente a uma fila de casas de tijolo a vista estava uma mulher já velha, mas muito bem vestida. Ela estava segurando o braço de outra mulher, que estava acompanhada de uma criança, e discutindo fervorosamente com ela. A outra mulher conseguiu se soltar e subir as escadas de sua casa, onde se refugiou. A velha estalou a língua, para então voltar para a carruagem.

Antes que Kaito conseguisse para-la, Elisabeth conseguiu avançar mais rapidamente até ela.

— Esta é a carruagem de vossa graça o Marquês, certo? Ai, graças a Deus! Meu nome é Flora. Eu vim para cá porque fiquei sabendo que estavam procurando por empregadas. Eu briguei com meu pai, então vim até aqui para me divertir um pouco, mas nunca pensei que teria tanta sorte! Quero viver como uma verdadeira donzela. Você teria a gentileza de levar a mim e a meu servo para ver vossa graça?

Os olhos de Kaito se arregalaram por completo. Quando Elisabeth o viu, apenas inclinou sua cabeça para o lado, com uma expressão tão pura que deu a ele vontade de perguntar quem era ela e o que ela fez com Elisabeth. A senhora respondeu com um olhar duro e incrédulo. Elisabeth deu um lindo sorriso e continuou sem se importar.

— A propósito, eu quase esqueci. Lá atrás na estrada principal, a senhorita Anna me disse para dizer que foi ela quem me mandou. Ela é tão gentil.

Após ouvir isso, ela abriu um sorriso e concordou com a cabeça. Depois de perguntar para Elisabeth quem era seu pai e se já haviam notado sua ausência, ela abriu a porta da carruagem bastante contente.

Quando Elisabeth cruzou ao lado da velha, seu rosto ficou com uma expressão zombeteira e perversa.

Ao sair da cidade, a carruagem passou ao lado de um campo de trigo, fazendo um desvio para contornar o rio. No meio do caminho já dava para enxergar o castelo. Ele era feito de uma mistura de pedras cinzas e amarelas, além de ser fechado de todos os lados por uma muralha. As paredes grandes e espessas eram sustentadas por campanários cilíndricos que se esticavam de norte a sul. Sua sombra refletida na água parecia com a de uma grande coroa.

A carruagem atravessou o profundo fosso por uma ponte levadiça, assim chegando ao castelo propriamente dito.

— // — // —

Talvez para corresponder ao gosto do seu lord, o castelo possuia um interior invejável, em contraste com seu exterior simples. Candelabros estavam espalhados ao redor da escadaria do hall principal e vastos tapetes feitos com fios de prata e ouro cobriam o chão. Estava claro que as gravuras no corrimão da escadaria e as decorações com eram obras de uma mão bastante talentosa.Tudo na casa parecia elaborado e caro.

“Casas de pessoas ricas são tão excêntricas” — pensou Kaito disfarçando o olhar.

Ao seguir Elisabeth, ele caminhou através do hall e entrou por um caminho a direta. Quando o fez, um homem alto o segurou com força pelo ombro.

— Você não parece um nobre. Os servos ficam por aqui.

— Por favor, espere Elisa... Senhorita Flora!

Kaito gritou enquanto era arrastado. Elisabeth se virou e deu sua aprovação com o polegar levantado, em outras palavras disse: "Se vira, você é imortal, então dê o seu melhor e vença. Você é esperto a final" ou alguma coisa parecida. Mesmo adiando admitir, Kaito já estava acostumado com as atitudes dela.

Deste ponto em diante ele não tinha muita escolha. Sua expressão ficou severa, então ele desistiu e seguiu o homem. Ao chegar no fim do corredor ele levantou uma grande bandeira com um brasão em seu centro. Uma porta secreta se abriu e o guia de Kaito o empurrou pelas escadas. Kaito pode sentir um pressentimento se apossar dele, que seguia cada vez pior enquanto descia as escadas até o subterrâneo.

Ao chegarem em um corredor, iluminado pela luz de tochas, o homem finalmente parou diante de algumas grades que lembravam uma cela.

— Entre

— O que?! Você vai me tratar como um criminoso sendo que não fiz nada?!

Kaito argumentou como pôde, mas no fim acabou tudo em vão. O homem o chutou para dentro da cela. Alguém soltou um grito e, quando Kaito foi procurar de onde vinha, ele descobriu que aquela prisão era surpreendentemente espaçosa. Uma multidão de jovens humanos, demi-humanos e homens-besta se encontrava ali.

Suas idades, seus sexos e obviamente suas raças, eram bastante variados e o medo estava estampado em seus rostos. Esta cena nostálgica, pelo fato de se encontrar com criaturas míticas, também era bastante amarga e ele não sabia como reagir. Depois de matutar em sua cabeça sobre oque deveria fazer, ele acenou e tentou acalmá-los.

— E aí gente.

Não adiantou nada, só fez eles se encolhem e gemerem.

Subitamente um novo prisioneiro foi jogado na cela. Era uma garota vestindo um vestido vermelho-pálido. Ela tropeçou, mas Kaito conseguiu agarrá-la antes dela cair. Seus olhos inocentes acompanhados por seus cabelos castanhos e crespos, eram belos, bem em contraste com o resto dos prisioneiros. Ela olhou com medo para Kaito e suas bochechas ficaram vermelhas quando se deu conta de que estava sendo segurada por ele. Ao se levantar e se arrumar ela disse:

— Minhas sinceras desculpas. Meu nome é Melanie Eskrow, filha do conde Eskrow. Que lugar é este? Meu tio me mandado para cá, para eu me tornar uma dama.

— Eu sou Kaito Sena...Isso pode soar rude, mas seu pai por acaso morreu e deixou você aos cuidados de seu tio recentemente?

— Mas como você sabe?! Você conhece meu tio, senhor Kaito?

— Bem, quanto a isso... Certo, quer saber? Pode parecer estranho falar isso, mas é melhor não descobrir. A situação que estamos agora é super perigosa. Eu acho que você deveria se preparar para correr assim que ver uma brecha. Não há como dizer que coisas horríveis estão para acontecer.

— Se você diz... Posso perguntar o que vai acontecer conosco e essas crianças?

— Eu não sei. Eu realmente não sei, mas quando pessoas entram em choque, eles tendem a congelar, por isso tem que se preparar emocionalmente.

— Saiam. Vocês foram chamados.

Alguém cortou Kaito e escancarou a porta. Um grupo de homens guiou Kaito e as assustadas e soluçantes crianças para fora da prisão. Para impedi-los de resistir, eles colocaram uma faca contra a garganta de Kaito. Um garoto com cabelos vermelhos da idade dele e outro dos mais novos receberam o mesmo tratamento. Kaito era imortal, mas se ele fosse descuidado os outros 2 poderiam acabar virando vítimas. Ele estalou a língua em frustração e continuou sem resistir.

Eventualmente uma porta no final do caminho subterrâneo apareceu. Ela era feita de madeira com imagens de aranhas e corvos entalhadas reluzindo a luz de tochas. O design possuía corvos circulando a parte de cima, com as aranhas colocando teias na parte de baixo para pegá-los. Isso era de muito mau gosto. Os homens abriram as portas duplas e chutaram Kaito e os outros para dentro. Kaito achou que os guardas os seguiram, mas eles simplesmente fecharam as portas.

— Boa sorte.

Porque precisamos de sorte? Enquanto Kaito pensava sobre oque estava atrás dessas palavras, ele ouviu o som da porta sendo fechada a chave.

Quando ele se virou seu coração acelerou e quase saiu pela boca.

Dentro daquela sala um espetáculo bizarro se desenrolava diante dele. O teto era extremamente alto, com um dômo parecido com o de uma catedral. Seu centro era decorado com uma vidraça com desenhos de flores, mas as formas de luz complexas que saiam delas eram deturpadas pelos arames farpados que cobriam todo teto. Esse efeito inquietante era ampliado pelos corvos mortos enrolados entre os arames, com alguns deles ainda vivos e observando Kaito e os outros em silêncio.

"Qual é o significado desses corvos? Eu tenho um mau pressentimento quanto a isso."

Desgosto e ansiedade atingiam ele. Kaito olhou para o chão de mármore quebrado, com alguns pedaços faltando. Na terra desses buracos cresciam árvores massivas.

Dentre outras coisas, a sala parecia uma floresta em miniatura. Com essa já eram vários mistérios sem solução. Suprimindo seu mau estar, Kaito olhou para o centro da sala.

Em cima do palco circular estava deitado um homem de baixa estatura e corpulento, vestindo uma casaca. Ele se levantou lentamente, limpando a parte de trás de sua calça. Uma vez em pé, olhou para Kaito e as outras crianças. Quando Kaito viu seu rosto, tomou um susto, porque oque o cobria era uma máscara de ossos semelhante ao rosto de um corvo.

— Saudações, jovens e senhoritas. Bem vindos ao seu próprio Grand Guignol!

O homem desafinou durante seu grito deveras entusiasmado. Kaito começou a soar frio. Seu locutor era carismático, estranho e revoltante. Seu instinto fez com que Kaito tremesse de medo, até se dar conta do porquê.

"Este homem é provavelmente um demônio."

Não havia a menor possibilidade de Kaito conseguir enfrentá-lo sozinho e Elisabeth não estava lá para ajudar.

"Espera um pouco, como assim? Você não disse nada sobre lutar, Elisabeth!"

— Vocês são a platéia. Vocês são os roteiristas. E vocês são os atores. Então eu vos imploro! Aproveitem ao máximo! Vocês podem tentar escapar desta dependência, se desejarem, mas somente o último em pé será salvo, entenderam!? Até lá eu não me importo se diminuírem os números vocês mesmos!

Sua voz desafinou ainda mais. Quando ele terminou de falar, colapsou, mas antes que tivessem tempo de pensar sobre isso, um corvo desceu dos arames.

Kaito arregalou seus olhos. O corvo abriu suas asas enquanto caia, revelando seu verdadeiro tamanho, mais ou menos o de um homem adulto. Ele voou baixo para pegar um deles. O deslocamento de vento causado pelo bater de suas asas era tão forte que Kaito precisou fechar seus olhos. Quando o fez, ele escutou um grito.

— Não!!!

O garoto em frente a Kaito foi pego. Ao agarrar o garoto com suas garras, o corvo o elevou até o teto. Quando se aproximou de um arco fixado nas laterais, Kaito pôde ver que embaixo dele havia lanças.

— Mas… O que?

Oque se seguiu foi como uma resposta para qualquer dúvida que restava: O corvo empalou o garoto em uma das lanças, como um pássaro que alimenta seus filhotes, ele pendurou sua presa pelo estômago e o deixou lá. Depois de um grito de angústia, o corpo do jovem se contorceu até ficar em uma posição semelhante a fetal, então ele começou a convulsionar e a tossir uma grande quantidade de sangue escuro. Logo em seguida o único movimento que fazia era o de respirar ofegante. Kaito ficou sem palavras com o choque.

Ele não havia se dado conta por causa dos corvos, mas o resto das crianças estavam completamente desamparadas, não tendo nem mesmo vontade de gritar. Eles simplesmente se entregaram à agonia e ficaram estáticos em meio a este tormento incessante.

Kaito sentiu uma gota de suor escorrer por sua testa, pois sua imortalidade não significa nada aqui. Se ele for pego é o fim.

Uma massa de corvos voaram. A única coisa que Kaito conseguiu fazer foi gritar.

— Corram!!!

Sua voz atingiu os demais como se tivesse quebrado algum feitiço, até começarem a correr.

Kaito sabia que, querendo ou não, as portas dos inferno tinham sido abertas.

— // — // —

Algumas crianças tentavam arrombar a porta do corredor, mas ela estava firmemente selada.

— Isso não vai funcionar. Desistam e comecem a correr!

Kaito chamou o garoto que estava batendo na porta soluçando, daí ele se atinou a correr com os outros. Alguém empurrou Melanie e ela caiu. Em meio ao caos, Kaito segurou sua mão pálida.

— Melanie, por aqui!

— Senhor Kaito!

— Não, socorro! Eu quero minha mãe. Mãe!!!

Um corvo agarrou uma menina demi-humana, na frente de Kaito, pelos ombros. Em um reflexo ele conseguiu agarrar as pernas dela. O corpo da infeliz esticou e ela balançava seus olhos em vão enquanto as lágrimas escorriam por seu rosto.

— Socorro por favor! Tira ele de mim, isso dói! Mãeeeee. Eu quero minha mãe!

— Aguenta firme!

Kaito puxou a sua perna, com toda força que conseguiu, de um lado para outro. O corvo cravou suas garras ainda mais fundo e ela desesperada deu um grito de agonia. O monstro se chocou com outros e, como Kaito supôs, soltou ela.

Kaito quase deixou a menina demi-humana cair no chão, então correu com ela e Melanie para longe. Seu ombro ficou molhado de lágrimas. À sua volta as outras crianças eram pegas uma por uma. Várias penas negras preenchiam sua visão, com gritos de partir o coração vindos de todos os lados. Para piorar, gotas de sangues começando a cair como se fossem chuva.

Não importava o quanto gritassem ou chorassem, ninguém os salvou. Ele foram deixados para se afogarem em seu próprio desespero. O estômago de Kaito se revirou e ele quase vomitou. Ele só conseguiu pronunciar uma única palavra vinda do fundo de seu coração.

— Inferno!

Com Melanie e a demi-humana em seus braços, Kaito adentrou uma pequena floresta. Uma vez debaixo da copa das árvores, eles estão temporariamente a salvo da vista dos corvos.

Somente um demônio teria plantado essas árvores para prolongar este jogo. Mesmo revoltado, Kaito agradeceu por este capricho em particular. Depois de ver a ferida da menina soluçante, Kaito se virou para Melanie, a qual estava sentada a seu lado e começou a tirar parte da saia de seu vestido.

— Vai me desculpar Melanie, mas eu preciso disso.

— Se... Senhor Kaito! O que você está fazendo?

— Vou fazer um curativo no braço dela, se não se importa. Eu estou contando com você.

— Ah, claro. Entendi. Pode ir em frente.

Melanie fez pressão para parar o sangramento da garota. Enquanto fazia o curativo, Kaito espiou para ver se não via mais corvos. Tudo indicava que ainda não haviam percebido, entretanto um grupo de corvos pegou outro garoto e o carregaram para os espetos.

— Droga...

Desviando seu olhar daquele horrível espetáculo, Kaito notou algo estranho. Presos em uma árvore estavam um machado e uma espada, cada um com uma fita atada como se fosse um presente. Após um breve momento ele compreendeu o terrível significado por trás daquilo.

"Vocês podem tentar escapar desta dependência, se desejarem, mas somente o último em pé sera salvo, entenderam!? Até lá eu não me importo se diminuirem os números vocês mesmos!"

Foi isso oque o demônio disse, em outras palavras o demônio queria desde o começo que eles matassem um ao outro.

— ... Isso é tão doentio.

Kaito murmurou para si mesmo, com coração cheio de ódio. Enquanto isso, ele sentiu como se a ficha finalmente tivesse caído. Oque ele sentia agora era o mesmo pico de angustia, fúria e medo que ele sentiu tantas vezes durante sua vida e foi isso que fez ele voltar ao seu estado de lucidez.

Ele olhou para as armas de novo e percebeu que não havia motivos para deixar as coisas seguirem como o organizador queria, com isso, ele tinha uma chance de virar esta situação desesperadora a seu favor.

— Melanie, posso te perguntar uma coisa?

Quando Melanie virou-se para eles, seus olhos subitamente se abriram e sua atenção se focou em algo que estava atrás dele. Um calafrio correu pela espinha de Kaito. Ele resolveu confiar em sua intuição e se jogou para frente. Quando o fez, ele ouviu algo cortar o ar.

— Ei, voc...

Quando ele se virou, encontrou um jovem de cabelos vermelhos da sua idade, o mesmo que teve uma espada apontada para o seu pescoço antes. Ele estava trêmulo segurando uma espada longa com ambas as mãos. Não dava para saber oque ele iria fazer.

Kaito levantou as mãos para o alto, daí começou a tentar convencer o garoto.

— Vamos, abaixe isso. Não caia no que o demôn... No plano de nosso inimigo tão facilmente! Porque você deveria acreditar no que os caras maus dizem em uma situação caótica como essa?

Ela estava soluçando e chorando.

— Tem alguma prova de que irão te salvar se você for o último a sobreviver? Não foque em matar o resto de nós. Foque em descobrir um jeito de escapar e pedir socorro.

— Cala a boca! Ninguém vai nos salvar!

O rapaz de repente gritou de raiva. Ele balançou a espada. Kaito levantou suas mãos de novo e voltou a falar com ele.

— É só abaixar, ok? Só abaixar. Respire fundo. O que te faz pensar dessa maneira?

— O que?! É claro que ninguém vai nos salvar! Minha mãe me disse que eu deveria morrer de uma vez! Ele me disse para morrer pelo bem do resto da família. Ela me pediu pra morrer, então porque alguém viria me ajudar? Quem diabos virá por nós? E se esse for caso... Se esse for o caso, que outra escolha nós temos?

— Entendo...Então é isso que está te guiando.

O garoto estava à beira das lágrimas enquanto falava. Quando Kaito ouviu seu raciocínio, ele pode compreender.

Quando uma pessoa acredita que só há um jeito de sobreviver, eles farão oque for necessário para que isso aconteça. Infelizmente tal caminho geralmente termina em arrependimento. Depois de decidir não pensar e simplesmente aceitar o trabalho sujo imposto a ele, Kaito acabou estrangulado até a morte. Ele não achava que o garoto iria escutar ele, mesmo se tentasse explicar.

Kaito se moveu lentamente em direção às armas que ele havia visto antes e forçou a conversa um pouco mais.

— Então você decidiu me matar, mas você acha que vou morrer sem lutar?

— Cala a boca! Com essas roupas finas que está vestindo, eu aposto que esteve vivendo uma vida fácil até agora! Você poderia me fazer um favor e morrer? Considere isso presente!

— Que tipo de idiota morreria por alguém que nem conhece? Se eu vivia uma vida fácil, como então eu vim parar aqui?

Só mais um pouco e ele alcançaria arma, mas o jovem também se aproximou, empunhando a espada com um olhar desesperado. Quando as palavras "que droga" passaram pela cabeça de Kaito, ele ouviu um bater de asas.

Um corvo viu eles do této e mergulhou. O garoto soltou um gêmido e então começou a balançar sua espada em pânico. Kaito desviou dele e conseguiu pegar o machado. Ao ver Kaito e o pássaro, o menino gritou de desespero. O corvo partiu em direção dele e Kaito levantou seu machado.

Com um estampido, Kaito abriu a cabeça do corvo em dois. Ele caiu morto no chão. Kaito, para ter certeza, o golpeou de novo e de novo. Seu inimigo não era um corvo normal afinal de contas.

— Viu? É assim que devemos usar essas armas.

O rosto do menino se enrugou e ele começou a chorar. Vendo que o estava assustando, Kaito baixou a arma.

— É o seguinte: Se nós usarmos esse machado, talvez consigamos arrombar a porta do corredor. Como a ele é apertado, os corvos não vão conseguir nos seguir facilmente. Já que nós conseguimos chegar tão longe, podemos conseguir fugir com vida. Ter deixado estas armas na esperança de que íamos nos matar foi um grande erro. Vamos mostrar isso a ele.

— Ma... Mas eu...

— Vamos, não adianta ficar tremendo aqui o dia inteiro. Venha, se levante. Não estou bravo com você nem nada.

No final das contas, Kaito já tinha morrido uma vez. Ele podia fazer vista grossa para a impulsividade dele.

Kaito estendeu a mão e ajudou o garoto. Com sua atitude amigável, ele parou de tremer. Daí então Kaito e os outros começaram seu contra-ataque.

— // — // —

Um corvo segurou o braço de um menino homem-besta, batendo suas asas com força.

Kaito se esgueirou por trás do corvo, então ele pulou encima dele, cortando ambas as suas asas horizontalmente em um único golpe.

O corvo despencou e o rapaz de cabelos vermelhos o esfaqueou com sua espada algumas vezes. Melanie acariciou o choroso menino-besta. Kaito limpou o suor de seu pescoço e olhou para trás.

— Faltou mais alguém?

Haviam 8 crianças que conseguiram resgatar indo de mato em mato. Kaito estava desapontado com tão poucos sobreviventes, mas ele não tinha tempo para se lamentar.

O grupo se manteve escondido entre as copas das árvores, matando os corvos em uma única investida, por isso, o grupo principal deles ainda não tinha notado nada. Os corvos deviam pensar que sua caçada havia terminado, assim resolveram descansar nos arames. Essa era a hora do grupo escapar.

Kaito pegou um machado novo e uma espada curta debaixo de uma árvore. A espada era fácil de empunhar, então ele a deu para o menino-besta. Ele olhou para o resto deles nos olhos e os instruiu.

— Escutem, nós vamos correr para a porta. Se os corvos vierem atrás de nós, sigam o plano e balancem suas armas como loucos. Não precisam matá-los, apenas procurem ficar a salvo. Nós vamos sobreviver. É agora!

As crianças seguiram ele. O caminho que tinham que seguir não possuía nenhuma cobertura e parecia se estender por uma eternidade. De algum modo eles conseguiram cruzar e alcançar a porta.

Quando se deram conta, os corvos estavam perseguindo eles vorazmente. Kaito enfiou seu machado na porta.

— Lembrem-se do que eu disse. Espalhem-se ali e ali.

Os jovens acenaram com a cabeça, com o garoto ruivo liderando eles contra os corvos. Kaito sabia que isso não os compraria muito tempo. Ignorando a dor em seus braços e mãos de ficar usando tanta força, ele repetidamente bateu na fechadura com seu machado, até quebrá-la. Já cercado pelos gritos dos corvos ele arrombou a porta.

— Está aberto! Venham aq...

Então um grito foi ouvido atrás dele. Quando se virou, enxergou um dos rapazes tendo os olhos perfurados pelo bico de um corvo, daí ele foi pego por trás e levantando, mas as garras afiadas dele fizeram a camisa se rasgaram fazendo com que ele caísse. Sua pequena cabeça se abriu como uma melancia com o impacto. A morte foi instantânea.

A visão de Kaito escureceu de raiva. Sem parar pra pensar no excesso de força, ele jogou o machado com toda força possível. O corvo desistiu de sua presa e foi em direção às outras, mas o machado ficou cravado em seu peito. Ele bateu em outro corvo, rodopiou no ar e caiu. Kaito gritou:

— Corram!

Os outros atenderam ao chamado de Kaito e correram em direção a porta. O garoto de cabelos vermelhos seguiu logo atrás deles.

Quando Kaitou pegou outra espada, ele imediatamente a enterrou no crânio de outro corvo, daí chutou o corpo para cima dos demais. Para evitar serem atingidos pelo corpo, voaram mais alto e Kaito aproveitou essa abertura para fechar a porta. Ao se virar, agarrou um braseiro que iluminava a entrada e o jogou contra seu inimigo morto, fazendo o fogo se espalhar facilmente. Aquilo deveria comprar-lhes algum tempo.

Os corvos desviaram para não serem atingidos pela fumaça. Kaito correu para o corredor. Melanie e a maioria tinham ido na frente, mas, por alguma razão, o menino que tentou matar Kaito ficou esperando ele. Kaito piscou de falou alto:

— EI! O que você está esperando? Saia já daí!

— Certo.

Ele começou a correr ao lado de Kaito. O som dos corvos ficava cada vez mais e mais distante. Parecia que o fogo havia funcionado. Kaito desejou que continuasse assim.

O corredor escuro estava silencioso, exceto pelo eco dos passos deles. Quando a poeira baixou o rapaz ruivo falou:

— Meu...Meu nome é Neue. Qual é o seu, senhor?

— Sou Kaito. Kaito Sena.

— Kaito Sena... Me desculpe, Kaito.

— Pelo que?

— Porque eu tentei te matar. Eu disse que você vivia uma vida fácil.

— Não se preocupe com isso. Tudo que eu ouvi naquela droga de situação já é passado.

— Mas você estava muito mais calmo que o resto de nós e você nos salvou matando aqueles corvos. Você é incrível. Como você pode ser tão...?

Neue derrepente ficou quieto. Os dois olharam para trás. Eles puderam sentir uma presença vinda da escuridão. Um sussurro podia ser escutado, com uma forma se mexendo entre as sombras.

Vários olhos na vertical podiam ter seus brilhos vistos, como os de um inseto, além disso 8 pernas arranhavam as paredes.

Uma aranha gigante estava atrás deles.

Depois de verem mais de perto, sua pele estava coberta por penas de corvos e sua boca se estendia em um formato pontudo, foi quando Kaito entendeu porque os corvos tinham parado de seguir eles.

Por ser teimoso de acreditar que o fogo serviria como distração, ele se sentiu culpado.

Os corvos entenderam que estavam em desvantagem se entrassem pelo corredor, então eles se fundiram e se transformaram naquela aranha.

A aranha cuspiu contra eles. Kaito em um reflexo bloqueou o golpe com sua espada. No mesmo instante ela foi arremessada por ele, mas a lâmina não conseguiu cortar através das penas. A aranha deu um rugido e cuspiu mais uma vez. Neue no meio da mira e seu rosto se contorceu de medo. Kaito viu seu antigo "eu" naquela expressão.

O garoto em frente dele foi ordenado a morrer por sua própria mãe e então jogado em uma situação desesperadora sem um pingo de esperança.

Sem conseguir se controlar, Kaito colocou seu braço esquerdo diante do golpe.

A teia se enrolou em seu pulso. Kaito conseguiu puxar a espada de Neue. Sabendo que a teia era mais resistente que o aço, ele decidiu decepar a própria mão. Com um grito de satisfação, a aranha puxou sua teia e comer vorazmente a mão de Kaito.

A dor atingiu as profundezas de Kaito, mas ele já estava acostumado com sua amiga de longa data, além disso ele era imortal. Ele conseguiu aguentar. Se não tivesse feito, teria morrido e isso bastava.

Ele devolveu a espada para Neue e começou a aplicar pressão sobre a ferida, para daí começar a correr de novo. Lágrimas corriam dos olhos de Neue.

— Porque você fez uma coisa dessas? Porque? Que motivo você tinha?

— Não se preocupe com isso. Eu já estou morto.

— Como? Você é idiota por acaso?

— Que falta de educação. Oque acontece é o seguinte: Eu não sou deste mundo.

— Do que você está falando?

— Não se preocupe com isso, apenas escute. Meu pai me fez ralar até o osso no meu mundo. Eventualmente ele me matou como se eu fosse pouco mais que lixo. Foi uma vida de merda. Quando eu pensei que estava tudo acabado a Princesa... Melhor... A feiticeira. Ela me invocou e colocou minha alma neste corpo falso.

Depois de falar, Kaito pensou ter dito demais. A aranha havia acabado de comer a mãe de Kaito, com ossos de tudo e começou a cuspir novamente. Neue levantou sua espada para se proteger, mas isso fez ela ser envolta pela teia e depois arrancada de sua mão. Vendo seu rosto empalidecer, Kaito suspirou e tomou sua decisão. Ele não queria ter que fazer isso, mas se fosse a única forma, ele não hesitaria.

— Eu sou apenas um cara morto qualquer. Na próxima vez que a aranha cuspir a teia, aproveite para fugir e me deixe.

— De novo? Do que você está falando?! Você está louco!?

— De novo essa falta de educação. Claro, se ela me pegar vai comer devorar por completo, mas eu não queria voltar a vida pra começo de conversa. Esse é o fim pra mim. Se apenas um de nós pode sobreviver, deveria ser o cara que ainda está vivo.

Kaito olhou para Neue, que estranhamente parecia ainda mais novo. Neue olhou de volta para ele, com seus olhos cheios de lágrimas. Era assim que tinha que ser. Kaito estava satisfeito por fazer a escolha certa.

Crianças choronas não merecem estar em um lugar como esse. Kaito não derramou uma única lágrima.

— Você ainda não morreu, então o mundo é seu. Boa sorte.

Kaito fez sua declaração de forma otimista. A aranha deu um grito medonho e Kaito mordeu seus lábios.

Ele realmente estava com medo de morrer uma segunda vez. O medo que antes havia perdido, agora voltava a assombrá-lo. A dor de ainda querer se agarrar à vida era quase insuportável, mas ele não tinha outra escolha.

Ele estava prestes a morrer para salvar alguém que lembrava o seu antigo "eu".

Se fizesse isso, ele poderia se tornar o tipo de herói que ele sempre quis que o salvasse.

Se ele seguisse pensando assim, pelomenos este absurdo epílogo de sua vida teria algum significado. Kaito refletiu sobre sua decisão com satisfação. A aranha disparou sua teia. Ele não fez esforço algum para se esquivar. Então aquilo aconteceu.

— ...O que?

Neue o empurrou para fora do alcance do ataque.

A teia se envolveu a volta do dorso de Neue. Kaito olhou do chão com pavor. Ele esticou sua mão para tentar alcançar Neue e uma pergunta estúpida escapou de seus lábios.

— Por que?

— Eu queria saber.

Neue estava incerto, com sua voz cheia de incerteza. A aranha começou a enrolar sua teia. No momento que se seguiu, o rosto de Neue se congelou e ele disse:

— Eu acho... Eu só esperava que você pudesse encontrar felicidade neste mundo.

Kaito parou de respirar. Neue deu um sorriso melancólico antes de ser tragado.

Um grito agonizante correu pelo local. Kaito se pôs de pé. Podia-se escutar a aranha rasgando algo vorazmente. Ele não queria saber oque significava aquele som e tratou de correr para a aranha, mas quando ouviu o som de ossos sendo esmagados, seu coração foi preenchido por fúria e ódio. Quando voltou a si, se encontrou em um estranho estado de lucidez. Ele parou e disse para ele próprio:

— ...Eu acho que é inútil tentar salvar um homem morto.

Ele deu de costas e começou a correr. Ele estava calmo o suficiente para se surpreender consigo mesmo. Seu rosto estava inexpressivo, mas o fogo em seu olhar estava mais vivo que nunca. Ele repetiu de novo e de novo:

— Eu vou matar aquela coisa. Eu vou matar. Eu vou esmagá-la. Eu vou!!!

Sua voz mostrava sua sede por sangue. Se aranha o pegasse ali, o sacrifício de Neue seria em vão. Ele não deixaria isso acontecer. Este era o sentimento que o impulsionava a seguir correndo.

Ele já conseguia ver a saida. Ele achava que a porta também deveria estar trancada, por isso ele deu o machado a uma das crianças mais velhas. Depois de tanto tempo ter se passado, eles já deveriam ter conseguido arromba-la. Kaito estreitou seus olhos, porque a porta parecia estar intocada, talvez até nem estivesse trancada.

Enquanto as dúvidas cruzavam por sua mente, a porta se abriu e dela um vestido vermelho-pálido surgiu.. Atrás da porta estava Melanie, chamando-o com sua voz doce. Ela correu para ele o mais rápido que suas pernas conseguiram.

— Senhor Kaito!

— Melanie?! Espere, não venha! Você precisa correr!

Ignorando seu aviso, Melanie o envolveu com um abraço. Ela pôs seus pequeninos braços ao redor do pescoço de Kaito. Seus lábios rosados estavam abertos em um grande sorriso e seu ar doce pôde ser sentido antes dela começar a falar.

Antes que pudesse, a porta se abriu mais uma vez. Uma cor vívida chegou aos olhos de Kaito.

Era uma uma vestido vermelho muito mais escuro que o de Melanie, o qual já fora branco como a neve.

— Ora, se não é o Kaito!

A voz que se seguiu era tão indiferente com a situação, que parecia não pertencer àquele lugar

Lá estava Elisabeth, embebida em sangue e energicamente acenando para ele.

— // — // —

— Ora, eu estava justamente pensando em te ver. Que reviravolta mais conveniente. Quanta consideração sua vir por conta própria... Oh? Você está coberto de sangue... E a beira de morrer por falta dele, pelo que parece. Vejo que você deixou sua mão em algum lugar. Por acaso ela era de encaixar? De qualquer jeito, será melhor se eu parar o sangramento com minhas correntes... Aquilo é um inseto? Ahhh! Com certeza é um! Eu odeio eles! As aranhas são as mais nojentas!

Elisabeth deu um pequeno salto quando chegou atrás de Kaito. Quando aterrizou o chão a volta de seus pés foi tomado por trevas e pétalas de flores carmesins. Elas formaram uma espiral em direção ao teto, daí criaram um buraco em cima da cabeça da aranha. Uma massiva carga de espinhos surgiu do buraco.

Quando ela despencou, esmagou a aranha de uma só vez.

— Morra seu lixo!

Elisabeth levantou seu punho. Seu ataque foi tão intenso, que Kaito sentiu como se ela soubesse os horrores que aquela aranha havia feito. Provavelmente ela apenas detestava o inseto, mas Kaito se alegrou mesmo assim.

Ela dilacerou aquela aranha horrenda com tanta facilidade que pareceu que estivesse matando uma barata com um chinelo. O braço de Kaito agora estava com um torniquete feito de correntes, uma maneira bastante grosseira, mas funcional de parar seu sangramento. Quanto abriu sua boca, Melanie impediu que pronunciasse suas palavras e se agarrou a o seu casaco aterrorizada.

Um silêncio se abateu sobre eles, o qual foi quebrado por Elisabeth.

— Então. O que aconteceu aqui?

Naquele momento, Kaito sentiu um alívio. A força avassaladora de Elisabeth, assim como seu comportamento despreocupado, permitiu com que ele finalmente relaxasse seus nervos que haviam sido puxados ao limite.

Ele disse para Elisabeth oque havia ocorrido.

— Elisabeth. Tem um demônio no anexo. Ele fez um monte de corvos matar todos aqueles que foram trazidos para lá.

— Então é isso.

Kaito seguiu falando de forma confusa, atropelando as palavras. Ele acabou falando muitas coisas sem sentido e outras desnecessárias. Ele não sabia se ela estava entendo, até que ela começou a caminhar para longe dele, sem ter terminado de falar. Ela caminhava despreocupada para a saída.

Kaito segurou as mãos trêmulas de Melanie e seguiu Elisabeth.

— Elisabeth, você me escutou? Eu disse que tem um demônio no ane...

— Cale-se, Kaito!

Elisabeth parou em frente a uma das salas. Ao olhar para dentro, Kaito viu se tratar da cozinha.

Acima da mesa estava uma garota de aparência nobre, seu delicado vestido estava embebido em sangue e suas costelas foram selvagemente removidas. Ao seu lado estava um homem com uma cabeça de touro e vestindo um uniforme de chef. Sua virilha foi cortada ao meio por uma serra. Era um lacaio de um demônio. Sua morte sem sombra de dúvidas era obra de Elisabeth.

— Bem como o açougueiro disse, o cadáver desta garota está incompleto. Aparentemente os de linhagem nobre tem um gosto melhor que os plebeus. Eles saboreiam os ricos e brincam com os pobres. Não duvido que depois de brincarem com você e as crianças eles iriam vir para cá desfrutar de um bom jantar. Ah, quanto requinte.

Elisabeth reverenciou. Kaito cerrou seus punhos. O ódio e a sede de sangue dentro dele novamente se validaram. Sem se importar com sua fúria, Elisabeth se virou para Kaito e deu de ombros.

— Esses tolos tentaram me comer e mesmo que matar eles e fazê-los me contarem sobre a porta secreta tenha sido divertido, havia tantos que alguns conseguiram fugir para o pátio. Encontrar todos é que foi o problema.

— Elisabeth eu entendo porque você demorou tanto para vir me pegar, mas eu não dou a mínima pra isso. Nós temos que ir para o anexo. Eu preciso que você mate aquele demônio para mim!

— Ora ora, que animação é essa? Sua mão... Aqueles que não temem a dor são só alguns entre poucos, mas Kaito... Como você consegue a determinação para amputar a própria mão e experienciar um banho de sangue e ainda sim não conseguir ver a verdade diante de seus olhos?

— O que quer dizer?

Invés de responder a sua pergunta, Elisabeth começou a caminhar. Ela deixou a cozinha, caminhou pelo corredor e parou no centro do hall principal. Todos aqueles que não eram lacaios deviam ter fugido, porque o castelo estava em um silêncio mortal.

Seus cabelos negros balançavam sob a luz o candelabro, então ela olhou para trás sobre seu ombro.

— Pelo que parece o demônio daqui não atormenta as pessoas só pelo poder, mas também pelo fato de gostar disso ainda que seu amigo, o Cavaleiro, gostava. Ele tem prazer com sua dor e seus gritos. Além do Grand Guignol, parece que seus interesses vão mais a fundo, então pense: Qual é a mais elaborada forma de desespero? De que jeito um homem tão perverso como ele poderia obter o seu maior deleite?

Kaito não fazia ideia do que Elisabeth estava falando, mas ele de repente se lembrou de quando seu pai o estrangulava. Ele manteve Kaito em um estado de desidratação e depois deu-lhe água. Quando ele achou que estava salvo, seu pai o matou.

A mais profunda forma de desespero era pensar ter encontrado a salvação, apenas para descobrir que não há nenhuma.

— ...Ele da as pessoas esperança e justo quando esperam terem sido salvos, ele destroi ela na frente deles.

— Precisamente! Quando há apenas 2 pessoas vivas e uma delas é uma frágil e pequenina garota, aquele que está disposto a matar se sente mais aliviado que nunca. Nada pode ser mais revigorante do que matá-lo nessa hora! Claro, suas ações possuem riscos, mas eu imagino que o demônio se divirta muito. A final, nem uma criança sobreviveu.

Ao entender sua resposta, Kaito fechou seus olhos. O hall estava em silêncio. Nenhuma criança podia ser ouvida em lugar nenhum. Balançando sua cabeça, Kaito tomou distância de Melanie, a única sobrevivente.

Quando eles fugiram daquele jogo mortal, na boca de qual monstro elas desapareceram?

— Só para acrescentar, eu duvido que você tenha gostado de uma forma tão delicada, mesmo que temporariamente...

Elisabeth abriu um amável sorriso ao ver o rosto de Melanie, mas quando questionou a trêmula menina, sua voz era de puro desdém.

— ...Por que a filha de um conde seria escolhida como um brinquedo invés de comida?

Com isso o vestido vermelho-pálido inchou como um balão. A doce garotinha se transformou em uma massa de carne e tecido, com sua pele se rasgando e escorrendo pûs.

De dentro daquilo surgiu um homem nu, com pernas de aranha e uma estranha pele branca, com seu corpo coberto por penas de corvo.

O homem gordo e careca estalou seu bico de corvo. Quando olhou para o grotesco colossus, Elisabeth esfregou seu queixo e estalou a língua por causa das pernas de aranha.

— O homem lá embaixo sem sombra de dúvidas era um lacaio ou algum tipo de imitador. Então depois de perder sua forma humana você consegue se transformar em uma garotinha é...? Eu sei que se fosse em um menino ele provavelmente seria morto, mas talvez você apenas goste de vestir roupas de menina. Quanta deselegância. E pensar que quando humano seu título era de marquês. O demônio que você fundiu não é ninguém menos que o Conde. Como eu pude vir aqui esperando uma luta decente?

— E quem se importa? Apenas mate essa coisa de uma vez!

— O que foi agora? Você tem agido bem estranho. Por acaso está com raiva ou algo assim?

— Pode ter certeza... Eu faço oque você quiser, apenas faça com que a morte dele seja a mais dolorosa possível!

O ódio transbordava das profundezas do coração de Kaito.

Tê-lo tornado o único sobrevivente daquele massacre foi uma piada cruel demais para ele suportar. O conde havia matado todas as outras crianças. Kaito não podia deixá-lo viver.

Mesmo que ele tivesse sido resgatado, ele não se importaria em dar a vida por uma chance de matá-lo. Ele simplesmente não podia deixá-lo viver.

Em vez de respostas, Elisabeth riu. No momento que se seguiu ela o chutou. Quando ele caiu, ela pôs um pé em cima de suas costas. A força era tanta que Kaito achou que sua espinha fosse se romper.

— Jamais pense por um momento sequer que pode dar ordens ao seu mestre, seu vira-lata. Suas palavras não mudam o fato de que ele é minha presa. Com ou sem o seu pedido eu planejo tomar a vida dele como meu brinquedo.

Elisabeth falou com frieza e mandou Kaito voando com um chute no estômago. Ele parou perto da parede e expeliu uma mistura de vômito e sangue. Elisabeth virou-se para o conde.

— Meu servo precisa aprender boas maneiras. Não se preocupe, agora podemos proceder sem mais interrupções.

Ela levantou seus braços majestosamente. As trevas e as pétalas carmesins circulavam pelo ar, envolvendo seu corpo.

Quando as trevas desapareceram e as pétalas caíram no chão, ela estava de volta com suas vestes usuais. Seus dedos esbeltos se envolveram no cabo da Espada executora de Frankenthal.

Ela colocou uma de suas mãos em seu busto bastante revelador, curvou-se de maneira formoza para o conde e fez sua proclamação:

— Bem vindo ao seu próprio Grand Guignol. Eu sou a audiência, sou a roteirista e a atriz. Não pretendo fazê-lo aproveitar nem um bocadinho se quer. Vou fazê-lo gritar como um porco e se contorcer como uma lesma.

Após esta grandiosa proclamação, ela empunhou sua espada. Correntes apareceram à sua volta e partiram em direção onde o conde estava instantes antes, mas as 8 pernas que possuía o permitiram esquivar com facilidade. Ele saltou para trás, derrubando alguns candelabros no processo. Ao inflar seu corpo, ele disparou penas de corvos contra Elisabeth, além de se preparar para lançar sua teia.

— Rá! muito fraco. Muito lento!

Elisabeth correu, tomando cuidado com os projéteis. O teto e o chão foram cobertos por buracos, mesmo assim ela não tinha um arranhão sequer. Ainda assim, ela não tinha aberturas para um contra-ataque. Ao perceber sua excitação, o conde riu com zombaria e disparou uma nova onda de ataques.

Ele ainda não havia notado as trevas e pétalas carmesins se aglomerando em seus pais e sobre sua cabeça.

De repente o chão e o teto começaram a fazer um som de gongo e começaram a esmagá-lo.

O conde foi prensado entre duas grandes placas de pedra. Uma vara dourada se assemelhando a um cano de órgão atravessava uma delas.

Kaito notou Elisabeth largar a vara. Ela se virou para o conde, o qual ainda não compreendia a situação em que estava.

— A roda da morte. Eu esmaguei o seu bichino, sabia? Mas quer saber, com você eu vou levar algum tempo.

As pedras começaram a fazer um som terrível quando começaram a rodar. Enquanto ela empurrava a manivela, as placas giravam como rodas. Uma delas ia no sentido horário e a outra no anti-horário. O corpo do conde estava sendo esfolado. As penas foram arrancadas e sua pálida e flácida pele começava a descascar. Sangue, gordura, e carne começavam a escorrer pelo chão.

O conde soltou um grito horripilante. Seu bico voou pela sala e a boca que cobria tremia de dor e medo. Sua orelha foi rasgada e os músculos de sua têmpora começaram a ficar lisos. Ele gritava de desespero.

"Elisabeth!!, Elisabeth!!!"

— O que foi, ó Conde? Você é tão desagradável quanto o grunhido de um porco. Você não pode manter um pouco de sua dignidade e ter a decência de gritar como um corvo?

— Posso te fazer uma oferta! Podemos fazer um acordo!!!

— hum...

As rodas pararam. Os olhos de Kaito queimavam de fúria.

— ... Nós não vamos aceitar nenhuma oferta que tenha a oferecer.

— Eu... Eu ouvi que quando você terminar de caçar os 13 demônios você vai ser queimada na estaca. Se me deixar viver, você não vai precisar morrer. Estou certo? Nossos objetivos são os mesmos. Por favor, não me mate.

Seu rosto havia sido raspado nas laterais, com sua boca vertical cuspindo saliva e sangue enquanto fazia seu pedido. Elisabeth murmurou — Entendo.

Ela sorriu com doçura para a grotesca criatura entre as rodas. Tremendo de medo, o conde dolorosamente devolveu o sorriso.

— Seu idiota!

Com um rugido, as rodas começaram a girar de novo. Balançando seus membros freneticamente, o onde soltou um berro, mas seu braços foram dilacerados e seus ombros ficaram lisos. Ele estava sendo esmagado como uma nós. A poça de sangue no chão ficava cada vez mais e mais repulsiva.

Os olhos de Elisabeth brilhavam com absoluta frieza enquanto olhava para o homem.

— Os déspotas são mortos, tiranos são pendurados e executores são executados. Assim é o mundo. A morte para os torturados deveria ser adornada com seus gritos, enquanto eles afundam no inferno sem nenhuma chance de salvação. Só nesta hora que a vida de um torturador está realmente completa. Ainda sim você torturou sem entender o mínimo disso? Você envergonha a si mesmo, Conde.

A voz de Elisabeth estava preenchida com ódio e indignação. Kaito nunca havia visto ela com uma expressão tão raivosa. As rodas finalmente pararam uma acima da outra. Sangue escorria da abertura entre elas. Elas já tinham terminado de esmagar o Conde, quando Elisabeth pôs um pé sobre elas.

— Você e eu. Nós fomos destinados a morrer, abandonados por toda a criação.

Ela lentamente levantou seu pé. Quando o fez, a poça de sangue se transformou em penas pretas. Elas planaram pelo ar, pararam por um momento e caíram no chão.

Elas caiam em silêncio de uma maneira bela, como se fossem flocos de neve pretos. Kaito apertou seu punhos enquanto as observava.

— ...Ei, e quanto as crianças nas estacas? Será que algumas podem estar vivas?

— Se estavam era porque o Conde as mantinha vivas com magia. Elas devem ter morrido junto com ele.

— ...Entendo...

— Qual o problema? É muito melhor isso que uma eternidade de sofrimento.

Elisabeth suspirou, parecendo estar incomodada. Kaito olhou para ela atordoado. Uma vez Elisabeth cometeu as mesmas atrocidades que os demônios estavam fazendo agora, ainda sim, de alguma forma, ela parecia fundamentalmente diferente deles. Pelo menos Kaito via uma grande diferença entre os dois.

Ele se levantou ignorando a dor e falou para ela:

— Obrigado, Elisabeth.

— Por que me agradecer? Eu apenas fiz com ele oque desejei. Para me agradecer por tamanha ação você que estar além do reino da idiotice, beirando a loucura. Não acha?

— Você vai morrer depois de matar os 13 demônios, certo? Mesmo assim você matou ele.

— Isso pouco me importa E eu certamente não fiz isso por você. Depois que eu atormentar os 13 demônios, ou, para resumir, torturar as minhas últimas 13 vítimas que a igreja me deu permissão, eu deveria pouco me importar com a morte. As pessoas sofreram muitas baixas para me capturar, então se ele querem minha morte, devo cumprir com meu dever e ser queimada viva.

Ela estalou seus saltos e começou a andar. Seu vestido negro flutuava enquanto ela continuava.

— Tendo vivido a vida cruel e arrogante de uma loba, eu devo morrer como uma porca imunda.

Elisabeth foi ficando cada vez mais distante e murmurou baixinho:

— ... Esta é a escolha que eu fiz.

Kaito foi deixando sozinho, olhando para o lugar. As penas negras tocavam seu rosto como se o ofendessem.

Ele pensou em Neue e na morte das outras crianças. Só ele sobreviveu. O final de sua fuga foi tão trágico que era quase cômico, mas não importava o quanto ele lamentasse a realidade cruelmente se recusava a mudar.

Por ele ter sobrevivido ele achava que havia algo que ele precisava fazer.

Recordando as últimas palavras de Neue, ele pronunciou para si mesmo.

— Não sei se terei muita sorte em achar a felicidade neste mundo."

Mas ele iria fazer tudo que fosse possível.

Apertando o seu ferimento, ele seguiu adiante, quando o fez uma das penas queimou em um fogo azul. Uma por uma o resto da penas seguiu o mesmo caminho.

Eventualmente as chamas azuis tomaram conta de todo o castelo.

Aquele lugar se tornou a casa de incontáveis mortes, as chamas tocaram os muros de pedra, parecendo cada vez que elas estavam em prantos.

// — // —

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