Torneio da Corte Brasileira

Autor(a): K. Luz


Volume 1

Capítulo 3: Primeira Fase

Uma maçaneta é girada, a porta é aberta.

— Finalmente acabou… — diz um rapaz ao sair do banheiro.

Seu suspiro de alívio soa pelo local. Ele caminha com uma toalha por cima do cabelo molhado, indo na direção de uma mesa. Seus fios são brancos, amontoados em mechas pontudas que ficam caídas. Sua altura é de 1,79 m.

— Então você veio, Jay. — A voz soa do outro lado do local, fazendo o citado se virar e ver o falante. É outro jovem, com uma altura similar a dele. O cabelo desse é amarelo e longo, amarrado para trás; a firmeza da sua expressão demonstra uma seriedade permanente.

— Oh! Ury!

— Sinceramente… — Ele cruza os braços. — Fiquei preocupado por não ter surgido notícias da sua chegada pela frente, já estava até pensando que não viria para o torneio. Só que no final das contas é o de sempre… estava apodrecendo no banheiro.

— Não diga dessa forma. Fazer o que, quando estou nervoso fico com dor de barriga.

—  E como ninguém te viu pela frente?

— Fui pela entrada de trás.

— Entendo. E pensar que você perdeu a divulgação do lado de fora por causa disso, que patético. — Seus braços se descruzam, ele vai para porta ao lado, que leva ao corredor. — Se prepare, eles vão começar a sortear os pares quando acabarem de limpar a arena.

— Sim, sim. Ah… E… ei… 

— O que foi?

— Não teve problemas para chegar no meu quarto? Tipo, pensei que os guardas não fossem deixar os lutadores se encontrarem tão facilmente nesses lugares.

— Humpf! Como se um deles fosse conseguir me barrar. — A porta é fechada, Jay deixa o quarto.

— Hahaha… é bem a cara dele, eu devia ter imaginado essa resposta. Será que não tem medo de ser desclassificado?... 

Jay se aproxima da mesa, enxugando o cabelo molhado ao se esfregar na toalha.

— “Você perdeu a divulgação do lado de fora”, é? Isso não vai ser um problema se eu ganhar o torneio, não acha, irmão? — Um sorriso se expande em seu semblante.

Algum tempo se passou. Ele anda pelo corredor, chegando em uma sala com a frente feita de vidro, conectando-se pelos lados com outras. É um andar oculto entre duas arquibancadas, parecendo, para o lado de fora, apenas uma cobertura negra na parede de concreto.

— Yo! — diz ao acenar para o irmão, que está observando a arena pelo vidro. — Bem que eles podiam colocar algumas TVs nos quartos, é inconveniente não saber o que está acontecendo lá embaixo.

— Para você em especial deveriam instalar uma no banheiro.

— Que piada horrível. — Jay para de se mover ao ficar ao lado dele.

Minutos se passaram. No centro da arena, o narrador aponta para uma assistente, dando o sinal para que gire a roleta com os nomes dos participantes, e, assim é feito. A imagem das letras se desfazem em borrões devido à velocidade, parando só após vários instantes. O selecionado aparece nos telões, fazendo a plateia levantar a voz em espanto.

— Que surpresa! — brada Gaojung. Laerte é o nome que está escancarado no telão. — Temos um dos favoritos para a primeira luta!

Depois de mais comentários serem feito pelo homem, a roleta volta a rodar, causando um arrepio em todos nos momentos finais do movimento, sendo pior para a maioria dos lutadores, que ficam com os olhos vidrados no objeto.

— Só pode ser brincadei...! — fala Jay, vendo que o nome “Traçal” está quase parando na marcação.

Lutador por lutador passa pela seta vermelha, gerando estalos que soam pesados pela mente de todos. O narrador fica boquiaberto, ficando mais ainda ao ver que o nome por baixo da seta é o do Traçal; um estalo é emitido na passada de mais um nome, substituindo o de antes por um chamado “Tansai”.

— Ah! Meu coração! — exclama Gaojung, segurando o microfone com as duas mãos; suor desliza pelo seu rosto. — Achei que ia infartar! Caramba! Por um instante quase tivemos o confronto mais esperado da noite na primeira rodada!

Alguns da plateia seguram a cabeça, outros suspiram densamente.

— Droga, minha barriga… — Jay a segura, esboçando um sorriso torto pela sensação que o aflige.

— Parece que não estamos com sorte — comenta Ury. — Se esses dois monstros se matassem agora seria muito proveitoso para nós.

Traçal gargalha, abrindo bem a boca enquanto bate a palma no peitoral, provando pelo som que são pancadas com força o suficiente para derrubar um homem. Ele está em uma sala VIP no último andar com o pai, um lugar mobiliado com poltronas vermelhas ornamentadas por bordas douradas; esculturas metálicas de bestas com bocas grandes e garras enormes, afiadas como os dentes salientes; pinturas moldadas com traçados puxados e intensos, formando imagens de brigas violentas, cumprindo os seus propósitos como registros. Dois guardas ficam parados ao lado da porta, congelados sem esboçar nenhuma ação.

— Escapou por pouco, Laerte! Hahahaha! — Ele cerra o punho, destruindo a taça que segura. Seu pai é impassível, não demonstrando nenhuma reação ou palavra sobre a situação.

O tempo passa, a roleta é girada várias vezes, decidindo o destino dos lutadores restantes. Após todos os sorteios, a tabela é exibida no telão, fazendo o público bater palmas junto de assobios altos.

“Confrontos da primeira rodada:

[Laerte vs Tansai]

2º [Traçal vs Omnislai]

3º [Poker vs Kimai]

4º [Ury vs Sencastroll]

5º [Kobele vs Holpos]

6º [Unsai vs Kaon]

7º [Jay vs Darada]

8º [Humine vs Oralo]”

— A primeira luta será à uma hora da madrugada! — fala Gaojung. — Até lá alguns vídeos sobre o circuito profissional desse ano serão passados! Vejo todos vocês de novo em breve!!

Uma bochecha negra se mexe, mastigando o que foi abocanhado da barra de chocolate. Laerte joga na lixeira o que restou do pacote.

— Ah! Que azar, que azar! Queria ter caído na última. — Ele põe as mãos nos bolsos, continuando a caminhada pelo corredor dos quartos. — Mas é isso… Devo me aquecer, o mestre disse que me mataria se eu não levasse esse torneio a sério.

 

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— E enfim chegou a hora! — Gaojung está sentado, compartilhando a mesa com uma mulher. — Não estarei sozinho na narração dessas incríveis lutas, a senhorita Malena irá me acompanhar nesta jornada, e espero que ela não me deixe muito para trás com seus dotes nisso.

— Hahaha! Não diga isso, senhor Gaojung. — Malena é jovem, seu cabelo longo possui um tom leve como o tom da sua voz. — Estou muito longe do seu nível, então estou honrada de estar aqui com você hoje. Espero criarmos bons momentos juntos.

A mesa em que estão fica localizada acima de uma arquibancada, em uma posição com boa vista tanto da arena quanto do telão. 

— Diga Malena, como você acha que serão as coisas nesse primeiro confronto?

— Sendo sincera, estou confiante no mesmo que a maioria está. Laerte é um oponente que temo que Tansai não esteja à altura, mesmo que tenha ficado bem colocado no circuito amador do ano passado, não conseguiu chegar nenhuma vez perto do desempenho dele.

— É, vocês ouviram, as coisas estão tensas para Tansai, é algo inegável. Pessoalmente estou mais confiante, não julgo que será uma vitória fácil para Laerte, pois Tansai é um lutador experiente no cenário amador, e se passaram vários meses desde que tivemos algum registro de suas lutas. Para existir tanto sigilo sobre ele, significa que o treinamento deu “frutos” novos, que provavelmente serão postos em prática.

— São especulações interessantes. Bem, no fim, só saberemos quando a luta começar.

— Falando em começar… por que não começamos de uma vez?! Hahaha! — Gaojung levanta o dedo, apontando em seguida para uma das entradas na arena. — Está na hora! REVELE-SE AO MUNDO, TANSAI!!!

Os barris ao lado da entrada jorram faíscas, holofotes vermelhos circulam pelo lugar, a plateia grita. Uma silhueta masculina surge da fumaça, expondo-se ao passar pela linha dos barris.

Tansai possui 1,80 m de altura, usa um quimono com uma faixa preta na cintura, tem um semblante rígido, que fica franzido quase numa expressão de ira, mantendo essa seriedade por todo o tempo; seu cabelo é curto e baixo, penteado para o lado. As faíscas e outros efeitos cessam, ele para ao ficar perto do centro da arena.

— Uoh! Ele está bem imponente! — comenta Gaojung, a moça ao lado também transparece certa surpresa. — E olhe seu físico! Nem parece o mesmo do último circuito amador!

— Deve ter treinado muito para construir esse corpo. Eu retiro o que disse antes, não consigo mais o ver da mesma forma.

— Sim! Não precisa nem de uma luta para sabermos… — Tansai junta os pés e fica com os braços à frente, com os punhos na altura da cintura, enchendo os pulmões de ar. Ele abre a postura, firmando uma base com os pés distantes para os lados, mantendo o braço direito recuado com o punho cerrado enquanto o esquerdo fica estendido com a palma aberta. O ar à volta do rapaz fica denso, fervendo no vapor transparente da sua temperatura, da sua determinação.  — ...que Tansai é forte!

Os barris da outra entrada jorram faíscas azuis, a plateia saúda a chegada do lutador restante com mais ânimo, o suficiente para fazer o lugar ser engolido pela barulheira.

— E lá vem ele!! Um dos milagres da nova geração! vencedor absoluto dos circuitos amador por mais de dois anos!! LAERTE, A LANÇA IMPARÁVEL!!!

O rapaz atravessa a fumaça, rasgando-a com um passo largo; ele assopra, demonstrando o quão relaxado está pelos olhos entreabertos. Laerte possui músculos além da média, sendo mais largo que o oponente, como a diferença de um tank de guerra para uma caminhonete; não que Tansai também não seja além da média, é apenas uma questão de a diferença entre os dois ser o equivalente a de alguns patamares. O rapaz está vestido com um calção e tênis de cano alto, usando luvas azuis com fitas enroladas a partir delas até metade dos braços.

Um juiz corre até o meio dos dois, iniciando uma conversa com cada.

— Laerte também não esteve nenhum pouco parado no tempo! — O narrador bate a palma na mesa, inclinando-se sobre ela. Suor escorre pelo seu rosto, ele olha incrédulo para o rapaz. — Nunca imaginei que fosse vê-lo tão diferente em tão pouco tempo! Que absurdo!

— Apenas… — Malena segura as bordas do queixo, quase cobrindo a boca com os dedos. — O quão forte ele ficou?...

— Ha ha ha! Assustador! Eu mal posso acreditar que são jovens que ainda não entraram no mundo profissional! Eles certamente não são como os outros! Como o esperado de um evento do Holliver, extraiu um potencial inacreditável dos lutadores!

— O juiz não parece ter encontrado qualquer problema com os dois, o combate está perto de começar! Meu sangue está fervendo!

— Vocês já conhecem sobre a falta de regras nos torneios do Holliver, mas vou relembrar as condições para uma derrota: qualquer revelação de armas; sair da arena; desistência; um participante não ter mais condições de continuar; ataques intencionais que machuquem pontos vitais como os olhos ou reto; o juiz julgar que um está correndo risco de vida pelos ferimentos. São esses. Esses rapazes nunca participaram oficialmente de algo tão “aberto”! Seus pescoços podem estar em risco aqui, como agirão nesta pressão?! O que os aguardam é glória… ou miséria?!

O juiz se distancia com um apito na boca, levantando o braço.

— Não fica cansado nessa pose? — pergunta Laerte em um tom brando. Ele salta algumas vezes onde está, parando ao balançar em um ritmo lento com os braços à frente, próximos do rosto, em uma genuína pose de boxe.

— Posso ficar três dias inteiros nela.

— Ah! sério? Mas tome cuidado, quando “aquele” som soar, ela não vai durar cinco segundos.

— Humpf! Faça se puder! Eu vou nocauteá-lo sobre esse chão, Laerte! Hoje será o dia da sua queda!

— Interessante.

O braço do juiz é abaixado, o apito soa alto. A plateia comemora, a luta começa.

Um tênis acerta o chão, levantando poeira pelo impulso da investida do Laerte, que borra o contorno da sua imagem, estando prestes a disparar um cruzado de direita. Seu olhar amarelo é destacado pela imagem conturbada que se torna — tamanha velocidade —, apertando a pupila que reflete o adversário, esmagando-o.



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