Volume 1
Capítulo 10: A Persistência da Fera
Traçal estende o braço esquerdo à frente, mantendo o punho direito alinhado na cintura.
— E AÍ ESTÁ!!! — grita Gaojung. — Ele existe! O estilo híbrido de Lorde e Shinsai... existe!!
— Depois daquele golpe — fala Malena —, Traçal enfim decidiu levar a luta totalmente a sério! Ele sentiu que a “lança” do Omnislai pode derrubá-lo da glória!
O próprio, inspira fundo com os olhos fechados por alguns segundos. Ele ouve com nitidez o som dos narradores e plateia, pensando:
“Calem a boca…” pensa. “Vocês não sabem de nada… Pensam que as coisas aqui estão tão simples. Hahahaha! Ingênuos irremediáveis, voltem para o útero de suas mães para recomeçar uma vida que sirva ao menos como estrume!”
Omnislai vê só o oponente na arena, sentindo toda a pressão que ele emite de vermelho e azul se moverem mais rápido no turbilhão. Os braços dele passam pelo ar em movimentos circulares fluídos, virando as articulações constantemente.
“Está vindo!”
Areia explode, Traçal desaparece com uma investida que o leva ao limite da sua velocidade, surgindo na frente do oponente em uma postura bastante inclinada para o lado, arremessando o braço esquerdo como uma alabarda que busca o pescoço do Omnislai. Um azul toma a realidade dos arredores; o rapaz fica assustado com a velocidade, desviando para o lado quando os dedos estão próximos da sua carne.
Poeira se espalha à volta.
Traçal não perde tempo com a falha, recuando o membro imediatamente enquanto fortalece os músculos do braço direito, girando o tronco ao projetar o soco, passando-o pelo chão como se virando uma marreta. Os arredores são encobertos pelo vermelho; Omnislai esquiva com um passo súbito para trás, evitando que sua cabeça fosse pelos ares com a subida do golpe.
“São definitivamente ataques lançados de balanços largos…” O rapaz olha para Traçal enquanto ambos ainda estão presos nos movimentos. Sua zona está ativa, voltando a assimilar o redor como um branco absoluto com partículas negras caindo lentamente em um trajeto diagonal. “Então por que são tão difíceis de desviar?...”
Omnislai pisa bem à frente, rodando o corpo com tanta força que distorce o solo em uma espiral, destacando o olhar no meio da impulsão que o torna um vulto, ofuscando tudo com o estouro do soco. Ele quebrou mais uma vez a barreira do som.
“(...) como querem falar alguma coisa não sabendo merda nenhuma?”, pensa Traçal. O tempo está quase parado, ele se encontra no ar com o corpo envergado prestes a se chocar no concreto da parede. A plateia e os narradores estão pasmos. “Não conseguem nem ver no que essa luta se tornou… Que isso já foi além de uma batalha mortal, que é uma conversa com nossas vidas em jogo! ‘Compartilhamos de um destino embaixo das rochas’, esse confronto é uma obra do destino, e, será eu quem vai pô-lo ao seu favor!”
Uma nuvem de poeira é levantada com a colisão no muro, poucos instantes depois Traçal surge de lá avançando, deixando um traçado de sangue desde o canto da boca. O mundo fica vermelho; Omnislai move a cabeça para o lado enquanto se inclina junto, saindo da trajetória da ofensiva, dando a volta pelo adversário com uma corrida, que o persegue com um giro repentino do corpo sem sair da área em que está.
Eles trocam olhares afiados nesse cenário puxado pela velocidade, sendo o robusto o primeiro a atacar, aproximando sua mão esquerda em um ataque lateral visando o fígado; a realidade fica azul, clareada quando o corpo do Omnislai bate sobre uma parede de ar, rompendo-a num aumento de velocidade, já aparecendo do outro lado do adversário; no soar de um som altíssimo, Traçal é jogado de novo contra a parede.
— O-o que está acontecendo?! — indaga Gaojung, estando com os olhos arregalados ao máximo. — Ele está sendo jogado de um lado para outro! Sempre voltando como um tigre furioso!! E que som alto esses golpes têm!
O robusto é mandado mais uma vez contra o muro.
— A terra da arena foi manchada de vermelho! Isso já não é uma luta até a morte?! Será que já não é o momento para o juiz encerrá-la antes que o pior aconteça?!
Traçal dispara um soco de direita contra o rosto do Omnislai, que o vê saindo com a explosão de um canhão, sentindo o ar ao lado da cabeça ser pulverizado em um formato circular. As articulações deixam da perna deixam traços de luz verde para trás na ação súbita; ele chuta o adversário no rosto, amassando a cara da fera.
O robusto tenta acertá-lo com um chute baixo, mas é notado, fazendo o oponente ir para trás no mesmo instante. Ele investe na busca de impor um ritmo, lançando, com a mão esquerda, estocadas e cortes, e com a direita, “marteladas”, espalhando algumas manchas vermelhas e azuis nas falhas.
“Mestre Lobo, será que era assim que você se sentia na guerra? Está a beira da morte é um sentimento interessante, mas nada divertido…”, considera Omnislai. No fim os ataques inimigos são ignorados nos acertos dos socos impulsionados, dizimando a tempestade de duas cores com os estouros de branco total. Traçal é jogado contra o muro continuamente.
Sangue escorre para o solo, formando uma pequena poça; um som de vômito soa da nuvem de poeira. É da mão direita do Omnislai que todo esse vermelho sai, estando quebrada; é do robusto que o barulho de vômito soou, tendo sujado o seu peitoral de vermelho.
“(...) apesar de está me sentindo sereno, sinto medo de não poder ver nunca mais todos da academia.” Ele retoma a postura de luta com a qual sempre aguardou as investidas do adversário, com a diferença da inversão que fez para ter mais foco no lado esquerdo do corpo. “Mestre Lobo, você me acolheu quando minha família morreu naquele desastre. Deve estar se sentindo culpado por isso até hoje, mas espero que um dia entenda que não tem culpa de verdade nisso. Ah! cara, isso me lembra o quão difícil foi convencê-lo a me treinar e a reabrir a academia. E caramba, foi dureza correr tanto todo dia, no começo o treinamento foi cabuloso…”
Um sorriso se forma no seu rosto.
“Não se sinta mal, não fique preocupado; porque não sinto nenhum desgosto com a vida que tive, mestre… ou melhor, pai?”
Traçal arranca na direção dele, vendo bem que o oponente está prestes a liberar o soco impulsionado. O azul toma a realidade; a mão esquerda vira para tentar parar o vulto verde que passa direto, ofuscando tudo em uma infinidade de claridade com o impacto.
O tempo salta. A plateia e os narradores bradam com muita euforia, mas os sons deles são quase inaudíveis; as cores que formam tudo também estão estranhas, parcialmente obscurecidas, ameaçando desaparecer às vezes em um mundo de escuridão. É como a realidade se tornou para o robusto, que está cravado na parede, havendo algumas pedras caindo sobre seu corpo antes de pousarem na terra.
Ele suspira, portando um olhar vago para o alto. Seus danos internos acumulados são incalculáveis; os órgãos foram revirados muitas vezes, as costelas estão trincadas no centro no ponto de estarem próximas de quebrar.
Em um cenário de luminosidade, há tons amarelos que parecem flores espalhados e, também, a forma de uma jovem. Ela tem cabelos longos e usa um vestido modesto, estando com as costas apoiadas sobre o nada. Mãos masculinas seguram as mãos magras e pálidas que estão caídas; a boca com bochechas secas diz algo, os lábios cansados tentam se mexer.
“Me leve para o topo”, pensa Traçal, tirando devagar as costas da parede, tendo a camisa rasgada pelas rochas. “Mesmo atualmente você ainda é irritante.”
Ao levantar ele puxa o que sobrou da peça de roupa, jogando-a para longe.
— Não precisa repetir, sempre esteve claro na minha mente.
Ele surge à frente do oponente com uma expressão torcida, prestes a mandar um soco de direita, mantendo os dentes à mostra e um olhar com parte do reflexo manchado de vermelho.
Omnislai vocifera alto, respondendo o ataque inimigo com um soco impulsionado que o acerta no plexo solar; o golpe do Traçal estendido para o ar estremece o ar, empurrando poeira desde as costas do oponente, um momento que é engolido pela realidade de luzes ofuscantes criada pelo outro impacto, que teve êxito. Sangue vaza para fora desde as bordas da boca do robusto, uma imagem que é tomada pelo aumento massivo da luminosidade.
“Vou levá-la para um lugar tão alto que vai se borrar de medo com à altura.” Traçal sai da poeira; ambos os lutadores rugem antes de tentarem se golpear, aumentando a intensidade dos traços que os moldam. Omnislai amassa o tronco do adversário com o golpe, refletindo-o contra o muro, mas não demora para ele voltar, sendo jogado de imediato para longe mais uma vez.
A batalha prossegue neste ritmo, a arena fica com crateras por todas as paredes, a terra fica marcada por gotas de sangue e movimentações repentinas.
A plateia — tanto a de baixo quanto as das salas VIPs — e os narradores ficam calados no soar do apito. O juiz declara o fim da luta.
Traçal está com um punho direito estendido, não tocando em nada, ficando congelado nessa posição. Sangue escorre para o chão, formando uma pequena poça.
— Oponente sem condições de continuar!! — grita o juiz, mantendo a mão levantada. O volume da sua voz é aumentado nas transmissões dos telões, chegando a todos que aguardam o fim de suas palavras. — Declaro Traçal o portador do direito de avançar para a próxima fase! Declaro ele, o vencedor!!
À alguns centímetros do punho está a face do Omnislai, uma desprovida de vida, sem qualquer reflexo de luz nos olhos; está escorrendo muito sangue pelo nariz dele, deslizando até o queixo antes de ir para a poça. O corpo do rapaz cai de frente, balançando as mechas bagunçadas antes do baque abafado pela colisão na terra.
Traçal ri, se virando para caminhar ao pôr uma mão no bolso e erguer a demais em uma comemoração, pensando:
“No final… depois dele ter imergido na Zona, não consegui tocá-lo nenhuma vez.” O público glorifica o vencedor, afundando o edifício em uma empolgação descomunal. “Foi uma boa ‘conversa’, caipira. Ambos perdemos coisas ‘naquele dia’, e viemos parar nesse mesmo palco de merda… coincidência? Bem, tanto faz. A gente se esbarra por aí!”
— E TRAÇAL LEVAAA!!! — grita Gaojung. — Depois de minutos de tensão, que afundaram nossos corações em um abismo, temos a confirmação da presença do favorito na próxima rodada!! Provando o porquê de haver tantas expectativas sobre ele!! “Não tem yrai?”, não importa! pois ele prossegue... absoluto!!
— Mas o que aconteceu?! — pergunta Malena. — Ele ganhou sem bater mais no oponente?... Apenas o que diabos aconteceu?
A equipe médica chega para verificar a condição do Omnislai. Ele está com as mãos destruídas, continuando desacordado.
Traçal desaparece nas sombras do corredor escuro.
Na arquibancada em que está Lobo, os membros de sua academia estão chorando, com exceção do próprio.
— Mestre… — diz um jovem ao lado. — Omni foi tão forte, mesmo assim não conseguiu ganhar… O que deveríamos falar para ele quando o vermos?
O idoso fica calado por alguns segundos, abaixando a cabeça antes de responder:
— “Vamos correr.”
— Hã?
— Não precisa de mais nada, idiota. Ele nunca foi um garoto tão complicado. — Lágrimas escorrem do canto de seus olhos. — Nunca foi…
Ele se recorda de quando se ajoelhou com a testa no chão, em um pedido de desculpas para o garoto à frente.
“‘Tudo bem, vovó, eu te perdoo’, foi o que ele disse… Você não deveria aceitar as desculpas de quem matou seus pais tão facilmente, garoto… Eu pretendia cometer suicídio depois daquele terremoto, mas aí descobri que não havia sobrado nenhum parente para cuidar de você. Apesar de eu não ter salvado ninguém que te era importante, você salvou um velho assassino. Me perdoe, Omni… Não consegui te tornar forte o suficiente para vencer este torneio, mas estou feliz que tenha saído vivo…”
[2° Luta (1°F) - Traçal vs Omnislai
Duração - 11 m 5 s
Vencedor - Traçal
“Eu senti como se os minutos fossem horas. O desenvolvimento do Omnislai no meio da luta foi algo absurdo, Traçal nem conseguia mais tocar nele, só que no fim parece que o próprio corpo dele não aguentou tanto esforço. Devo destacar também a defesa do Traçal, aguentar aquelas pancadas que faziam aqueles estrondos não deve ser brincadeira… Ele é feito de aço?!”, comentário por Gaojung.]