Tokyo Ravens Japonesa

Tradução: Nie

Revisão: Math


Volume 10

Capítulo 1: Coelho do Tempo Sombrio

 

 

“Acredito que a essência da magia é o que chamamos de mentira.”

“Mas a verdade às vezes não é mais falsa que a mentira?”

 

~ Tsuchimikado Harutora.

 

PARTE 1

Isso ocorreu muitas noites mais antes...

Aquele altar ficava no telhado de um edifício.

Os torii foram erguidos nos quatro lados de uma plataforma construída em pedra. O torii norte era preto, o torii leste era azul, o torii sul era vermelho e o torii oeste era branco.

A plataforma já havia sido montada em muitos pedestais, dispostos com uma infinidade de oferendas. Moedas de prata, seda branca, um cavalo de papel, um soldado de papel, armadura completa, arco e flechas, uma espada longa, esmalte cloisonné, ouro, um koto, um alaúde. Havia também muitos vasos feitos de papel cuidadosamente infundidos com energia mágica por quem gerenciava a plataforma. Ao lado deles também havia ferramentas de rituais – um tambor de taiko, uma concha, sinos de trenó, um gohei, incenso, um sino de mão, uma boneca vodoo e talismãs.

O ritual já havia sido preparado adequadamente. O vento soprava através do topo do telhado. O céu se iluminava lentamente e toda a escuridão era afastada pelo sol. Logo amanheceria. O momento em que o sol e a lua trocavam de lugar era iminente.

Havia cinco figuras na plataforma. No centro estava um garoto envolto em um casaco preto, o olho esquerdo coberto com um pano. A bainha do casaco preto era levada pelo vento.

Na frente do garoto havia um pedestal sobre o qual estava uma garota. Era como se ela estivesse dormindo, mas o uniforme em seu corpo estava ensopado de sangue. O vento roçava suavemente contra a garota, e a fita rosa amarrando os longos cabelos negros da garota balançava suavemente.

Atrás do garoto e da garota havia duas figuras assistindo tudo. Uma era uma mulher com orelhas e cauda animalescas, e a outra era um homem com apenas um braço. Os dois ficaram parados sem dizer nada, esperando em silêncio pela chegada daquele momento.

A pessoa final era uma garota pequena que havia preparado o ritual enquanto esperava por eles. Sua expressão era fria enquanto olhava para o garoto atencioso.

O garoto estava olhando em volta com o olho direito restante para verificar o altar. A garota esperou que o garoto terminasse sua inspeção, depois caminhou em direção a ele, dando-lhe uma folha de papel que havia sido dobrada várias vezes. Este seria o roteiro da oração do ritual.

O garoto recebeu o roteiro e o segurou contra o peito por um momento, fechando os olhos. Depois de um tempo, ele acenou com a cabeça para a garota. Depois que a garota pegou um martelo, ela bateu no taiko.

*Boom.... Boom... Boom... Boom... Boom... Boom...*

Ela bateu seis vezes. Então, ela pegou a concha e soprou. O som continha energia mágica e gradualmente permeava o ar do amanhecer, mas a última nota ecoou pela área várias vezes.

As duas figuras assistindo tudo por trás viraram seus corpos levemente.

O casaco preto em volta do garoto inchou como se estivesse respirando. O garoto segurou o roteiro diante de si e entoou em voz alta o encantamento.

“A seita Onmyoudou Tsuchimikado gostaria de se dirigir a Taizan Fukun, o senhor do submundo...”

... Isso aconteceu há muitas noites.

A roda do destino que transcende o tempo acelerou.

 

PARTE 2

O vento soprando na floresta intensificava o frio do inverno. O corpo pequeno da garota não podia deixar de tremer, então ela levou a vassoura de bambu ao peito, esfregando as mãos. O topo da montanha sempre sentia a chegada do inverno mais cedo do que o sopé. A respiração que saía de sua boca instantaneamente se tornava uma névoa branca e fraca.

Ela olhou para cima, onde o céu escuro estava coberto por galhos em toda parte. As folhas vermelhas brilhantes começaram a desaparecer nesses últimos dias. As frutas maduras ocasionalmente deixavam as pontas dos galhos, caindo livremente. Graças a isso, ela não seria capaz de varrê-lo, não importando o quanto varresse.

 

 

“Hah...” Com esse suspiro, a garota olhou para as folhas caídas.

Não muito depois.

“Akino! Você ainda não terminou!?”

Um rugido veio de um lugar muito distante. A garota chamada Akino gritou um ‘Sim...!’ depois de ouvir isso e, no momento seguinte, o cabelo da garota pareceu flutuar para cima.

A garota rapidamente cobriu a cabeça com as mãos e, em troca, a vassoura caiu no chão.

“Ah... Ah...” Ela olhou para a vassoura caída no chão, e os óculos mal ajustados em seu rosto também deslizaram sem perder o ritmo. “Uuu...” No final, Akino gemeu baixinho enquanto segurava a cabeça com as duas mãos e os óculos pendurados. Ela se virou para olhar na direção do rugido.

Além das folhas de bordo avermelhadas, vários enormes e antigos cedros se erguiam ao redor. Um antigo salão podia ser visto do outro lado dos cedros. Um monge budista franzindo a testa andava de lá, vestindo uma túnica negra de sacerdote sobre uma antarvasa kasaya. Ele era o ajari com excesso de peso deste mosteiro.

“Ah, Sacerdote Tadanori...”

“Os outros já terminaram, você é a única que sempre demora.”

“A-Ah... Desculpe...”

Akino pensou em fugir enquanto pedia desculpas em uma gagueira. Embora ela tivesse se desculpado, sua voz era quase inaudível, a menos que alguém ouvisse atentamente.

Sem saber por que, o monge franziu a testa e olhou para a garota com um olhar assustador. O monge reclamou para a garota com uma expressão resignada, mas os olhos de Akino olhavam cautelosamente para cima e o monge só pôde forçar-se a engolir toda a sua raiva.

“... De qualquer forma, apresse-se e termine. Vamos preparar o almoço, então vá ajudar a preparar a comida!”

“C-Certo...”

Akino respondeu imediatamente e pegou sua vassoura, ajustando os óculos ao mesmo tempo. Depois que Tadanori olhou para a garota novamente como se a estivesse exortando, ele voltou para o salão.

Tadanori era o responsável pelo vihara e era um homem que gostava de repreender os outros, mas agora ele se tornara cauteloso. Não só ele, todos os adultos deste mosteiro estavam assim. Era uma sorte rara quando as divergências eram resolvidas sem irritação.

Mesmo com isso dito, nada realmente acontecia.

Akino apressadamente varreu todas as folhas em uma cesta. Depois de jogá-las no incinerador atrás do mosteiro, ela caminhou em direção ao armazém para ajudar a preparar o almoço. Havia uma cozinha do mosteiro no armazém, além de muitas salas para monges. Havia também cozinhas instaladas nos aposentos dos monges.

Gritos soaram no instante em que ela entrou.

“Você é lenta! Akino! O que você estava fazendo!?”

“Desculpe-me...”

“Akino, não há lenha suficiente!”

“C-Certo... Eu vou pegar um pouco agora...”

Akino respondeu enquanto corria para a direita, trazendo consigo a lenha empilhada sob os beirais do edifício. Provavelmente por o gás ser muito caro, seu uso era restrito. Por isso, eles basicamente usavam um fogão a lenha para cozinhar alimentos todos os dias.

Mas o método de iluminação deles era muito único – era realmente muito estranho.

Os veteranos do vihara estavam em frente ao fogão, formando selos de mão em sua direção e entoando encantamentos com os olhos semicerrados. Não muito tempo depois, a lenha dentro se acendeu em chamas.

Isso era magia.

Além disso, era classificada como uma verdadeira magia de Primeira Classe sob a lei Onmyou moderna.

“Tire os pratos agora, Akino!”

“Certo...”

“Apresse-se um pouco...!? Você, isso de novo!?”

“D... Desculpe...”

Repreensões irritadas e impacientes criticavam a lenta idiota. Akino, chorando, pegou os pedaços do prato quebrado. Mas ela ainda fora repreendida em voz alta por seus veteranos depois disso. Akino gritou apressadamente enquanto lidava com sua tarefa. A dieta do mosteiro deveria ser vegetariana, mas isso não era seguido rigorosamente. A pobreza era uma coisa, mas comer carne sem preocupação era outra. O que eles estavam assando agora era o veado que haviam caçado vários dias antes.

O estômago de Akino roncou de fome. A tampa da panela batia e começava a tremer como se respondesse a ela.

Depois de terminar o almoço e limpar as coisas, Akino teve um pouco de tempo livre até a hora de preparar o jantar que eles chamavam de ‘despejo’. Akino observou, disfarçadamente, os veteranos, enquanto pegava uma pequena fogueira do armazém e algumas pequenas batatas-doces e caminhava para o templo na metade dilapidada dos terrenos do mosteiro.

Akino cavou primeiro um buraco raso no chão. Depois de colocar as batatas doces, ela colocou as folhas caídas em cima, acendeu-as e cobriu-as com cinzas. Depois de verificar se as folhas tinham pegado fogo, ela se sentou em silêncio na base de um cedro que ficava próximo.

Como não chovera recentemente, as folhas queimaram em cinzas muito rapidamente. Akino assistiu as cinzas serem levadas pelo vento enquanto esperava silenciosamente que a batata-doce terminasse de assar. Era para evitar ser repreendida por Tadanori se ele a visse em seu esconderijo, secretamente assando e comendo comida, que ela fugira. Mesmo que ela fosse vista por outro veterano, tudo seria confiscado.

O mosteiro em que Akino morava se chamava Templo Seishuku. Era um mosteiro situado perto do pico de uma montanha, longe da civilização. Chegar ali era extremamente difícil e era como um lugar isolado do mundo exterior.

Não, não era ‘assim’, era para ser isolado. Até os arredores do mosteiro escondiam ativamente sua existência do mundo. Era um lugar que havia sido esquecido pelo tempo. Era um mundo diferente além do pé da montanha, um verdadeiro mundo alternativo montanhoso.

Akino era a mais nova nesse mundo alternativo e também a mais fraca. Ela estava sempre no fundo da hierarquia. Deixando de lado as aparências por enquanto, ela estava em uma posição em que lhe era negado tudo. Mesmo no almoço, pouco antes, nada do delicioso veado havia sido compartilhado com ela. Mesmo tendo poucas expectativas, ela acabara decepcionada. Então, ela aproveitou a oportunidade que viu para matar a fome em seu tempo livre.

O calor do fogo já havia desaparecido. O ar frio parecia penetrar em seu corpo, pouco a pouco, enquanto ela permanecia sentada diretamente sobre o chão. Mas era uma sorte que não estivesse ventando. Akino colocou os braços em volta dos joelhos, curvando-se em uma pequena bola e silenciosamente olhou para as cinzas. Akino pensava que, se assim pudesse deixar as batatas doces um pouco mais quentes e um pouco mais deliciosas, ela não se importaria em esperar no frio. Seu coração também estava um pouco feliz, e também tenso, por roubar comida. Na verdade, assar batatas-doces era a única coisa que Akino sentia diversão nos últimos dias.

“... Batata-doce~ Batata-doce~ Você já terminou? Deliciosa~ Quente~ Estalando...”

Não era claro se elas já haviam assado ou não, então saber o tempo exato dependia da própria intuição de Akino.

“Elas estão quase prontas... Ah, vou esperar um pouco mais.” Assim que Akino, sem pressa, falou consigo mesma...

“Ei, Akino!”

De repente, uma voz soou atrás dela e Akino ficou sem fala por medo. Ela segurou os joelhos e, ao mesmo tempo, seu corpo ficou rígido. Simultaneamente, acima de sua cabeça – a área no topo, onde não deveria haver absolutamente nada – ocorreu um ‘distúrbio’, um fenômeno que se chamava Lag. Então, as coisas escondidas ali se materializaram e se revelaram.

Duas orelhas compridas se projetavam levemente. Eram duas orelhas de coelho, cobertas de pelo prata-esbranquiçado. Não foram apenas orelhas. Uma cauda curta e felpuda também apareceu em sua bunda, que estava no chão. Era uma cauda de coelho, assim como suas orelhas.

Akino, com olhos arregalados, não conseguia se mover, e apenas suas orelhas giraram em todas as direções em pânico.

“Haha.” Uma risada seca soou depois que Akino foi vista assim. Depois de ouvir isso, sua tensão desapareceu repentinamente e ela relaxou, as orelhas em sua cabeça desabando como se tivessem ficado sem energia.

“Sen-jiichan...”

Ela olhou para trás com uma expressão infeliz enquanto um homem idoso saia de entre os cedros, sorrindo. Seus cabelos brancos caíam em um coque vertical e tomados com sua barba branca, não lhe escondiam sua idade, mesmo que de relance. Estranhamente, ele usava um casaco branco desgastado, hakama remendado e um atraente vestido de linho. Mas inexplicavelmente, ele não parecia confiável à primeira vista, não apenas por sua aparência preguiçosa. Um sorriso provocador surgiu em seu rosto cheio de rugas quando ele revelou uma disposição infantil e fofa.

“Não fique tão surpresa, Akino. Você não teve bastante prática.”

“Foi Sen-jiichan quem me assustou~ Principalmente por você ter mudado a voz...”

“O que você pensa que eu sou, para ter tanto medo de mim? Para que servem aquelas orelhas compridas?”

“Eu não as tenho porque gosto delas...”

“Haha, você provavelmente ficou feliz em ver as batatas-doces. Tadanori-san notará você mais cedo ou mais tarde, se continuar assim. Ele está irritado recentemente, então você definitivamente terá uma séria repreensão se for pega.”

Sen riu alto, mas Akino franziu a testa, com suas orelhas se curvando em formato de. Na verdade, desde que Sen a notara, ela não podia afirmar que Tadanori não o havia feito.

“Elas não são orelhas valiosas? Você sempre as esconde, devia usá-las se forem eficazes.”

“I-Isso não é da conta de Sen-jiichan.”

Akino fez beicinho, abraçando firmemente os joelhos e se curvando em uma bola. Mas ela não podia esconder suas orelhas agora.

Akino era uma daquelas que eram chamadas de ‘possuídas’.

Parecia que as pessoas assim também eram chamadas de ‘espíritos vivos’ recentemente. Os chamados ‘espíritos vivos’ originalmente se referiam a pessoas que foram possuídas por ‘Oni’ e que, portanto, se tornariam ‘Oni’. Mas nos tempos modernos, enquanto se acreditava que ‘Oni’ era uma espécie de espírito, parecia que as pessoas possuídas por outros espíritos que não ‘Oni’ também eram coletivamente chamadas de ‘espíritos vivos’. Nesse sentido, os espíritos vivos não eram raros neste Templo Seishuku, pelo menos deixando de lado como a sociedade era normal. Embora não se pudesse dizer que houvesse muitas, pessoas possuídas por inugami ou raposas geralmente iam para lá.

Infelizmente, Akino não era um espírito comum.

Ela era o espírito vivo de um ‘coelho’ que não era visto com frequência neste mundo.

“Não importa o quanto você queira escondê-las, parece que elas aparecerão toda vez que você for assustada. É como um kitsune tentando esconder sua cauda com pouca capacidade de transformação.”

“Você não precisa se preocupar com isso. Embora eu ainda não esteja qualificada, poderei escondê-las bem enquanto praticar mais.”

“Não importa o quão bem você as esconda, todo mundo vai saber sobre suas orelhas em breve.”

“Isso não importa. Eu quero escondê-las.”

Akino, de mau humor, aumentou o tom de voz.

Aquelas longas orelhas de coelho eram a raiz do complexo de inferioridade de Akino.

Ela não sabia ou queria saber o que as outras pessoas pensavam, mas para Akino, ter ‘esse tipo de coisa’ em sua cabeça só parecia perturbador e verdadeiramente inútil.

Havia pessoas que a chamavam de coelhinha e outras que a evitavam e não gostavam dela.

Mais importante, a própria Akino definitivamente não tinha talento para se tornar boa nas coisas – pelo contrário –, desde que ela era uma idiota e, devido à atenção contraproducente de seu raro espírito de coelho, ela acabara sendo tratada como uma idiota e recebia ordens .

Outras pessoas também a tratavam como um animal exótico.

Para Akino, essas orelhas odiosas eram o símbolo dela sendo tratada como um objeto inútil.

“Eu mesmo acho que elas são um par de orelhas bem fofas.”

“Isso... não é verdade.”

Akino se enrolou em uma bola enquanto deliberadamente negava o elogio.

Mas enquanto ela respondia lentamente, as pontas de suas orelhas saltaram alegremente. Outra razão pela qual Akino sempre não gostava de mostrar suas orelhas era que elas expressavam completamente seus sentimentos ocultos. Mas o fato de Akino não esconder suas orelhas na frente de Sen, no entanto, era uma prova de quão próximos eles eram.

A maneira como Sen brincava com as orelhas de coelho de Akino sem reservas não era o sentimento de como as outras pessoas falavam sobre elas com desprezo e malícia.

Em contraste, Sen tratava a inútil Akino como sua neta. Sen era a única pessoa que Akino se sentia relaxada quando próxima, no mosteiro.

As orelhas compridas de Akino tremiam enquanto ela perguntava a Sen: “Sen-jiichan, você estava regando de novo?”

“Sim, isso mesmo.” Sen respondeu enquanto se virava para o templo ao lado deles.

O templo estava quase completamente em ruínas. Suas paredes e teto estavam cobertos de buracos e também estavam completamente cheios de ervas daninhas do chão. Parecia que tinha sido chamado de Salão Tachibana e ainda era espaçoso como uma sala dividida. Como não havia mais ninguém que o usasse, Sen trouxera vasos com mudas plantadas neles e as criara com cuidado.

Akino também costumava matar o tempo nas proximidades. De qualquer forma, ela podia se sentir mais à vontade no lugar em que Sen costumava estar.

“Seu trabalho vai bem?”

“Eu terminei há muito tempo.”

“Aahhh... Sem querer, sabe... ouvi dizer que o Sen-jiichan é sempre assim. Por que você pode terminar tão facilmente?”

“Eu sou eu, sabe? Eu vivi várias vezes a sua idade. Terminar esse nível de trabalho rapidamente é natural.”

Sen era um servo no Templo Seishuku e responsável pelas tarefas do mosteiro, exatamente como Akino no vihara. Mesmo que ele fizesse um trabalho difícil para o seu corpo envelhecido, esse velho homem gentil estava sempre flutuando e sem pressa. Akino não podia deixar de pensar que estava acostumado a essas coisas. No entanto, para Akino, ela não conseguia imaginar se acostumando a esse tipo de coisa.

“Parece que eu poderia fazer muitas coisas se conseguisse terminar um pouco mais cedo...” Ela tentou murmurar palavras que não pareciam realistas.

Akino parecia ter doze ou treze anos, mas nem ela sabia sua verdadeira idade.

Ela morava no Templo Seishuku desde que se lembrava, e além de ir para o pé da montanha como enviada, ela nunca fora a nenhum outro lugar. Ela vivera essa vida desinteressante todos os dias, juntamente com a mudança das estações. Mesmo ela não sabia o quanto havia crescido durante esse tempo. Ela não podia imaginar que haveria alguma mudança se ela tentasse fazer um pouco mais.

Mas...

“Bem... Este lugar ainda existirá quando chegar a hora?”

Sen sorriu enquanto falava com uma voz estranhamente clara. As pontas das orelhas de Akino tremeram levemente em resposta, e ela olhou para Sen acima da cabeça.

“Eh...? Sen-jiichan? O que isso significa...?”

“Ei, Akino.”

“Sim?”

“As batatas doces estão prontas?”

“Batatas doces...? Ahh!?”

Ela tinha esquecido completamente. Ela pegou a vassoura em pânico, tirando as batatas doces das cinzas. Assim como ela havia previsto, a pele externa estava assada em preto. Akino chorou enquanto Sen ria.

“Bem, tudo bem, estou indo, a comida desaparecerá em breve...”

Depois de dizer isso, Sen entrou no Salão Tachibana para regar as mudas.

Depois disso, Akino se livrou da metade externa da batata-doce assada e só conseguiu comer as porções centrais. Mas ela teve sorte porque as partes não queimadas estavam muito bem assadas, o que a consolou um pouco.

Depois que ela destruiu e ocultou a evidência de sua comida furtiva, ela deu uma volta apropriada – escondendo cautelosamente as orelhas – e depois voltou ao armazém.

A preparação para o jantar começaria em breve, antes do crepúsculo.

O jantar era chamado de ‘despejo’ no mosteiro, porque apenas duas refeições eram servidas no mosteiro, café da manhã e almoço. Eles não comiam comida no jantar, mas comiam ‘despejo’. Obviamente, no Templo Seishuku, onde até a carne era escassa, era apenas um nome formalizado. Akino fora repreendida por seus veteranos novamente e andou com uma expressão chorosa enquanto se preparava para o jantar.

No meio do caminho, não havia lenha suficiente novamente, e ela saiu para trazer um pouco.

Então, quando Akino estava pegando a lenha empilhada sob o beiral, enquanto reclamava com um murmúrio fraco, ela ouviu a voz de Tadanori.

“... Você está tão impaciente de novo. A identidade... Sim, se estiver lá...”

Ela olhou. Ele tinha uma expressão triste no rosto e segurava um telefone celular com uma mão enquanto caminhava do templo.

“... Já aqui? Entendido. Por enquanto, mandarei alguém. Você estará aqui amanhã...? Sim... Nn...”

Ele respondeu várias vezes por telefone e depois desligou o telefone quando a conversa terminou. Akino silenciosamente olhou para Tadanori. Em vez de se interessar pelo conteúdo da conversa, ela estava mais interessada em saber como Tadanori tinha um telefone.

Por causa do trabalho no mosteiro, havia recepção de telefones celulares nas montanhas e também havia telefones celulares. Mas Akino naturalmente não tinha um, e ela nem sequer tocara em um na vida. Um telefone celular era uma das coisas que Akino mais queria.

Depois que Tadanori notou Akino olhando sem palavras para ele, ele olhou-a. Para evitar ser vista como preguiçosa, Akino rapidamente se virou, carregando a lenha e indo embora.

Mas Tadanori chamou Akino quando ela deu as costas e se preparou para sair.

“Akino...”

“S-Sim? Eu não estava relaxando. Estou me preparando seriamente para o jantar...”

“Sim. Isso é o suficiente. Eu só queria pedir que você fosse uma enviada.”

“Uma enviada?”

“Sim. Vá para o Salão Frontal agora para mim.”

Ao ouvir isso, Akino inadvertidamente revelou as orelhas que ela havia escondido originalmente – embora ela estivesse surpresa, havia alguma alegria nisso.

Assim como o nome, o Salão Frontal ficava do lado de fora do recinto do mosteiro – era um salão do Templo Seishuku erguido em uma área no sopé da montanha.

Tinha sido remodelado muito antes de Akino nascer, e tinha sido usado pela cidade como um armazém para armazenar materiais comprados até recentemente. Para Akino, que quase nunca podia sair, aquele lugar era como uma conexão com o mundo exterior.

“Desça a montanha antes que escureça, se puder. Seria melhor voltar amanhã, então se apresse e vá.”

O coração de Akino bateu ainda mais rápido quando soube que poderia passar a noite. Ela poderia abrir suas asas e voar alto naquela noite – e brincar com o conteúdo de seu coração. Não importava o que houvesse, havia revistas do lado de fora no Salão Frontal, juntamente com televisões. Embora houvesse revistas, televisões e computadores com acesso à Internet no mosteiro, Akino não conseguia monopolizar nenhum deles. Sua pequena liberdade naquele momento era como um suspiro momentâneo pelo qual ela se sentia extasiada.

Então...

“S-Se eu for agora, então e o jantar...?”

“Você pegará depois. Tem fast food.”

Ela não pôde deixar de se sentir maravilhada. Ela quase jogou a lenha para levantar os braços e aplaudir. Ela poderia comer cup noodles lá. Para Akino, essa era uma bênção que ela não recebia há um ano. Os pensamentos em sua mente estavam refletidos em seu rosto? O rosto de Tadanori ficou nublado. Akino rapidamente afastou sua expressão infantil.

Só então ela percebeu que não tinha ouvido algo importante.

Ela levou a lenha de volta enquanto perguntava.

“Então, Sacerdote Tadanori? Por que exatamente sou uma enviada?”

“Você não ouviu? Vou entrar em contato com Kengyou-sama agora. Parece que haverá um novo discípulo. Parece que a pessoa já está no pé da montanha.”

Nesse momento, houve um pouco de ‘perturbação’ acima da cabeça, e Akino rapidamente a pressionou. Os olhos atrás de seus óculos se tornaram amplos e redondos.

“Ele terá que sair em breve. Então, amanhã, você trará essa pessoa para o mosteiro em meu lugar, está bem?”

Tadanori franziu a testa e Akino voltou ao templo com ele. Depois de dar a Akino a chave do Salão Frontal, ele voltou ao seu trabalho. Por outro lado, Akino, que fora deixada para trás, ainda estava em estado de choque depois de aceitar a chave.

Tadanori disse para trazer o discípulo para o mosteiro.

De qualquer forma, haveria uma nova pessoa no mosteiro.

Antecipação e emoções inquietantes agitaram seu coração. Já fazia vários anos desde que houvera um recém-chegado. Que tipo de pessoa seria? Um homem? Uma mulher? Qual idade? Seria uma pessoa gentil ou de mau coração? Essa pessoa zombaria de Akino se visse suas orelhas de coelho?

“... Ah, hmm? Espere! Se essa pessoa já está no pé, isso significa...”

‘Seria melhor voltar amanhã’ significava que Akino teria que ficar junto com o recém-chegado durante a noite.

De repente, a sensação desconfortável aumentou rapidamente em comparação à sua antecipação. Seria bom se ele ou ela fosse alguém fácil de conversar, mas se não, então ela poderia estar nervosa demais para dormir. O que ela deveria fazer!?

... Akino, cuja tristeza parecia ter se reunido em seu rosto, ouviu o grito de um corvo à distância enquanto saía sozinha. O céu já estava completamente colorido com o brilho do pôr-do-sol e o sol gradualmente afundava. Embora Akino tivesse confiança em sua velocidade, era excessivamente perigoso andar pelo caminho da montanha à noite. Então ela tinha que descer a montanha antes que o sol se pusesse completamente.

Ela voltou às pressas para o armazém, explicando a situação aos veteranos.

Originalmente, era um tempo ocupado, mas Akino queria sair, então seus veteranos foram extremamente sarcásticos com ela, mas não podiam ser afiados, pois era uma missão de um superior. Akino constantemente se desculpou e depois saiu do armazém às pressas.

As folhas de bordo vermelhas balançavam com o vento e depois caíam silenciosamente.

 

 

Desde que fazia muito tempo que ela tivera a oportunidade de sair e andar, o céu estava preto e o ambiente estava envolto em escuridão quando Akino finalmente descera a montanha.

Ela atravessou o bosque da montanha através de terraços nas encostas. As luzes das casas das famílias de agricultores eram escassamente espalhadas pelas vastas profundezas do desfiladeiro.

Então, as colinas que cercavam essa área se espalhavam acima de sua cabeça, enquanto a noite caía. As nuvens no céu eram extraordinariamente atraentes e ela podia sentir uma atmosfera pesada. Não era tanto por estar imersas na fraca luz da lua espalhada entre as nuvens, mas pela sensação de que dava ao céu azul profundo uma cor diferente. As nuvens que flutuavam de um lado da lua para outro mudavam de forma aos poucos à medida que fluíam lentamente.

Akino normalmente vivia cercada por uma floresta alta de cedros. Nesse mundo, Akino ocasionalmente chegava a um lugar vazio e aberto e ficava impressionada com a sensação de vastidão ao ver o céu. Como um coelho que se arrastava para fora da toca. Ela originalmente se considerava extremamente minúscula, até mesquinha, uma existência como uma pedra ou uma erva daninha.

Mas, por outro lado, ela de repente pensou em correr para algum canto abaixo daquele céu e de repente teve uma sensação inexplicável.

Mesmo que ela não soubesse aonde ir – mesmo que pudesse ir a algum lugar que imaginasse, seu coração não parava de bater e ela pensava em seguir em frente. Os outros no mosteiro provavelmente também tinham os mesmos sentimentos.

Akino não tinha deixado a montanha.

Até Akino conhecia o mundo exterior. Ela havia recebido apenas os ensinamentos mais básicos dos adultos no mosteiro. Através de revistas, televisão, internet – é claro, as informações não estavam completas – ela havia entendido as práticas sociais normais sobre o mundo fora da montanha.

Mas isso era apenas conhecimento, e era o conhecimento sobre outro mundo. Embora ela quisesse ir um dia, afinal era um mundo estrangeiro.

Akino tinha um corpo estranho, como havia experimentado pessoalmente todo esse tempo. Embora os espíritos vivos fossem muito valiosos, era apenas um espírito vivo de coelho. Quantas pessoas que moravam em um local tão fechado desde que se lembravam ainda existiam hoje no Japão? Embora o mosteiro fosse anormal para o mundo exterior, era tudo para ela.

Mas por que ela realmente queria sair correndo e ver a paisagem do outro lado do mosteiro?

É claro que seu ‘eu’ lento definitivamente não poderia dar uma resposta para uma coisa dessas, não importava como ela pensasse.

“... Ah, estou com fome.”

Já seria hora de jantar no mosteiro. Akino apertou a chave, continuando em direção ao Salão Frontal.

O Salão Frontal era o cruzamento entre o Templo Seishuku e a estrada do condado, situada no centro de um trecho de terra estreita e plana.

Embora fosse chamado de ‘salão’, parecia um antigo armazém pelo exterior. Normalmente havia apenas uma barreira defensiva automática ao redor, mas hoje a luz externa da entrada para mercadorias importadas estava acesa, revelando uma pequena luz laranja.

Havia duas figuras sob aquela luz.

Um era um rosto familiar e o outro era um rosto desconhecido. Os batimentos cardíacos de Akino aumentaram violentamente.

“Ah, você não é a coelha? Você é a enviada?”

“Sa-Sacerdote Kengyou!? Por favor, não me chame assim! Eu sempre te peço!”

“Bem, mesmo com seus quadris e seios, você parece uma coelha. Você provavelmente já cresceu desde então, certo? Hmm?”

“Is-Is-Isso...”

O que ele estava dizendo de repente na frente de um recém-chegado!? Akino corou e olhou para o homem de terno diante dela – o Sacerdote Kengyou.

Embora Kengyou fosse um ajari do Templo Seishuku, ele não usava roupas de sacerdote nem estava com a cabeça raspada. Ele estava sempre trabalhando fora do mosteiro e era bom em vários aspectos.

Esse monge depravado que amava as mulheres seria muito mal avaliado em vários aspectos como discípulo. Akino parecia ainda estar fora do alcance de ataque de Kengyou, por isso estava acostumada a essa brincadeira.

“De qualquer forma, você ouviu falar de tudo? Essa pessoa é alguém que espera entrar no mosteiro, do qual não temos novatos um há muitos anos.”

Kengyou acariciou levemente o queixo, falando com um tom arrogante. Antes que Akino se preparasse para encará-lo novamente, a figura que esperava atrás saiu para o lado de Kengyou.

Era uma garota

E ela era muito jovem. Apesar de ser mais velha que Akino. Talvez ela já fosse uma estudante do ensino médio. Seus longos cabelos negros refletiam sua pele branca como a neve. Ela tinha um corpo esbelto e uma figura bonita. Como alguém do mesmo sexo, Akino também ficou surpresa. Era uma garota extraordinariamente bonita, tanto nas características quanto na figura.

Mas ela dava uma impressão muito fria.

Era o luar que ela via refletido nos seus olhos? Ela não podia ver nada parecido com gosto ou desgosto nos olhos que encaravam Akino. Essa expressão também, tão calma e tranquila quanto a superfície de um lago... Ela dava mais uma impressão calma e completa do que uma indiferente. Ela estava mais endurecida e solitária do que desapaixonada.

Ela usava um casaco curto, shorts e meias longas. Ela usava luvas sem dedos e botas um pouco curtas nos pés. Uma bolsa com um padrão de camuflagem estava pendurada no ombro. Em vez de ser infantil, era mais como se ela estivesse completamente vestida para obter eficiência e sem enfeites. Então, essa discrepância era claramente evidente como se dominasse as características da garota.

Mas havia exceções nessa roupa utilitária.

Havia uma fita rosa amarrando os longos cabelos negros da garota.

“... Hum...”

Quando Akino estava prestes a cumprimentá-la, ela imediatamente percebeu que não sabia o que dizer.

Ela a julgou ser do tipo que não era muito fácil de conversar e até se sentia assustada.

Mas, embora não tivesse certeza dos motivos, sentiu uma estranha sensação de erro. Outras pessoas poderiam não sentir nada. No entanto, havia algo palpável, sombrio e errado – algo ameaçador.

Mesmo assim, ela não conseguia desviar o olhar.

“...”

A garota também olhou sem palavras para Akino, que não podia dizer nada e apenas olhava fixamente para ela. Então, o aroma do solo da montanha, vegetação e coisas do gênero se misturaram e um leve aroma surgiu flutuando pelos arredores.

Era o cheiro de incenso que ela nunca sentira.

Então...

“... Prazer em conhecê-la, eu sou Hokuto.”

A garota abriu a boca.

Palavras simples, mas uma voz pura.

“A-Ah, sim! Eu-Eu sou, hum, Akino, então...!?”

De repente, ela ficou tensa e com a língua presa. Definitivamente fora uma impressão muito ruim. Com as palavras provocativas que Kengyou acabara de dizer, essa fora a pior primeira impressão. Talvez ela já estivesse sendo tratada como uma idiota pela garota que ainda não fizera nenhuma reação em particular.

Kengyou estava bastante despreocupado com a Akino de rosto vermelho, comentando com uma atitude desorganizada.

“Então, está feito, certo? Akino, eu vou embora, então deixarei todo o resto para você.”

“Eh? Vo-Você já está indo?”

“Você chegou tarde demais, eu já terminei tudo. Tenho que voltar para a cidade hoje.”

Kengyou olhou o relógio enquanto falava sem educação, mas Akino foi rapidamente dominada pelo pânico.

“Mas você realmente não nos apresentou...”

“Basta fazer o que quiser durante a noite. Parando para pensar sobre isso, estou com pressa, não tenho tempo de continuar falando.”

Kengyou lançou um olhar de soslaio para a garota com um olhar frio, dizendo isso. A garota ainda estava sem resposta.

O estômago de Akino já começava a doer.

“Então te vejo mais tarde. Não faça nada problemático.”

Kengyou egoisticamente deixou essas palavras, não explicou mais nada e se foi. Assim, ele caminhou em direção ao carro parado na estrada do condado. Akino parecia empurrada para o canto e olhou para a garota diante dela enquanto Kengyou partia.

Então...

“Ah, certo.”

Inesperadamente, Kengyou parou e voltou.

“Akino, Hokuto, vocês vão se dar bem no mosteiro, certo? Já que vocês duas são camaradas da mesma natureza.”

“Eh? O-O que isso significa?”

Kengyou sorriu levemente para Akino, que perguntou de volta. Era o sorriso que ela via de seus veteranos e ajari no monastério. Um sorriso que zombava de um fraco, uma expressão que zombava de alguém.

“Como vocês duas são espíritos vivos valiosos, pratiquem o máximo possível e façam o melhor possível para o mosteiro.”

 

PARTE 3

Talvez ela não fosse capaz de dormir naquela noite.

Em contraste com esse pessimismo, Akino comeu três tijelas de cup ramem no jantar e dormiu profundamente segurando o estômago até o amanhecer. Às nove horas, a garota recém-chegada – Hokuto – gradualmente acordou e levantou-se. As pessoas no mosteiro acordavam cedo. Os discípulos geralmente se levantavam às quatro. Se eles dormissem, havia punições.

Tadanori não mencionara um prazo para trazer Hokuto para o alto da montanha, mas ela definitivamente seria repreendida se não voltasse antes do almoço. Depois que Akino e Hokuto se ocuparam tomando café da manhã, elas partiram do Salão Frontal.

Pedras foram empilhadas em forma de escada pelo caminho que continuava até o Templo Seishuku. Exuberantes florestas de cedro cresciam ao seu redor. Árvores de cedro altas, robustas e cobertas de musgo se estendiam da grama densa sob as árvores sem limite, como pilares sustentando o céu. O caminho se estendia sem parar para cima entre aqueles cedros.

A encosta da montanha era muito tranquila. Os únicos sons que elas podiam ouvir eram os sons de seus próprios passos e respiração. Às vezes, os cantos dos pássaros nas montanhas as alcançavam, e o eco dos sons parecia adicionar contraste à quietude da floresta.

“...”

Akino, que seguia em frente, subia o caminho da montanha, enquanto olhava para trás.

Além de Akino, que havia crescido na montanha, o caminho da montanha seria definitivamente cansativo para alguém que não está acostumado – especialmente para uma mulher delicada. Mas Hokuto basicamente não teve nenhum problema, pois ela carregava a bolsa aparentemente muito pesada, seguindo indiferentemente atrás dela. Ela não parecia preocupada com a falta de ar. Embora não fosse visível, parecia que ela era realmente muito forte.

Nesse caso, o próximo problema era o silêncio entre as duas.

Hokuto era uma garota reticente.

Elas haviam assistido televisão e comido juntas ontem à noite, mas Hokuto não tinha aberto a boca para falar enquanto estava lá. ‘Pelo menos me responda se eu falar.’ Esse era o padrão mínimo necessário para ser tolerável. Graças a isso, ela não se apresentou adequadamente desde a noite passada até agora. Até ela se sentia envergonhada.

Mas mesmo assim, ela sabia que Hokuto não era uma pessoa tão indiferente quanto a impressão que ela dera no início. Ela responderia ativamente se contasse algo, e era muito obediente às instruções complexas de Akino sem um pouco de descontentamento no rosto. Além disso, ontem à noite ela havia deixado Akino escolher os canais de televisão e o sabor de ramen que ela gostava. Havia apenas um sofá, e Akino a convidou para sentar, mas ela recusou firmemente e deixou Akino sentar lá. Ela não estava brava ou ansiosa quando dormira também, elegantemente arrumando a cama. Ela era linda e elegante, simplesmente um anjo para Akino.

Mas como Hokuto não expressava suas emoções, ela não sabia o que estava pensando, e essa era a verdade. Além disso, o odioso sentimento de injustiça que ela sentiu quando se conheceram não havia desaparecido.

“...”

Se elas fossem adiante para o mosteiro assim, Hokuto se tornaria uma discípula. Os veteranos do sexo masculino definitivamente estariam loucos para agradá-la, porque ela era uma mulher tão bonita. Nesse caso, Akino seria definitivamente convidada a fazer muitas, muitas coisas para eles se aproximarem de Hokuto.

Como ela não sabia de nada agora, ela poderia não tratar Akino bem depois de aprender a posição de Akino no mosteiro, mesmo que ela tenha tratado Akino respeitosamente até agora. Ela rapidamente se tornaria como todo mundo e definitivamente trataria Akino com força... Akino tinha esse tipo de premonição.

... Hmm?

Durante isso, ela sentiu que algo estava errado.

Não era uma razão muito substancial, era só que ela não podia imaginar aquela cena natural futura ocorrendo com Hokuto. Talvez fosse porque Hokuto era diferente dos outros discípulos no mosteiro. Como a atmosfera envolvida ao seu redor era incongruente demais, ela não conseguia imaginar a cena em que estava sendo contaminada pela atmosfera de seus veteranos.

Claro, poderia ser porque a imaginação de Akino era insuficiente.

“...”

Akino olhou de canto do olho algumas vezes para Hokuto subindo silenciosamente.

Então...

“... Nós realmente não conversamos ontem.”

De repente, Hokuto abriu a boca. Akino parou surpresa, e instintivamente cobriu a cabeça com as mãos.

... A-Ah não!?

Ela estava condenada por parar? Akino cautelosamente olhou para trás.

Mas Hokuto olhou aturdida, piscando como se estivesse um pouco chocada.

Parecia que ela ficara surpresa ao cobrir a cabeça enquanto falava. Ela provavelmente estava cansada e acidentalmente havia mostrado seus atributos idiotas.

“O que há de errado? Você está bem?”

“Nã-Não é nada! Eu estou completamente bem!”

Depois que Akino respondeu com um rubor, Hokuto riu baixinho.

Uma risada amarga. Mas não era uma risada sarcástica e amarga como as pessoas no mosteiro. Fora a primeira vez que ela viu a expressão sincera de Hokuto.

Akino tossiu secamente para insistir.

“U-Hum, Hokuto-san...?”

“Você pode me chamar apenas de Hokuto. Eu disse isso ontem também, já que sou novata.”

“Ah, mas você é mais velha que eu e não estou acostumada a chamar as pessoas pelo nome diretamente...”

Akino ainda não tinha feito uma amiga que pudesse chamar diretamente pelo nome. Ela viu Hokuto ficar confusa, mas Hokuto não insistiu no assunto, sorrindo para Akino novamente.

“Eu não achei que houvesse jovens como você aqui.” Hokuto falou em um tom calmo. “Mas é natural se você pensar sobre isso. Como nem todos neste Tempo Sombrio vieram aqui por vontade própria.”

O olhar de Hokuto não encontrou Akino quando ela disse isso, mas olhou na direção da estrada da montanha atrás dela.

Akino raramente conhecera adultos verdadeiros que vieram de fora, mas eles tratavam Akino com esse tipo de atitude quando ela era criança. Era patético como ela era sênior no mosteiro, mas Hokuto era mais parecida com um adulto. Mas, mesmo assim, a fez feliz por poder conversar sinceramente, mesmo que tratasse Akino como uma criança.

Mas...

“Tempo Sombrio?”

“Eh, uhh, desculpe. Essa maneira de dizer é muito rude, certo?”

“M-Muito rude...? Você quer dizer o Templo Seishuku?”

“Você não sabe?”

Hokuto perguntou de volta como se estivesse muito surpresa, e Akino se desculpou automaticamente.

“Eu nunca saí do Templo Seishuku.”

“Eh? Então Akino-san nasceu no mosteiro?”

“Embora eu não tenha nascido no mosteiro, fui criada lá desde quando era bebê... Além disso, u-hum, não me chame de ‘san’, é um pouco embaraçoso.”

‘Tempo Sombrio’ provavelmente era o apelido do Templo Seishuku lá fora. Foi a primeira vez que ela escutara.

Ela sentia como se fosse um nome maligno. Bem, se ela tentasse pensar sobre isso, obviamente haveria muitas semelhanças.

“Então Akino-chan sempre morou no Templo Seishuku, hein?”

“N-Não me chame de ‘chan’ também, você pode me chamar de Akino diretamente.”

“É mesmo? Então, por favor, me chame de Hokuto também.”

“Eh? S-Sim... Certo...”

Akino conseguiu responder e Hokuto sorriu.

Sua atitude era menos estranha do que quando se conheceram no dia anterior. Provavelmente até Hokuto tinha sido um pouco cautelosa. Aquela atmosfera fria tinha sido uma manifestação disso. Mas se o que Akino temia mostrasse alguns sinais de diminuição, poderia ser o motivo pelo qual ela dormira naquela manhã?

Um pássaro da montanha gritou de algum lugar.

O vento refrescante soprava – o cheiro de incenso que ela havia sentido na noite anterior flutuava levemente de Hokuto. Não era um cheiro ruim. Morando no mosteiro, ela já havia se acostumado a cheirar a incenso. Mas o cheiro do corpo de Hokuto era mais uma sugestão sutil de incenso do que um perfume que Akino conhecia.

As duas começaram a caminhar novamente para o mosteiro.

“Akino, você tem alguma ideia do que eles fazem no mosteiro...? Não, você sabe?”

“Eu sei. Hum... todas as pessoas do mosteiro praticam magia.”

Desde que ela estava indo ao Templo Seishuku, Hokuto deveria saber disso. Mesmo assim, Akino sinceramente explicou a ela.

Por causa do governo, a magia começou a ser amplamente utilizada. Supostamente, meio século atrás, às vésperas da Guerra do Pacífico, as várias magias passadas desde os tempos antigos foram analisadas uma a uma e depois adicionadas a um sistema geral que a desenvolveu.

A magia contemporânea fora administrada por uma organização nacional – a Agência Onmyou. A magia que a Agência Onmyou reconheceu como tendo efeitos reais foi denominada ‘Magia de Primeira Classe’, e era preciso obter qualificações estabelecidas pela lei Onmyou para usar ‘Magia de Primeira Classe’.

“A magia comum atual mal pode ser chamada de Onmyoudou. Na verdade, a magia de outros sistemas foi adicionada a ela. Como Vajrayana, Shinto, shugendo e outros tipos... Hmm? Então, nesse caso, por que é chamado ‘Onmyoudou Geral’?”

“Porque o grande homem que adicionou essas outras magias e estabeleceu os fundamentos da magia moderna não era um monge ou um xintoísta, mas um Onmyouji.”

“Ah, você sabe! Ele era o praticante das forças armadas durante a guerra. Como ele era chamado? Eu me lembro que ele era chamado...”

Ela sentia como se fosse um nome um pouco incomum relacionado à luz. Sondando as profundezas de sua memória, Akino ponderou sem fundamentos.

Então...

“... Yakou.”

“Eh?”

“... Ele era chamado Tsuchimikado Yakou.”

“Ah, certo! Esse era o nome dele.”

Hokuto parecia ter conhecimento detalhado sobre esse aspecto. Toda vez que ela dizia uma palavra, ela parecia estar reduzindo seu prestígio como sênior do mosteiro. Ela sentia vergonha.

... Ah, mas...

“Certo. Tsuchimikado Yakou foi considerado um terrorista.”

No instante em que Akino acidentalmente sussurrou isso, ela notou Hokuto tremer um pouco. Percebendo isso, Akino virou-se para Hokuto.

“Hmm? Hokuto-san – Não, Hokuto – você não sabia? No período do ano passado... Hmm, acho que foi no verão? Aquela reencarnação de Tsuchimikado Yakou andou cometendo crimes em todos os lugares.”

Isso era uma novidade que até ela sabia. Akino tentou perguntar, sentindo-se surpresa.

Hokuto parou um pouco antes de sua resposta.

“... Eu sei.”

“Oh. Então você sabia. Bem, ele é muito famoso na comunidade mágica. Ouvi dizer que havia um mandado de prisão emitido pelo país.”

“...”

Hokuto não respondeu às palavras de Akino, sua expressão quase congelada. Mas Akino não percebeu. Seu humor ingênuo tornou-se bom ao descobrir um tópico comum.

“Essa reencarnação geralmente se torna um tópico em nosso mosteiro, sabe? Especialmente porque, bem, o mosteiro não é um lugar extremamente sério que pratica magia? Esse tipo de tópico se espalha com muita facilidade...”

Akino olhou para a aparência de Hokuto para ser um pouco prudente. Mesmo assim, ela não precisava se preocupar. O rosto de Hokuto revelava que ela já tinha um entendimento sobre os ‘assuntos do Templo Seishuku’.

“Falando em esconder praticantes, eles vêm aqui porque existem dois praticantes importantes reunidos no mosteiro?”

Akino sorriu brevemente para o tom calmo de confirmação de Hokuto, respondendo com uma risada.

“Parece que sim. Embora eu não saiba muito sobre o esconderijo ou os dois praticantes...”

No momento, a magia era legalmente regulamentada pela lei Onmyou, e a maioria dos praticantes era gerenciada pela Agência Onmyou.

Mas nem todos eles.

As primeiras magias e a história dos praticantes eram ainda mais antigas que a história da lei Onmyou e da Agência Onmyou. Era inútil dizer que se tinha conhecimento dessas magias e praticantes décadas depois da guerra. Mais importante, também havia um pouco de escuridão escondida atrás da magia. O que as autoridades públicas ditavam não se infiltrava em todos os grupos de pessoas com tanta facilidade.

Portanto, o escopo de gerenciamento da Agência Onmyou não conseguia alcançar as ‘profundezas’ da comunidade mágica que formava várias redes diferentes, apenas a chamada ‘superfície’. O Templo Seishuku, conhecido como Tempo Sombrio, era um dos centros representativos dessas redes.

Informações, técnicas e pessoas talentosas que nunca apareceriam na ‘superfície’ se reuniam ali.

Por exemplo, Hokuto, que atualmente queria entrar no mosteiro, era uma pessoa bastante talentosa.

“Hokuto-san, você foi apresentada por um mosteiro filial?”

“... Ah, bem.”

“Está muito estranho recentemente, mas parece que havia muitas dessas pessoas antes, certo? Os mosteiros do Templo Seishuku estão espalhados por todo o país. Ouvi dizer que era para aumentar a difusão de técnicas ou algo assim... Muitas pessoas com vários talentos vêm visitar o mosteiro...”

Akino explicou a Hokuto que involuntariamente se tornara ambígua.

Havia várias pessoas que pretendiam se tornar praticantes, mas elas tinham algo em comum. Essa era a capacidade de ‘espírito vidente’. Para um usuário de magia moderna, era o talento e a capacidade de ‘ver’ a aura.

Todo mundo carregava aura em seu corpo e todos possuíam poder espiritual, mas havia muito poucas pessoas que podiam sentir aura e poder espiritual. Mas a magia era baseada em técnicas que controlavam o poder espiritual; portanto, pensar em se tornar um praticante – se tornar um dos poucos extremos que poderiam usar a magia de Primeira Classe – era impossível sem essa habilidade.

Mas como as pessoas que possuíam essa habilidade eram poucas, havia muitos exemplos daqueles que eram respeitados por várias pessoas ao mesmo tempo em que eram abominados e enojados.

Era da natureza humana ter cuidado com as pessoas diferentes de si e tratá-las de maneira diferente. Hoje em dia, informações sobre magia se espalhavam pelas ruas e podiam ser captadas por pessoas normais. Mas mesmo assim, as pessoas que possuíam uma habilidade anormal – que tinham ‘superpoderes’ – receberiam olhares críticos daqueles que os cercavam. Especialmente em um ambiente que carecia de entendimento da magia, era muito difícil para as pessoas que possuíam a capacidade de espírito vidente de viver uma vida comum. Portanto, se a antiga porção relacionada à magia de Tóquio, propensa a Desastres Espirituais, fosse tirada de cena, o nível de entendimento da sociedade definitivamente não seria muito alto. Mesmo se eles tentassem coexistir, haveria muitas pessoas que acabariam encontrando o infortúnio.

Lugares como o Templo Seishuku ou seus mosteiros filiais lidavam com essas circunstâncias.

Os anormais que a sociedade não aceitava seriam levados para o mosteiro, que os treinaria em praticantes preparados.

Os chamados ‘discípulos’ eram os praticantes imaturos reunidos no mosteiro.

“... É muito raro. Porque não há mais para onde ir.”

Havia muitas pessoas de mau coração entre os ‘discípulos’ no mosteiro. Pessoas torcidas, pessoas que se irritavam facilmente, pessoas que desdenhavam demais os outros...

Mas eles também eram jovens que haviam crescido em ambientes infelizes, pessoas que não tinham para onde ir além do mosteiro.

Akino não era um contra-exemplo. Ela fora abandonada no mosteiro e morava lá desde que era bebê. Seria definitivamente desanimador se crescesse um par de orelhas de coelho em um bebê. Não havia como evitar que seus pais tivessem desistido dela e a confiado ao Tempo Sombrio que era muito bom em lidar com essas coisas. Pelo contrário, era uma sorte que ela tivesse sido abençoada por poder morar no mosteiro depois de nascer – porque ela não conhecia os pais e não sentia nada como ressentimento ou raiva por eles. Ela sentia que as coisas estavam melhores assim.

“Ah, mas eu realmente tenho parentes em Tóquio, sabe? Embora eu não possa conhecê-los. Mas eles são uma família famosa que tem ligação de gerações com a magia... Se eu praticar e der o meu melhor, talvez eu possa morar com meus parentes em Tóquio algum dia.”

Claro, Akino entendia completamente que isso era impossível. Um veterano no mosteiro – Sen – disse a ela que ela tinha parentes em Tóquio. Ela acreditara nele de maneira muito simples quando o ouvia quando era criança e, embora ainda não pudesse fazer nada, mesmo depois de ouvir, deveria agradecer.

Hokuto definitivamente teria uma situação semelhante.

... Ah.

 

Então, quando pensou nisso, Akino parou. Ela pensou no que Kengyou havia dito quando se separaram ontem.

“Um, Hokuto-s... Não, Hokuto?”

“Hmm?”

“Posso perguntar uma coisa? Ontem, o que o Sacerdote Kengyou disse...”

Hokuto pareceu perceber imediatamente depois que ela abriu a boca com tato.

“Sobre o valioso espírito vivo?”

Hokuto respondeu diretamente a Akino, mas sua expressão era muito complexa. Como esperado, tinha sido indelicado.

“U-Um!?” Akino se encolheu em vergonha.

Mas Hokuto não estava preocupada.

“Agora que você mencionou, Akino também é um espírito vivo. Eu sou um espírito vivo de dragão da água.”

“Dragão da água?”

“Sim.”

Isso era realmente muito valioso. Pelo menos Akino não tinha ouvido falar disso até agora.

Os chamados dragões da água eram um tipo de espírito da água. Embora eles fossem um subtipo de dragão, eles eram tratados como parte da família dos verdadeiros dragões. Eles pareciam cobras, mas ela parecia lembrar que eles tinham chifres, mãos e pés. De qualquer forma, havia pouquíssimas pessoas que viram um dragão da água.

... Ah, certo...

O sentimento incongruente que Akino havia sentido no corpo de Hokuto poderia ser por causa daquele espírito vivo de dragão da água. De qualquer forma, Akino nem sabia o que era o chamado dragão da água. Se ela considerasse isso seriamente, o perfume peculiar que Hokuto emitia poderia ser por causa do efeito do dragão da água.

... Mas se ela fosse um espírito vivo de dragão da água, talvez...

Talvez Hokuto tivesse algo como um rabo de uma cobra semelhante às orelhas de Akino? Ou ela tinha presas ou algo como uma língua bifurcada? Embora ela estivesse muito interessada, questionar mais certamente não seria bom.

“Akino, que tipo de espírito vivo você é? Você poderia me dizer se não se importar?”

Seu rosto tremeu inconscientemente com a pergunta de Hokuto. Mas seria muito astuto apenas para ela fazer perguntas. Akino desviou o olhar levemente, como se estivesse tendo um grande problema em responder.

“Eu sou um espírito vivo de coelho.”

Apesar de seu constrangimento, ela estava curiosa sobre a resposta de Hokuto depois de dizer isso. Akino voltou seu olhar para Hokuto.

“Coelho, hein? Isso é realmente incomum. Parando para pensar sobre isso, eu nem sabia que existiam espíritos vivos de coelho.”

“... Eles são ainda mais raros que os dragões da água?”

“Sim. Dragões da água também devem ser muito raros, mas mesmo assim, houve pessoas possuídas por dragões da água ou que se aproximavam de espíritos de cobras no passado, como os registros das pessoas que eram possuídas pelos Yato-no-kami. Especialmente cobras, elas são na verdade um número bastante grande. Mas quanto aos coelhos...”

Hokuto olhou para Akino com um olhar completamente diferente de antes. Akino sentiu-se envergonhada de qualquer maneira e se virou para esconder-se.

... Como esperado, eu sou realmente estranha.

Ela não precisava perguntar especialmente isso. Hokuto não zombara dela nem se surpreendera, remediando o incidente. Se Akino tivesse sido traída e tratada como uma idiota, ela poderia ter afundado em tristeza e depressão.

“En-Enfim. Se dê bem com os espíritos vivos no mosteiro, certo? Existem muitas pessoas diferentes lá. Não existem apenas ‘discípulos’ como eu, também existem muitos Sacerdotes de verdade. Além disso, embora fala-se de pessoas escondidas aqui e das duas pessoas importantes, todos no mosteiro vivem uma vida comum.”

Akino mudou de assunto, continuando a explicar para Hokuto.

Na verdade, as pessoas no mosteiro não eram legalmente qualificadas para usar magia de Primeira Classe e eram muito indiferentes ao fato de serem infratores da lei. Aliás, a própria Akino não tinha notado que as pessoas ao seu redor eram na verdade o equivalente a criminosos.

Obviamente, o fato de eles terem conseguido evitar entrar em pânico com uma prática tão comum era porque as pessoas no mosteiro não sabiam como era feito o trabalho no mundo exterior. Mas era por isso que eles eram chamados de ‘sem esperança’.

Muitas pessoas no mosteiro apenas faziam seu trabalho para viver.

“Embora existam muitas coisas inconvenientes em comparação com a cidade do lado de fora, você se acostuma quando mora aqui por um longo tempo. Acho que você vai se acostumar rapidamente... Ah, bem, embora... agora, talvez... seja um pouco estressante...”

“Aconteceu alguma coisa no mosteiro?”

“Hah... bem, na verdade, os Sacerdotes tiveram algumas brigas neste ano... Parece que foi porque havia algumas opiniões divergentes...”

No final, era um pequeno mosteiro, e um confronto aberto frontal não aconteceria.

Mas era verdade que os sacerdotes do Templo Seishuku haviam se dividido em duas facções. Essa também era a razão do constante mau humor de Tadanori.

“Ah, mas tudo bem se você não se preocupar com isso. Porque são apenas os Sacerdotes, por isso não tem nada a ver conosco... Mas de qualquer forma, tinha algo a ver com a organização nacional da Agência Onmyou, eu acho. Também não conheço os detalhes.”

“Nesse caso, receio que seja algo relacionado à reforma legal da lei Onmyou.”

“Eh?”

“Bem, para a posição da Agência Onmyou, o Tempo Sombrio é um ponto escuro da comunidade mágica.”

Se a jurisdição da Agência Onmyou crescesse, chamaria a atenção das pessoas ao seu redor. Eles queriam aproveitar a oportunidade para chegar a um acordo agora. As opiniões no mosteiro provavelmente discordavam sobre a aceitação ou não dessa mudança, bem como sobre a futura política do mosteiro.

“...”

“Eh? O que é isso!?” Akino olhou incerta para Hokuto.

Por que Hokuto sabia dessas coisas quando ela estava entrando no mosteiro agora? Mesmo os veteranos entre os ‘discípulos’ definitivamente não sabiam do que os Sacerdotes falavam.

... Esta pessoa...

Quem era ela? O momento em que esse pensamento passou por sua cabeça...

“... Ah.” Hokuto parou.

Akino olhou reflexivamente para os degraus ao longo de seu olhar. “Aha!” Então, ela riu baixinho. “Esse é o nosso portão da montanha.”

O portão da montanha era ladeado de ambos os lados por florestas de cedro e também tinha escadas de pedra que levavam ao topo da montanha.

À primeira vista, um portão antigo e ultrapassado se erguia ali.

Uma porta com um telhado anca-e-empena construído a partir de duas estruturas de madeira e coberta com telhas desbotadas. Não era enorme, mas tinha uma ótima impressão dominante quando vista de repente nas montanhas. Abruptamente, ele se fundiu com a paisagem circundante.

Era como um juiz reconhecido pela montanha. Mesmo sem nenhuma palavra, proclamando claramente que a partir daí havia território divino.

“...” Hokuto compôs sua expressão. “... Há uma barreira colocada nas bordas desse portão.”

“Ah, você já sabe? Mas está tudo bem. Porque você pode entrar pelo portão.”

“... Uma magia que eu nunca vi... Essa barreira pode cobrir toda a montanha daqui?”

“Sim. É por isso que você só pode entrar no mosteiro através deste portão.”

O Templo Seishuku ficava perto do topo da montanha. Assim, a barreira do templo cercava todo o topo da montanha. Era uma barreira bastante ampla, e pessoas de fora – é claro, praticantes de fora – também ficariam muito surpresas no início. Mas essa barreira sempre existira desde antes do nascimento de Akino, e Akino não achava isso incrível. Para Akino, era exatamente esse tipo de coisa, nada mais.

“De qualquer forma, vamos subir. Porque provavelmente vamos nos atrasar...”

Akino imediatamente caminhou até o portão depois de dizer isso, e Hokuto seguiu logo atrás dela.

O interior do Templo Seishuku começava depois que eles passaram pelo portão. Mesmo assim, o cenário circundante não mudou muito rapidamente. A floresta de cedro ainda se erguia imutável em torno de uma escada contínua de pedra. O Templo Seishuku era um templo da montanha, e essa sanghamara fora construída ao longo da montanha. O portão da montanha era a entrada formal.

Mas mesmo assim, depois de passarem um tempo pelo portão da montanha, elas puderam ver árvores de faia, glicínias e folhas de bordo carmesim junto com os cedros.

Então elas viram várias estruturas de madeira do outro lado das árvores.

Os degraus de pedra se transformavam em um shikyakumon muito menor que o portão da montanha e terminavam na metade do caminho. Akino trouxe Hokuto sobre os degraus de pedra e através do portão.

As duas haviam conseguido chegar ao local nesta montanha para a qual haviam se dirigido.

Era um lugar parecido com um pátio cercado pelas florestas e corredores das montanhas. O movimento da superfície também era muito suave, e havia lanternas velhas colocadas em todos os lugares.

“Tudo bem, estamos aqui.” Akino voltou a olhar para Hokuto. Hokuto parou, lançando um olhar afiado ao redor.

“O salão principal está na frente e você pode ver o salão de reunião em frente a ele. Os templos estão lá, e embora você não possa ver daqui, existem armazéns no interior. Depois, há os alojamentos e... Você pode ver o telhado do pagode do outro lado das árvores. Existem alguns outros lugares no interior do mosteiro, como campanários, aposentos dos monges e salas menores... esses tipos de edifícios.”

Akino apontou para eles enquanto explicava, mas ela não sabia o quanto Hokuto ouvira. A garota que se declarara espírito vivo de dragão da água estreitou os olhos sem palavras, olhando atentamente para o cenário do mosteiro – e provavelmente usando seu poder espiritual para ‘ver’.

A explicação de Akino terminou abruptamente depois de perceber que Hokuto estava rodeada por aquela atmosfera fria novamente. Akino teve grande dificuldade em falar com Hokuto e ficou lá estupidamente até o fim.

Mas...

“... Akino. Parece que há uma comoção por lá.”

“Eh? Hmm? Realmente. O que aconteceu?”

Hokuto estava falando sobre a sala de reunião. Vozes barulhentas estavam sendo ouvidas dali.

“Vamos ver...” Disse Hokuto. Ela caminhou para frente sem esperar por uma resposta e Akino correu atrás dela.

Provavelmente havia uma disputa acontecendo na sala de reuniões. Depois que Hokuto e Akino se aproximaram, um monge saiu do centro. Ele caminhou em direção ao templo e parou depois de perceber Hokuto e Akino.

Era Tadanori.

“Akino, já é tão tarde. O que exatamente você estava fazendo?”

“Desculpe-me estar atrasada! Hum, o Sacerdote Kengyou trouxe uma recém-chegada, e eu já a trouxe, hum...”

Um aviso agudo assim que se encontraram. Akino instantaneamente ficou tímida. Tadanori moveu seu olhar afiado de Akino para Hokuto. Hokuto tinha sua aparência habitual sem expressão enquanto silenciosamente aceitava o olhar de Tadanori.

“... Hmm, então é você? Mas não é um bom momento agora. Você não pode entrar no mosteiro como uma recém-chegada agora.”

“Eh? Hum, Sacerdote?”

“Akino. Ainda tenho outros assuntos a tratar. Senhorita, como vê, temos alguns problemas para resolver.”

Tadanori proclamou egoisticamente e imediatamente correu em direção ao templo.

Hokuto, que praticamente havia sido abandonada, não disse nada em particular, seu olhar perseguindo atentamente as costas de Tadanori. Por outro lado, Akino estava confusa e sem noção.

Era muito evidente que ela nunca tinha sido encarregada de fazer nada como cuidar de uma recém-chegada até agora. Da mesma forma, Akino se sentia completamente inadequada para algo assim.

Eh? Ehh?

O que exatamente acontecera? Então, de repente, Hokuto olhou atentamente para trás ao lado dela.

Akino também se virou para olhar.

“Ah, Akino, você voltou.”

“Ah, Sen-jiichan.”

Sen as abordou em algum momento. Ele falou com as duas como se estivesse em pé na frente da sala de reunião por um tempo.

Ele ainda mantinha sua imutável atitude despreocupada, como se o barulhento mosteiro não tivesse nada a ver com ele. Akino recuperou um pouco de calma em frente a esse velho sênior.

“Uma recém-chegada ia entrar no mosteiro, então eu senti que deveria dar as boas-vindas... É ela?”

“Sim, ela é Hokuto-san... Mas, em vez disso, o que está acontecendo? O que aconteceu na sala de reuniões?”

Akino perguntou com uma careta, mas Sen não ficou sério.

“Na verdade, parece que eles foram contatados por Kengyou-sama agora.”

Ele respondeu com isso.

“Eh? Ele entrou em contato com eles? O que é desta vez?”

“Nnn. Não é muito. Um enviado da Agência Onmyou de Tóquio chegou hoje. É por isso que todo mundo está empolgado. Tornou-se tão caótico quanto uma colmeia perturbada.”

Akino soltou uma voz estupefata quando ouviu essa resposta inesperada.

Ela acabara de falar sobre a Agência Onmyou com Hokuto. Akino rapidamente olhou para Hokuto, mas Hokuto estava mantendo sua expressão solene, ouvindo atentamente as palavras de Sen.

Vendo que as duas não tinham nada a perguntar, Sen riu alto enquanto contava a elas com mais detalhes sobre a situação.

“Além disso, ouvi dizer que o enviado é um dos famosos Doze Generais Divinos, sabe? Que tipo de habilidades ele tem? Oh meu Deus, é tão interessante.”



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