Sword Art Online Progressive Japonesa

Tradução: slag

Revisão: Shisuii


Volume 5

CÂNONE DA REGRA DE OURO (INÍCIO) - SEXTO ANDAR DE AINCRAD, JANEIRO DE 2023 (PARTE 5)

5

2 DE JANEIRO DE 2023

Diferente de ontem, o céu da manhã estava sombrio e escuro — embora visível apenas pela faixa da abertura externa, é claro. As atividades do dia começaram com uma pequena organização de inventário.

Depois de tomarmos café da manhã no restaurante da pousada, voltamos à suíte do quarto andar e materializamos os itens adquiridos no dia anterior na mesa. A maioria dos itens eram materiais de utilidade incerta deixados pelos muriquis, como Peles de Macaco-Aranha e Caudas Felpudas, mas o verdadeiro problema era o que o falecido «Cylon» havia deixado. O ouro e as joias foram recolhidos pelos Muriqui Ladrões antes que os pegássemos, então agora estavam misturados ao nosso dinheiro, mas não tínhamos certeza se era certo usar ou vender os itens equipáveis que ele havia deixado.

— Será que o «Cylon» tem alguma família? — murmurou Asuna, levantando um chamativo pingente dourado.

Balancei a cabeça. 

— Não... Não me lembro de haver esposa ou filhos naquela mansão dele.

— Entendo... Mas a maior questão é: isso significa que o «Cylon» simplesmente desapareceu de Aincrad para sempre? Isso não significa que ninguém mais pode começar a missão "A Maldição de «Stachion»"...?

Mais uma vez, balancei a cabeça.

— Não... Duvido que chegue a esse ponto. Meu palpite é que, quando ele apareceu no esconderijo em «Suribus», já havia outro «Cylon» na mansão em «Stachion». O que o Morte matou foi apenas "o nosso" «Cylon». Aposto que isso não terá impacto nos outros jogadores que vão começar a missão depois de nós.

Asuna pressionou os dedos contra a têmpora esquerda e gemeu.

— Ugh... Eu simplesmente não consigo entender essa ideia. Os mapas instanciados já são complicados o suficiente, mas ter a mesma pessoa em vários lugares ao mesmo tempo é apenas...

— Sei como se sente — disse com uma risada. Despejei o suco semelhante a limonada em dois copos e dei um para ela. Tomei um gole do líquido açucarado e continuei. — Durante a quest da "Guerra dos Elfos", no terceiro andar, tenho quase certeza de que mencionei que, para conseguir a «Anneal Blade» no primeiro andar, você precisa completar uma quest de coleta de ingredientes medicinais na floresta para uma garota doente. Quando ela toma a poção pronta, ela melhora, mas apenas enquanto você está na cabana deles. Assim que outro jogador entra no local para iniciar a missão, ele verá novamente uma garota doente e sofrendo. É inevitável, sabe... As pessoas enlouqueceriam se apenas o primeiro grupo a começar uma missão pudesse concluí-la. Ainda assim, há algo perturbador nisso...

— Sim, eu sei...

Asuna tomou um gole do suco também. Ela fez uma careta e depois suspirou.

— Sinto que o «Cylon» estava sofrendo também, lá no fundo. Ele foi o primeiro aprendiz de «Pithagrus», mas o mestre disse que ele não podia herdar o título, então ele ficou com raiva e o matou, e teve que carregar esse segredo por uma década inteira, certo? Além disso, alguém levou o cubo dourado com a marca ensanguentada da mão dele, então ele sabia que pelo menos uma pessoa estava ciente da verdade... Tenho que acreditar que ele estava tenso durante todos aqueles dez anos.

Ela estava conjecturando como se «Cylon» fosse uma pessoa real.

Como um NPC, eu duvidava que ele sentisse qualquer culpa, já que não estava programado para isso. Mas pensando bem... Diferente do beta, a versão atual de Aincrad apresentava vários NPCs com tanta inteligência e emoção que eram quase indistinguíveis de pessoas reais. «Kizmel», Visconde «Yofilis»... e talvez o «Cylon» também.

Asuna se recostou no sofá, exalou e continuou.

— Eu pensei... que talvez no final da missão, o «Cylon» se arrependesse de seu crime e aceitasse seu castigo... e talvez até encontrasse perdão... mas nem foi isso que aconteceu. Ei, Kirito.

— Hmm?

— Se voltarmos a «Stachion», e realmente encontrarmos outro «Cylon» na mansão de lá, a missão não vai continuar de onde paramos, certo?

— Não... Não acho que vai. Não concluímos aquele evento crucial, para começar. Aposto que o registro da missão ainda está travado naquela parte...

Eu já tinha minha janela de inventário aberta, então mudei para a aba de missões e toquei na entrada "A Maldição de «Stachion»" para ativá-la. A última linha da missão dizia...

— Vamos ver... "«CYLON», SENHOR DE «STACHION», FOI MORTO POR BANDIDOS. VOCÊ DEVE ENCONTRAR O LUGAR ADEQUADO PARA USAR AS DUAS CHAVES RESTANTES."

Nos encaramos em silêncio. Depois, ambos olhamos para a mesa. Entre os vários itens ali estavam duas chaves, uma de ouro e outra de ferro

— O quê...? Espera, o «Cylon» ser morto faz parte da história dessa missão? — Asuna perguntou, mas balancei a cabeça várias vezes.

— Não, isso não é possível. Morte e seu amigo não eram NPCs, eram outros jogadores. Diz que eles são bandidos, mas não é como se o sistema de SAO estivesse controlando-os para fazerem isso.

— Então por que o registro da missão diz isso?

— Humm... A única coisa que consigo pensar é que consideraram a possibilidade de o «Cylon» ser morto por outro jogador quando o evento ocorre entre cidades e prepararam essa mensagem... talvez...?

— Sério? — disse ela, me olhando com descrença. — Se eles iam se dar a todo esse trabalho, não poderiam simplesmente fazer o «Cylon» superforte para que ninguém pudesse matá-lo?

— Bem, isso é verdade... mas aí você se perguntaria por que alguém que não é guerreiro seria tão forte, certo? Esse é o tipo de detalhe com o qual SAO é bem meticuloso…

— Verdade. Eles chegam ao ponto de imprimir todo o conteúdo de todos os livros do mundo, mesmo que a gente não consiga lê-los — admitiu Asuna. Ela colocou o copo de limonada sobre a mesa e pegou as duas chaves, a de ouro e a de ferro. — Essa chave dourada é a que encontramos no esconderijo, certo? Então... onde usamos essa chave de ferro?

— Não sei... A chave dourada é para a dungeon embaixo da mansão do Lord, mas eu nunca vi essa chave de ferro antes...

— Dungeon...? É lá que você encontra o cubo dourado?

Eu não tinha certeza se deveria responder àquela pergunta ou não, mas então decidi que, como já tínhamos nos desviado completamente da linha de história que eu conhecia, não faria mal.

— Sim — admiti — quem pegou o cubo do local do assassinato de «Pithagrus» e o escondeu sob a mansão foi a antiga criada com quem falamos primeiro. O nome dela era... «Theano», eu acho. Ela era, na verdade, uma gênio dos quebra-cabeças, e «Pithagrus» queria torná-la sua herdeira do título.

— Sério...? Mas «Theano» viu «Cylon» assassinar «Pithagrus», certo? Por que ela escondeu a arma do crime, em vez de acusá-lo como testemunha?

— Veja, a questão é que «Cylon» e «Theano» eram amantes.

— Oh, céus... ooh, aah — murmurou Asuna ao absorver a informação, olhando para as chaves em suas mãos. — Dez anos atrás... «Cylon» estaria com quase quarenta, e «Theano» teria cerca de vinte e cinco, acho. Então talvez ela não quisesse acusar seu amante de assassinato, mas sua consciência não a deixou ficar de braços cruzados...

— Foi mais ou menos assim que aconteceu, eu acho. «Theano» trancou o cubo dourado sob a mansão do Lord, depois colocou a chave dele no esconderijo em «Suribus». Ela queria que «Cylon» admitisse o seu pecado e se redimisse.

— O que você quer dizer?

— A dungeon sob a mansão é uma sequência de enigmas super difíceis, e você nem consegue chegar à última parte sem uma dica de um dos livros no escritório do esconderijo. Durante dez anos, «Theano» esperou que «Cylon» admitisse o seu crime e buscasse a sua ajuda. Ela ia lhe contar a localização da segunda casa, caso ele o fizesse. Para recuperar o cubo dourado, «Cylon» precisaria estudar os livros no esconderijo o máximo possível e resolver a dungeon dos enigmas. Na verdade, esse é o teste para determinar se você tem o que é necessário para herdar o título de rei dos enigmas e Lord da mansão.

— Aha... mas «Cylon» não tentou o teste por conta própria, ele só ficava contratando pessoas para fazerem isso...

— E, além disso, paralisava e sequestrava as pessoas que contratava — acrescentei.

Asuna soltou um longo suspiro.

— Se Morte não tivesse interferido... o que teria acontecido com a gente?

— «Cylon» ia nos trancar na dungeon da mansão para que recuperássemos o cubo para ele. Mas «Theano» descobriria e nos ajudaria nas ruas de «Stachion», e a partir daí, trabalharíamos com ela na missão, no caminho principal...

— Hmm. Talvez devêssemos perguntar a «Theano» o que fazer com essa chave, então — sugeriu Asuna, levantando a chave de ferro.

Concordei hesitante.

— Essa seria... a ideia mais ortodoxa. Também poderíamos ignorar «Theano», usar a chave dourada para entrar na dungeon e pegar o cubo por conta própria. Mas não consigo prever como a história vai prosseguir nesse caso.

— Bem, então não vamos perder tempo — Asuna se endireitou com as chaves ainda nas mãos, mas eu segurei sua manga e a forcei a se sentar de novo.

— Espera aí. Ainda não terminamos a investigação mais importante.

— Hã? Mas o resto disso é coisa do «Cylon», certo? Espera, você não vai vendê-las, vai?

— Não, não, não, não vou. Embora eu aposte que essa máscara de gás valeria uma boa quantia...

Levantei brevemente a máscara de couro bastante feia que Asuna havia usado na noite anterior, quando se aproximou sorrateiramente do usuário de adagas, e a coloquei de volta na mesa. Depois, guardei todo o equipamento no armazenamento especial do quarto do hotel, liberando a mesa para materializar o dardo e a adaga bastante usada.

Asuna fez uma careta ao vê-los.

— Ah, certo... Você estava bem obcecado com eles. Isso me lembra, eu tenho um desse.

— O quê?

Para minha surpresa, Asuna abriu sua janela e rapidamente produziu um novo dardo. Colocados lado a lado, era claro que, em cor, textura e design hexagonal curvado, ele era idêntico ao primeiro. Embora fosse surpreendente, percebi rapidamente que o primeiro dardo do conjunto de três havia me errado e desaparecido entre as árvores quando Morte o lançou. Um Muriqui Ladrão deve tê-lo pegado e, quando Asuna o derrotou, o Muriqui o dropou para ela.

— Oh, belo trabalho em equipe, macaco e Asuna.

— Isso... não parece um elogio — ela murmurou, fazendo outra careta. — Mas... espera aí — Ela colocou um dedo na bochecha e comentou. — Todos os itens que pegamos dos muriquis foram direto para nosso armazenamento de itens, certo?

— Sim — respondi, imaginando onde ela queria chegar com isso, mas não tinha resposta para sua próxima pergunta. — Então por que todos os itens de «Cylon» caíram no chão quando Morte o matou?

— Hã... mmm...

Ela tinha um bom ponto. Sobrevivemos porque «Cylon» deixou cair seu Jarro de Veneno de Namnepenth ao nosso alcance. Mas isso não deveria ter ido automaticamente para o inventário de Morte?

— Bem, vejo duas possibilidades. Ou o inventário de Morte estava quase cheio... ou as regras para itens caírem são diferentes quando um jogador mata outro jogador ou um NPC.

— Morte provavelmente é de nível muito alto, então duvido da primeira hipótese.

— Isso é verdade. Ele deve estar limitado em espaço porque alterna entre espada e machado, mas mesmo assim, não consigo imaginar que ele planejou nos atacar estando no limite de peso. Então pode ser um conjunto especial de regras... mas não temos como testar isso.

— Como era no beta?

— Acho que era igual à caça de mobs... mas eu não pratiquei PK, então não posso te dizer com certeza... Se encontrarmos Argo em algum lugar, deveríamos perguntar a ela — disse, deixando em pausa o tópico dos itens dropados e voltando ao dardo preto na mesa.

Conseguimos dois dos três dardos envenenados, mas o verdadeiro problema era de onde eles vieram. Rezei para que houvesse uma dica para a resposta nas propriedades do item e toquei em um deles. Asuna e eu nos inclinamos para ler as informações.

— Hm... chama-se... Spine of... Sh... Shmargor... eu acho? — ela arriscou.

— O que isso significa? — perguntei. Estava começando a sentir que estava usando minha parceira como um dicionário ambulante de inglês-japonês, mas Asuna não parecia incomodada.

— "Spine" provavelmente significa "espinho" neste caso. Suponho que Shmargor seja um nome próprio, mas nunca ouvi falar dele no mundo real ou em Aincrad.

— Mmm...

Continuei lendo. As classificações de ataque e durabilidade eram um pouco melhores do que o que se podia comprar em uma loja, mas nada surpreendente. O verdadeiro problema estava no efeito especial abaixo disso.

PARALISIA (TRÊS): QUANDO ESTE ESPINHO MALÉVOLO GOLPEIA, ELE CONCEDE UM EFEITO DE VENENO PARALISANTE DE NÍVEL DOIS. O VENENO SE DESGASTARÁ APÓS TRÊS USOS... 

Uau, nível dois? Nós nem sequer conseguimos veneno paralisante de nível um ainda. Isso significa que uma poção de cura de nível um de uma loja provavelmente não vai funcionar nisso.

— Então... o que podemos fazer?

— Ou aumentar o nível da habilidade de «Mixture» para poder fazer poções de cura de nível dois ou usar um Cristal de Purificação, mas...

Asuna franziu a testa.

— Quanta proficiência é necessária para fazer poções de nível dois?

— Cerca de cem, eu acho.

— Ugh.

Aquela reação foi tão perfeitamente alinhada com o que eu diria que não pude evitar olhá-la de lado. Asuna percebeu o que havia feito e ficou um pouco vermelha, gaguejando.

— E-E nós ainda não estamos conseguindo itens de cristal nessa fase. Então, no momento... não temos como neutralizar a paralisia desse espinho?

— Hum... bem...

A principal maneira de reverter o efeito de veneno paralisante ou danoso era usando poções ou cristais, mas isso não era tudo. Entre os inúmeros tipos de alimentos e bebidas deste mundo, havia alguns com efeitos de cura de debuffs, e também existia uma boa variedade de itens materiais que proporcionavam benefícios curativos quando usados sozinhos. Além disso, havia armaduras e acessórios que aumentavam a resistência a venenos e...

Minha mente estava completamente absorta nesses pensamentos quando Asuna prendeu a respiração. Ela estava lendo o texto descritivo no final da janela de propriedades.

— Oh...

— O-O que foi?

— O GENERAL ELFO AFUNDADO «N’LTZAHH» ENFRENTOU O PAVOROSO DRAGÃO SHMARGOR E CORTOU CADA UM DOS SEUS ESPINHOS, QUE GOTEJAVAM COM UM VENENO LETAL — ela recitou, enquanto eu acompanhava o texto. Aparentemente, Shmargor era um dragão com espinhos venenosos. Mas isso não era a parte mais surpreendente.

O "elfo afundado" claramente se referia aos Elfos Caídos. E o indivíduo chamado General «N’ltzahh» era alguém que Asuna e eu havíamos testemunhado pessoalmente.

— E-Espera aí. Você quer dizer que esse espinho é um dos que o General «N’ltzahh» arrancou de um dragão?

— É o que está escrito aqui...

— M-Mas... por quê...?

Tive que parar um momento para terminar minha limonada.

— Por que Morte teria algo assim?

— Você não acha... que ele realmente derrotou o General «N’ltzahh»... acha? — Asuna especulou.

Pensei um pouco e balancei a cabeça.

— Não... não consigo acreditar nisso. Você viu o cursor de cor do general, não viu?

— Sim — suas bochechas ficaram mais pálidas do que o normal.

Nós vimos o General «N’ltzahh» na base dos Elfos Caídos, escondida nas profundezas da dungeon submersa no quarto andar. Eu estava no nível 16 na época, e o cursor dele parecia completamente preto para mim. Nem por um instante senti vontade de sair do meu esconderijo e desafiá-lo para uma luta. Mesmo agora, dez dias depois e no nível 19, eu tinha certeza de que, se tivesse feito isso, tanto eu quanto Asuna estaríamos mortos em menos de um minuto.

O Elfo Caído estava envolto em uma aura fria como gelo, e até mesmo jogadores experientes em batalhas, como Morte e o usuário da adaga, não teriam chance contra ele. Em outras palavras, se eles fossem fortes o suficiente para derrotar «N’ltzahh», poderiam ter nos matado facilmente sem precisar tirar vantagem daquele evento de paralisia.

—Bom, eu acho... eles teriam que se infiltrar no esconderijo dos Elfos Caídos e roubá-los, ou conseguiram um drop muito raro de um dos Elfos Caídos de nível inferior — o tipo que estávamos enfrentando... acho...

Eu mesmo não estava nem um pouco certo disso. Decidi tocar na adaga ao lado dos espinhos. Quando li as propriedades que apareceram, minha voz ficou presa na garganta.

Ela se chamava «Dirk of Agony». Seus bônus especiais incluíam melhor resistência a venenos e congelamentos, e uma pequena chance de causar dano por sangramento em qualquer alvo. O texto descritivo dizia que era "uma adaga dada como prêmio pelo Comandante dos Elfos Caídos".

— Um prêmio dos Elfos Caídos? — murmurei. Asuna empurrou minha cabeça para o lado com a dela para ler o texto, e ficou igualmente chocada.

— Isso significa... que foi uma recompensa de missão?

...

Não tinha uma resposta imediata para a pergunta dela. A descrição do item não sugeria outra interpretação, mas, se fosse verdade, isso significaria que o usuário da adaga recebeu uma missão do Comandante dos Elfos Caídos, completou-a e ganhou essa adaga como recompensa.

E se esse fosse o caso, então os espinhos envenenados de Morte não foram roubados de um Elfo Caído; provavelmente foram dados a ele. Uma coisa seria se fosse uma missão que só pudesse ser realizada uma vez, mas, na remota possibilidade de que fosse uma recompensa por uma missão repetível de eliminação ou coleta... isso significaria que os espinhos paralisantes que nos esforçamos tanto para roubar estavam praticamente em oferta ilimitada.

— Ei, Asuna — disse eu, exatamente no mesmo instante em que ela disse — Ei, Kirito...

Cada um de nós indicou com os olhos para o outro continuar, até que Asuna, que era ligeiramente menos paciente do que eu, finalmente cedeu e prosseguiu.

— Bem... estou curiosa sobre a missão de «Stachion», mas por enquanto, acho mais inteligente investigar um pouco mais esses espinhos.

— Eu estava prestes a dizer exatamente a mesma coisa — respondi, o que trouxe um leve sorriso aos lábios dela, antes de eles se apertarem novamente.

— Se eles conseguirem essas armas quantas vezes quiserem, isso é um grande problema. Eles podem não ir atrás apenas de nós, e teríamos que garantir que todos os jogadores que estão lutando fora da área segura tenham resistência contra paralisia...

— Concordo completamente — disse — mas como mencionei antes, temos muitas poucas opções para lidar com o veneno paralisante de nível dois como está... então acho que deveríamos perguntar sobre isso também.

— Perguntar... para quem? — Asuna perguntou.

Eu lhe dei um sorriso astuto.

— Uma cavaleira que saberia algo sobre os Elfos Caídos e Venenos.

 

✗✗✗

 

O mapa circular do sexto andar de Aincrad estava dividido em cinco fatias iguais por linhas íngremes de montanhas, com um lago em forma de estrela no centro. 

«Stachion» e sua vizinha «Suribus» estavam na fatia nordeste, e a torre do labirinto ficava na área adjacente ao sudeste, mas as montanhas rochosas entre elas eram tão altas que quase chegavam à parte inferior do sétimo andar e bloqueavam toda a passagem.

Portanto, os jogadores precisavam contornar o andar no sentido anti-horário. As montanhas tinham cerca de cem metros de largura em sua base, e as dungeons que serviam de passagem eram relativamente curtas. No entanto, estavam repletas de quebra-cabeças irritantes em cada sala, com um sub boss esperando na saída de cada área.

A DKB e a ALS, as duas principais guildas da linha de frente, haviam se movido de «Stachion» para «Suribus» logo no primeiro dia do andar. Após meio dia de upgrade de nível e atualização de equipamentos, seguido de um bom descanso na pousada sem quebra-cabeças, eles agora estavam planejando enfrentar a caverna na área noroeste adjacente — pelo menos, de acordo com a mensagem que recebi de Agil, líder do Bro Squad.

No momento dessa mensagem, Asuna e eu estávamos tomando café da manhã no restaurante e planejando voltar a «Stachion» antes do meio-dia para terminar a missão de várias partes, e depois seguir para a área noroeste. Mas, por causa das armas que Morte e seu amigo deixaram cair, nossas prioridades mudaram. Guardamos nossas coisas, fizemos o check-out da Jade e Kingfisher e nos dirigimos à dungeon no extremo sul da área.

Embora tenhamos saído tarde e encontrado alguns mobs no caminho, nós dois ainda éramos mais rápidos do que um grupo completo de invasão com várias dezenas de pessoas, então ainda conseguimos ver três grupos circulando fora da entrada da dungeon em seu vale profundo quando chegamos lá.

 

✗✗✗

 

— Droga, eu esperava que eles já tivessem limpado a dungeon, assim poderíamos simplesmente atravessá-la — Asuna resmungou enquanto esperava à sombra das árvores.

Eu pensei nisso e sugeri.

— Não seria a mesma coisa se esperássemos eles entrarem e depois seguíssemos discretamente atrás deles?

— Há uma enorme diferença entre "Nós corremos, mas não chegamos a tempo" e "Escolhemos não correr para chegar lá". Além disso, o grupo de Agil já está ali.

De fato, descansando fora da dungeon estavam os dezoito membros (em três grupos) da DKB, vestidos de azul, outros dezoito da ALS, vestidos de verde, e os quatro membros do Bro Squad, que usavam armaduras variadas, mas seguravam exclusivamente armas de duas mãos. No final da mensagem de Agil dizia: "Se vocês tiverem tempo, podem nos ajudar a passar pela dungeon", então a ideia de reclamar sobre nossos próprios problemas me fez sentir culpado.

— Tudo bem, acho que devemos ir — disse, endireitando-me e dando um tapinha nas costas de Asuna. Seguimos para a fenda estreita que levava à dungeon. Enquanto passávamos pela parede de pedra com seus estranhos relevos, fiz questão de pisar o mais alto possível para anunciar nossa entrada — e então acenei para o Bro Squad, que estava mais próximo de nós, reunido em torno de uma pequena fogueira.

— Yo — oi, pessoal — cumprimentei.

— Boa tarde, Agil, Wolfgang, Lowbacca e Naijan — acrescentou Asuna.

Os caras durões nos cumprimentaram em retorno, embora apenas sorrissem para Asuna.

Amaldiçoando-os silenciosamente, sentei-me ao lado de Agil. Um olhar rápido para frente mostrou-me que a ALS de Kibaou e a DKB de Lind estavam nos observando com expressões desgostosas. Fiz uma saudação com dois dedos e me virei de volta para o fogo.

Diferente do mundo real, não era necessário saber nada para acender uma fogueira aqui, mas encontrar toras de qualidade para o combustível era surpreendentemente difícil. Havia galhos caídos por toda parte nas áreas arborizadas, mas se você quisesse fazer uma boa fogueira, tinha que tocá-los para ter certeza de que o nome do item era "Galho de Árvore Morta". Um "Galho de Árvore Viva" ou "Galho Úmido" produziria muita fumaça e uma chama fraca e instável. Eles vendiam feixes de lenha de boa qualidade na loja da cidade, mas eram bastante pesados e ocupavam espaço, então não dava para carregar muitos.

Mas graças ao alto status de Força geral do Bro Squad, eles tinham bastante capacidade de carga e estavam usando lenha de boa qualidade comprada na loja. Um tripé de metal estava montado sobre o fogo, com uma chaleira pendurada no topo, emitindo o cheiro de chá.

— Quanto tempo vai durar essa pausa, Agil? — perguntou Asuna. O homem disse que seria cerca de dez minutos, então julguei que tinha tempo suficiente e abri meu menu para pegar um estoque de batatas-doces — o nome do item era Batata Ictioide — que eu tinha guardado desde o quarto andar. Joguei três no fogo.

Esses itens alimentares já existiam no beta, mas eram originalmente vendidos a preços baixos, provavelmente porque eram dropados por mobs meio-peixe. Como o quarto andar no beta era um lugar de desfiladeiros secos e empoeirados, a presença de criaturas aquáticas tornava tudo ainda mais estranho.

Mas uma vez que as pessoas descobriram que assá-las na fogueira as tornava mais saborosas do que qualquer doce comprado em loja, o preço disparou, e houve uma corrida de jogadores para matar os meio-peixes em busca de suas recompensas amiláceas. A informação não estava circulando tão rapidamente na versão atual de Aincrad, então fiz uma anotação mental para voltar ao quarto andar e estocar logo.

Quando percebi, já se haviam passado cinco ou seis minutos, e um cheiro doce emanava da fogueira.

Asuna e os Bros interromperam sua conversa, com as narinas farejando, mas deixei as batatas-doces no fogo o máximo possível — o momento exato antes de queimarem completamente era quando ficavam melhores — e, com timing perfeito, puxei minha espada e dei três golpes rápidos no fogo.

Faíscas voaram com a perturbação, mas quando retirei minha espada, havia três batatas-doces perfeitamente assadas espetadas na ponta. Todos os cinco companheiros estenderam as mãos em silêncio, então cortei cada uma das batatas ao meio e as distribuí.

O chá estilo chá-verde que Agil havia preparado combinou muito bem com a batata meio-peixe. Minha cidade natal, Kawagoe, na província de Saitama, era uma área conhecida por batatas-doces, e eu as comia o tempo todo desde criança. Por isso, eu era tanto exigente quanto ao gosto e textura, quanto um pouco cansado de comê-las, mas mesmo sendo digitais, eu daria pelo menos noventa e cinco de cem para essas batatas-doces.

As metades das batatas logo desapareceram em estômagos virtuais, e seis suspiros de contentamento escaparam em uníssono. Wolfgang, que estava planejando abrir uma churrascaria no segundo andar no futuro, me perguntou onde consegui-las. Para evitar decepcioná-lo com os fatos, simplesmente disse — Eu vendo para você por um preço barato — e terminei meu chá. O Bro Squad com certeza tinha lutado contra alguns dos mobs meio-peixe na torre do labirinto do quarto andar, mas os Cultivadores Ictioides que dropavam as batatas não apareciam sozinhos, e fugiam assim que chegavam a 50% de HP, então a única maneira confiável de derrotá-los era usar uma habilidade importante no momento certo.

Trinta segundos antes do fim da pausa, a fogueira foi arrumada, e Agil nos adicionou ao seu grupo. O Bro Squad tinha apenas quatro membros no momento, então Asuna e eu podíamos nos encaixar no máximo de seis, mas cedo ou tarde eles conseguiriam mais membros, e não poderíamos assumir que sempre haveria um lugar para nós. Estava me ocorrendo que eu precisaria pensar no que fazer quando inevitavelmente fôssemos excluídos do grupo de ataque... quando Asuna se aproximou de mim com uma pergunta do nada.

— Ei, Kirito. Como um jogador com um cursor laranja faz para voltar a ter o cursor verde?

—Hã?

Por que ela estaria perguntando isso agora?

Pisquei, mas logo entendi aonde ela queria chegar.

Morte e seu camarada haviam se infiltrado na ALS e DKB escondendo suas identidades, e estavam usando vários truques para colocar as guildas umas contra as outras. Quando percebi o esquema deles no terceiro andar, Morte já havia deixado a guilda, mas meu palpite era que o usuário da adaga ainda estava na ALS.

Mas ontem, ele havia atacado o NPC que ajudava «Cylon», fazendo seu cursor ficar laranja. Então ele não podia entrar em nenhuma cidade, o que tornaria muito difícil para ele se encontrar com seus colegas de guilda. Isso significava que, se houvesse algum jogador entre eles que tivesse desaparecido de repente na noite passada ou que ainda estivesse no grupo com alguma desculpa para o motivo de estar com o cursor laranja, esse seria o nosso homem. Mas apenas se ele não tivesse conseguido restaurar seu cursor para verde ao longo da noite.

— Para voltar de laranja para verde, você precisa completar algo chamado uma missão de "Recuperação de Alinhamento". Eu não sei exatamente como funciona, mas se o seu cursor ficar laranja, você ocasionalmente encontrará viajantes ou andarilhos NPCs no deserto, e eles te darão um tipo de missão de teste... eu acho — murmurei, não totalmente seguro de minha memória sobre o assunto.

Asuna ponderou isso.

— Isso é algo que dá para fazer em uma noite?

— Aparentemente, a dificuldade e a duração da missão mudam dependendo do seu crime. Roubar algo barato de um NPC pode não precisar de uma missão muito longa, mas se você atacou ou matou alguém, isso seria muito mais sério. E se você cometer o mesmo crime de novo, na segunda vez a missão é mais difícil que a primeira, e na terceira é mais difícil que a segunda. Eu me lembro das pessoas dizendo que, se você matasse uns cinco jogadores no beta, era praticamente impossível voltar a ter o cursor verde.

Depois de tudo isso, percebi que não havia realmente resolvido a preocupação de Asuna, então acrescentei.

— Eu não sei quanto seria necessário para reparar o alinhamento do cara da adaga, para ser honesto... Além disso, ele atacou o grandalhão, mas não o matou...

— Sim... e outro problema é que apenas metade da ALS está aqui...

— Meio que duvido que eles nos levariam a sério se explicássemos a verdade, também...

Fomos interrompidos da nossa conversa em voz baixa por uma voz alta e retumbante vinda da entrada da dungeon.

— Ei, se quiserem nos acompanhar, são bem-vindos! No entanto, se se juntarem à invasão, têm que seguir nossos comandos!

Era uma voz que eu jamais confundiria com a de outra pessoa além do líder da ALS, com seus cabelos espetados como um porrete, Kibaou. Fiz sinal de "ok" para ele, que bufou e voltou-se para a entrada. Entre seus três grupos havia alguns rostos familiares.

Okotan, o alabardeiro, e Liten, a garota de armadura completa, que nos ajudaram na última luta contra o boss. Eles fizeram pequenos gestos para chamar nossa atenção, e Asuna e eu retribuímos com uma reverência.

Claramente, havia sido decidido que a ALS lideraria essa dungeon, enquanto Lind, Shivata e Hafner, da DKB, lideravam seus grupos atrás da outra guilda sem uma palavra de reclamação, e o Bro Squad, com seus dois extras, fechava a retaguarda da mesma forma.

Kibaou confirmou que todos os grupos estavam prontos e bradou.

— Vamos passar por esse lugar e almoçar na próxima cidade!

Os membros da ALS comemoraram animadamente — o resto de nós com metade do entusiasmo — e o grupo de quarenta e dois conquistadores entrou na dungeon que dividia a cordilheira.

 

✗✗✗

 

Em menos de vinte minutos, já estávamos brigando. 

A dungeon em si era bem simples, composta de grandes salas e os corredores que as conectavam. Derrotamos facilmente os dez mobs Estátua Viva que apareceram na primeira câmara sem muitos problemas. 

O problema surgiu quando chegamos à trava de quebra-cabeça na porta no fundo da sala.

Parecia um quebra-cabeça deslizante — no Japão, isso é frequentemente chamado de quebra-cabeça "filha na caixa" — com blocos grandes, médios e pequenos que podiam ser movidos. Para vencer o quebra-cabeça, era necessário mover o bloco grande, que estava no topo, até a saída na parte inferior. Mas enquanto na versão beta havia apenas um bloco grande, quatro blocos verticais, um bloco horizontal e quatro blocos pequenos — um exemplo relativamente simples e ortodoxo — o quebra-cabeça da porta agora era maior, com oito blocos pequenos no total.

Naturalmente, foi Kibaou que, com confiança, fez a primeira tentativa. Mas após cinco minutos e pelo menos trezentos movimentos, ele não estava nem um pouco mais perto de resolver o problema, e Lind, que estava cansado de esperar, sugeriu que ele desistisse e deixasse outra pessoa tentar. Kibaou gritou para ele não se meter, e eventualmente, a DKB e a ALS estavam divididos na sala, em um confronto de olhares.

— Bem... isso parece familiar — suspirou Asuna, irritada, enquanto se encostava em uma parede distante. — Não existe um jeito simples e confiável de resolver isso, tipo o quebra-cabeça dos quinze?

— Infelizmente, não... Eu lembro que a solução mais curta para a versão original era 81 movimentos, mas essa tem quatro blocos extras. Acho que eu não conseguiria intervir e resolver de forma tranquila.

Enquanto falávamos, Kibaou continuava a mexer nos blocos de metal, deslizando-os de um lado para o outro. Mas ele apenas se encontrava nos mesmos pontos em que já estivera minutos antes, sem chegar mais perto de uma solução.

— A propósito, Kirito, os quebra-cabeças em «Stachion» eram parte de alguma maldição do Lord da cidade, certo? Nós não fizemos essa missão, então não sei os detalhes — disse Agil, juntando-se à nossa conversa.

Eu olhei para o rosto enrugado dele e acenei com a cabeça.

— Alguém morreu na mansão do Lord, e agora o lugar está amaldiçoado.

— Então por que há quebra-cabeças nessa dungeon que está a quilômetros de distância da cidade? Não havia nenhum em «Suribus».

— Você tem razão.

Eu sempre soube que o sexto andar era conhecido pelos quebra-cabeças, então nunca pensei muito sobre isso. Mas, agora que ele mencionou, se a maldição não se estendia até «Suribus», não fazia muito sentido que ela estivesse afetando essa dungeon tão distante. De fato, os quebra-cabeças se espalhavam para a área sul, do outro lado do lago, e até a torre do labirinto, e eu não me lembrava de nada na beta que justificasse isso.

Bem... é tudo apenas um cenário inventado por alguém, concluí de forma desanimada, e estava pensando se deveria dizer isso em voz alta quando a voz de alguém me interrompeu.

— Ei, você acabou de resetar tudo para o início! — gritou Lind, atraindo nossa atenção.

De fato, no enorme quebra-cabeça deslizante que abria a porta de pedra, o bloco grande, que deveria escapar pela parte inferior, estava de volta à posição inicial no topo. Enquanto mexia nos longos blocos verticais abaixo, Kibaou resmungou.

— Quando você fica preso, começa de novo! É senso comum!

— Você acabou de admitir que está preso! Então deixa outra pessoa tentar!

— Eu não disse isso! 

— Sim, você disse sim!  

Irritada com a discussão deles, Asuna comentou. 

— Às vezes, tenho a sensação de que eles são na verdade melhores amigos.  

— Talvez você tenha razão sobre isso...  

— Ah, vai lá e resolve o quebra-cabeça pra eles logo, Kirito.  

— E... escuta, tem uma linha extra adicionada ao que estava lá antes. Eu não consigo vencer isso só com os movimentos que me lem...  

Mas então me dei conta de algo: sim, havia uma fileira extra de blocos, mas a diferença eram apenas quatro novos blocos pequenos na parte inferior, que eram o tipo mais fácil de mover, então, na verdade, eles poderiam ser amplamente ignorados. Tudo o que precisava fazer era levar o bloco grande até o ponto onde ele originalmente deveria ir e depois mover dois dos blocos pequenos para os lados, criando um caminho até a saída.  

— Hum...  

Asuna estava sorrindo.  

— Bem, acho que vou tentar — Agil deu um sorriso.  

Deixando a dupla para trás, atravessei a grande câmara até a porta trancada. Kibaou e Lind notaram meus passos e se viraram para mim, prontos para objetar, mas eu levantei as mãos para interrompê-los.  

— Escutem, não há truque nesse quebra-cabeça além de memorizar os movimentos. Eu vou resolver esse, e se vocês lembrarem como eu fiz, devem conseguir resolver em um piscar de olhos se encontrarem o mesmo problema novamente.  

Os dois ficaram em silêncio, trocando um rápido olhar. Lind acenou com a cabeça, enquanto Kibaou virou as costas para mim.  

— Bem, se você diz isso, estou disposto a deixar você tentar.  

— Então, com licença...  

Aproximei-me do quebra-cabeça que Kibaou havia acabado de resetar e comecei a trabalhar nele, confiando na memória. Eu havia dito que não havia truque além da memorização, mas, em geral, o método mais rápido era reunir os blocos verticais longos no lado esquerdo ou direito e, eventualmente, movê-los para ocupar as fileiras superiores. Felizmente, consegui mover o bloco maior para baixo sem ficar preso, até que ele estivesse na posição de saída original. Como eu havia teorizado, uma vez que o bloco estava lá, bastaram alguns movimentos para ajustar os novos blocos fora do caminho e deslizar o grande bloco até o ponto final.  

— Ooooh — murmurou a multidão de jogadores, enquanto a enorme porta afundava no chão, abrindo passagem para o corredor à frente.  

— Vamos seguir em frente! — disse Kibaou triunfante, liderando seus colegas de guilda pela passagem.  

Parte do meu "show" foi a pedido de Asuna, mas havia outro propósito também. Enquanto a ALS passava, eu casualmente comecei a caminhar com eles até que pude me aproximar de um dândi de bigode na fileira de trás.  

— E aí — murmurei para Okotan, o capitão da equipe de recrutamento da ALS. Ele olhou para mim e murmurou.

— Bom trabalho.  

— Valeu. Escuta... odeio perguntar isso do nada — comecei, provocando um olhar curioso dele — mas dos membros originalmente escalados para participar dessa dungeon, alguém desistiu de repente antes de começar?  

Mas a verdade é que eu já estava esperando ouvir um certo nome como resposta de Okotan.

O homem que me deu o apelido de Beater depois de eu vencer o boss do primeiro andar, o homem que tentou crucificar Nezha por sua participação no escândalo de aprimoramento de armas, o homem que alegou que Asuna e eu estávamos tentando monopolizar a missão "Guerra dos Elfos" no terceiro andar, o homem que se afastou no quarto andar, mas me acusou de tentar pegar a bandeira da guilda para mim no boss do quinto andar, o homem com o bordão "Eu sei a verdade" — o homem chamado Joe. Eu já havia ficado desconfiado dele em várias ocasiões, e quando ele não estava entre os membros da ALS nessa dungeon, minhas suspeitas cresceram ainda mais.  

As únicas coisas que Joe tinha em comum com o Segundo Capuz Negro eram que ambos usavam adagas e tinham mais ou menos a mesma altura. O Capuz Número Dois usava seu capuz baixo ontem à noite, e também quando o vi nas catacumbas — e Joe sempre usava uma máscara de couro que escondia seu rosto, então nenhum dos dois mostrava suas feições. Suas vozes agudas também eram semelhantes, mas máscaras podiam alterar isso, então não era um detalhe confiável.  

Mas no quinto andar, Kibaou disse a Joe que as informações que ele trouxe sobre a bandeira da guilda eram precisas. Isso significava que, no mínimo, Joe tinha acesso a informações do beta, que poderiam ter vindo de Morte, que era um beta tester. A ALS tinha alguns outros usuários de adagas, e assim como Morte, não havia garantia de que o Número Dois não estava trocando sua arma principal enquanto trabalhava com a ALS — mas se Okotan mencionasse o nome de Joe, minha suspeita se transformaria quase em convicção.  

— Bem — começou Okotan, aparentemente sem qualquer suspeita, com os olhos olhando para cima à esquerda, onde estava a lista dos membros de sua equipe. Ele balançou a cabeça. — Não, ninguém mudou seus planos. Todos os que se inscreveram na reunião de ontem estão presentes aqui.  

— Ah... entendo — respondi, sem demonstrar reação visível. Por dentro, no entanto, eu estava surpreso.  

Morte e seu companheiro deviam saber, ao planejar o ataque da noite anterior, que se tornariam jogadores laranja por causa disso. Mesmo que o plano deles fosse completar uma missão de "Recuperação de Alinhamento" durante a noite para voltar ao verde, o Número Dois havia perdido sua especial «Dirk of Agony» no ato de salvar Morte. Se ele não tivesse jogado a adaga para me distrair, eu teria desviado a bomba de fumaça com minha espada no instante antes dela explodir.

Perder a poderosa arma que ele recebeu do Elfo Caído seria um grande golpe para seu poder de combate, e essa perda poderia afetar sua capacidade de completar a missão de recuperação antes do amanhecer. Eu presumi que, se o Número Dois fosse Joe, ele inventaria alguma desculpa para explicar por que de repente não poderia participar da atividade de hoje — mas descobri que Joe nunca estava programado para estar aqui.

Eu precisava obter o máximo de informações que pudesse enquanto tivesse a oportunidade.  

— Hum, que horas exatamente foi a reunião? — perguntei.  

— Foi depois do jantar, provavelmente por volta das oito e meia da noite — disse Okotan. Finalmente, ele parecia encontrar algo suspeito no meu questionamento. — Por que você quer saber algo assim?

— Eh... bem... Ontem à noite, vimos alguém que parecia ser da ALS lutando na floresta, e essa pessoa estava com dificuldades. Só fiquei preocupado, só isso...  

Eu sabia que era uma explicação fraca, mas, de fato, não estava exatamente mentindo — só não ia revelar que os adversários eram eu e Asuna.  

No entanto, Okotan aceitou isso como verdade; ele até fez uma leve reverência.  

— Ah, entendo. Obrigado pela preocupação. Não ouvi nada sobre nenhum membro ter tido problemas ontem à noite, então acredito que não houve nada de errado.  

— Ah, que bom — respondi, ponderando.  

Se a reunião foi às oito e meia, eles teriam terminado depois das nove. O ataque contra nós aconteceu depois das nove; se o nosso segundo atacante fosse, de fato, Joe, ele não poderia ter estado na reunião.  

Eu queria saber se Joe estava lá ou não, mas perguntar isso diretamente seria estranho nesse ponto. E mesmo que Joe não estivesse na reunião, isso apenas aumentaria minhas suspeitas sem me dar provas concretas.  

Se ao menos eu pudesse descobrir por que Joe não participaria desta exploração de dungeon hoje, já que ele esteve em todas as lutas contra bosses até agora...  

— Ei, a próxima sala está logo à frente! Todos os membros, preparem-se para o combate! — Kibaou gritou da frente da fila. Seus seguidores da ALS brandiram suas armas. Decidi que não valia mais a pena tentar falar e agradeci a Okotan antes de me afastar.  

Quando a DKB passou e eu estava de volta à retaguarda, Asuna se aproximou de mim.  

— Sobre o que você estava conversando com Okotan?  

— Perguntei se algum dos membros desistiu dessa exploração no último minuto.  

Asuna imediatamente entendeu aonde eu queria chegar. Ela se inclinou mais perto.  

— E...?  

— Infelizmente, ele disse que não.  

— ...Ah... Acho que não seria tão fácil pegá-lo no flagra...  

— É... Nesse ritmo, devemos ficar atentos o dia todo.  

— O que você quer dizer?  

Eu me inclinei.  

— A verdade é que não é muito difícil encobrir a razão de ter ficado laranja. Ele poderia dizer que usou um ataque em área que atingiu um NPC por acidente — e pedir ajuda aos companheiros de guilda para fazer a missão de 'Recuperação de Alinhamento'. A razão pela qual ele não fez isso provavelmente é porque considerou a possibilidade de que o ataque da noite passada não funcionasse. Ele poderia enganar seus companheiros de guilda, mas se você ou eu sobrevivêssemos e soubéssemos que alguém do ALS ficou laranja, poderíamos confirmar que ele era o nosso PK... E se eles forem espertos o suficiente para planejar com tanto cuidado, poderiam ter decidido que nós baixaríamos a guarda, pensando que eles não atacariam de novo no dia seguinte, nos tornando alvos mais fáceis dessa vez.  

— Quando você coloca dessa forma, parece provável. Então, assumindo que ficaremos mais atentos daqui pra frente — Asuna ponderou, inclinando-se bem perto com um olhar irritado — eu gostaria de uma correção na sua frase sobre 'se você ou eu sobrevivêssemos'.  

— O quê...?  

— Por que você acha que, se um de nós fosse morto, o outro fugiria? Diga de novo, mas corretamente: 'se você e eu'.  

— C-Certo...  

Eu não estava planejando abandonar Asuna e fugir, claro, mas pensei que talvez precisasse me sacrificar para ajudá-la a escapar... e se eu ousasse sugerir isso em voz alta, receberia mais do que um olhar zangado em resposta. Então, concordei com ela e comecei a me corrigir — quando ouvi um assobio rude atrás de nós.  

— As coisas estão esquentando por aqui!  

— Vão para um quarto! — provocaram Lowbacca e Naijan do Bro Squad. Quase instantaneamente, Asuna e eu já não estávamos mais ombro a ombro e com as cabeças próximas, mas mantendo uma distância respeitosa.  

Eu não pude deixar de pensar: Eu não provocava Shivata e Liten desse jeito, porque me convenci de que estar na nona série significava que eu era muito velho pra isso!

 

✗✗✗

 

Conseguimos passar por quatro das grandes salas — cada um dos quebra-cabeças das portas era do mesmo tipo, em arranjos cada vez mais complexos, mas superamos todos, apesar das discussões entre Kibaou e Lind — até que a sala final nos apresentou um enorme boss em forma de planta trepadeira. Ela rapidamente cresceu vagens que lançavam ervilhas explosivas contra nós, até que Agil e Lowbacca avançaram com seus machados de batalha para cortá-la de suas raízes, finalmente derrotando-a.  

Eu não consegui o bônus do Last Hit, pois estava ocupado desviando dos explosivos, mas segundo Agil, tudo o que ele ganhou foi um enorme monte de ervilhas. Com muita empatia, sugeri que talvez elas ficassem doces se cozidas. Uma vez fora da dungeon, nos separamos do resto dos combatentes da linha de frente.  

A ALS, DKB e Bro Squad seguiram rumo ao horizonte oeste, em direção à silhueta distante da próxima cidade, mas Asuna e eu tínhamos outro destino em mente: A fortaleza dos elfos negros no sexto andar que ficava nesta fatia noroeste do mapa.  

— Acho que não adianta reclamar do design do mapa de Aincrad neste ponto — disse Asuna depois de alguns minutos caminhando fora do caminho, através do deserto — mas quando há apenas uma linha de montanhas entre nós e a primeira área, realmente não deveria ser tão diferente assim.  

— Não discordo de você — respondi.  

A área nordeste que continha «Stachion» e «Suribus» era principalmente uma floresta densa, como no terceiro andar, mas adjacente a ela no mapa, a área noroeste era um deserto vermelho queimado, como num filme de faroeste. Não havia vida vegetal verde nesse terreno ondulado, apenas rochas desgastadas e alguns cactos de formas estranhas aqui e ali. Quando uma brisa particularmente forte começou, levantou areia em pequenos redemoinhos que atrapalhavam a visão.  

Fome e sede não podiam matar você em Aincrad, mas no mundo real, você jamais pisaria num lugar assim sem algumas garrafas de água. Nosso destino estava perto da abertura diretamente ao norte, após uma caminhada de cerca de quatro quilômetros. E não havia caminho a seguir, então tivemos que evitar leitos de rios secos e afloramentos rochosos ao longo do caminho, enquanto lutávamos contra os muitos mobs que apareciam.

Felizmente, minha parceira não achou os escorpiões gigantes, as centopeias gigantes e as aranhas-camelo gigantes tão nojentas quanto os mobs astrais, apesar de que a maioria das garotas os odiaria absolutamente. E quando meu inventário estava quase cheio de itens de ingredientes pouco apetitosos, como caudas de escorpião e mandíbulas de aranha-camelo, finalmente atingi o marco do nível 20.  

— Yahoo!  

No momento em que a luz do aumento de nível me envolveu, levantei meu punho direito e saltei no ar para comemorar. Asuna, que havia alcançado o nível 19 não fazia muito tempo, deu um passo para trás.  

— D-Desde quando você começou a agir assim?  

— Eu também fiz isso quando atingi o nível 6 e o nível 12 — insisti.  

Finalmente, Asuna reconheceu a ocasião.  

— Ah, então você ganhou outro espaço de habilidade... Nesse caso, parabéns são realmente necessários.  

— Yahoo!  

— Tá, tá, tá. Então, qual habilidade você vai escolher como quinta?  

— Mamma mia! — exclamei, percebendo que estava me empolgando demais, justo quando minha parceira me lançou um olhar gélido. Limpei a garganta, envergonhado.  

— Atualmente, tenho «One Handed Sword», «Martial Arts», «Search», e «Hiding»... então acho que vou escolher entre «Throwing Knives» ou «Sprint»...  

— Eu recomendo «Sprint» — disse ela. — Reduz o tempo de deslocamento, e correr é uma sensação boa.  

— Sim, eu gosto dessa habilidade, mas...  

Considerei que já fazia um mês que estávamos trabalhando juntos e que provavelmente estava tudo bem perguntar agora, mas mesmo assim, hesitei.

— Diga, Asuna... você tem «rapiers», «Light Metal Armor», «Tailoring» e «Sprint», e qual é a outra?  

No nível 19, Asuna ainda tinha apenas quatro espaços, mas graças ao ultra-megatônico item raro, provavelmente único no mundo todo, a Garrafa de Cristal de «Kales’Oh», ela conseguia efetivamente usar uma quinta habilidade. Pelo que eu sabia, ela usava a garrafa para alternar entre «Sewing» e «Sprint», então a habilidade final era um mistério para mim.  

Asuna piscou três vezes com a pergunta e, para minha surpresa, olhou para cima, afastando o olhar de mim e franzindo os lábios. Isso só me deixou mais curioso, mas nunca poderia ter previsto sua resposta.  

— Hm... é um segredo. Não quero que você fique bravo comigo.  

— O quê?! Ficar bravo? Eu? Espera aí, eu não vou ficar bravo... As habilidades que você escolhe são problema seu...  

— Os professores que dizem isso são os que mais ficam bravos.  

— Professores...  

Bem, ela talvez estivesse certa quanto a isso. Mas ainda assim, eu não sou professor.  

Asuna aproveitou meu silêncio para apontar o dedo para mim. Ela continuou.

— Não estamos falando de mim agora. Eu estava perguntando qual habilidade você vai escolher.  

— Ah, c-certo... Bem, acho que será «Throwing Knives» ou «Sprint», mas vou deixar para decidir depois...  

— Entendi. Bem, vamos continuar — ordenou, voltando seu olhar para o norte sem criticar minha falta de decisão. Acho que ela realmente não queria falar sobre sua quinta habilidade.  

Nos últimos minutos, estávamos caminhando por desfiladeiros arenosos que me lembravam o estado de Utah, nos Estados Unidos — com base em filmes, claro, não em experiência pessoal. O terreno era monótono, mas complexo, e consultar o mapa não ajudava muito, exceto para saber a direção em que estávamos indo, mas a única maneira de chegar ao nosso objetivo era passar por esse labirinto natural.  

Se soubéssemos o caminho correto, poderíamos correr direto até lá e evitar todos os mobs, mas mesmo um beater como eu, que só havia passado pelo labirinto uma vez, meses atrás, não tinha o layout memorizado. Só nos restava seguir em frente, matando todos os escorpiões, centopeias e vermes da morte da Mongólia que surgiam das rachaduras nas paredes empoeiradas do desfiladeiro. A luz que penetrava no desfiladeiro estava ficando mais escura e espessa quando finalmente encontramos um sinal de civilização.  

De repente, o chão do desfiladeiro ficou mais largo, e muitas colunas de pedra alinhavam o caminho, com blocos de pedra colocados como uma ponte sobre a areia fina. Havia um grande portão à nossa frente, no topo do qual tremulavam uma infinidade de bandeiras com um brasão familiar de cimitarras e chifres.  

— Uau, isso é enorme...  

Asuna estava cansada de tanta batalha constante, mas mesmo ela não conseguiu esconder sua reação ao portão do castelo ao longe. Em termos de nível, ela ainda era forte o suficiente para essa área, mas a combinação de todos esses mobs venenosos e a preocupação com novos ataques de PKers só aumentava o cansaço mental.  

Não podíamos ficar na defensiva contra esses PKers o tempo todo. Precisávamos pensar em maneiras proativas de eliminar a ameaça que eles representavam, pensei, enquanto cruzávamos a ponte de pedra.  

— O Castelo Galey lá em cima é a maior das fortalezas dos elfos negros. O prédio em si não é tão luxuoso quanto o Castelo Yofel, mas eles têm um refeitório e uma banheira.  

— Espera, você mencionou banheira?  

Asuna não saltou no ar com um "Yahoo!", mas a mudança em sua expressão sugeria que seu medidor de energia havia subido de 30 para 70 por cento ou mais. Ela acelerou o passo, e eu me apressei para acompanhá-la, eventualmente decidindo que deveria elaborar melhor.  

— A questão é... o refeitório é ótimo, mas há algo sobre a área que pode ser um problema... ou talvez não...  

— O que seria?  

— Bem... na verdade, é... público...  

Asuna não entendeu o que eu quis dizer de imediato. Ela repetiu "Público...?" algumas vezes, então franziu a testa.  

— Isso é tipo o antônimo de instanciado? Então não é um espaço só para nós? Outros jogadores podem entrar?  

— Isso mesmo. Entre todos os locais dos elfos negros, apenas o castelo da rainha no nono andar e o Castelo Galey lá em cima são públicos... Acho que eles acharam difícil ter um monte de fortalezas e castelos ocupando o mesmo espaço ao mesmo tempo...  

— Bem, o Castelo Yofel era bem grande também. Mas acho que não posso reclamar... Então, o que você está dizendo é que outros jogadores podem entrar no refeitório e no banho e tal — disse ela. Eu praticamente podia ouvir a efervescência de seu medidor de energia diminuindo, então me apressei em esclarecer.

— Em teoria, sim, mas as únicas pessoas que podem passar por esse portão são as que estão na linha de missões da "Guerra dos Elfos" com a facção dos elfos negros e que estão pelo menos tão avançadas quanto nós. Não acho que exista mais nenhum jogador que se qualifique neste momento, então vá em frente e tome seu banho à vontade... Eu até poderia ficar de guarda do lado de fora, como fiz no terceiro andar...  

Asuna parecia estar ponderando essa ideia, mas de repente ficou muito séria.  

— E o castelo dos elfos negros definitivamente não é um refúgio seguro, certo?  

Fiquei um pouco surpreso e olhei para o portão, que agora estava bem mais perto. O código anti-criminoso que prometia proteção absoluta sobre a vida e os pontos de vida dos jogadores era invisível, mas havia algo diferente no ar ao redor do castelo em comparação com as cidades humanas. Olhei de volta para ela e assenti.  

— Sim... Eu acredito que sim. Teoricamente, é possível que a gangue de Morte entre e nos ataque de alguma forma. Mas, como eu disse, eles precisariam estar envolvidos com a facção dos elfos negros para fazer isso. Não acho que eles tiveram tanto tempo para isso... e, no mínimo, seria impossível para o J— para o usuário da adaga que se infiltrou na ALS.  

A sobrancelha de Asuna se contraiu quando comecei a dizer o nome, mas sua reação não foi além disso. Sua sugestão envolvia um personagem inesperado.  

— Você acha que... o Visconde «Yofilis» nos diria se perguntássemos? Ele poderia dizer se Morte ou seus amigos estavam trabalhando para os elfos negros?  

— Hmm...  

Parei sem perceber, cruzando os braços. Eventualmente, balancei a cabeça.  

— Não... O Castelo Yofel é uma instância, então o Visconde «Yofilis» deve existir em diferentes estados para cada grupo que trabalha nas missões dele. Segundo o nosso Visconde «Yofilis», ele provavelmente diria que somos os únicos humanos ajudando os elfos negros em sua luta.  

— Oh... Mais uma vez, tenho que dizer, não gosto desse sistema — opinou Asuna com um encolher de ombros. Ela se virou para o alto portão do castelo. — É melhor ficarmos em alerta dentro do castelo, então. Vamos.  

— Sim — concordei, e minha parceira e eu cruzamos o último trecho da ponte de pedra para nos aproximarmos do enorme portão, que parecia ter sido esculpido em uma única formação rochosa gigante.  

Em todos os acampamentos e fortalezas anteriores, sempre havia guardas na entrada, mas havia uma razão especial para que os elfos do Castelo Galey quase nunca saíssem. Em vez disso, vozes agudas surgiram das janelas de sacada no topo do portão.  

— Fora daqui!  

— Este portão não se abre para humanos!  

Esses avisos eram ainda mais severos do que os do Castelo Yofel. Mas ao erguer o anel Sigilo de «Lyusula», que o Visconde «Yofilis» me deu, fiz com que os guardas nas janelas se virassem e sinalizassem para dentro. Um sino claro e nítido começou a soar de algum lugar dentro do castelo, e o portão começou a se abrir lentamente.  

Levaria quase um minuto inteiro para o portão se abrir completamente, então, assim que houve espaço suficiente para uma pessoa passar, incentivei Asuna a entrar e depois a segui. No instante em que cruzamos o limiar, o portão começou a se fechar com um barulho.  

Asuna deu três passos antes de parar e exclamar.

— Ooooh...!  

O Castelo Galey foi construído — mais como esculpido — em uma bacia circular de mais de 180 metros de diâmetro. O castelo de três andares se curvava ao longo das paredes internas da bacia, mas, em vez de ser construído de pedra ou madeira, foi esculpido diretamente na formação rochosa natural, como uma antiga ruína.  

Ao redor do castelo, em forma de C, de leste a oeste ao longo do lado norte, havia uma área aberta coberta de mosaicos de azulejos, com guardas e servos elfos negros passando silenciosamente. Não vi nenhum jogador no momento.  

No centro desse espaço aberto estava uma enorme árvore de madeira nobre. O deserto e os cânions pelos quais caminhamos até aqui não apresentavam plantas além de cactos marrons, mas os galhos dessa árvore estavam repletos de folhas verdes vibrantes. Uma nascente natural brotava com água cristalina em suas raízes, brilhando dourada onde o sol se filtrava pelos galhos.

Perto da base da árvore havia um grande nó oco, e, se eu apertasse os olhos, podia ver uma luz azul pulsante dentro dele. Quando Asuna notou, sussurrou.

— Oh... aquilo é... uma árvore espiritual...?  

— Sim. Há uma árvore espiritual no castelo aqui.  

As árvores espirituais eram como teleportadores que os elfos negros e os elfos da floresta usavam para se deslocar de um andar para outro, muito parecido com os portões de teleporte que os jogadores tinham. Mas, enquanto nossos portões de teleporte podiam ser sempre encontrados na maior cidade de qualquer andar, muitas das árvores espirituais eram colocadas longe de qualquer fortaleza ou castelo élfico, o que eu achava curioso no início.  

Aparentemente, as árvores espirituais tinham um ciclo de vida e brotavam novamente a cada cem anos ou mais, mas nem os elfos sabiam onde elas iriam surgir. No entanto, a árvore espiritual do sexto andar era uma exceção em sua longevidade e já existia há séculos, mesmo quando construíram o Castelo Galey ao seu redor.  

Eu estava explicando todo esse contexto para Asuna quando a porta na ala oeste do castelo se abriu ruidosamente. De repente, o rosto de Asuna se iluminou com um sorriso brilhante.  

— Asuna! Kirito!  

Nos saudando e correndo até nós estava uma cavaleira vestindo uma armadura de aço negro e uma capa escura, com um sabre curvado no quadril esquerdo. Sua pele era de um marrom brilhante, e seu cabelo curto era de um tom roxo-acinzentado.  

Asuna deu um passo à frente e abriu os braços. A cavaleira saltou para eles e envolveu as mãos nas costas da espadachim. 

Depois de mais de cinco segundos desse abraço, ela se virou para mim com os braços abertos. Eu estava prestes a cumprimentá-la com um aperto de mão, então precisei conter minha timidez e aceitar o abraço apertado. Em algum lugar na minha mente, veio a ideia curiosa de que, por ser através de uma armadura pesada de metal, tudo bem.

O abraço da cavaleira durou mais cinco segundos antes que ela me soltasse, recuasse e batesse em meu ombro. Fazia apenas três dias que nos separamos, mas parecia que havia sido muito mais. Cumprimentei a integrante da Pagoda Knights Brigade de «Lyusula», a bela elfa negra que era nossa boa amiga.  

— «Kizmel», é bom ver você.  

— De fato, Asuna e Kirito. Fico feliz que tenham vindo... Deve ter sido difícil atravessar esta terra árida a pé — disse ela.  

Asuna sorriu radiante.  

— Não foi nada, sabendo que veríamos você no final.  

— Fico feliz em ouvir isso. Por favor, entrem e limpem a poeira da jornada... mas somente depois de prestarem suas homenagens ao Lord do castelo. Sinto muito por atrasar seu descanso...  

— Não, se vamos desfrutar da hospitalidade aqui, devemos mostrar nossa gratidão — eu disse. «Kizmel» parecia se desculpar, mas nos conduziu pela praça aberta.  

Refletindo agora, entre o acampamento no terceiro andar, o Castelo Yofel no quarto e a Vila «Shiyaya» no quinto, os NPCs elfos negros nunca foram abertamente hostis conosco, mas geralmente eram distantes. Parecia que as missões que estávamos fazendo para eles começaram a afetar sua atitude, porque, assim como no acampamento quando o visitamos ontem, os vários guardas e servos que passávamos na área aberta nos cumprimentavam com saudações educadas. Isso poderia ser apenas porque tínhamos a cavaleira de elite conosco, mas eu retribuía os gestos da mesma forma. Nos dirigimos para a esquerda da árvore espiritual — até o portão principal do castelo.  

A estrutura principal do castelo era um andar mais alto que as alas e sobressaía cerca de quatro ou seis metros acima das falésias que cercavam a bacia. Visitei este lugar durante o beta, mas apenas aceitei a missão principal e retornei quando terminei, então não tinha memórias fortes daqui.  

Mas quando passei pelas portas guardadas para o salão principal, não pude deixar de me juntar à Asuna em sua admiração.  

O exterior do Castelo Galey era esculpido na rocha avermelhada, com um design detalhado, mas uma textura uniforme que não transmitia a mesma beleza do Castelo Yofel. Mas, por dentro, ele tinha ladrilhos finamente dispostos em preto e marfim, e nenhum vestígio de que fosse alguma ruína arqueológica. Senti que o interior foi decorado de forma mais simples durante o beta, então ou os designers da Argus se esforçaram para melhorar o lugar, ou os elfos negros o fizeram.  

Cruzamos o salão perfeitamente limpo — não havia um grão de poeira à vista — e subimos a escada em espiral dupla até o escritório do lorde, no terceiro andar. O mestre do castelo, Conde «Melan Gus Galeyon», era um elfo extremamente raro: grande e robusto, com uma barba esplêndida. Mas ele não possuía a mesma humanidade (elfanidade?) do Visconde «Yofilis», e seu diálogo era bastante genérico ao nos dar uma missão principal e três sub-missões.  

Quando saímos de seus aposentos, «Kizmel» nos acompanhou com um suspiro de alívio. Eu a observei sem perceber o que estava fazendo, e ela me deu um sorriso culpado.  

— Sou de origem humilde. Desde que recebi o dever de recuperar as chaves escondidas, tive mais interações com nobres, mas não é algo que se acostume.  

— Ha-ha, também sou plebeu. Fico nervoso perto de pessoas importantes. Não sei sobre Asuna, porém.  

Eu suspeitava que Asuna era uma garota bastante mimada — apesar de sua propensão à violência instantânea — e a espadachim me deu uma cotovelada na lateral, como era de se esperar.  

— Claro que sou uma cidadã comum, e sim, fico nervosa!  (Para de mentir, rapaz.)

— Ha-ha-ha. Vocês dois se dão muito bem. Bem, deixe-me mostrar o quarto de vocês.  

«Kizmel» colocou uma mão em cada uma de nossas costas e nos empurrou para o oeste, por um corredor sem janelas. Logo chegamos a um quarto de hóspedes no terceiro andar da ala oeste. Na parede oposta à porta havia uma janela de treliça, através da qual o sol se pondo no horizonte — ou melhor, na abertura externa de Aincrad — estava vermelho brilhante.  

— Ooh, é um quarto tão adorável! — exclamou Asuna, dando uma volta completa no centro do cômodo.  

— É um pouco menor do que o quarto de hóspedes no Castelo Yofel, eu sei — começou «Kizmel» — mas é, na verdade, o segundo melhor de todo o Castelo Galey.  

— Não, não é apertado! Aposto que dá para acomodar cinco pessoas neste sofá sozinho!   

Asuna estava mostrando sinais de obsessão por mobília. Ela desfez seu equipamento e se jogou em um longo sofá de madeira com um design elegantemente curvado. «Kizmel» sorriu, removeu seu sabre e sentou-se ao lado dela. Eu tirei minha espada e armadura e me afundei em uma poltrona em frente a elas.  

A suíte na Pata de Pégaso, onde conversamos com Lind sobre a bandeira da guilda, também era bastante luxuosa, mas o castelo de um conde estava naturalmente em um nível ou dois acima em termos de qualidade dos móveis e maciez das almofadas. Parecia um desperdício que apenas Asuna e eu fôssemos os únicos jogadores hospedados neste castelo... e então percebi que havia algo que precisava confirmar primeiro.  

— Escute, «Kizmel».  

— O que foi? — perguntou a cavaleira, que estava estendendo a mão para o prato de frutas na mesa de centro entre nós. Escolhi minhas palavras com cuidado.  

— Bem... há outros humanos além de nós no Castelo Galey, você sabe?  

De repente, o sorriso desapareceu do rosto de Asuna. Mas «Kizmel» simplesmente disse.

— Não, não há.  

— Oh, entendo. Desculpe por ser esquisito — eu disse, relaxando. Peguei uma fruta em forma de estrela do prato.  

— Mas ouvi falar de outros espadachins humanos ajudando o povo de «Lyusula» — ela continuou. — Talvez vocês os encontrem algum dia.  

Eu congelei em uma posição estranha, segurando a fruta antes de colocá-la na boca.  

Quase dois meses haviam se passado desde o início deste jogo mortal — e mais de duas semanas desde que abrimos o terceiro andar — então não era nada estranho que houvesse outros jogadores realizando a missão de "Guerra dos Elfos" do lado dos elfos negros. Mas se por acaso fosse Morte e seus amigos, não haveria proteção aqui no Castelo Galey contra sua malícia.  

Morte matou «Cylon», o Lorde de «Stachion», sem hesitar. Então, se quisessem, eles tentariam fazer o mesmo com os elfos negros neste castelo... e com «Kizmel» também. Em termos de poder de combate puro, «Kizmel» era esmagadoramente mais forte do que eles, mas não havia como ignorar a criatividade maligna de um PKer motivado.

— Precisamos cumprir nosso objetivo neste castelo o mais rápido possível — decidi. Troquei um olhar com Asuna, joguei a fruta na boca e abri minha janela de jogo.  

O que tirei do meu armazenamento de itens, que os elfos chamavam de Escrita Mística, foram o punhal de lâmina dupla e os dardos de arremesso, que compartilhavam um certo tipo de crueldade em seu design. Assim que «Kizmel» viu as armas dispostas na mesa, seu rosto ficou tenso.  

— Kirito… o que são essas…?  

— Hum… fomos atacados por dois humanos ontem à noite. Eles deixaram essas armas na tentativa…  

«Kizmel» já estava de pé.  

— Vocês foram atacados?! — gritou ela. — Foi apenas uma tentativa de roubo, ou…?  

— Hum… acho que eles estavam tentando nos matar…  

— Meu Deus…!!  

Os olhos onix da elfa negra brilhavam com chamas pálidas — ou assim me pareceu. Ela ficou ereta, pegando o sabre que havia deixado ao lado do sofá, e gritou.

— Se eu estivesse lá, teria arrancado a cabeça deles dos ombros! Kirito, Asuna, vocês não devem voltar para as cidades humanas! Vocês precisam ficar comigo…  

— Não, não, estamos bem — assegurei à elfa furiosa, fazendo-a se sentar novamente. Apontei novamente para as armas na mesa.  

— Conseguimos afugentá-los sem sofrer muitos danos… quer dizer, sem nenhum ferimento. Mas eles são muito persistentes, então não há dúvida de que ainda estão atrás de nós. O problema são as armas que eles estavam usando… Especialmente essas, que são dardos de arremesso envenenadas. Você pode nos dizer algo sobre isso, «Kizmel»? — terminei, em um único fôlego, deslizando um dos dardos na direção da cavaleira.  

……  

«Kizmel» apoiou o sabre no sofá e ergueu o dardo sobre a cabeça, de modo que ela captasse a luz da janela.  

— Isso não é aço. Foi feito a partir do espinho de algum ser vivo — disse ela.  

Asuna inclinou-se para frente e tocou na outra agulha. Ela leu o texto descritivo nas propriedades do item em voz alta.  

— «Kizmel», essas palavras humanas dizem: O GENERAL ELFO AFUNDADO «N’LTZAHH» ENFRENTOU O TERRÍVEL DRAGÃO SHMARGOR E ARRANCOU CADA UM DE SEUS ESPINHOS, QUE ESCORRIAM COM VENENO MORTAL…  

— «N’ltzahh»… Shmargor…?! — repetiu ela, levantando-se novamente e inicialmente jogando a mão com o dardo para longe de si, antes de recuperar a compostura e colocar a arma sobre a mesa. Ela nos lançou um olhar e começou a falar em um tom oficial.  

— Shmargor é um dragão maligno mencionado na lenda élfica. Muito tempo atrás, quando os elfos, humanos e anões ainda viviam na terra, uma pequena e maligna serpente passou despercebida pela sacerdotisa e subiu na Árvore Sagrada Negra para dar uma mordida no único fruto que crescia na ponta de um de seus galhos. A serpente ganhou vida eterna, mas foi amaldiçoada de forma que tudo o que entrasse em sua boca se transformaria em veneno. Cada vez que comia, a serpente sofria e morria, apenas para voltar à vida pelo poder sagrado do fruto. Após vários séculos, a serpente evoluiu para um dragão venenoso, enorme e feio, que atacava cidades e vilas. Mas o herói humano Selm o derrotou, e ele fugiu para a terra de gelo, muito ao norte distante…  

A rica voz de «Kizmel» foi diminuindo, levando tanto a mim quanto Asuna a exalarmos. Sua entrega suave e lírica era tão agradável de se ouvir que queríamos pedir que ela nos contasse mais, mesmo sabendo que ela não poderia.  

— Hmm, essa é uma história meio triste… Duvido que a serpente quisesse morder o fruto da Árvore Sagrada por maldade — disse Asuna, balançando a cabeça.  

Kizmel assentiu profundamente.  

— Diz-se que o fruto da Árvore Sagrada concede vida eterna, e sua seiva proporciona carne invulnerável. Muitas histórias trágicas giram em torno desse fruto. Há, por exemplo, esta história: no final do Mês do Azevinho, que a humanidade designa como dezembro, há um sábio sagrado encarregado de dar presentes às crianças. Um ano, ele descobriu que o presente que deveria dar a uma frágil garotinha humana era, na verdade, um pedaço do fruto da Árvore Sagrada. Incapaz de conter sua curiosidade, ele abriu a caixa de presente e encontrou um cristal incrivelmente lindo. O sábio desejou esse cristal, e de todas as milhares de crianças, ele só falhou em entregar o presente para essa garotinha. Sem a proteção daquele cristal, a menina não viveu para ver o novo ano, como deveria, e assim o sábio enlouqueceu, condenado a vagar para sempre por uma noite sem fim…  

— As outras histórias têm finais parecidos? — perguntou Asuna.  

«Kizmel» deu de ombros.  

— A maioria delas tem. Os presentes da Árvore Sagrada não devem ser cobiçados.  

— E, pelo que lembro, os Elfos Caídos foram banidos porque tentaram colher a seiva da Árvore Sagrada — intervim, o que fez Asuna arfar.  

— Ah, certo! Os Elfos Caídos foram enviados para o extremo norte também. Então faria sentido que ele tivesse encontrado Shmargor lá… Mas espera, isso significa que o General «N’ltzahh» está por aí desde antes da criação de Aincrad…?  

Kizmel franziu a testa em silêncio enquanto falávamos, então perguntei cautelosamente.

— Hum, na verdade… há quantos anos Aincrad foi criado…?  

— Na verdade, nós os cavaleiros reais não sabemos os detalhes. Como acredito que o Lorde «Yofilis» lhes disse, apenas Sua Majestade Real possui todas as lendas sobre a Grande Separação e as seis chaves sagradas. Tudo o que nos dizem é que este castelo flutuante foi criado há muito tempo.  

Ela fez uma pausa por um momento, ajeitando o fecho de sua capa antes de continuar.

— No entanto, ouvi dizer que Sua Majestade e o rei dos elfos da floresta são muito longevos. Então, talvez o homem que lidera os Caídos seja igualmente antigo. Não que ele me assuste.  

Essa era uma atitude encorajadora, mas eu não queria que «Kizmel» acabasse lutando contra o General «N’ltzahh». Eu não duvidava de sua habilidade como cavaleira, mas só de lembrar a visão de «N’ltzahh» de perto me deixava sem fôlego. Ele seria pior do que qualquer coisa que enfrentamos até agora, incluindo os cinco bosses de andar.  

Embora «Kizmel» não pudesse saber o que eu estava pensando, ela me lançou um longo olhar com seus olhos escuros e estendeu a mão para a mesa novamente. Desta vez, ela pegou o punhal negro que o Número Dois havia deixado — a «Dirk of Agony».  

Diferente do dardo, «Kizmel» apenas deu uma olhada rápida na adaga e declarou.

— De fato. Esta é uma arma dos Caídos.  

— Você consegue dizer só de olhar? — perguntou Asuna, de olhos arregalados.

A cavaleira indicou a base da lâmina fina.

— Você vê o símbolo esculpido discretamente aqui embaixo?

— Hã? — gritei. Eu me senti envergonhado por não ter percebido isso quando examinei a arma na pousada em «Suribus», mas, claro, logo acima do punho, havia uma gravação muito fina que brilhava laranja à luz do sol. O desenho era de duas linhas dobradas que formavam um padrão de três diamantes, mas eu não tinha ideia do que significava.

— O que é isso? — Asuna perguntou.

— Aparentemente, representa gelo e relâmpago — respondeu «Kizmel».

— Ohhh — murmuraram dois humanos em uníssono.

Os elfos negros tinham uma cimitarra e um chifre, os elfos da floresta tinham um escudo e uma espada longa, e os Elfos Caídos tinham gelo e relâmpago. Em outro jogo, você imaginaria que os Caídos seriam mestres da magia de gelo e relâmpago, mas, infelizmente — ou felizmente, na verdade — não havia magia em SAO.

«Kizmel» colocou a adaga de volta na mesa e cruzou seus braços esbeltos sobre o peito.

— Estas são, de fato, armas dos Caídos. O mesmo símbolo estava nas lâminas daqueles que lutamos no terceiro e no quinto andares. Mas me parece que os sigilos que vi não eram simples entalhes, mas prata fundida.

— Agora que você mencionou, acho que é verdade — Asuna concordou, mas eu honestamente não conseguia me lembrar. Era difícil acreditar que uma IA como «Kizmel» estivesse errada, então segui em frente.

— Você está dizendo... que esta adaga é mais barata do que as armas dos Caídos que enfrentamos até agora?

— Eu diria que sim, mas isso não é tudo. Suspeito que essas sejam armas dadas a colaboradores de outras raças... O que significa que aqueles vagabundos humanos que o atacaram não roubaram essa adaga de um Caído morto, mas a receberam como recompensa por sua ajuda.

... 

Asuna e eu discutimos essa possibilidade com base no texto descritivo da «Dirk of Agony» naquela manhã. Senti que a declaração de «Kizmel» transformou essa suspeita vaga em uma quase verdade verificável.

Morte e seu companheiro haviam encontrado uma rota de missão que envolvia colaborar com os Elfos Caídos, em vez de lutar contra eles. Então, deveríamos assumir que haveria uma maneira de recuperar aqueles mortíferos dardos envenenadas. Se íamos continuar lutando contra eles, precisávamos de uma forma de neutralizar o veneno paralisante de nível 2 o mais rápido possível.

Respirei fundo para explicar isso, mas fui interrompido.

— Não se preocupe. Como eu disse antes, enquanto eu estiver ao seu lado, nenhum vagabundo o ameaçará — «Kizmel» afirmou categoricamente. Ela deu um leve tapinha no joelho de Asuna e se levantou.

— Uh, «K-Kizmel», nós não — comecei a dizer, mas ela apenas voltou a se sentar e nos fez sinal para nos levantarmos com ela.

— Por que não lavamos a poeira da viagem primeiro? Você deve ter acumulado bastante areia durante sua viagem a este castelo.

Essas palavras transformaram os olhos de Asuna em corações — ou, mais precisamente, no símbolo de fontes termais. Ninguém poderia detê-la agora.

Guardei rapidamente as armas de volta no meu inventário e apressei-me atrás das mulheres.

 

✗✗✗

 

Quando visitei o Castelo Galey no beta, fiz um tour pelo prédio. Um tempo nos banhos não estava no roteiro, mas me lembrava da localização das instalações.

No entanto, «Kizmel» não seguiu para o segundo andar da ala leste, onde eu me lembrava que ficavam. Ela desceu as escadas no centro da ala oeste. Achei isso confuso — mas não tanto quanto quando continuamos descendo, mesmo além do térreo. Não estávamos indo para o banho? Será que havia um porão no beta...? Mas o passo da cavaleira estava absolutamente confiante.

As escadas terminavam no nível do porão, transformando-se em um corredor com piso de azulejos, iluminado por lâmpadas de cores estranhas. Enquanto caminhávamos, o ar frio gradualmente ficava mais quente.

Eventualmente, havia uma grande porta na parede à direita. Não estava adornada com uma cortina pendurada com a palavra "banho", como no Japão, mas a porta aberta exalava vapor branco, então era definitivamente o lugar certo. No mundo real, um local tão úmido no subsolo ficaria mofado o quanto se poderia imaginar, mas não precisávamos nos preocupar com microrganismos ou vírus no mundo virtual — eu esperava.

Quando «Kizmel» e Asuna passaram pela porta, eu parei e chamei.

— Ok, eu vou esperar por vocês aqui.

A cavaleira se virou rapidamente e me chamou, parecendo magoada.

— Não seja bobo, Kirito. Venha conosco.

— Hm... Eu me sentiria mal se forçasse vocês duas a usarem maiôs, como no Castelo Yofel... Além disso, na chance de um em um milhão de que aqueles vagabundos ataquem de novo...

Asuna parecia extremamente conflituosa, dividida entre a culpa de ser a única a tomar banho e o desejo de se banhar apropriadamente sem roupa, mas «Kizmel» não hesitou nem por um segundo.

— Não se preocupe com um ataque — disse ela. — Este castelo só pode ser acessado pelo portão ao sul, e quando ele se abre, os sinos podem ser ouvidos por todo o castelo. E você não precisa se preocupar com o outro assunto.

— Hã...?

— Venha ver.

Ela agarrou meu braço e me puxou pela porta.

Era um tipo de sala de descanso, decorada com plantas atraentes e mesas com cadeiras de vime ao longo das paredes laterais. Havia também jarros e copos para água. Não havia outros elfos negros ali, provavelmente porque ainda era cedo. Havia também duas portas de vime na parede do fundo, que provavelmente levavam ao banho. Havia um círculo na porta à esquerda e um quadrado à direita.

— O banho deste castelo é muito grande, então há entradas separadas para homens e mulheres. Vocês não precisarão dos seus "trajes" aqui, Kirito e Asuna.

— Oh... isso faz sentido — eu disse, aliviado. Nesse caso, eu não me oporia a relaxar em uma grande banheira. Não tinha nada contra banhos.

— Nos vemos depois, então — «Kizmel» sorriu. Ela e Asuna desapareceram pela porta do círculo, acenando, então eu me dirigi à entrada quadrada. Como eu esperava, havia uma sala de trocas em seguida. Parecia adequada ao gênero de fantasia, pois, além das cestas de vime para guardar roupas, também havia ganchos para armaduras. Mas graças à minha habilidade de Escrita Mística, eu podia simplesmente apertar o botão REMOVER TUDO para que minhas roupas fossem guardadas automaticamente no inventário. Depois de verificar rapidamente se não havia mais ninguém por perto, removi a última peça também.

Usando a toalha branca fornecida como o mínimo de defesa, passei pela próxima porta. O corredor de azulejos virou à esquerda, conduzindo em direção a...

— Oooh...

A visão era tão fantástica que me arrancou um murmúrio. O espaço era uma enorme cúpula com um raio de provavelmente nove metros. As paredes e o teto curvos foram claramente esculpidos diretamente da rocha, o que só acentuava a sensação de uma fonte termal natural. Havia nichos nas paredes em intervalos regulares, contendo lâmpadas que forneciam uma luz suave à câmara.

Sob a cúpula, havia um líquido leitoso de cor branco-opala, e algo que parecia uma videira grossa pendia diretamente do meio do teto até a água. Esta cúpula provavelmente estava localizada logo abaixo da praça aberta na superfície, o que significava que a videira era uma raiz da árvore-espírito.

Coloquei a toalha no meu inventário e pisei no primeiro degrau do banho, permitindo que o calor me envolvesse até o topo da cabeça. Dessa vez, um “Fwaaa…” escapou da minha boca. No entanto, era muito raso para submergir todo o corpo, então caminhei em direção ao centro, abrindo caminho pela névoa que pairava no ar.

Perto da raiz, a profundidade chegava até a minha cintura, então finalmente me afundei na água.

Nesse momento, o vapor branco à minha frente se dissipou, revelando outra figura assustadoramente próxima. Era profundo demais para eu pular para longe, então tudo o que pude fazer foi encarar.

Em geral, eu não era uma pessoa que dependia muito de regras, autocontrole ou princípios pessoais — mas mesmo eu tinha algumas coisas que exigia de mim mesmo.

Uma delas era nunca pensar "Se ao menos eu tivesse (ou não) feito isso ou aquilo". Era importante entender o motivo das coisas para garantir que eu não repetisse os erros, mas eu considerava que se preocupar com "Por que você disse aquilo?", ou "Se ao menos eu tivesse percebido isso", ou "Se eu tivesse começado meu dever de casa mais cedo" era apenas um desperdício dos meus limitados recursos mentais com o tempo.

Mas até eu, neste momento, não pude evitar considerar uma série de ações que eu falhei em tomar.

Se ao menos eu tivesse ficado satisfeito com a borda da banheira. Se ao menos eu tivesse percebido por que o enorme banho era uma cúpula. Se ao menos eu tivesse considerado melhor a descrição de «Kizmel»: — Há entradas separadas para homens e mulheres. Se ao menos...

Se ao menos eu tivesse fechado os olhos instantaneamente, virado e dito "Eu não vi nada!", talvez o resultado tivesse sido diferente.

Mas o que eu realmente fiz foi encarar, atônito, por cerca de três segundos inteiros a jogadora feminina parada a menos de sessenta centímetros de distância, sem qualquer equipamento. Minha visão automática focalizou primeiro da clavícula até o osso pélvico submerso na água, e depois voltou para cima, até eu finalmente ver o rosto dela.

Naquele momento, havia apenas uma outra jogadora no Castelo Galey além de mim. Então, naturalmente, a pessoa igualmente atônita me encarando era minha parceira de cerca de um mês, a senhorita Asuna, a espadachim.

Nossa... depois de tanto esforço, derrotamos cinco bosses de andar em um mês. Nesse ritmo, poderíamos estar no décimo andar até meados de janeiro, pensei, tentando me concentrar em qualquer coisa além da realidade que eu estava enfrentando: o pescoço, o maxilar e, em seguida, o nariz de Asuna ficaram vermelhos como fogo. Quando a cor atingiu sua linha de cabelo, ela resmungou "Nngh!" e ergueu o braço com um violento respingo. Ao ver seu punho cerrado, pense. 

Bem, acho que mereci essa, justo e quadrado—

Não, não, não, espera!

Eu não podia aceitar aquele soco. Este castelo não estava sob o código anti-crime. Se a Asuna de nível 19 me acertasse com um soco de força total enquanto eu estava sem armadura, ela causaria dano ao meu HP, e isso mudaria a cor do cursor dela para laranja. Normalmente, quando estávamos fora da cidade, ela ajustava cuidadosamente seus golpes para não machucar, mas agora as luvas estavam literalmente fora de cena.

— E-E-Espera, não! — gritei, mas a Deusa da Fúria diante de mim não podia ouvir palavras humanas.

— Hnnngggg! — ela rugiu, e antes que pudesse desferir seus punhos, eu tomei a única opção que evitaria que ela fosse designada uma jogadora criminosa.

Eu caí para frente, não para trás, e enrolei meus braços ao redor de seu corpo, depois a empurrei para dentro da água, levantando uma gloriosa pluma de água quente. Afundamos quase um metro na banheira turva.

Eu agarrei a garota que se debatia, que continuava tentando gritar mesmo debaixo d'água. Eu queria gritar "Você vai ficar laranja!", mas o único som que saiu da minha boca foi "Bwuh-bubbu-ba-beww-bowah-glurble-gurlurgle!"

Naturalmente, o ícone de Afogamento apareceu acima de nossas barras de HP, e com o ar escapando de nossas bocas, a perda de HP não estava longe. Não podíamos nos deixar morrer por uma razão tão patética, então eu nos puxei para cima o suficiente para que nossas cabeças rompessem a superfície, ainda segurando Asuna. Essa seria minha última chance de avisá-la sobre o risco de ficar laranja...

Então uma torrente de água gelada caiu sobre nós, literalmente esfriando nossas cabeças. Eu congelei no lugar, completamente atônito. Era «Kizmel», que sem dúvida veio ao banho mais tarde devido ao processo de remover manualmente a armadura, nos observando de cima.

— Ora, ora, não estão muito amigáveis não? — comentou ela.

Naturalmente, ela também não estava usando um único equipamento, mas a essa altura eu já não tinha mais força mental para refletir sobre isso.

 

✗✗✗

 

Mais tarde, me disseram que a árvore-espírito no Castelo Galey estava constantemente absorvendo a água da fonte termal natural por meio de suas raízes para sustentar seus galhos e folhas, ocasionalmente ficando tão saturada que gotejava como chuva, formando a piscina em sua base. A piscina fria penetrava lentamente na rocha, e a cada hora mais ou menos, vertia na nascente subterrânea como uma cachoeira.

Faz sentido de certa forma — e ao mesmo tempo, não faz sentido algum — mas o importante é que isso nos salvou de uma série de problemas. A classe da Asuna temporariamente mudou de Espadachim para Deusa da Fúria, mas quando ela se lembrou de que não estávamos em uma zona segura, ela entendeu o que minhas ações pretendiam. Ela passou por cinco ou seis diferentes expressões faciais antes de dizer — Peço desculpas por ter feito aquilo — e voltou a ser humana novamente.

Afundei até os ombros e considerei o que fazer agora. A água em si era quase completamente opaca, então, se você ficasse a um metro e meio de distância, não conseguia ver o corpo da outra pessoa de jeito nenhum, mas eu não tinha força de vontade para me sentar e aproveitar o banho, mesmo nessas circunstâncias. Parecia que eu deveria simplesmente equipar o traje que Asuna fez para mim no quarto andar, mas por algum motivo, ela estava apenas deitada, absorta, sem fazer o mesmo, então eu fiquei um pouco hesitante em abrir minha janela.

No fim, decidi que o melhor seria simplesmente encontrar uma forma de sair dali, e já estava me esgueirando para o lado quando «Kizmel», que estava imersa do outro lado de Asuna em relação a mim, começou a falar.

— Sabe, sobre aquelas adagas arremessáveis... acho que posso saber uma maneira de neutralizar o veneno que se infiltra nelas.

— O quê...? — Era exatamente o que eu estava esperando para perguntar a ela. Me aproximei alguns centímetros mais, movido pela curiosidade — até que um olhar severo de Asuna me conteve.

— Se essas adagas arremessáveis forem realmente feitas dos espinhos do dragão Shmargor, então a história do herói humano Selm lutando contra o dragão deve ser útil. Pelo que me lembro, Selm conseguiu a ajuda de um sábio élfico e construiu uma ferramenta para deter o veneno do dragão...

— Ooh... e como se cria esse item? — perguntei, inclinando-me para a frente novamente. Desta vez, Asuna estava prestando atenção em «Kizmel», então não atraí sua ira.

— O sábio era um elfo negro ou um elfo da floresta?

«Kizmel» respondeu com um leve encolher de ombros.

— Ouvi a história de minha avó quando era criança. Receio não me lembrar dos detalhes mais específicos. Mas acredito que um contador de histórias elfo negro teria uma recordação completa e adequada da história de Shmargor.

— C-Contador de histórias? Onde podemos encontrar uma pessoa assim?

Por favor, que seja em algum lugar que já limpamos, relativamente perto da cidade principal! Rezei. E minha oração foi atendida de maneira surpreendentemente útil.

— Há um contador de histórias neste próprio castelo. Mas, como regra geral, eles são muito velhos e passam a maior parte do dia dormindo, então vocês precisarão visitá-lo na biblioteca por volta do meio-dia.

— Legal!

Eu quase não consegui conter um "Massa!" também. Ainda não estava confirmado que seríamos capazes de fabricar um antídoto, mas só a possibilidade já era bem-vinda.

Quanto a Asuna, ela se interessou por outra coisa. Ela se virou para «Kizmel», fazendo a superfície da água ondular.

— Nunca vi um elfo idoso antes... Eles também têm aparência jovem?

— Nossos anciãos raramente saem da cidade, por isso. Quanto à aparência deles... bem, acho essa uma pergunta difícil de responder.

— Ah. Claro. Vou esperar para descobrir pessoalmente.

— Essa é uma boa ideia. Acho que vou sair agora. E vocês dois? — perguntou a cavaleira. Nos olhamos por um breve momento, depois concordamos que também estávamos prontos. Me virei, ainda agachado, e fui em direção ao vestiário masculino — embora não fizesse sentido para mim o fato de haver vestiários separados que levavam ao mesmo banho. Mas antes de sair, uma última pergunta cruzou minha mente, e eu me virei novamente.

— Ah, é, «Kizmel»—

Em minha linha de visão apareceu a metade superior da cavaleira de pé — e Asuna desesperadamente usando ambas as mãos para cobri-la. Rapidamente desviei os olhos.

— Hmm? O que foi, Kirito?

— E-Eu... vou perguntar no salão! E-Er, vejo vocês mais tarde!

Rápido, fiz uma fuga estilo nado de peito até as escadas antes que qualquer outro ataque viesse em minha direção.

 

✗✗✗

 

Uma das vantagens do SAO era que cabelo e pele molhados secavam muito rápido ao sair da água. Então, eu não precisei me enxugar enquanto seguia pelo corredor escuro em direção ao vestiário, equipei uma camisa preta e calças, e entrei no salão. As mulheres ainda não tinham voltado, e ninguém mais estava visitando o local, então me joguei preguiçosamente em uma das cadeiras de vime ao longo da parede e soltei um profundo suspiro.

Eu não tinha problemas com banhos em geral, mas eles já tinham sido fonte de problemas mais de uma ou duas vezes desde que me juntei a Asuna: tive que usar um traje minúsculo com o logo de um urso no Castelo Yofel, e lá, acabei com a cabeça submersa. Tive que proteger Asuna enquanto ela tomava banho no acampamento dos elfos negros no terceiro andar, onde «Kizmel» invadiu meu espaço. Nada de mais aconteceu no segundo andar, mas no primeiro...

— Na verdade... acho que o banho foi o começo de tudo isso — murmurei, derramando água do jarro sobre a mesa em um copo e bebendo tudo.

Na verdade, quando nos conhecemos, Asuna não tinha tirado seu capuz vermelho na frente de ninguém, e o momento em que eu senti que a distância entre nós estava começando a diminuir, ainda que um pouquinho, foi quando ela veio até o lugar que eu estava alugando em «Tolbana», no primeiro andar de Aincrad. Sua visita foi para usar minha banheira.

Com um timing perfeitamente ruim, Argo, a vendedora de informações, chegou enquanto ela estava no banho, tendo se deparado com ela enquanto tentava entrar no banheiro para trocar de equipamento. Mas, se eu não estivesse alugando um lugar com um banheiro de luxo desde o início, talvez nunca tivéssemos acabado trabalhando juntos.

Então, por mais que os banhos levassem a incidentes, eu não podia guardar rancor dos banhos de Aincrad... Eu só precisava garantir que os banhos masculinos e femininos fossem totalmente separados da próxima vez. A porta giratória com o símbolo de círculo se abriu, e Asuna e «Kizmel» voltaram. A espadachim usava uma túnica amarela que eu nunca tinha visto antes, enquanto a cavaleira estava em um vestido roxo brilhante — ambas notavelmente mais translúcidas do que suas roupas habituais, o que me deixou um pouco nervoso no início (mesmo que parecesse desnecessário me preocupar, depois do que acabara de acontecer no banho).

Felizmente, as memórias de Asuna daquele desastre tinham sido substituídas pelo prazer de seu primeiro banho em uma fonte termal natural de Aincrad. Ela se jogou na cadeira de vime à minha direita, com uma expressão de felicidade no rosto, e disse — Ahhh... isso foi bom...

Eu lhe entreguei um copo de água gelada, que ela bebeu de uma só vez.

— Pweeh!

«Kizmel» sentou-se na cadeira à minha esquerda, cruzando elegantemente suas longas pernas, e disse.

— É realmente um banho esplêndido que temos aqui. É uma pena que eu tenha que me mudar novamente, assim que meu dever neste andar acabar.

— Entendo. Você tem uma vida agitada, «Kizmel»... Você colocou as Chaves de Jade, Lápis e Âmbar em um local seguro, certo?

— Mas é claro. Elas estão no depósito de tesouros no quarto andar do salão central.

— D-Depósito de tesouros, oh...?

Eu gostaria de ver isso. Mas aposto que é o tipo de lugar onde serei repreendido, pensei egoistamente, mas Asuna tinha uma ideia muito mais prática em mente.

— «Kizmel»... você não está preocupada que os elfos da floresta possam atacar em busca das chaves novamente, como fizeram no Castelo Yofel?

Essa era uma pergunta muito pertinente. Tirando as grossas paredes de pedra e o enorme portão, este lugar seria um alvo significativamente mais fácil do que o Castelo Yofel, que era cercado por água por todos os lados. Os elfos da floresta se esforçaram tanto para recuperar as chaves, que era difícil imaginar que desistiriam após uma única derrota.

Poderiam haver soldados inimigos se aproximando furtivamente pelos portões enquanto estávamos ali sentados. Esse pensamento inquietante quase me fez levantar da cadeira.

— Não. Não precisa se preocupar com isso — afirmou «Kizmel». Tanto Asuna quanto eu olhamos para o lado do seu rosto. Algo na leve sombra de sua expressão me disse a fonte de sua certeza.

— Ah, entendi. A área fora deste castelo...

— Isso mesmo. O deserto que nos cerca é tão desolado e seco... que nem elfo negro nem elfo da floresta podem sobreviver muito tempo ali. Dentro do castelo, somos protegidos pelas bênçãos da árvore espiritual, mas se essa árvore morrer, seremos forçados a abandonar este lugar.

Quando visitei o Castelo Galey na versão beta, o elfo negro que me deu a missão — nem «Kizmel» nem o Conde «Galeyon», apenas um comandante sem nome — me disse a mesma coisa. Na época, aceitei isso como verdade, mas agora só surgiram novas perguntas.

— Então, como você vai recuperar a chave deste andar? Você pode telepor... quer dizer, viajar pelas árvores espirituais nos castelos do quinto e do sétimo andar, mas a chave ainda está longe deste lugar, não é?

— Isso mesmo — ela admitiu. Ainda parecia haver uma leve nota de luto em suas feições, mas quando se virou para nós, estava com seu habitual sorriso lânguido. — Mas não tema. Este castelo está equipado com um meio de sair em caso de emergência repentina. Isso nos permitirá atravessar os desertos áridos.

Nesse momento, minha parceira e eu trocamos um olhar significativo. Não precisávamos falar para nos entender.

— «Kizmel» — disse Asuna — Kirito e eu iremos recuperar a chave escondida deste andar. Talvez não sejamos tão fortes quanto você, mas estamos muito mais resistentes do que antes.

— Não duvido disso — respondeu a elfa, parecendo hesitante — mas não posso esperar que vocês façam o trabalho por mim. O atrito com os elfos da floresta e os Elfos Caídos é nosso problema... E pense desta forma. Se vocês não tivessem salvado minha vida na «Forest of Wavering Mists», eu teria sido morta por aquele elfo da floresta — ou, no melhor dos casos, lutaríamos até a morte. Como posso ficar aqui, segura e sã em um castelo, enquanto deixo vocês dois fazerem todo o trabalho sujo e perigoso?

Assim mesmo! — Queria gritar, mas o olhar no rosto da orgulhosa cavaleira me impediu. Asuna parecia ter mais a dizer sobre o assunto, mas eu a acenei para trás e disse.

— Tudo bem... então vamos buscar a chave amanhã. Mas não corra riscos desnecessários. Se qualquer coisa parecer difícil, você deve prometer nos avisar imediatamente.

Estendi meu dedo mindinho esquerdo, no qual «Kizmel» fixou o olhar.

— O que há de errado com seu dedo?

— Ah, é... é um costume humano. Quando você faz uma promessa, entrelaça os dedos mindinhos.

— Ah. Assim?

«Kizmel» entrelaçou seu dedo mindinho direito com o meu e moveu a mão para cima e para baixo. Asuna levantou-se da cadeira dizendo.

— Eu também! — e estendeu sua mão direita para «Kizmel», que usou sua outra mão para fazer o mesmo, sorrindo de maneira desajeitada.

— É um costume estranho, mas parece divertido. Prometo não correr riscos desnecessários, se vocês prometerem priorizar a própria segurança.

— Claro! — Asuna e eu respondemos em uníssono. A cavaleira sorriu radiante.

Após o banho subterrâneo, ela nos levou para a sala de jantar no segundo andar do salão central.

Era hora do jantar, e muitos elfos estavam presentes. Havia até um pequeno palco, onde dois elfos em trajes fantasiosos tocavam alaúde e flauta. Alguns dos soldados até cantavam baixinho junto à melodia.

A comida em si era visivelmente mais simples do que o banquete no Castelo Yofel, mas esse estilo combinava mais com o meu gosto, e o ensopado de tubérculos e carne no osso estava tão bom que pedi uma segunda porção.

Depois de combinarmos o horário de encontro pela manhã, nos despedimos de «Kizmel» no corredor do terceiro andar da ala oeste — apesar de o quarto da cavaleira estar logo ao lado do nosso — e voltamos para nosso aposento de hóspedes. Soltamos suspiros pesados e nos pegamos trocando olhares.

Eu sentia que precisava me desculpar pelo meu comportamento escandaloso no banho, mas Asuna estava me enviando um sinal silencioso para que eu não dissesse nada. Minha janela de jogo mostrava que ainda nem eram oito horas, o que, em um dia típico, significaria que eu sairia para alguma atividade noturna, mas estávamos cansados da exploração da dungeon e da travessia do deserto, e concordamos que deveríamos dormir cedo.

Mas falhamos em perceber que ainda não havíamos enfrentado o maior perigo do dia.

Esse aposento de hóspedes era outra suíte, onde a sala de estar ficava em uma área separada da área de dormir. Mas, ao contrário do lugar onde ficamos na noite anterior, havia apenas uma porta para o quarto.

Olhamos um para o outro novamente, cruzamos a sala de estar e abrimos a porta. O quarto era igualmente luxuoso, mas havia apenas uma cama de casal no centro da sala.

Na noite anterior, eu havia dormido no sofá ao invés da minha cama, então poderia simplesmente fazer o mesmo — exceto que isso aconteceu porque Asuna tinha adormecido primeiro. Sabendo o quanto minha parceira odiava ser tratada de maneira especial, eu suspeitava...

— Hum... Eu vou dormir no sofá, ok...?

— Você não vai conseguir dormir bem desse jeito.

Eu teria protestado, mas ela estava certa, e sabia disso.

Enquanto dormia no SAO, o corpo do jogador na vida real também estava em um estado de sono, mas o NerveGear continuava fielmente enviando sinais corporais virtuais o tempo todo. Se você dormisse em uma cama luxuosa, sentiria a maciez envolvê-lo. Se dormisse ao ar livre no chão, seria áspero e desconfortável. Naturalmente, o último proporcionaria um sono mais superficial, muitas vezes resultando apenas em uma soneca leve. O sofá da sala de estar era grande o suficiente, era bom e espesso, mas, como as almofadas do assento eram elevadas, não era adequado para deitar. Quando eu estava sozinho no primeiro andar, acampava o tempo todo — pelo menos com um cobertor — então eu poderia dormir ali, mas se Asuna aceitava isso ou não era outra questão.

— Escuta, eu posso dormir em qualquer lugar. Não se preocupe comigo, pode ficar com a cama e...

— Somos parceiros de jogo, não somos? — Asuna interrompeu. Ela estava certa, é claro.

— S-Sim?

— Então seria errado colocar todo o peso em apenas um de nós.

Mais uma vez, ela estava absolutamente certa.

— Sim.

— Então, essa é a única opção.

Ela me puxou pela manga até o quarto e puxou metade das cobertas da grande cama. Bem no centro dos lençóis brancos perfeitamente impecáveis, ela desenhou uma linha de 30 cm de comprimento no meio com o dedo.

— Esta é a fronteira.

Eu não ouvia essa palavra desde a vez que dormimos na tenda de «Kizmel» no acampamento dos elfos negros, no terceiro andar, e a surpresa trouxe uma risada aos meus lábios — e um olhar feroz de Asuna.

— T-Tá legal... Entendi. Compreendido.

Asuna me lançou um olhar carrancudo de volta, mas indicou que isso era suficiente e colocou as cobertas no lugar.

Embora tivéssemos chegado a um acordo sobre a questão da cama, as circunstâncias eram um pouco — não, muito — diferentes da tenda. Dormir no chão ali significava desculpar muito do contato potencial sob a experiência geral de "sobreviver". Mas em um prédio adequado, um quarto adequado, uma cama adequada, não havia desculpas. A fronteira traçada nos lençóis era tão frágil e perigosa quanto a Linha de Controle na Caxemira.

Mas, apesar de ser tão suscetível a acidentes espontâneos, a espadachim exibia uma surpreendente resistência à situação.

— Bem... Vou dormir deste lado — ela disse, ocupando a metade mais distante da janela e se enfiando debaixo das cobertas. De costas para mim, ela abriu sua janela, apertou um ou dois botões e a fechou. Ouvi um som de movimento debaixo das cobertas, provavelmente ela trocando de roupa para o pijama.

Então, ela se acomodou mais profundamente até que apenas a parte de trás da cabeça dela fosse visível. Parecia que sua estratégia era adormecer o mais rápido possível, o que me pareceu a decisão certa, então bati na parede e apaguei as luzes do quarto e da sala de estar.

Havia uma janela na parede oeste do quarto, e a luz fraca da lua atravessava as cortinas de renda. O dia começou nublado, mas clareou à tarde. Espero que o tempo esteja bom amanhã, pensei, tentando me distrair enquanto entrava na metade da cama oposta a Asuna.

A cama tinha cerca de 1 metro e 80 cm de largura, então, enquanto eu ficasse na borda esquerda, longe da fronteira, eu não precisaria me preocupar com a presença física da minha parceira. O colchão tinha a mistura certa de firmeza e maciez, e o cobertor era leve e quente como um edredom de plumas. Eu tinha que admitir que Asuna estava certa; o sofá lá fora e meu cobertor de acampamento pesado não chegavam perto desse nível de conforto.

Minha cabeça afundou no travesseiro macio, e minhas pálpebras se fecharam, e, apesar da situação, senti o sono chegando. 

Pronto... dormir, dormir, e conseguir um quarto extra amanhã...

— Você ainda está acordado, Kirito?

— Sim.

O sono se afastou. Se ela dissesse "Só conferindo", que resposta eu deveria dar? Mas o que veio a seguir foi algo que eu não esperava.

— Sabe aquele código de anti-assédio? Aquele que apareceu na oficina do Sr. «Romolo» no quarto andar quando você tentou me acordar?

— Sim.

Esse assunto ominoso afastou completamente meu sono. Agora eu não fazia ideia de onde isso iria.

— Eu estava pensando... Você me empurrou quando estávamos no banho.

— Não... Eu estava te impedindo de ficar laranja.

— Mas você me empurrou.

— Sim.

— Então, por que o código anti-assédio não ativou?

Por que não ativou...?

Eu não tinha uma resposta pronta. Eu precisava pensar sobre isso.

— Hm... Não aparece se você estiver em um grupo...? Não, porque estávamos em grupo no quarto andar... Talvez dependa do tempo de contato...? Mas não me lembro de ter te tocado por muito tempo no quarto andar, também...

— Não é uma questão de como você faz o contato. Quando você tentou me acordar, você só tocou meu ombro, e o código disparou, mas não aconteceu quando você me tocou enquanto estávamos sem roupa.

— P-Por favor, não diga assim — implorei.

De fato, não fazia sentido que o código ativasse só por tocar o ombro dela, e, no entanto, ao pressionar contra ela sem nenhuma roupa, não aconteceu nada. Havia alguma outra condição diferente entre a oficina e as águas termais subterrâneas, além da configuração do grupo e do tempo de contato?

— Hmmm...

Eu afastei a fada do sono que tentava voltar à minha mente. Mas a cama era tão macia e confortável, e se ficasse mais macia e confortável, seria macia... confortável...

— Ah.

No instante em que comecei a cair no abismo do sono, a resposta que eu precisava surgiu.

— Quando aconteceu... você estava dormindo.

Ela também devia estar cochilando, porque sua resposta veio com um atraso.

— O quê? O código ativou porque eu estava dormindo? Você quer dizer que ele não dispara se você estiver acordado...?

— Não, acho que não é isso... Mas é a única coisa que consigo pensar...

— Hmm...

Depois de mais alguns segundos de silêncio, minha parceira temporária me surpreendeu novamente.

— Mindinho...

— Hã?

— Estenda seu mindinho.

Eu mexi meu dedo mindinho por debaixo do cobertor, então me lembrei da linha invisível.

— Mas a fronteira...

— Uma invasão de um dedo pode ser ignorada. Vai logo.

— Tá bom...

Hesitante, estiquei meu braço, apontando o mindinho perto da linha central da cama. Depois de alguns momentos, o que eu assumi ser o mindinho de Asuna roçou no meu e o agarrou. Instintivamente, apertei de volta.

— Então, hã... o que estamos fazendo?

— Apenas fique quieto.

...

— A janela do código não está aparecendo. Então, se dormirmos assim, e ela aparecer quando acordarmos, isso indicaria que sua teoria está certa, até certo ponto.

— Ah, entendi...

A tensão deixou meu corpo. A pressão do mindinho de Asuna diminuiu um pouco, e ela sussurrou.

— Bom, boa noite...

— Se a janela aparecer, não aperte o botão enquanto dorme.

— Sim... eu... sei...

— Boa noite.

A partir daquele momento, o silêncio reinou na terra dos cobertores, e a única coisa que cruzava a fronteira era o leve som de alguém dormindo. Fechei os olhos novamente, mas o calor suave daquele contato com o mindinho impediu meus pensamentos de se dispersarem.

Eu estava curioso sobre o funcionamento do código de anti-assédio, claro, mas ainda havia muitas coisas para Asuna e eu fazermos neste andar. Não havíamos terminado a missão "Maldição de «Stachion»", precisávamos ajudar a avançar o progresso pelo andar, o manuseio da bandeira da guilda ainda estava incerto, e amanhã estaríamos ajudando «Kizmel» com a missão para recuperar a Chave de Ágata. E o maior problema de todos eram os PKers.

Eu já havia dito a mim mesmo inúmeras vezes que era inútil tentar decifrar o modo de pensar deles, mas eu não conseguia evitar.

Por que Morte, o usuário de adagas, e o homem de poncho preto estavam tentando fazer a DKB e a ALS brigarem? Especialmente quando era óbvio que isso só prejudicaria nossas chances de vencer o jogo e encontrar a liberdade dessa prisão eletrônica?

Independentemente de seus motivos, eu jamais os perdoaria por terem tentado matar Asuna. Nunca deixaria suas lâminas malignas chegarem perto dela novamente.

Por um instante, fui tomado por um impulso surpreendentemente forte. Eu não queria apenas esse mindinho. Eu queria pegar sua mão, puxá-la para perto e envolvê-la com meus braços. Eu queria deixar claro que iria protegê-la.

Mas eu não podia fazer isso. Nossa parceria provavelmente não duraria para sempre, e nem deveria. Até o dia em que ela estivesse à frente dos nossos melhores e mais brilhantes, como um símbolo de esperança para todos os jogadores do jogo, eu continuaria fornecendo a ela toda a ajuda que pudesse, como um beta tester. Esse era o meu papel.

Deixei a tensão lentamente sair do meu corpo, exalei e tensionei meu dedo mais uma vez, apenas para sentir que a sensação ainda estava ali.

...Boa noite, sussurrei em minha mente, e finalmente me entreguei ao sono.

(Continua no próximo volume)


Este capítulo foi traduzido pela Mahou Scan. Entre no nosso Discord para apoiar nosso trabalho!


 



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