Sputnik Saga Brasileira

Autor(a): Safe_Project


72 SEASONS

Capítulo 4: Civilização

Rag deu um fraco chute contra os corpos carbonizados. O cheiro de carne podre subiu ao nariz e fez os pulmões coçarem, mas nada que o impedisse de continuar a caminhada. O olhar constantemente indo para a entrada do Corredor, a garantir que ninguém lhe seguia.

"No fim eu nem precisei chegar até o final deste lugar para descobrir a verdade."

O quão boca grande vampiros conseguiam ser era um detalhe bastante conveniente, alguns poderiam até chamar de malevolência do roteiro, enquanto outros talvez insistissem em dizer que era uma técnica avançada de gerenciamento de informações para justificar a preguiça do autor de arranjar uma alternativa melhor.

Independente disto, agora era fato de que as pessoas eram enviadas ali enquanto outros tinham noção da presença de vampiros no local. Se estavam ali desde o início, as coisas ficavam um pouco complicadas. Rag aos poucos ligava as peças em sua cabeça.

"Tecnicamente já tivemos nove Papas desde a fundação da Igreja, sendo que o Corredor foi fundado mais ou menos na época do terceiro, então…"

Vampiros não sofriam de velhice, o que deixava tudo confuso. Em que ponto a linha de sucessão foi quebrada? Era impossível supor com tão poucas informações, mas uma coisa era fato.

"Independente de quem fale, eu não posso dizer antes de ver com meus próprios olhos, mas o Papa atual, ele também deve ser…" Cerrou os punhos, querendo conter sua tremedeira. "Deve ser um Original."

As pernas pararam de repentino, a ideia de enfrentar uma criatura tão poderosa a travar seus músculos.

"Eu não sou um lutador, meu trabalho nem tem relação com lutar… Se eu voltar, com certeza encontrarei guardas e…!!"

Aliados dos vampirosClaro que nem todos poderiam ter noção do que se passava ali e agora, mas arriscar contar para alguém e acabar cercado por apoiadores desta conspiração seria um final bem fácil de alcançar. Já devia haver inspetores no salão da catedral, estes que encontraram um corpo cuja cabeça foi explodida como um balão, e um Arcebispo que atuava como ritual ambulante era o alvo perfeito da culpa.

Quando considerou isto, Rag entendeu que sobravam incríveis zero opções para seguir além desta cujo caminho percorria neste exato momento.

"Eu… lutar contra um Original? Não, não! Sem chance! Eu morreria na mesma hora!!"

Quanta covardia A voz da razão apareceu para falar o óbvio, sempre na pior hora. Como o demônio em seu ombro apareceu para dar sua opinião, Rag esperava que um anjinho surgisse do outro lado, infelizmente ele havia sido destruído pelo gnomo desnutrido há um bom tempo.

Você não precisa de ajuda, eu já sou mais do que suficiente para cuidar de tudo. Afinal, você não está limitado somente ao número de 72 selos, lembra?

— Eu não vou usar aquela habilidade de novo, ponto final!

Só porque eu fiz uma pequena bagunça da última vez? Tudo aquilo foi culpa sua, em primeiro lugar.

— Já chega, se for ficar me atormentando por causa daquele incidente, vai ajudar mais se só for… embora?

Rag, até então parado, olhou para trás para ter certeza se não tinha começado a andar sem perceber, mas isto apenas piorou a situação.

A entrada do Corredor, que devia estar somente uns cem metros de distância, havia desaparecido, restando somente um caminho infinito nas costas do Cardeal. Logo à sua frente estava justo o que menos esperava encontrar em algo chamado "corredor".

— Isso é… uma parede?

É, acho que vou embora, então! Divirta-se com seu novo problema! HAHAHAHAHA!

A criatura encolheu até o ponto de desaparecer, largando o rapaz no silêncio outra vez.

Mas que Rag evitou as próximas palavras por seu um homem puro, mas isto infelizmente não o deixava imune ao medo.

Olhando para trás via somente um caminho infinito, como se tivesse caminhado por horas. Até pensou em voltar para procurar a entrada, mas a possibilidade de ficar preso em algum tipo de loop infinito lhe fez descartar a ideia.

Já diante de seus olhos estava algo ainda mais inédito ao considerar o local em que estava. A parede era um literal divisor para o ambiente, ainda feita do mesmo metal que o resto do Corredor, dotada também de pequenas tubulações espalhadas sem um padrão notável. No centro da parede, frestas escuras destacavam a silhueta de uma porta.

"Como exatamente eu passo por isto?"

Nenhuma maçaneta, olho de vidro ou painel eletrônico à vista. Passou a mão pela área da porta e nada aconteceu. Considerou usar o 50° selo novamente e simplesmente queimar a porta, mas isto ocasionaria na próxima punição aleatória da Maldição, e usar isto enquanto sob o risco de mais vampiros aparecerem não era uma opção agora.

Matutou por alguns segundos, batendo o pé na esperança de que o pequeno demônio aparecesse para gozar da sua cara e convenientemente jogar uma informação útil como já aconteceu antes, uma técnica cujo uso nem foi necessário.

Um pedaço equivalente a uma portinhola para animais se abriu na parede, mas ao invés de um ser vivo, Rag foi recepcionado por uma máquina.

O robôzinho de tronco quadrado, capaz de se movimentar graças às quatro rodas de um caminhão de brinquedo, cumprimentou-o com um acenar dos braços feitos de latão e mãos no formato das garras de um alicate. O rosto se tratava de um binóculo para atuar como dois grandes olhos alegres.

— Bo-Bom… dia?

O cumprimento instintivo ao olhar convidativo lhe rendeu um rodopio alegre do robô. Em seguida, a porta maior se abriu, revelando o outro lado para o visitante.

"Isso é…" Analisou um pouco antes de entrar. "Parece o interior de uma casa."

Uma casa minimalista, para ser mais específico, pois não havia portas para outros cômodos além deste principal. As paredes eram brancas, decoradas com um quadro aqui e ali, e de móveis só se via um grande sofá preto e uma pequena mesa de centro.

Rag deu uma boa analisada, entrando na sala com cuidado e pronto para fugir ao menor sinal de perigo. No fim, nada aconteceu até que estivesse dentro do cômodo. A porta fez um som de despressurização e se fechou lentamente, tanto que poderia ter saído se quissese.

"Como exatamente eu atravesso esse lugar?"

Sem sinais de uma maneira de contornar por fora, restou encontrar uma saída por aqui. Caso nada funcionasse, bastava usar o 50° Selo outra vez até derreter alguma parede. Foi o que funcionou até agora.

Bzzt-Bzzt!! O som de estático atraiu sua atenção até o pequeno robô. Com dificuldade, ele segurava uma pequeno pratinho com uma xícara cheia de café usando as garras. Entre barrancos e abismos, conseguiu colocar o item sobre a mesa de centro, indicando o sofá para o convidado.

Hum Seu resmungo desconfiado fez o robôzinho indicar o sofá incansavelmente. Rag analisou o móvel, em busca de alavancas suspeitas, pisos ou almofadas falsas, e, ao não encontrar nada, cedeu aos grandes olhos brilhantes de cachorro abandonado da criaturinha aos seus pés.

Após umas últimas cutucadas de confirmação, se sentou no meio do sofá largo. Pelo jeito não havia risco de alguma armadilha ou coisa parecida. Aconchegou-se, encontrando aqui uma nova oportunidade para raciocinar.

"Será que eu uso algum Selo agora?" Pegou a xícara, o cheiro de um café doce a lhe acalmar.

Ainda tinha um uso dos Selos antes de receber uma penitência aleatória. Por mais que fosse incapaz de controlar, a probabilidade maior era a de cair outra onda de informações que causariam um desmaio. Se este local era seguro, deveria aproveitar para resetar os usos agora ao invés de correr o risco de desmaiar durante uma luta de vida ou morte.

"As penitências não podem me matar diretamente, então eu poderia apenas esperar aqui e me recuperar."

Tomou um gole do café, sem sinais de qualquer veneno. A intenção era beber com cuidado, mas ficar perdido em pensamentos fez o café sumir tão rápido que nem percebeu.

"É acho que é melhor usar um Selo. Vejamos… talvez eu use o 9° Selo novamente para pegar novas informações…"

Colocou seu livro sobre o colo e começou a folhear. Sem que percebesse, o robô encheu sua xícara novamente, repetindo o processo sempre que o líquido acabava.

Enquanto lia, a portinha de cachorro se abriu outra vez, permitindo a entrada de outros robôs idênticos ao primeiro. Traziam toalhas e roupas de banho — ainda que nenhum chuveiro estivesse à vista —, sem contar bandejas dos mais variados comestíveis e outros itens de uso diário.

Rag tinha um olho na comida e outro nas páginas do Livro de Selos, aos poucos cedendo para esse primeiro. Seu estômago já começava a roncar, e ainda que este fosse um local suspeito, não demoraria muito para seu corpo canibalizar-se caso não comesse agora.

Pegou as roupas de banho e colocou por cima de suas vestimentas sagradas, já que nem havia água de fato para se banhar. Em seguida, entre as várias opções, pegou um bolinho salgado. Abriu, sem sinal de alguma substância suspeita, e comeu numa só mordida após assoprar um pouco.

"Talvez esta área não tenha relação com os vampiros. Pode ser uma área de descanso planejada pelos engenheiros da época para aqueles que passassem pelo Corredor."

Pensar assim fazia soar suspeito, visto o quão rígida a Ghost era com os que buscavam subir de cargo. Fosse você super dedicado, promissor, talentoso ou cheio de dinheiro, receberia o mesmo tratamento que os outros. Tanto cuidado por uma provação igualitária mostrava o quanto os superiores se importavam com quem estava no topo da hierarquia.

Bem, ao menos deveriam se importar.

"Se o Papa for um vampiro, isso vai explicar muita coisa, mas… o que eu posso fazer sobre isso?"

Somente agora, com uma chance de sua mente relaxar um pouco, pensou no que estava de fato fazendo. Caso a pior opção se tornasse real, o Papa ser um vampiro, era muito provável que ele também fosse um Original.

Muita coisa mudou em La Serva quando um dos quatro Originais — Eduardo — foi morto mais ou menos dois meses atrás. Ninguém sabe ao certo como isto veio a acontecer, a última coisa que se espera no dia-a-dia é saber que uma das criaturas mais poderosas morreu sem explicação aparente.

Rumores diziam que um Amaldiçoado havia feito isto, e quando Rag usou o 9° Selo e descobriu que o príncipe de Von Legurn estava na Torre, foi fácil fazer a conexão de tudo. Porém, Vast era o Vast, enquanto Rag era… o Rag. Só porque alguém conseguiu, não era garantido que ele também o faria.

"Talvez eu encontre alguém forte no caminho até lá. O Corredor é bem longo…"

Esta era somente uma vaga esperança que ficaria nos fundos de sua mente, pois o foco agora era sobreviver o suficiente para continuar a caminhada.

É melhor eu ir logo. Engoliu outro bolinho e buscou mais um, só então percebendo que havia devorado todos. Se levantou em seguida, tirando o roupão e o devolvendo para o sofá perfeitamente dobrado.

"Agora, de novo… Como eu saio daqui exatamente?"

A dúvida de qual selo usar ainda lhe corroía. De portas só via a que usou para entrar, nada mais. Os robôs, por sua vez, levavam os pratos e o roupão dobrado para uma…

"Aquilo é uma escotilha?"

Escondida na parede contra a entrada do cômodo havia um outro tipo de portinhola, semelhante àquelas usadas em cozinhas industriais para descartar o lixo mais facilmente.

"É pequeno, mas suficiente. Se houver um caminho para uma saída por ali, então eu consigo dar um jeito."

Decidiu-se, abrindo na página do 9° Selo e imediatamente dando a ordem para o efeito específico que queria.

— Revele tudo abaixo de mim!

O efeito imediato deu aos seus olhos a capacidade de enxergar através das coisas, da terra em especial. Seguindo o duto de lixo, foi guiado para um compartimento que, infelizmente, não levava para nenhum tipo de saída, mas que lhe deu uma informação bem mais importante.

"O que é aquilo?"

A "lixeira", por assim dizer, estava bem cheia. Foi um pouco difícil enxergar devido a distância considerável, mas o cheiro indescritível que quase o fez vomitar ao abrir a escotilha e relacionar à cor preto esverdeado e vermelho rubro, além de acelerar seu coração, o permitiu entender tudo.

"É carne! Carne humana!" Estava mais que acostumado com o odor para ter certeza. "É um amontoado incontável de cadáveres!!"

Moldados como massas de modelar, apesar de aglomerados e em cores semelhantes, era possível perceber que os infelizes foram transformados em cubos de carne apenas um pouco maior que uma cabeça humana. O tamanho idêntico à caixa que se tratava do tronco dos pequenos robôs que acolhiam Rag neste momento.

Bom demais para ser verdade! Esta atmosfera preenchia a sala desde o início, e a pressa de Rag para sair se tornou tão grande quanto nunca. Porém, seu corpo desabou.

O quê!? A paralisia foi quase completa, ainda capaz de mover um pouco os braços e a cabeça.

"Foram os bolinhos? Droga…!"

Levado pela fome do momento, apenas piorou sua própria situação. Os robôs começaram a se amontoar ao seu redor de imediato, pequenas portinholas a abrir em seus torsos, prontos para compactar carne.

"A penalidade vai vir a qualquer momento, eu não posso correr o risco de desmaiar agora!!"

Concentrou toda sua força no braço direito, abrindo seu livro no Décimo Quarto (14°) Selo. A habilidade se ativou de imediato e uma onda de choque visível alcançou cada centímetro da sala. Apesar de não causar nenhum dano notável apenas com isto, os robôs fizeram o resto do serviço.

Plank! Um dos robozinhos deu um soco em seu companheiro, cujo revidou. Antes que percebessem, todos eles se envolveram numa luta uns contra os outros enquanto Rag colapsava no chão.

"Deu certo, agora eu só preciso…"

TUM! Poderia muito bem ser um tambor, ou algum tipo de ser colossal pisando sobre o mundo, mas este foi somente o som do latejar de sua cabeça. Seu cérebro apenas não explodiu por causa da condição que os Selos não podiam ser a causa direta de sua morte, mas nada falava sobre sues gritos.

AAAAAAAAAAAAAAARRRRRGH!!!

Como já dito antes, a maldição de Rag — [72 Seasons] — o permite usar de selos que ele carrega em seu livro, sendo que, a cada dois usos, ele mesmo será atingido por um efeito de um selo selecionado aleatoriamente. Porém, ao usar o poder de um terceiro selo antes da punição, esta será duas vezes mais dolorosa para o usuário, podendo variar tanto do dobro de efeito em um único selo quanto receber até cinco efeitos diferentes de uma só vez, sendo que o nível do efeito negativo aumenta conforme o número de selos extras que se utiliza antes da punição.

De certa forma, esta era uma punição ao usuário por tentar pagar de espertinho.

Ainda que tivesse usado somente um selo extra, Rag desmaiou instataneamente, sem saber ao certo quanto tempo o efeito do 14° Selo duraria nos robôs.

 

 

                                                                                                    

14° Selo: Causa batalhas e disputas / Putrefação a partir de ferimentos de flechas

50° Selo: Piromancia

9° Selo: Descobre tudo abaixo da terra e da água / Invoca familiares / Responde tudo que o magista quer

 


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