72 SEASONS
Capítulo 12: O Incidente da Catedral Secreta III
De quatro, eles rastejaram cova adentro. Semelhante à toca de um lobo, seguiram o fraco odor metálico que ainda residia em cada fresta das paredes, um contorcer que se seguiu por um longo período no túnel apertado que apenas descia com uma rampa cada vez mais íngreme. Quando a luz já quase não os alcançava, as paredes se alargaram o bastante para que ficassem de pé.
— É mais fundo do que eu esperava — disse Laira. — Estamos o quê? Uns 20 metros abaixo da terra?
— Sei lá, mas pelo menos ainda tem luz o suficiente para os olhos se acostumarem.
De imediato, Rag propôs:
— Eu posso usar um Selo para gerar um pouco mais de luz! — O Selo de piromancia seria perfeito.
— Melhor não. Você vai sofrer a punição após o próximo Selo, precisamos manter você como último recurso no caso de um imprevisto com o próximo vampiro.
Visto que o primeiro inimigo era um, foi natural assumirem que o outro também era, mas todos os três guardavam no fundo de suas mentes a possibilidade de ser um Amaldiçoado.
Aha! Estevan puxou algo de algum canto misterioso de sua batina, revelando ser uma lanterna.
— Fiz bem em trazer essa coisinha. Muito bem, vamos ver o que temos por… Eita!
Sequer precisaram sair do lugar, logo adiante estava um objeto, ou melhor, estrutura de grande interesse.
Destoante das paredes rochosas de onde minhocas brotavam para varrer o sangue seco, grandes portões de madeira semelhantes aos da Catedral Principal se colocavam como obstáculo. A imagem sobressalente era a mesma, um grande olho com a Torre Divina ao fundo.
— Deve ser aqui, e com certeza tem gente esperando do outro lado — Estevan manteve a luz sobre a porta. — Deve ter alguma maneira de nos infiltrarmos…
— Eu não trouxe nada que sirva para escavar — disse a garota. — Não é melhor só invadirmos e atacarmos primeiro como sempre?
— A porta é muito grande e parece pesada, um ataque surpresa não daria certo.
— Podemos tentar encontrar alguma fresta, então, mas essa porta também parece conservada demais para ter uma.
— Tá, mas e se a gente…
— Ge-Gente…!
A voz trêmula de Rag atraiu as atenções, seu olhar as direcionando para a porta. Cacete, digo, Meu Senhor! Exclamações novamente sincronizadas pelos dois veteranos.
O grande portão estava se abrindo, o movimento, apesar de visivelmente difícil devido ao peso da estrutura, não resultava em som algum, um silêncio tão absoluto que a respiração do trio tomou conta do ambiente.
A dupla experiente preparava suas mãos, procurando antecipadamente pelo alvo principal. Entre os dois, levemente afastado, Rag preparou o livro para qualquer emergência.
"Qualquer coisa eu uso um Selo que vai nos tirar daqui em um piscar de olhos!"
Sua confiança de que a fuga de emergência daria certo, quando unida àquela ainda mais cega que residia sobre a sombra dos colegas foi, sem dúvida alguma, seu maior arrependimento.
O ambiente revelado por um grande lustre bem no alto. Um tapete vermelho iniciado na porta guiava pelo vasto salão até um curto lance de escadas que guardava um grande trono que, se não fosse por manchas vermelhas espelhadas como um líquido acidentalmente derrubado, seria branco como nuvem. Apesar de vazio em questão de móveis além deste assento, uma quantidade incontável de pessoas jaziam ajoelhadas no mármore branco e gelado. Seus olhos arregalados lentamente direcionados ao trio ainda em posição de combate. Se organizavam como seria se houvesse fileiras de bancos no local.
O que é isso!? O pensamento em uníssono abafado por uma quarta voz, logo atrás.
— Quem são vocês?
Rag buscou olhar no puro susto, mas seu movimento foi interrompido. Estevan e Laira saltaram para a única saída sem nem pensar duas vezes, puxando Rag pela gola de sua batina para dentro do local junto deles.
Com os pés literalmente dentro da toca do leão, poderiam apenas rezar que este não estivesse faminto o suficiente para atacar com tudo. Logo no ato do pouso, a dupla se virou para a porta, atacando com os sinais de mãos para derrotar o indivíduo imediatamente.
Estevan, que deveria ter ativado sua Maldição primeiro, resmungou:
— O-Onde ele está? Foi uma alucinação?
Um não bastante conciso fez os rostos girarem novamente. Agora mirando o fim do tapete vermelho, o trio observou uma figura com roupas normais num certo nível. Um short curto destacando um baita par de coxas, tal como um top sem mangas a revelar um abdômen atlético. No pescoço havia uma coleira de espinhos, os braços recheados de pulseiras e cada dedo a conter dois anéis. Nos pés tinha botas de couro com salto e cano alto, a sola dura fazendo seus passos ecoarem pelo salão.
Poderia ser resumido no guarda-roupa de gótico/emo no início da febre deste estilo, a diferença era que, ao invés de tudo preto, era tudo branco, talvez representando o quão puro era seu amor ao rock.
O mais importante detalhe, no entanto, estava sobre sua cabeça, visível somente para o trio:
Vampiro Descendente
Força 50/50
Agilidade 50/50
Inteligência 80/100
Tinham ambos as mãos paralisadas em seus respectivos selos para ativar as habilidades, ainda assim, não miravam o vampiro.
Que tipo de aura é essa!?, pensavam em conjunto, visto que este estava longe de ser o nível de um simples Descendente. Por mais que a aura indicasse sua classe, seus atributos não batiam com espécimes anteriores, iam muito além disso. Este indivíduo estava perto, quiçá equiparável com um Vampiro Original!
"Isso é possível, por acaso?" Rag questionava para os céus, quase numa súplica.
Nunca havia presenciado algo igual, e com certeza deixaria esta informação muito bem guardada em sua memória, isto é, caso seu cérebro ainda estivesse inteiro dentro dos próximos minutos.
De costas para o trio, o vampiro subiu o curto lance de escadas até chegar em seu trono, onde se sentou na velocidade de um velho com severos problemas nas pernas e coluna, em outras palavras, num tempo suficiente para preparar um macarrão instantâneo. Mas independente de qual tempero em pó utilizasse, a língua de Rag neste momento sentia somente o gosto da morte.
Em agonia questionava a razão da criatura ainda estar viva, vasculhando os arredores até encontrar a imagem — embaçada pelo olhos a lacrimar — de seus companheiros estáticos como si. Por que não se moviam!? Se perguntava apesar da resposta estar sendo mostrada por seu próprio corpo.
Pele tão pálida quanto qualquer outro vampiro, mas ainda perdendo para um gótico. Os lábios e cílios destacados, a evidência do uso excessivo de delineador e batom preto (ou carvão). Encarando-os do trono, iniciou:
— Amaldiçoados? Eu nunca provei do sangue de um antes, então creio que será uma boa experiência. Será que o efeito no sacrifício será dobrado ou dividido pela metade? Haha! Agora eu fiquei curioso…
Enquanto o vampiro coçava o queixo e exibia um curto sorriso ansioso, Rag forçou um sussurro para os parceiros:
— E-Estevan! Laira…
Um intenso shhhh selou seus lábios. Apesar dos da mulher também estarem trêmulos, ela controlou o gaguejar para transmitir a informação o mais claramente possível.
— Não faça nada que o irrite, temos que ganhar o máximo de tempo que for possível!
— Ma-Mas por quê…!?
O vampiro se intrometeu na conversa:
— Ainda não percebeu? Ah! Você ainda não deve ter tentado me atacar. — Com o típico tom arrogante, ele cruzou as pernas e apoiou a cabeça sobre o punho fechado. — Eles não conseguem me atacar, ninguém consegue.
Uma interrogação surgiu sobre a cabeça de Rag. Ele falava devido sua aura assustadora? Era de pensar que muitos iriam reconsiderar atacar depois de ver seus atributos, mas sabia que este não era o caso, restando então a pior opção. O arregalar de seus olhos deu ao inimigo a chance que queria para confirmar dramaticamente.
— Sim, é exatamente o que pensou. — O sorriso ansioso se distorceu, agora tomando o rosto quase por completo de tão largo. — A minha habilidade é capaz de anular Maldições dentro deste local. Independente do que faça, é impossível usar sua habilidade enquanto estiver aqui dentro, pois esta é a regra do meu domínio.
Uma pegadinha, pensou, só podia ser isto. Esta era uma habilidade quebrada demais para existir!!
"Merda… Os Cardeais sabiam disso?"
Coincidência, tal palavra assombrou sua mente. Além de terem designado apenas três pessoas para uma missão para exterminar vampiros, também confiscaram os protótipos de pistolas que Rag havia desenvolvido com a desculpa de "analisar" os projéteis de Vitamina D, que curiosamente viriam a calhar até demais agora.
Um treino de espada que saiu do controle ou veneno na comida era aceitável, mas esta era uma tentativa de lhe assassinar tão descarada que foi capaz de sentir a raiva emergir, algo que não acontecia desde que o evento de conhecer uma pessoa aleatória e odiá-la instantaneamente por absolutos zero motivos se tornou um evento canônico em sua vida.
— O único problema é a característica — continuou o vampiro. — O domínio do Mestre Vloid, por exemplo, foi adaptado especificamente para sacrifícios, mas eu também estou evoluindo, então acho que é isso que importa. Vocês querem saber do meu plano, caros convidados?
O momento aguardado pelo trio chegou, era a chance de agarrar informações convenientes que talvez ajudassem a driblar o efeito da habilidade e virar o jogo. Responderam com um sim perfeitamente sincronizado.
Um curto riso marcou sua satisfação. Dado o caminho da conversa, ele obviamente revelaria seu nome sem ninguém ter perguntado.
— Podem me chamar de Evanescence! Com certeza são pessoas de sorte, pois se fosse meu Mestre no meu lugar, vocês estariam mortos antes mesmo de encontrarem a entrada desta Catedral… ou talvez ele tivesse oferecido um chá. Mas enfim, eu estava prestes a iniciar um breve ritual com estas pessoas, mas como vocês são convidados, então eu devo ao menos demonstrar alguns modos. Qual de vocês será o primeiro? Por favor, aproxime-se!
Estevan puxou seus colegas para perto e sussurrou:
— Vamos obedecê-lo. Eu vou chegar perto e ver o que consigo fazer, vocês dois tentem fugir de alguma forma.
Rag abriu a boca para questionar, interrompido por um sim mais que decidido da garota. Encarou-a, incrédulo, sendo óbvio que este era um plano estúpido.
"Eles já pensaram em alguma coisa? Eu sou o único perdido aqui!?"
As falácias de sua própria mente agiam como cortina, fechada por sua própria vontade. Os olhos dos dois colegas foram dominados por espirais, a alma perdida num desespero tão profundo, manifestado em seus rostos na forma de um sorriso cínico.
Estevan avançou a passos largos, o peito estufado na direção do vampiro que finalmente desfez a postura relaxada. Por sua vez, Laira puxou seu júnior pelos braços na direção da porta.
— No que vocês dois estão pensando? E-Eu posso tentar usar os Selos se…
— Não! Confie no Estevan, ele sabe o que faz, agora me ajude com a porta!
Ela começou a apalpar a estrutura como se procurasse por algum tipo de alavanca secreta, um desespero tão óbvio que foi fácil prever sua rápida desistência.
Um plano, definitivamente eles tinham um plano… não é? Uma dupla como estes dois nunca seria derrotada ao primeiro momento em que suas Maldições são neutralizadas. Aguardar! Sim, iria aguardar enquanto atuava junto da garota até que Estevan fizesse seja lá o que tinha em mente.
"Ele consegue! Ele com certeza consegue…!"
O relance até o altar com o vampiro lhe trouxe uma imagem que inicialmente pensou ser uma mera alucinação, tornada em realidade assim que Rag analisou a cena, ao passo em que sua visão embaçava.
Sustentado no ar por um braço que atravessava seu tórax, seu colega jazia mole como uma boneca de pano. Seu sangue escorria do rombo em seu corpo até a ponta de seu sapato, de onde se originava o fino rio que descendia em direção às pessoas a rezar.
Laira não se deu ao trabalho de olhar para o colega empalado, ocupada demais em usar a porta como distração da realidade às suas costas.
As pessoas ao redor colocaram suas testas contra o chão, esticando os braços à frente em louvor. Num tipo de resposta, Evanescence trouxe o cadáver para mais perto e mordeu o pescoço, arrancando um pedaço e saboreando bem devagar. No entanto…
— PFFTTT!! O QUE É ISSO!? — Um cuspe violento fez chover carne sobre os fiéis. — Argh! Eu pensei que seria um sangue especial, mas parece que me enganei…
Fumaça vazava de sua boca e ouvidos como fazia no capô de um carro cujo motor queimou, algo que parou logo que a regeneração começou.
— Tsc! Será que todos os Amaldiçoados são assim? Bem, acho que não vale a pena arriscar. É uma pena, sem dúvidas, mas pelo jeito não há outra alternativa. — Mirou a dupla restante. — Qual de vocês quer ser o próximo?
Jogou o cadáver do homem escada abaixo num balançar de seu braço, limpando o sangue fresco dos lábios e cuspindo uns últimos pedaços de carne ainda presos em seus dentes.
Laira caiu de joelhos, ainda de costas para o inimigo, seus olhos arregalados a focar o chão enquanto lágrimas escorriam isoladamente. O semblante, apesar de marcado pelas rugas do medo, também contendo um largo sorriso de aceitação.
Rag alternou entre a mulher e o vampiro, sua mente finalmente capaz de prever o fim desta situação: seu túmulo seria aqui.
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