Sonhar Brasileira

Autor(a): Caetano F.


Volume 1

Capítulo 8: Uma Moeda

A carruagem cortava as ruas centrais da antiga cidade destruída. Grupos de criaturas se movimentavam pelas casas estreitas, borrões vermelhos com formas difíceis de distinguir pela altura.

Ezkiel encarava o buraco na parede imaginando a queda. Ele poderia tentar descer escalando, mas sabia da sua baixa capacidade de aguentar-se com o ombro direito machucado. Porém, o senso de desespero que banhava sua espinha e fervia os seus instintos quase lhe impulsionava para pular. Parecia que seu próprio corpo estava tremendo de medo a cada barulho dos trotes dos cavalos contra o solo e das rodas de madeira e metal, envernizadas em um tom escuro.

Seu coração pulsava loucamente, sangue correndo para sua cabeça. As veias da testa pulsavam enquanto os olhos tremiam em desconforto. Nunca havia se sentido assim antes. Esteve em graus de frenesi ao fugir das criaturas, sentiu medo do desconhecido, mas nunca algo tão irracional como medo de uma carruagem.

Ezkiel estava com medo, mas parecia ser algo forçado do seu próprio corpo. O próprio cérebro estava entregando hormônios para sentir aquilo. A mente tendia a desesperar-se, mas ele não sabia o porquê. Parecia uma grande crise de pânico.

Como se não houvesse outra escolha, Ezkiel se aproximou da beirada da cela destruída. Analisou novamente a forma de escalar, mas percebeu que não teria chance com as mãos nuas, eram 7 andares totais até chegar ao solo. Entretanto, uma ideia veio em sua mente desesperada. Ao olhar melhor abaixo viu as janelas com grades metálicas que tinham em todas as celas. Tocou levemente em suas correntes presas aos braços. A imaginação da dor veio a sua mente, mas era um caminho que podia ser seguido.

O barulho da carruagem se aproximava e o pânico tomou todas as dúvidas. O corpo tremulo se ajoelhou na beirada descendo devagar com as mãos nuas entre os tijolos de pedra quebrados com o tempo, até se aproximar da primeira janela. Desenrolou as correntes do seu braço velozmente, enquanto força os pés pegajosos com os excrementos das criaturas a não escorregarem lhe levando a uma queda fatal.

As correntes se mexeram no ar enquanto ele jogava os pulsos para dentro das celas, fazendo-as escorrerem para dentro do aposento. Então, as puxou devagar, guardando o restante de força que tinha para amarrá-las nas grades da janela.

Assim feito, respirando profundamente com o coração prestes a explodir, deu um leve puxão para certificar-se que elas aguentariam seu peso. Por sorte, as correntes eram muito duráveis e seu corpo era extremamente leve.

Com a confirmação feita, soltou seu corpo devagar. As correntes se toraram eretas, como pontes fixas, segurando o corpo que ainda se apoiava a parede pela ponta dos dedos.

Uma respiração de alívio ressoou em seu corpo que descansaria os braços até a próxima descida.

“A dor nos pulsos é forte, mas não comparada a dos dedos... Pelo menos assim eu não vou cair. Merda! O que eu estou fazendo? Quando me acostumei a fazer esse tipo de coisa?”

Ao ouvir o barulho dos cavalos novamente, percebeu que estava tempo demais descansando. Voltou seu corpo para cima em uma escalada leve, desfez o nó das correntes e voltou a descer com cautela. A dor nos punhos piorava sua velocidade, mas logo estaria na próxima janela e precisaria fazer o mesmo processo mais 6x.

...

Os pulsos de seus braços estavam inchados e roxos. O sangue de seu ombro direito vazava mais devagar pelo o corpo e a mente começava a se tornar sonolenta. Após todo esse processo, finalmente a perda de sangue estava fazendo efeito. Porém, os pés estavam mais próximos do solo, quase chegando as ruas, faltava apenas mais 20 metros de descida.

O barulho dos cavalos se tornou mais audível e mesmo que não conseguisse os ver após alguns momentos de descida, a carruagem adentrou em seu campo de visão. Próximo o suficiente para conseguir distinguir detalhes mais nítidos.

De frente ao portão principal da prisão em que estava, dois cavalos pretos com crinas que refletiam a luz como manchas de óleo no asfalto, trotando devagar, prestes a parar a longa trajetória pela cidade abandonada. A carruagem era feita de madeira escura, com leves detalhes esculpidos, figura geométricas em uma tapeçaria antiga. Podia se ver também detalhes metálicos, que se assemelhavam aos símbolos que vira no portão do prisioneiro.

“Sigilos...”

Eram bem menos rebuscados e menores em tamanho. Não causavam o mesmo desconforto ao olhá-los, mas um sentimento estranho preenchia a mente de quem fixava a visão sobre eles por muito tempo.

Na parte central da carruagem, onde ficava a pequena porta de saída em volta de cortinas preto-azuladas, estavam um símbolo de um escudo com o rosto de uma mulher em perfil, semelhante a uma estátua. Uma beleza inumana. O único detalhe marcante em sua face era olho esquerdo que havia uma gema branca. O único detalhe claro de toda a carruagem.

Assim que Ezkiel notou que havia um sigilo dentro do olho, a porta se abriu.

Um homem desceu da carruagem. Ele usava um chapéu coco preto, com uma fita mais escura presa a borda. Sua vestimenta era semelhante a um sobretudo elegante do final da era vitoriana. O estilo parecia impecável, dês das botas escuras que se destacavam pela limpeza a o lenço branco que vazava para fora de seu sobretudo. O homem se virou, retirou o chapéu por um momento e ajeitou os cabelos pretos para trás. Olhou de um lado ao outro, como se não procurasse nada, apenas se indignasse com a vista. Uma carranca surgiu em seu rosto após a leve averiguação. Com um suspiro de desaprovação, puxou um cachimbo preto, com pequenas espirais. A cabeça era cônica, mais larga do que a base e a haste reta, mas curta. Ele puxou um pouco de fumo do seu bolso e colocou no cachimbo. Um isqueiro antigo, no estilo de filmes girou entre seus dedos quando o acendeu.

— Tem certeza de que estamos no lugar correto Madly? A última vez que houve um erro como esse fizemos toda uma viagem e ainda perdi um dos meus sapatos preferidos por uma abominação sem-alma.

A fumaça saia de sua boca, deixando sua voz um pouco mais grossa.

— Calvirs, isso foi a 3 anos. E foi um erro da assembleia local. — Uma voz feminina surgiu de dentro da carruagem. — E eu confirmei diversas vezes com a catedral. Esse é o local mesmo. Um sigilo dos tempos da Nova Ordem foi quebrado.

Uma mulher bela desceu da carruagem. Sua roupa era similar a do homem chamado Calvirs, porém seu chapéu era uma bela cartola curta, com um lenço acinzentado rodeando a parte central. As mãos possuíam luvas de cor preto fosco, o que ressaltava o tom de sua pele branco como cera de vela. Os cabelos eram de um castanho bem claro, levemente encaracolados, porém difícil de distinguis presos coque baixo, abaixo do chapéu.

— Isso será um grande problema então, Madly. Enviar nós dois para adentrar uma antiga ruína do tempo da Nova Ordem. Eles pensam que conseguiremos o que aqui? Matar o que quer que esteja preso desde aquela época. Tenho meu potencial claro, meu grau está beirando o segundo, mas tenho os meus limites.

A fumaça entrava em sua boca enquanto outra parte saia do seu nariz em um suspiro leve.

— Nossa missão é apenas analisar o local. Não precisamos entrar em combate. Apenas descobrir quem o soltou e como. Provavelmente foi algum cultista pagão dos Deuses antigos que ainda acredita que eles estão vivos.

 Madly com uma expressão seria virou seus olhos pelo local.

O tom castanho avermelhado vibrava no movimento de suas írises Ezkiel quase ficou paralisado com a beleza da mulher. O formato do rosto era completamente simétrico, os lábios avermelhados com uma leve pinta na parte inferior a direita.

Por um instante ele quase se esqueceu que estava a alguns metros do solo ainda. Tentando ignorar a conversa voltou a descer loucamente.

— Não temos tempo a perder. Vamos adentrar esses portões logo. Quanto antes entrarmos, mais rápido poderemos voltar.

Calvris estava impaciente. Colocou a mão esquerda dentro do bolso retirando uma moeda. Focou a visão sobre ela, mostrando um sigilo simples sobre a base prateada. Ele passou o polegar de leve sobre o símbolo. Um brilho se emergiu das runas espalhando por toda a moeda. Com a mão direita focada em segura o cachimbo, arremessou a moeda em direção ao portão principal da prisão abandonada.

Com o tilintar leve do metal contra metal, uma grande explosão deu ignição jogando pedaços de madeira e metal para todos os lados. O tremor efetuou uma reverberação por todas as paredes e barulhos de desmoronamento internos podiam ser ouvidos a distância. Pedaços de tijolos mais soltos começaram a cair para fora das grandes paredes e Ezkiel não conseguiu se segurar, caindo contra o solo lamacento das ruas.

Vento percorreu por toda a cidade como um enorme uivo. O correr do ar parecia pesado e quente causando um leve desconforto a todos próximos da explosão. Inclusive do prisioneiro caído.

As correntes em seu corpo fizeram um leve estardalhaço após a explosão. As costas doeram pela queda, mas poderia ser pior, pelo menos agora estava fora da prisão.

A fumaça da explosão desapareceu e os dois indivíduos estavam se encarando. Madly tinha um olhar de raiva e desgosto, enquanto Calvris parecia levemente envergonhado.

— Okay... Isso não foi uma ação tão esperta. Achei que o portão iria aguentar apenas uma moeda sabe? Era apenas uma moeda! Não sabia que uma ruína da época da Nova Ordem seria tão frágil.

Ele dizia enquanto limpava seu sobretudo sujo de poeira.

— Era apenas uma porta de metal Calvris... De pelo menos 500 anos atrás... Poderíamos apenas tê-la aberta com as nossas mãos...

O rosto da mulher demonstrou um desdém enquanto a fuligem de madeira queimada batia sobre sua pele branca. Ela adentrou a prisão sem mudar a expressão, conformando-se com seu parceiro.

O homem bufou devagar. Seguiu sua parceira enquanto batia o cachimbo contra uma das paredes, espalhando o fumo queimado contra o solo.

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