Volume 1
Capítulo 6: Anátema do Prisioneiro
Ezkiel ainda estava em choque. A fala do prisioneiro reacendera o mesmo sentimento de quando recebeu a adaga: ele iria morrer se não fizesse essa escolha. Infelizmente, o sonho estava guiando-o a cometer atos impensáveis em sua vida. E agora, para ter uma chance de sobreviver, precisaria coletar o sonho do homem a sua frente — que simbolizava a sua morte.
“Eu matar alguém? Não... Por que isso está acontecendo comigo? É só um sonho Ezkiel, um maldito e filho da puta sonho! Você não é um assassino! Você está sendo forçado a isso!”
Mas, no fundo, ele sabia: Não havia uma força maior o manipulando, nada do exterior que lhe forçasse a matar aquele homem. Apenas o desejo que reverberava em suas entranhas, mente e naquele vazio que borbulhava em seu estomago.
O puro instinto de sobrevivência.
A vontade cegante de não ser morto, de não desistir. Esse sentimento crescia cada vez mais dentro de sua mente. O próprio corpo lhe ensinava o que deveria ser feito, como se o próprio prisioneiro do mundo dos sonhos deixa-se seu legado em cada projeção hormonal de perigo e desejo.
Ezkiel sentia-se diferente, mas não compreendia o que mudara. Já fazia parte dele. Não era mais o mesmo garoto que adormecera ao lado da namorada. Em apenas uma hora, tudo que fora havia se reconstruído em meio a traumas. E, ainda assim, ele não havia se perdido. Apenas sua percepção de mundo havia mudado.
Nem ele sabia o rumo que tomava, apenas entendia que precisava sobreviver. E, para isso, teria de matar o homem diante dele e coletar seu sonho.
— Como faço isso... Coleto seu sonho?
A voz de Ezkiel soava tremula nas primeiras palavras, até criar confiança.
O homem novamente gargalhou alto, não se importando que o assunto fosse sua morte. Seus cabelos pretos com mechas brancas diversas mexeram contra o rosto pálido.
— Está perguntando para mim? Você que é o Coletor de Sonhos! Se eu soubesse como coletá-los com certeza não estaria nessa situação...
O homem parou para pensar e deu uma enorme bufada, em meio ao se engasgue de seus risos.
— Estaria em uma situação bem pior!
Ezkiel o encarou por um instante, aproximando a faca do homem pendurado. Ele era mais alto e estava suspenso, de modo que o garoto só conseguiu alcançar o abdômen magro entre as correntes.
A respiração do prisioneiro tornou-se ofegante. Seus olhos âmbar desciam sobre Ezkiel como os de um predador prestes a ser abatido por sua presa. As correntes agora pareciam armadilhas que haviam capturado um grande lobo outrora poderoso, mas naquele momento faminto.
Adaga tremula aproximou-se entre as correntes, alinhando-se para adentrar um pequeno espaço entre elas para ferir a carne do homem. Ezkiel queria chorar, mas lagrimas não saiam de seu rosto, o corpo não obedecia a essa ordem, pois sabia o que deveria ser feito para a sobrevivência.
A lâmina adentrou entre as fendas das correntes e tocou na pele magra, mas não conseguiu perfurar, apenas gotejou pequeno sangue vermelho do arranhão formado.
— Não tenha medo garoto. Faça! Estou entregando minha vida a você, então não faça tanta cena!
A voz solene do homem tinha um ar de brincadeira, mas se notava a seriedade no timbre grave que ressoava sobre a cabeça de Ezkiel.
Por sua vez, o material difícil de ser perfurado, a pele do prisioneiro, tornou-se menos rígida, aceitando a faca como um presente de despedida dentro de seu corpo. Ezkiel efetuou a estocada mais força, chorando por dentro enquanto a lâmina mergulhava por completa adentro do corpo do hospedeiro.
— Qual o seu nome?
Ezkiel questionou, achando que era justo perguntar ao homem que estava tirando a vida.
— Ah... meu nome? Apenas um prisioneiro!
Ele deu uma leve gargalhada baixa, um pouco enfraquecida, como se estivesse controlando o próprio corpo para aceitar a morte.
“Apenas um prisioneiro... Me desculpa ter que fazer isso, mas eu tenho que coletar o seu sonho!”
Sangue começou a vazar contra o solo banhado em correntes, tingindo o branco prateado de carmesim.
Fios azul púrpura surgiram na visão de Ezkiel, se misturando ao ambiente escuro a sua volta como ondas sem rumo. O vermelho do sangue, o brilho metálico das correntes e a escuridão ao redor se misturavam aos tons azuis como uma única sinfonia de cores.
《 Um Sonho foi detectado 》
《『Coletar Sonho』pode ser ativada 》
“Sim. Coletar sonho.”
Um filtro de sonhos ilusório, semelhante ao presente que recebera de sua namorada, surgiu em sua frente. Diversos fios o ligavam ao corpo de Ezkiel, puxando a energia do homem para dentro de seu corpo. A essência azul-púrpura saia de dentro da ferida da adaga, jorrando essa essência para dentro do filtro que a devorava com uma voracidade insaciável. A energia foi transformada em pequenos fios azuis que se entrelaçavam as conectando ao filtro e por sua vez a Ezkiel.
Ezkiel sentiu um preenchimento profundo. A satisfação da coleta o inebriava, completando seus sentidos, mesmo enquanto o homem se contorcia de dor. Era como se parte de sua alma estivesse sendo arrancada. A dor era quase palpável, misturada ao desespero familiar que Ezkiel já conhecia intimamente nesse sonho.
O prisioneiro se debatia em angústia, na tentativa inútil de resistir a dor. O sentimento de ser entregue como mártir repousava em seus olhos. Ele estava entregando seu sonho de bom grado ao garoto a sua frente.
— Lembre-se, Ezkiel Arcs... Não confie nos Deuses, nem nos antigos e muito menos nos novos.
A fraqueza refletia em sua voz paralisada. Não havia mais diversão em sua face.
— Que esse mundo que me odiou sofra... É o meu último pedido para você... Faça bom uso do que me motivava e me perdoe por lhe passar esse fardo...
O silencio devorou o ambiente. O corpo morto do homem repousou pendurado sobre as correntes carmesins de seu próprio sangue. O brilho prateado que elas efetuavam desaparecerem, junto com a luz âmbar de seus olhos.
O filtro de sonhos ilusório piscou mais uma vez, desaparecendo na escuridão. Deixando Ezkiel sozinho com o corpo do único homem que lhe ajudará nesse maldito pesadelo.
《 Sonho Coletado 》
《 Você adquiriu o Sonho: 『Anátema do Prisioneiro』》
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