Volume 1

Capítulo 19: Hora de agir (versão antiga)

 

7:00 a.m

Na vila dos Cicatrizes, Mike acordava e apoiava sua mão na cabeça. Apesar de ter dormido o suficiente, seu olhar não era de alguém muito animado. Os últimos dias estavam sendo complicados para ele por causa de todos os problemas com os ghouls.

Após se levantar, era possível ver que ele só utilizava uma bermuda para dormir, sendo também notável que, além de moreno, ele tinha um corpo bem definido para alguém que não lutava na linha de frente.

O rapaz então ia ao banheiro enquanto bocejava, jogava um pouco de água em seu rosto para acordar de vez e suspirava após reparar nas olheiras que aumentaram de alguns dias para cá. Ele então vestia uma regata branca e, enquanto ia na direção de sua cozinha, ele amarrava seus dreadlocks atrás de sua cabeça.

Por sua casa ser pequena, era questão de poucos passos e ele chegava em cada cômodo. Adentrando na cozinha, ele colocava água em uma chaleira e a colocava para esquentar no fogão a lenha, e depois pegava os grãos de café em um pacote ao lado.

Enquanto ele esperava a água aquecer, Mike ia na direção da janela e a abria. Sentindo o sol batendo em seu rosto, ele colocava a mão na frente para evitar da luz afetar os olhos.

Na vila, ele conseguia ver as pessoas levando seus filhos para a única escola que havia lá. Dentre essas pessoas, o líder dos Cicatrizes: Bruno. Ele parecia ter um olhar cansado e quase sem esperança, mas que ainda mantinha o sorriso para sua filha, que em compensação era uma expressão meiga e inocente de uma criança.

Após deixar sua filha na escola, Bruno relembrava o que precisava fazer hoje, saindo dali na direção da praça principal. Enquanto isso, Mike via Alex se aproximando de sua casa, e acenava para ela. A moça parecia um pouco cansada e estava com roupas de corrida, junto de um par de tênis bem gastos já. Ela o notava e acenava de volta, aproximando-se mais, e os dois se cumprimentam batendo os punhos.

— Conseguiu recuperar? – Mike perguntava. Alex tomava um gole de água antes de responder.

— Hã? Ah, sim sim, eu recuperei boa parte do ferro que perdemos. Mas eu ainda acho melhor pegarmos materiais mais resistentes. Fala sério, tem tungstênio a alguns quilômetros daqui. – a loira dizia, deixando Mike com uma expressão de alguém que acabou de ouvir uma besteira, mas ao mesmo tempo não estava surpreso.

— Isso que dá só ser boa em educação física. – Mike sussurrava.

— Quê? – Alex perguntava.

— Nada.

Os dois olhavam para Bruno com uma certa admiração, mas também preocupação.

— Ele deveria parar um pouco para descansar. – Alex dizia.

— Concordo, mas ele não aceita esse fator. Honestamente eu tenho medo dele acabar se exaustando, sem o Bruno a gente não é nada. – Mike suspirava e esfregava um pouco os olhos.

— Falando nisso, como estão os quatro? Não morreu mais ninguém, né? A Mary tá viva? – Alex perguntava, dando ênfase no nome de Mary.

— Jura que ela é sua preocupação? Eu me questionaria se o David não bancou o esquentadinho e entregou a missão de vez. – Mike dizia, esticando-se um pouco e ativando seu poder para sentir se os quatro ainda estavam vivos.

— É... Bom, ela é bem interessante, sabe? – Alex dizia, coçando a nuca enquanto olhava aos arredores para disfarçar.

— Era para ser só um reconhecimento, mas eu acho que eles decidiram acabar com os ghouls de vez. Pode ficar tranquila, os quatro ainda estão bem. – o moreno respondia, olhando para sua mão com um brilho azul.

—Ah, que bom, já facilita meu trabalho também. Se os rumores forem verdadeiros, a Mary já teria aniquilado aqueles ghouls no mesmo dia. – Alex começava a se indagar por que isso não havia acontecido ainda.

—Talvez ela esteja se contendo por causa do Ethan, vai saber. Talvez ela queira que ele aprenda também, ou só não quer assustar ele. – Mike respondia.

—Bom, o David é bem forte se ele pensar direito, e a Lucy... Eu acho que nunca vi ela em ação de fato.

—Ela mesma já disse que só o David a viu lutando pra valer. Vai saber, talvez ela surpreenda. – Mike dizia, dando as costas e adentrando sua casa.

—Não vai me convidar pra entrar? – Alex perguntava, cruzando os braços.

—Você tem coisa pra fazer, e eu também. – Mike respondia enquanto fechava a porta de sua casa. Alex imitava o rapaz de maneira debochada, logo em seguida pegava impulso e saía correndo dali com sua supervelocidade.

Mike ativava seu poder e o mapa holográfico em sua mesa de centro. Ao ver a região demonstrada, os quatro pontos brilhantes, que representavam o quarteto restante da missão, ele acabava por se questionar do porquê de eles estarem parados e próximos uns dos outros. O rapaz então, enquanto bebia sua caneca de café, começa a contactar mentalmente os quatro.

—Mary, David, Lucy, Ethan? Alguém na escuta? – porém, nenhum deles respondeu. Mike de início ficava apreensivo, porém notava que não havia movimento perto deles e os pontos ainda emitiam pulsos, indicando que estavam vivos.

Ele então acabava entendendo o que estava acontecendo e só se perguntava por que os quatro não fizeram isso de noite.

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Mary foi a primeira quem acordou, em um susto, ofegando e com os olhos arregalados. Assim que notou que aquilo se tratava apenas de um pesadelo, ela abaixava a faca que estava apontando para o nada e sua expressão voltava ao normal. A albina coçava os olhos e notava que o sol, que antes estava na frente dos quatro, agora estava fazendo sombra no prédio quebrado atrás deles.

— Bom dia, flor do dia. – Mary recebia um chamado de Mike em sua mente. De primeira ela se assustava, mas logo começava a conversar com o rapaz.

— Mike, que horas são? – perguntou apreensiva.

— Deixa eu ver aqui. São duas e meia. – ele respondia, deixando Mary surpresa, logo em seguida colocando a mão no rosto de decepção.

— Como eu fui dormir? Isso nunca aconteceu antes... – ela se indagava porque agora parecia que ela estava ficando mais relaxada.

— Aproveita que está aí e acorda o David e a Lucy. – Mike dizia para a albina, que ia e dava um peteleco na testa de Lucy, fazendo-a acordar com um susto.

— Que isso? Ah, Mary, é assim que você acorda o Ethan é? – Lucy perguntava irritada enquanto acordava gentilmente David. Mary enquanto isso cutucava Ethan um pouco para ele também se levantar.

Os dois esfregavam seus olhos enquanto Mary pegava um pedaço de concreto logo ao lado e fazia um diagrama no chão de terra.

— Mike, quantos ghouls têm à nossa volta, consegue identificar? – a albina perguntava e Mike girava o mapa.

— A que eu captei está junto de alguns outros ao redor de vocês, parece que estão tentando fechar suas saídas.

Subitamente, os quatro tomavam um susto com algo enorme caindo bem perto do buraco em que eles estavam, os pedaços de concreto quase os acertavam também. Mary começava a se apressar no diagrama que estava fazendo.

— Já começaram o ataque, é hora de agir. Mike, onde eles estão? – perguntava a albina.

— Até onde consigo ver, tem alguns que estão no prédio que vocês derrubaram, devem estar descansando ou protegendo algo ali. – Mike terminava seu energético e jogava a lata para o lado, acertando perfeitamente no lixo.

— O Carniçal. Tem mais dormindo ou tentando nos cercar? – ela novamente perguntava.

— Com certeza tentando cercar. É melhor pensarem bem, porque eu não consigo informar a localização exata deles. – Mike dizia.

— Não vai ser necessário, eu disse meu plano antes de cairmos no sono. – Mary terminava o diagrama no chão e um carro destruído acertava o prédio atrás deles, David fazia rapidamente uma pequena proteção de gelo para evitar que os destroços caíssem em cima deles.

— Vamos fazer agora? – David perguntava.

— Sim, ou vamos ficar sem saída, e aí sim encurralados de vez. – Mary dizia enquanto jogava o pedaço de concreto para trás e aponta para o que fez na terra. – Eis o plano. Lucy e David irão pela direita, enquanto Ethan e eu iremos pela esquerda, vamos dispersar as forças deles até chegarmos ao prédio e encontrar o Carniçal.

— Mas aí estaremos dispersando nossas forças também. – David dizia, um pouco apreensivo.

— Não se garante? Você mesmo tinha dito que você e Lucy eram suficientes. – Mary dizia com a expressão neutra dela, mas com um certo tom de deboche do rapaz.

— Gh... Tá, que seja, não morram então. Eu não vou buscar seus corpos. – David respondia e se levantava, um pouco enfezado.

— Eu não acho bom, porque eu vou ter que dividir a atenção com as duas equipes, mas eu vou tentar. – Mike dizia enquanto estralava seus dedos.

— Pronto, Ethan? – Mary perguntava para o menino, que agora, um pouco mais descansado e por ter sua mestra ao seu lado, demonstrava um olhar mais determinado.

— Sim, senhora! – ele respondia, colocando seu capuz e se posicionando igual a Mary.

Mary e Ethan ficam de costas para David e Lucy, os quatro se preparavam.

— Três, dois, um. – a albina contava, e, no final da contagem regressiva, os quatro saíam correndo de onde estavam, logo antes de um pedaço enorme de concreto atingir o buraco em que antes eles estavam.

— Isso é um plano muito desesperado. – Lucy comentava enquanto corria.

— A situação já é desesperada. – Mary respondia no comunicador. Na mesma hora ela e Ethan se inclinavam para desviar de um pedaço de lataria que quase os acerta.

David e Lucy chegavam às ruas, expondo-se novamente, enquanto Mary e Ethan corriam por entre as construções. Logo que notaram os dois nas ruas, os ghouls rugiram e, conforme os grupos se afastavam do buraco de corpos, os canibais começavam a avançar para tentar alcança-los, enquanto outros continuavam arremessando destroços.

O singular gélido de início deslizava seu pé pelo chão e fazia um movimento rápido com o braço, criando uma parede de gelo que bloqueava alguns projéteis antes de se estilhaçar.

Para acompanhar a corrida de todos, Lucy novamente bombeava mais sangue para suas pernas, que mais uma vez ficam com as veias destacadas e com um tom avermelhado. Já David utilizava sua pista de gelo para ficar fora de alcance.

Victor acabava reparando que ainda faltavam dois integrantes e então dizia antes que outros se juntassem à perseguição:

— Faltam dois! O garoto e a albina foram por aquele lado! – ele gritava enquanto suas garras ficavam expostas e as veias em seus braços, destacadas.

— Eu quero aquela vadia e aquele pivete! – Rebecca respondia enquanto as veias salientes ficavam em seu pescoço.

Com isso, a ghoul soltava seu grito absurdamente alto, forçando Ethan e Mary a cobrir seus ouvidos enquanto corriam pelos becos dos prédios.

— Nos encontraram... Droga. – Mary dizia e já sacava sua katana, e seu pupilo, vendo a atitude dela, sacava suas pistolas.

— Mary, Ethan, certeza que eles vão vir por cima. – Mike dizia enquanto tentava acompanhar as duas equipes.

— Eu imaginava. Ethan, me acompanha. – Mary dava as indicações.

A albina utilizava o poder em suas botas, as veias de suas pernas ficavam escurecidas e ela corria pela parede ao seu lado para em seguida saltar até o segundo andar do prédio destruído do outro lado. Ela realizava a manobra com maestria e aterrissava sem nenhum problema.

Ethan tentava repetir igual à sua mestra, ele quase cai devido à dor nas pernas que aqueles coturnos causavam, mas consegue correr pela parede e saltar para o segundo andar, porém, por não ter usado força o suficiente, ele acaba aterrissando somente com a ponta dos pés, o que faz o garoto escorregar e quase cair dali de cima.

Felizmente, Mary o agarra pelo braço a tempo. Sem questionar nem falar nada, ela só o puxa para cima a tempo de evitar que ele fosse acertado por mais destroços.

—Corre. – Mary ordenava e os dois saíam em disparada.

___________

Enquanto isso, David e Lucy ficavam em uma região mais aberta, em que haviam menos prédios e mais estabelecimentos comerciais e casas.

Por causa disso, não foi difícil para os ghouls os encontrarem. Logo que perceberam as aproximações, os dois ficavam de costas um para o outro e se posicionavam para lutar.

—Agora que eu tô parando para pensar, esse plano da Mary foi horrível. – David dizia enquanto via os canibais levantando-se nos terraços dos estabelecimentos e sorrindo para eles enquanto lambiam seus lábios, ansiando para saborear a carne daqueles singulares.

—Você quem decidiu deixá-la como líder! – Lucy respondia, irritada, enquanto reparava que as fêmeas que estavam ali, se preparavam para gritar.

Os dois cobriam seus ouvidos e tentavam resistir ao máximo aqueles sons ensurdecedores, porém, eles não notaram que aqueles gritos eram apenas uma distração para um dos ghouls chegar na espreita e rapidamente saltar na direção do casal.

—David! Atrás de você! – Mike tentava avisar o rapaz, porém sem sucesso.

Ele agarrou-se em David e antes que o singular gélido pudesse entender o que estava acontecendo, ele sentia os dentes daquele canibal mordendo seu ombro e penetrando sua carne, uma sensação que ele não desejaria nem para seu pior inimigo.

Lucy só reparou quando David soltou um grito de dor. Ele sentia os dentes do ghoul perfurando e chegando em seus músculos.

A ruiva, desesperada, aproximava-se para ajudar o rapaz, que pensou muito rapidamente e, mesmo com seu ombro latejando de dor, ergueu seus braços e sobiu mais rápido ainda uma cúpula de gelo antes que o restante dos canibais conseguisse chegar onde eles estavam.

Agora isolados naquela pequena redoma, Lucy sacava sua faca a cravava com toda a força na cabeça do ghoul, atravessando seu cérebro e fazendo-o perder a consciência.

David então notava um problema enorme junto da dor insuportável em seu braço. No desespero ele rapidamente congelava toda a cabeça do canibal e a destroçava, matando aquele pelo menos.

Lucy ofegava aliviada, após isso ela olha o ferimento de David enquanto notava que os ghouls de fora estavam atacando com tudo a redoma, tentando adentrar, e, aos poucos, aquela camada de gelo estava sendo destroçada. David ainda estava em choque pelo que estava sentindo e acaba falando para sua companheira.

—Lucy... Eu não consigo mexer meu braço. – ele não conseguia ver, mas quando Lucy analisou melhor o ferimento, estava praticamente faltando uma parte do ombro de David. Era possível ver até mesmo os ossos de tão profunda que havia sido a mordida, a ligação dos nervos do rapaz havia sido rompida. David perguntava ainda com os olhos arregalados e com o olhar fixo no nada. – Você... Acha que consegue? 

Lucy estava tão em choque quanto o rapaz. Ela analisava a situação, parecia o caso de Mary, em que o braço dela estava retorcido e com os estilhaços de ossos saindo para fora.

Porém, no caso da albina, ela ainda tinha a massa de seu braço, então não foi difícil recolocar as partes e cicatrizar por completo o membro dela. Agora, com David, estava pior que a situação de Ethan, que tinha um buraco na mão.

A ruiva lembrava que, quando cicatrizou a mão de Ethan, ela usou um pouco de sua própria massa corporal para reconstruir a dele, porém ainda assim era só um buraco, fora que eles não estavam em uma situação de confronto direto, portanto em questão de alguns minutos, no máximo horas, Lucy iria recuperar o que gastou para ajudar o menino.

Agora, na situação de David, além de ser um buraco maior, eles estavam em uma situação de conflito e a ruiva precisaria de toda a energia necessária para lutar.

E o principal fator, a regeneração exigia em partes, a energia da própria pessoa. Mary não sentiu sono na hora pois ela era algo inexplicável até para Lucy, já Ethan continuou dormindo pelo dia todo em que recebeu a ajuda da ruiva.

David, independentemente do tipo de cicatrização que Lucy fizesse nele, ficaria muito sonolento.

Lucy começava a pensar e olhava para o corpo do canibal jogado logo ao lado, e enfim acabava tendo uma ideia.

—David, isso vai doer bastante. – ela dizia enquanto pegava o braço do ghoul e fincava a faca no ombro dele.

— É sério? Uma parte minha agora vai ser desses seres...? – ele perguntava enquanto tentava aguentar a dor, porém ele percebia que aquele sangramento que não parava estava deixando-o mais fraco.

—Não reclama. – Lucy levantava um pouco o corpo do canibal e começava a cortar um pedaço enorme do ombro. Incrível como ela nem sentia ânsia ou nojo de fazer isso. Junto a isso, ela quebrava um pedaço de osso do canibal e vai para David carregando essas partes. – Respira fundo.

Dito e feito. E nesse momento, Lucy encaixava o osso no ombro de David, que sentia um dor indescritível. Estava doendo ao ponto de ele ficar zonzo, mas, com o poder da ruiva, os ligamentos de seu ombro com o braço são restaurados.

Para finalizar, ela colocava os pedaços de músculo e pele do ghoul e começava a apertar o local enquanto as partes se uniam ao corpo de David e alteravam sua composição para não haver rejeição.

Tudo isso enquanto o singular gélido tentava manter a barreira de gelo ativa para não deixar os canibais entrarem. Era questão de tempo até aquela proteção se quebrar, assim como os dentes de David por terem que servir para aliviar a dor dele.

Finalizado essa questão, David caía no chão, sentindo-se bem cansado, mas pelo menos conseguia mover seu braço. Lucy olhava para a situação em volta e para seu namorado, nisso ela tomava uma decisão, virando-se de frente para a cúpula de gelo.



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