Sakurai Brasileira

Autor(a): Pedro Suzuki


Volume Único

Capítulo 44: De volta ao Japão

— O Pavlov realmente é impressionante, como ele conseguiu a permissão para entrar nessa ilhazinha isolada? — disse um dos cozinheiros do primeiro turno, que mordia um limão. 

— Como assim isolada? — perguntou Hiroshi. 

— Você não veio de lá? Ouvi que nenhum estrangeiro pode fazer comércio e ninguém pode nem entrar ou sair Japão, não sabia disso? 

— Eu saí diversas vezes... — Mas Hiroshi se lembrou que em todas as vezes não havia saído por conta própria, pois quem o levou foi seu pai adotivo, todas as vezes para lutar em alguma guerra ou escoltar o príncipe em uma missão diplomática ou viagem. — Esquece, eu era um caso à parte mesmo.  

— Espera, você é realmente japonês? Nascido lá? 

— Sim. 

— Como que é lá? Para parar na Rússia, você foi exilado? Não, mas você disse que saiu mais de uma vez... Será que você é um príncipe!? 

Os dois conversavam no segundo andar do barco, apreciando o céu limpo e as ondas que por enquanto estavam calmas. 

“Se não podem entrar navios de comércio no Japão, por que aquele navio que a família do Pavlov estava...” 

Hiroshi desceu apressadamente para o primeiro andar, onde Boris mordia um limão. 

— Será que o Victor e o Pavlov combinaram de abandonar a gente no Japão com esses maníacos? 

— O que você está falando? 

— Já seria difícil conseguir autorização para um barco desse tamanho chegar à costa do Japão, imagina um navio de carga. Ele não especificou o lugar para onde o navio estava indo, ele nos abandonou com eles!  

As últimas horas foram devastadoras para Hiroshi. Os cozinheiros do primeiro período estavam muito além de todos que já tinha conhecido. Perto deles, até Smile parecia normal. 

O navio foi colocado em chamas duas vezes, quatro ajudantes foram sequestrados por piratas, mas de alguma forma acabaram se tornando parte deles, colocando todos ali em perigo ao arranjarem briga com a marinha Russa; um cozinheiro foi arrastado para o fundo do oceano por alguma criatura marinha misteriosa, dois cozinheiros principais tentaram caçar um tubarão e iriam morrer se não fosse por Hiroshi, enquanto passavam por uma tempestade, alguns deles jogaram quase todos os suprimentos no mar com medo de que o barco iria afundar, deixando só um barril de limões e água; todos lá fizeram tanto barulho e confusão que o timoneiro se jogou no mar, novamente salvo por Hiroshi; três outros auxiliares descobriram uma ilha deserta e levou uma hora para convencer eles a não ficarem lá e Boris quase assassinou um deles por uma pegadinha que fizeram, o acordando e assustando usando a cabeça do tubarão. 

— Olha, a esse ponto eu também gostaria de concordar com você e fugir daqui, mas olha para sua direita — disse Boris, entregando um binóculo. 

Hiroshi usou o binóculo e conseguiu ver bem perto do horizonte um porto do Japão. 

— Chegamos vivos, isso que importa — disse a chefe de cozinha provisória. 

O barco atracou no porto e o timoneiro expulsou a todos e partiu imediatamente. 

— Eu conheço você de algum lugar... — Dois guardas armados com armas de fogo antigas chegaram para revistar, os interrogar e provavelmente tentar expulsá-los dali. — Se perderam, o navio naufragou ou o que? 

Hiroshi começou a explicar a situação, mas foi interrompido pela chegada do navio de carga de Pavlov, que roubou a atenção de todos os soldados. 

— Sabia que eles não iriam largar a gente aqui. Ei! Estamos aqui! — gritou Boris. 

O clima já tenso, só piorou com a aparição de Pavlov. 

No momento em que ele pisou no Japão, uma reação ainda pior que com Hiroshi nas estações de trem aconteceu. 

Os guardas que o esperavam arrancaram seus ornamentos de cruz a força e sem perguntas, eles prenderam a todos do navio violentamente. 

— Eu tenho uma autorização oficial do czar Russo para vir aqui — disse Pavlov, mostrando um documento que rapidamente foi rasgado pelos guardas. 

— O que é tudo isso? — perguntou Hiroshi, que vendo que a situação iria só piorar, foi obrigado a fazer algo que odiava. — Eu conheço pessoalmente o imperador! Parem imediatamente com isso! 

— E eu sou Sasaki Kojirō! — disse um dos guardas, em um tom irônico. — Mentir é fácil, como pode provar isso? Não... Sobre isso, mesmo que prove ser verdade, não mudará em nada essa situação. 

— Envie um mensageiro que diga a ele que sou seu mestre de esgrima, Hiroshi Mizutani. E que estou pedindo ajuda. 

— Não me ouviu?  

— Envie a droga desse mensageiro antes que eu mesmo vá até ele e peça a cabeça de cada um de vocês aqui! 

— Tudo bem, mas isso for mentira, pedirei o mesmo. 

O mensageiro foi e voltou com a seguinte mensagem: 

— Isso é impossível, charlatão! Pelo crime de profanar o nome de meu querido falecido mestre, eu exijo ver a sua presença, para assim decidir seu destino, que não espere ser uma morte rápida. 

Hiroshi foi preso e levado diante do imperador, junto de Pavlov e todos os outros. 

Nessa curta viagem, o ódio de Hiroshi voltou a crescer, por causa das humilhações e torturas que o guarda com quem havia apostado fazia. O único motivo para se segurar era o perigo de Pavlov e sua família serem mantidos reféns, já que na mesma carta de condenação, o imperador havia especificado para os soldados não encostarem um dedo nos prisioneiros, o que poderia mudar caso Hiroshi se rebelasse. 

Gravemente ferido, Hiroshi chegou ao salão do imperador, que instantaneamente o reconheceu e ordenou todos a saírem do salão. Seus olhos se marearam, mas ele não chorou e fez diversas perguntas para testar se não era um impostor. 

Essas perguntas duraram trinta minutos e uma vez que respondidas, o imperador se levantou e abraçou a Hiroshi. 

— Eu vi com meus próprios olhos seu cadáver! Como está aqui? 

Os dois discutiram por um longo tempo. Hiroshi revelou tudo que havia acontecido, incluindo possíveis acontecimentos do futuro.  

Depois disso, o imperador providenciou servos para cuidarem das feridas, o banharem e roupas caras foram colocadas em Hiroshi. Os guardas foram enforcados publicamente e as suas casas queimadas junto de suas famílias. O ódio de Hiroshi se cessou no mesmo momento. Ele pediu para que as famílias fossem poupadas, mas o imperador não parou até que todos seus parentes de segundo grau fossem exterminados. 

— Por que foi tão longe? — perguntou Hiroshi. 

Jin, a virtude da compaixão aos meus servos. Só consegui entender a beleza do Buxido após sua morte. Incorporei o que me ensinou na minha vida e logo irei instituir essas virtudes sobre todo o nosso povo. 

Algo estava diferente nesse imperador para o do mundo passado, e isso era sua culpa. Foi o que Hiroshi sentiu. 

Após três dias, comendo junto do imperador, ele finalmente tomou coragem e pediu: 

— Por favor, liberte a Pavlov. 

— Mas é claro, diga a ele para pisar no fumi-e e ele será imediatamente solto, mesmo que continue usando seus ornamentos, desde que não fique mais de um mês por aqui. 

Hiroshi saiu feliz para contar essa notícia a Pavlov, mas se surpreendeu ao ver que ele, com intensa raiva em suas feições, recusou firmemente a proposta. 

— É só pisar em um pedaço de bronze, por que coloca isso acima de sua própria vida? — perguntou Hiroshi. 

— Me deixe sozinho por um tempo — E Pavlov não disse mais nada por vários dias. 

Um décimo dos funcionários se recusou junto de Pavlov a pisar no fumi-e, o que os renderia a pena de morte, mas que com a influência do imperador e súplicas de Hiroshi, foi reduzido a prisão perpétua. 

O resto, incluindo a família de Pavlov, foram libertos em uma propriedade confortável, mas impedidos de sair até que chegasse um navio para os levarem de volta a Rússia. 

Sozinho ele partiu, sozinho Hiroshi retornou a vila. 

— De novo, de novo e de novo. Apenas desgraças ocorrem para aqueles que andam comigo! Estou amaldiçoado a viver sozinho para sempre? Sou proibido pelos céus de ter paz? Eu deveria apenas sumir? Eu melhoro, eu tento mudar, mas de nada adianta! Todo tempo que passei no vazio não serviu como minha penitência? Tudo isso não serviu de nada!? 

A maldita desonra voltou a perturbar Hiroshi. 



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