Volume 1

Capitulo 3: O Esconderijo

Era uma manhã calma de segunda.

Quelo tolada… — falou Eric. — Quelo tolada… Que disglaça.

Isso o irritava, entedia que era normal embolar as palavras nessa idade. Contudo, sentia-se incomodado com isso. O garoto estava agora sentado em uma cadeira, dentro da cozinha de sua casa, sua mãe, Emma, estava ao seu lado fritando alguns ovos.

— Hehe, você fica fofinho tentando falar corretamente — falou a mulher, oferecendo um prato de torrada e ovos.

Achava Irritante o fato de sua dislalia atacar apenas algumas palavras, isso o confundia muito na hora de se expressar.

— Mas eu não gosto, quero falar celto — respondeu o garoto, irritado.

Seu tempo nesse corpo era algo monótono e calmo, algo de seu gosto, passava boa parte de seu tempo lendo os livros de seu pai.

— Mamãe, posso trabalhar com a senhora hoje? — perguntou o garoto.

Emma trabalhava como costureira, criando e vendendo roupas para o povo das redondezas. O garoto aproveitava da situação, para poder conter sua abstinência em forjar objetos, costurando algumas roupas em segredo.

— Não! Já falei que é perigoso você brincar com a máquina de custura — alertou a mulher. — Você pode se ferir ou acontecer algo pior!

— Ta celto… — murmurou o garoto, chateado.

Ao comer seu cafe da manhã, a mulher o tirou da cadeira. 

“O que fazer hoje…”, pensou.

Seu pai havia indo trabalhar, então brincar com o homem estava fora de questão, podia ir até a casa de Aisha, desde seu primeiro encontro com a garotinha, amizade dos dois havia fortalecido. A garota tinha um gosto peculiar por animais, entendendo assuntos bastante complexos para crianças da sua idade.

“Acho melhor não, Aisha vai querer me ensinar sobre lontras como da última vez…”

Dirigiu-se até seu quarto, que se localizava no segundo andar da casa.

“Hum, será que devo sair escondido para explorar o local?”, indagou, em seus pensamentos.

Adentrando seu quarto, observou os arredores. O local não era algo tão mobiliado, comparado aos seus aposentos do seu antigo corpo, no local só existia sua cama e um armário de madeira lotado de roupas feitas pessoalmente por Emma, havia também uma escrivania com alguns livros.

“Pelo visto, vou passar o dia deitado mais uma vez…”

Pensou em ir ver o galpão abandonado, dito por Aramis a um tempo, mas não sabia como dar uma desculpa para poder sair de casa, sem que sua mãe desconfie. De repente, a mulher apareceu na porta de seu quarto, em suas mãos ela carregava um vestido que acabará de fazer.

— Eric, vou precisar sair para entregar uma encomenda, quer ir comigo? 

— Não, obligado — ao deitar de lado, escondendo um sorriso malicioso, o garoto respondeu.

Esperou sua mãe sair de sua vista, para poder correr para a janela.

“Um golpe de sorte! Poderei sair e voltar rapidamente”, pensou, enquanto olhava a mulher sumindo na estrada.

Ao se dirigir para a escrivania de seu quarto, abriu um fundo falso de baixo dela, havia o encontrado há muito tempo ao fazer uma inspeção no local.

“Como não sei nada sobre o local, melhor levar alguns tecidos para marcar o meu caminho”

Dentro do fundo falso, guardava um pequeno baú com alguns vestidinhos que mesmo costurou, guardava também alguns tecidos extras que pegou emprestados de sua mãe. Após confirmar ter pego tecido suficiente, seguiu viagem, saindo da casa pela entrada dos fundos, adentrando mata adentro.

Não soube quanto tempo caminhou através do matagal denso, não possuía uma vista de cima para se basear. A todo momento, parava para marcar um tronco, amarrando nele um de seus tecidos.

“Como aqui é quente…” 

Ao afastar um galho de uma árvore, percebeu uma estrutura solida em seu caminho.

“Cheguei, finalmente!”, pensou, ao dar um grande sorriso

O galpão estava tomado pela vegetação, algumas de suas janelas estavam quebradas, enquanto outras estavam cobertas de musgo. O garoto se dirigiu até a entrada, uma porta de metal que estava enferrujada e presa a um cadeado.

“Hum, isso vai ser difícil de abrir…”

Para sua sorte, parte de seu poder continuava nesse novo corpo, estava em uma escala bem reduzida, mas serviria para quebrar aquele cadeado. Ao olhar para os lados, confirmando se não havia ninguém no local, esfregou a ponta de seus dedos. 

De repente uma pequena chama surgiu, usando-a para derreter o cadeado.

“Ficou feliz de ainda poder usar a energia elemental, mesmo que fraquinha”.

Os humanos dessa terra tinham a acesso à energia elemental, uma força que permitiam manipular os elementos da natureza. Contudo, não a utilizavam para o combate, pelo menos não do jeito que Nephrite chegou a testemunhar. 

Ao adentrar o galpão deu uma profunda analisada no estado do ambiente. O lado de dentro parecia bem melhor que o lado de fora, havia algumas máquinas enferrujadas, algumas partes do local a vegetação já havia tomado conta.

“Vou ter um bom trabalho para arrumar tudo isso…”

Fora a bagunça, o local era bastante agradável aos seus olhos, era grande o suficiente para guardar suas criações, e adequado para ser usado como esconderijo. Entretanto, o garoto precisava fazer algo, antes de botar a mão na massa.

“Com toda certeza, se eu trabalhar aqui, vão aparecer olhos curiosos… Melhor eu usar uma marcação de camuflagem nesse local”

Ao pegar um de seus tecidos, olhou em volta, escolhendo uma máquina com uma espécie de parte pontiaguda.

“Posso acabar pegando um Tétano, mas é o jeito”, pensou, ao esperta seu dedo no objeto.

Desenhou uma espécie de runa no tecido com seu sangue que saia do machucado, e ao se dirigir para fora do galpão, o pregou em árvore próxima.

“Ótimo, isso vai esconder minha presença, e vai impedir dos curiosos virem a esse lugar”

A runa possuía a habilidade de esconder a energia dos seres vivos, criando uma sensação que fazia os de fora, ignorarem o ambiente, era como uma camuflagem natural.

“Vejamos se está funcionando”

Ao olhar para os lados, começou a procurar algo para testar sua marcação, notou que próximo a ele, em cima de uma árvore, havia um pássaro empoleirado. O animal possuía penas de cor marrons, e se movia euforicamente para os lados, ignorando-o, mesmo estando apenas a alguns metros próximo a ele.

“Oh…”, murmurou, em seus pensamentos.

Ao subir na árvore começou a se aproximar do animal, contado a sua distância para ele em seus pensamentos

“30 centímetros, sem sinal de atenção…”, murmurou.

Ficando cara a cara, esboçou um sorriso malicioso.

— Buuu! — exclamou, ao assustar o animal.

Piu!

Exclamou o pássaro, voando para longe.

“Dez centímetros… Deve ser o suficiente para eu poder fazer contra medidas, caso eu seja descoberta” 

Ao descer da árvore, o garoto decidiu voltar para sua casa, já havia conseguido cumprir o que desejava no local.

“Agora pensado bem, como vou fazer para trazer meus materiais de forja…”

Tudo o que Nephrite usava para a confecção do metal foi deixado em seu castelo, podia os trazer até onde estava, mas isso ia acabar a entregando.

“Vou pensar em outra solução”

Mais tarde naquele dia…

O garoto passou o tempo todo pensado em como trazer seus materiais, não conseguindo pensar em nada.

“Que chatice…”

A mulher então adentrou a sala, segurava uma cesta com algumas roupas recém-tiradas do varal.

— Não quer ouvir o rádio? Posso ligar para você — Ao notar a situação da criança, perguntou.

— Não, obligado — respondeu o garoto.

A monotonia era algo legal no começo, mas agora seu corpo ansiava por confusão.

“Nunca pensei que ia ficar com vontade de trabalhar…”

Levantando-se do sofá, dirigiu-se para o quintal de sua casa, na esperança de ter algo interessante.

“Lembro-me de haver alguns formigueiros perto de casa, torcer para estarem guerreando”

 Agachando-se próximo a um arbusto, começou a procurar os formigueiros, não notando algo que vinha por trás.

— Voadora!! — gritou uma voz feminina.

O garoto foi atingido em cheio por um par de pês, caindo sobre o arbusto.

— Não teve glaça sabia? — remusgou.

Com um grande sorriso em seu rosto ao ver sua situação, a garota começou a se explicar.

— Desculpe, Eric. Eu estava lendo sobre rinocerontes lá em casa, e os rinocerontes dão cabeça…

— Tá bom, Aisha! — exclamou o garoto, Interrompendo-a.

Aisha vestia-se com um vestido casual, algumas partes dele estavam manchadas de terra, o que demonstrava que a garota estava em meio aos matos.

— Oh, veja Eric, formigas! — Ao apontar para o corpo do garoto, alertou.

— O que… Ai! Ai! — exclamou o garoto, ao ser ferroado pelos insetos.

Se mexia euforicamente em uma tentativa tirar os bichos de seu corpo. A garotinha achou graça das atitudes de seu amigo.

— Que engraçado, parece que está dançado.

Eric fez uma expressão de desgosto para sua amiga, jogando uma formiga em sua face.

— Ei! — exclamou, ao esfregar seu rosto. — Isso não teve graça…

Eric zombou da garota, mas acabou sentindo pena em seguida, dando tampinhas gentis no vestido de sua amiga para limpá-lo. Mesmo considerado certas atitudes de sua amiga como impulsivas, não se incomodava com a sua presença. 

  A garota costumava aparecer frequentemente em sua casa, porque seu pai não possuía alguém para cuidar dela quando saia para trabalhar, por isso ele sempre pedia a ajuda de Emma.

— O tio está aí? — perguntou Eric.

— Não, papai estava com pressa, parece que o tio Aramis disse que chegaram as peças dele — ao juntar seus braços, a garotinha respondeu.

— Entendo… — comentou Eric, sentido incomodado com algo.

“Porque ela tem um dicção tão boa? Somos praticamente da mesma idade…”, indagou Eric, em seus pensamentos.

Emma, curiosa ao escutar a confusão de dentro da casa, foi conferir o que estava ocorrendo, notando a visitante. 

— Oh, Aisha como vai? Que vestido lindo — falou a mulher.

— Oi, tia Emma, obrigado, foi a vovó que me deu — falou a garotinha, rodopiando para mostrar o vestido.

Emma tratava a garotinha como se fosse sua segunda filha, era algo que deixava Eric curioso, e, ao mesmo tempo, contente com a humildade de sua mãe. De repente a garotinha agarrou sua roupa, com uma expressão seria em seu rosto

— Eric, preciso de sua ajuda!

O garoto ficou curioso, mas já imaginava que não era algo tão sério.

— Diga — falou Eric.

A garotinha então mostrou uma boneca de porcelana.

— Bonita, seu pai que deu? — Perguntou o garoto.

— Foi minha avó… Eu fui inventar de tirar o vestido dela, e acabei o rasgando — choramigando, a garota explicou — Consegue consertar?

A garota então mostrou o vestidinho da boneca de cor azulada rasgado em sua saia.

— Consigo… Num quer um dos meus não? — ofereceu o garoto.

— Não entendi — com uma expressão confusa em seu rosto, a garota respondeu.

Levando-a a seu quarto, a mostrou seu bau de tecidos secretos, olhando para os lados para ver se Emma não havia os seguidos.

— Não conta para minha mãe soble isso… É segredo meu — Explicou.

Aisha ficou abismada com o conteúdo do bau, os vestidos de Eric eram perfeitos para sua boneca.

— Posso ficar com qualquer um!? — perguntou a garota, animada com o que via.

— Pode… Só estão pegado sujeira de qualquer maneira— respondeu.

“Pelo menos vão ser uteis para alguma coisa… Melhor do que pegar poeira…”, murmurou, em seus pensamentos.

Aisha começou a analisar os vestidos, a procura do melhor para vestir sua boneca, havia vestidos que simulavam os usados em ballet, alguns possuíam saia longa, enquanto outros tinha saia curta.

— Vou escolher esse! — exclamou a garota.

Em suas mãos, a garota segurava um vestido de saia longa, sua cor era branca e havia bordados na região próximo ao busto.

— Posso? — perguntou a garota, ao fazer uma expressão fofa.

— Já disse que pode! — respondeu Eric, irritado.

O motivo da reação do garoto, era que aquele vestido era uma versão reduzida do que ele vestia quando era Nephrite. O vestido que sua mestra havia o dado de presente quando fez seu aniversário de dez anos.

“Curiosa a Aisha escolher esse… Na verdade, faz sentido, minha mestra sempre teve bom gosto” concordou consigo mesmo, em seus pensamentos.

A garotinha vestia a boneca com um grande sorriso em seu rosto, era como se tivessem ganhado algum presente maravilhoso.

De repente o garoto sentiu uma sensação estranha, era como se estivesse sendo observado. Ao olhar cuidadosamente para os lados, tentou descobrir de onde vinha essa sensação, sem sucesso.

“Estranho…”

— Algum problema, Eric? — ao perceber a expressão do garoto, a garotinha perguntou.

— Nenhum… — respondeu.

— Veja, ela ficou fofa! Obrigado pelo vestido Eric — aproximando a boneca frente a frente com a cara do garoto, agradeceu.

Eric nada respondeu, apenas retribuiu com um sorriso. Emma então os chamou do andar de baixo.

— Crianças, fiz uns sanduíches, venha lanchar!

— Já vamos mãe! — Respondeu o garoto.

Guiando Aisha para a cozinha, a todo momento ficou pesando na sensação que havia sentido, não sabia o que tinha feito aquilo

“Esquisito… Muito esquisito…”



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