Ryota Brasileira

Autor(a): Jennifer Maurer


Volume 7 – Arco 3

Capítulo 78: Choque de Lâminas

— … Mas não esperava que me alcançasse tão cedo — Miura concluiu em voz baixa, observando com os olhos estreitados as duas pessoas que estavam paradas abaixo das escadas — Deveria submeter a vocês singelas palmas por tamanha determinação.

Tal como falou, palmas foram ouvidas quando o Akai começou a batê-las. O som ecoou por todo o amplo espaço, permitindo que chegasse aos ouvidos da dupla tensa que enrijeceu ainda mais o corpo ao ver o assassino dar um passo adiante, descendo um degrau da escadaria.

— Onde está Fanes? — perguntou, finalmente, Luccas, com o tom de voz forte.

Miura, sem responder, desceu mais um pouco.

— Ocupado com os atuais conflitos — respondeu o guardião, sem pestanejar.

— Então, seremos apenas nós três? — perguntou mais uma vez o homem de olhos bicolores, de cabeça baixa — Ótimo.

Ao silêncio do assassino, que havia parado de descer as escadas para observá-los, Luccas escondeu a expressão que fazia ao sacar a espada que pendia em sua cintura. Assim como a que estava nas mãos de Tom ao seu lado, era um modelo relativamente comum, sem nada de especial.

Entretanto, o poder daqueles que as empunhavam era completamente diferente. Quando os dois sacaram suas armas e apontaram-nas na direção de Miura, com olhos afiados, prontos para o combate, o guardião soltou uma risada sutil.

— Pretendem me enfrentar agora? Não acham que está tarde demais?

— Não, estamos no momento exato — respondeu Tom. Ao contrário de Luccas, que nitidamente parecia irritado com a pessoa na sua frente, o capitão estava completamente sério — Afinal, se o derrotarmos agora, ninguém poderá nos impedir.

As palavras de Tom eram certeiras. Uma vez que o palácio fora reduzido a uma quantidade de pessoas bastante limitada, com todos da guarda real trabalhando para salvar as pessoas na cidade, era impossível que qualquer um pudesse se intrometer nas coisas que ali aconteceriam. E esse era um fator muito importante para a dupla espadachim deduzir que aquela era exatamente o cenário desejado pelo homem de íris vermelhas. 

Em relação a este ponto, parecia que Miura não discordava. Sua usual expressão de desinteresse estava em seu rosto, sem qualquer menção de ser mudada. Dito isso, os olhos do assassino deslizaram de Luccas para o capitão da guarda real, e se afinaram.

— Diga-me, senhor Tom: Por que se rebela ao lado deste homem? Não deveria estar protegendo a capital na Sede dos Cavaleiros?

Era uma pergunta bastante pertinente. Ainda que as condições não fossem favoráveis, era quase esperado que Luccas, o guardião responsável por Marie, viria se vingar por ela. Em contrapartida, estava ali uma pessoa que nada tinha a ver com a situação. Sob circunstâncias normais, ele teria defendido a família real ao invés de apontar sua espada para ela.

Olhando-o de volta, Tom apenas soltou um riso com o nariz e passou a mão pelos cabelos negros com mechas douradas.

— Essa é uma dúvida que pode ser respondida de forma bastante simples — o capitão fechou os olhos — Senhor Akai, sabe qual o dever de um capitão?

Miura ficou em silêncio.

— Cada um de nós da guarda real jurou lealdade e nossas próprias vidas à Thaleia. Nossa maior vontade é defender a honra de nosso país e garantir prosperidade a ele. Saudamos nosso monarca e brandimos nossas espadas diante do peito como um sinal de respeito aos antepassados que passaram adiante a vontade da espada.

O assassino franziu a testa. Vendo essa reação, Tom quase achou graça.

— A vontade da espada representa nossa força de vontade e coração de guerreiro. Afinal, enquanto estivermos empunhando-as, somos homens honrados. Um indivíduo que gerou lealdade ao seu país sem empunhar uma espada — Tom bateu o punho no peito, bem acima do coração — Jamais poderá ser chamado de honrado. 

As palavras de Tom eram poderosas. Sua aura exalava excelência e força. Seus olhos negros brilhavam com uma determinação ardente, com um orgulho que irradiava e era capaz de se expandir, alcançando seus homens. Havia nele uma presença que influenciava as pessoas ao seu redor. O tipo de pessoa que, com certeza, era capaz de reerguer a vontade de seus homens e influenciá-los a lutar.  

A espada à qual ele se referia não era apenas no sentido literal. Ao tocar em seu próprio peito, Luccas entendeu isso. Uma vez que se jurava algo a alguém, era necessário lutar com todas as forças por isso. Oferecer suas vidas era o mínimo. Brandir suas armas contra seus inimigos não se tratava de combater por ódio a eles, mas por desejarem proteger aquilo que lhes era importante. E, para isso, era preciso muito mais que portar uma arma em mãos: Era necessário ter um coração tão poderoso quanto. 

— Da mesma forma, alguém que se nomeia guardião e não cumpre com a lealdade jurada, jamais poderá ser chamado de honrado.

Apesar do apontamento, Miura apenas franziu ainda mais a testa. Parecia bem mais pensativo do que irritado.

— Não deve ser possível para vocês entenderem isso. Afinal, o senhor foi treinado para matar e silenciar aqueles que intrometem-se no seu caminho — as palavras de Tom se tornaram afiadas — Ainda que jurem suas próprias almas a um mestre, sua maior preocupação sempre será consigo mesmos. E, como a família nobre mais tradicionalíssima, com certeza deve prezar pelas três regras principais da nobreza: Orgulho, lealdade e diligência.

Aquelas três palavras eram realmente poderosas. Todos aqueles que nasceram sob a guarda da nobreza precisavam segui-la à risca. Fuyuki Minami, por conta daquelas mesmas tradições, sofreu como uma herdeira mulher, mas se reergueu e tomou o posto de primeira matriarca. Era uma dificuldade que nenhum dos homens poderia entender. Entretanto, a pressão colocada nos ombros de cada um dos descendentes da família Akai era tão poderosa quanto.

Saber de algo e entendê-lo na própria pele eram circunstâncias diferentes. Tom e Luccas sabiam como era sentir orgulho de seu próprio trabalho e honrá-lo com a própria vida, sem remorsos. Miura, não. Em contrapartida, ele conhecia perfeitamente a sensação de preocupar-se apenas consigo mesmo e abandonar aliados que não eram capazes de acompanhá-lo. Se não fossem de seu próprio nível, eram descartados imediatamente. O Akai poderia não fazer isso com as próprias mãos, mas não levantaria um dedo para ajudá-los em momentos de dificuldade.

— Não entendo que mal há nisso — observou Miura, finalmente falando — Afinal, eu e Sua Majestade firmamos um trato que estava plenamente de acordo com o que desejávamos. 

Luccas apertou os olhos bicolores. Ele podia não conhecer plenamente a relação daqueles dois, mas sabia que não deveria ser tão simples assim. O mesmo valia para Tom, que não mudou a expressão séria que mostrava.

— Com isso dito, ainda não compreendo porque este assunto é relevante.

— O que estou tentando dizer, senhor Akai — corajosamente, o capitão deu um passo à frente e apontou a espada para o rosto do assassino — É que não precisamos de um indivíduo que assuma um posto tão importante ao lado de Sua Majestade com tamanho ideal. Suas ações se provaram cruéis e mancham de sangue a família real. No passado, eu poderia apenas ter requerido que se retirasse pacificamente. Entretanto, após descobrir com que sangue suas mãos foram sujadas, não o perdoarei por tamanha desonra!

Com uma veia de raiva estourando em sua testa, Tom ergueu a voz contra Miura e o desafiou.

As duas pessoas com ideais e visões de mundo diferentes se encararam nos olhos e não desviaram suas atenções. Atrás de Tom, Luccas permanecia em silêncio. Ele percebeu que não seria correto interferir na conversa entre eles. Era algo que o assassino diante dele precisava ouvir, mesmo que fosse incapaz de entender em seu frio coração.

Uma parte de Luccas, no passado, teria sentido pena dele por isso. Mas, agora, as circunstâncias mudaram. E ele, assim como o capitão ao seu lado, desejava vingança.

Observando aqueles olhos negros que brilhavam com as mais diversas emoções, as íris vermelhas sem vida de Miura se fecharam e o assassino soltou um suspiro.

— Que cansativo — murmurou para si mesmo, inclinando a cabeça.

Foi nesse pequeno espaço de tempo que uma mudança ocorreu. Um frio subiu à espinha de Luccas e ele avançou, erguendo sua espada para defender o ataque que viria. Um brilho amarelo cintilou na orelha esquerda do assassino, e então, duas armas afiadíssimas surgiram em suas mãos. Uma delas deslizou pelo ar e buscou acertar o pescoço do capitão da guarda, mas ele foi mais rápido. A defesa veio no tempo certo. Luccas, para ajudá-lo, lançou-se no chão e impediu a segunda haladie de acertar as pernas do capitão. O choque de lâminas fez ranger um som desagradável aos ouvidos.

— Estou ocupado, então acabemos logo com isto.

Após essas palavras, Miura usou uma força descomunal nos braços para lançar os dois homens para longe. Seus corpos rolaram pelas escadas, mas rapidamente se recuperaram do impacto, colocando-se de pé novamente. Nas mãos de Miura, que não saiu do lugar, surgiram duas haladies em suas mãos. Eram armas com lâminas dos dois lados, dando-lhe uma movimentação ágil e fatal.

— Belos reflexos, rapaz — elogiou o assassino à Luccas, abrindo um sorriso divertindo quando suas íris ganharam um brilho afiado. Era o despertar do Instinto Assassino —  Mas será que vocês podem acompanhar meu ritmo?

Os dois homens hesitaram e sentiram suor descer por suas costas quando o Akai deu um passo adiante, descendo mais um pouco na escada. Cada movimento era como o tique-taque de um relógio, que lentamente cronometrava o início daquele embate difícil. Ambos os espadachins estavam nervosos. Eles sabiam que não poderiam vencer tão facilmente um mestre na arte de matar. E foi exatamente por isso que planejaram ser cautelosos.

— Não se precipite — sussurrou Tom para Luccas, dando-lhe um olhar de escanteio — Eu sei que quer vingar Marie, mas faremos isso juntos.

Luccas não era uma pessoa que se deixava levar pelas emoções tão facilmente. Porém, as coisas mudaram quando sua protegida estava envolvida, e parecia que, mesmo sabendo por cima a respeito de seu relacionamento, o capitão o entendia e respeitava seus sentimentos. Aquelas palavras o deixaram feliz, e o homem de olhos bicolores assentiu discretamente com a cabeça.

Passos ecoaram pela escadaria. Lentamente, Miura se aproximava. As duas haladies em suas mãos brilhavam como lâminas novas, prontas para o abate. A luz violeta que desenhou o ar quando as movimentou era um sinal de seu perigo. O som delas passando por seus ouvidos arrepiava todos os pelos do seu corpo. A pressão exercida por aquele homem era simplesmente insana o bastante para fazer seu corpo congelar.

Mas, mesmo com o medo desejando usufruir do controle de seu corpo, Luccas lutou contra ele e se focou. E foi graças a isso que, quando um corte repentino cruzou seus olhos, ele foi capaz de se defender com a espada, desviando do ataque. Lâmina contra lâmina soaram, e o choque de armas cessou. Foi um movimento de mestre, pois ele sequer havia notado a aproximação do assassino. Os passos que antes ecoavam pelo ambiente cessaram completamente com sua aproximação repentina.

— Está muito distraído — murmurou Miura, com um sorriso desenhado nos lábios — Tome cuidado.

Ainda que o desvio tenha sido concluído com sucesso, o avanço do assassino continuou. Após seu salto e tentativa de corte falhas, ele girou seu corpo na direção de Tom, que havia avançado na direção dele. Houve um novo choque de armas, assim como uma troca de golpes poderosa o bastante para fazer o ar vibrar. Luccas piscou e, acordando para o que acontecia, segurou sua espada para atacar.

Ele se aproximou por trás e, erguendo a espada, disparou um corte de cima a baixo em suas costas. Entretanto, o movimento foi imediatamente repelido por um chute, como um coice. As íris vermelhas de Miura deslizavam de um lado para o outro, como se vissem em 360º. Mas, mesmo assim, Luccas e Tom não deixaram de atacá-lo cruamente. Uma dança de espadas e golpes se iniciou. Ainda que fossem dois contra um, a vantagem estava claramente pendendo para um único lado.

Luccas, uma vez, fora membro da guarda real e condecorado como o capitão. Portanto, ele possuía habilidades de combate de nível igualado aos de Tom. Entretanto, nem mesmo os dois juntos poderiam igualar-se às capacidades de Miura.

Os dois espadachins trocaram golpes com as haladies. Movimentadas como se fizessem parte de seu corpo, o assassino enfrentou os dois ao mesmo tempo. Por vezes, cortes surgiam aqui e ali em seus corpos, mas nada realmente preocupante. O combate escalonou e, por fim, começaram os golpes físicos. Tom desferiu um soco contra o assassino, mas ele habilmente desviou com um passo para trás, abaixando o corpo para dar uma cotovelada no queixo do adversário. Eram movimentos conhecidos, porém, tão velozes que se tornava ridículo considerar escapar deles.

Luccas, mais uma vez desviando a linha de ataques da haladie, decidiu usar aquele momento para atacar. Enquanto Tom recebia o golpe, seu pé voou contra as costas do joelho de Miura. 

— Não faça isso! — exclamou o capitão, com sangue saindo de seu nariz.

Naquele segundo, foi por um mísero movimento. Luccas hesitou e usou a espada para levar o chute para longe, bem a tempo de desviar do corte que deceparia sua perna. Um arrepio percorreu a espinha do homem de olhos bicolores ao ver as íris vermelhas brilharem com insatisfação. Ele havia ficado incomodado por ter sido incapaz de cortá-lo devidamente.

— Cale-se — disse o assassino, dessa vez sendo ele aquele que desferiu um chute, porém, no estômago de Tom, levando-o a cair da escada.

Não demorou mais de um segundo para Miura voltar sua atenção à Luccas e rasgar o ar com suas haladies. Luccas, que apenas ficou na defesa, começou a recuar os passos, mas o guardião não permitiu que ele fosse capaz de escapar. 

Quando Luccas conseguiu conter as duas lâminas com a espada, mantendo o choque de espadas acontecendo por um pequeno período, perguntou:

— … Por quê? Por que você machucou a Marie? — suor escorreu por seus olhos e ele franziu a testa — Por que você a torturou daquele jeito?!

Luccas, lembrando-se do estado em que a encontrou, usou ainda mais força para empurrar Miura para trás. O movimento não surpreendeu o assassino, e ele sequer mudou sua expressão.

— Era necessário.

— Necessário?! Era necessário torturar uma menina indefesa?! Era… Necessário… Fazê-la sofrer tanto? — Luccas engoliu em seco e então gritou — O que vocês querem, afinal?!

Miura, observando o rosto do adversário se contorcer em ódio, apenas piscou com ligeiro tédio.

— Eu não me importo — foi sua resposta — Estou apenas seguindo ordens.

— Ordens?! De quem?! Não me diga que são de Fanes!

O guardião, para sua surpresa, ficou em silêncio. Não foi a reação de alguém que optou por omitir, era mais como se escondesse um segredo desconhecido a eles. 

— Isso não lhe cabe saber — concluiu o assassino aos sussurros, antes de recuar suas lâminas e desferir um golpe de palma. Foi um movimento que usava os pulsos para atacar. Um acertou-lhe no ombro, desequilibrando-o, e o outro voou contra seu peito.

Luccas segurou seu braço imediatamente, impedindo-o de desferir outro golpe. Seus olhos bicolores aguardam a outra palma acertar-lhe o rosto para, então, ser capaz de pará-la também. Ele fez força e não permitiu que fosse puxada de volta. Ao mesmo tempo, captou, à distância, Tom se aproximando. Tendo batido contra a parede e a quebrado, o capitão se aproximava com a espada em mãos e sangue escorrendo pelo queixo.

— Me cabe saber, sim! — respondeu Luccas, por fim, ao apontamento de Miura — Como responsável, devo ser capaz de protegê-la e saber tudo sobre ela!

Pela primeira vez, Miura pareceu ligeiramente surpreso.

— Responsável…?

Luccas também ficou curioso ao perceber que o assassino desconhecia suas verdadeiras origens, mas decidiu não se importar muito com aquilo. O guardião sabia que ele fora o antigo capitão da guarda e possivelmente alguém próximo a Fanes, mas não muito além disso. Possivelmente, não era o tipo de informação que fosse relevante a ele, então Miura apenas o ignorou. Entretanto, graças a essa revelação, ele pareceu um pouco mais interessado no homem à sua frente.

— Entendo, então essas são suas razões… — murmurou ele mais uma vez, parecendo girar as engrenagens de sua mente — … O que aquela mocinha possui de tão especial, afinal?

Mais uma vez, o homem de olhos bicolores se surpreendeu. Miura realmente não sabia de nada? Ele havia apenas seguido ordens superiores com seus métodos cruéis, ignorante quanto à origem desses pedidos? 

— Me diga você — refutou Luccas, ainda segurando-o. Ele aguardava a chegada de Tom, que agora apressava o passo para chegar até eles — Ou isso significa que sequer sabe os objetivos daquele a quem lhe enviou as ordens?

À provocação barata, Miura franziu a testa.

— Que guardião meia boca você é. Ou será que Fanes não confiou-lhe o bastante para contar isso?

— Está enganado.

Dessa vez, foi Luccas quem mostrou uma careta à recusa imediata do assassino.

— Sua Majestade não foi o responsável ou aquele que desejou o sangue dos olhos da garota que estava nas celas.

Aquela informação era realmente valiosa e importante. Mas, mais do que isso, as duas metades dentro de Luccas entraram em conflito. Uma, que defendia o atual monarca, ficou feliz em saber que era verdade. Ele jamais poderia ter ferido a filha de uma pessoa tão especial para ele, certo? Entretanto, seu outro lado ficou atento e se perguntou se Miura não estaria apenas mentindo. Poderia ele omitir informações dessa forma? Estava tão desesperado assim para proteger seu mestre? Seria ele muito mais leal ao rei do que realmente parecia?

Qual era a verdadeira relação entre Fanes e Miura?

Apesar dos pensamentos que vinham em disparada na mente do homem, parecia que o mesmo acontecia com o assassino. As palavras de Luccas o fizeram refletir em silêncio, como que pensando em algo. Por segundo, se perguntou se aquele homem na sua frente realmente não soubera de nada, apenas seguindo ordens e ouvindo nomes sem qualquer contexto das circunstâncias que fora envolvido. 

Mais uma vez, o coração de Luccas se apertou. Era uma empatia hipócrita considerando tudo o que aquela pessoa havia feito à ele, à Marie, à Ryota e possivelmente a diversos outros. Porém, mesmo assim, ele não conseguia deixar de ter aqueles sentimentos. Era algo natural da pessoa chamada Luccas. Facilmente se compadecia dos outros, mesmo que fossem inimigos e suas atitudes fossem terríveis. 

Ele não sabia se essa era uma característica natural ou que cresceu dentro dele desde que conheceu Teresa no palácio, há tantos anos. Fosse o que fosse, Luccas era uma pessoa boa demais — e, por isso, estava constantemente sofrendo sozinho devido possuir tamanho coração.

Enquanto aquela cena acontecia, Tom se aproximou pelas costas de Miura. Então, ao invés de rasgar o ar com um golpe comum, concentrou seu poder nas próprias pernas. Os pés, que antes corriam desajeitadamente, agora saltaram no espaço, alcançando o alvo imediatamente. A espada traçou uma luz amarela quando cortou na direção do pescoço do assassino.

— A situação mudou.

A esse murmúrio que não chegou aos ouvidos de nenhum dos dois espadachins, Miura virou os pulsos e fez um movimento impensado. Com Luccas batendo as costas contra a parede, o assassino usou-o para subir, escalando na vertical. Isso permitiu que seus pulsos fossem soltos e, em seguida, pudesse ver Tom de cima. Ao cair atrás dele, suas haladies cintilaram ao golpe que viria.

— Ugh!

As lâminas se chocaram contra a espada de Luccas, que atravessou o espaço entre eles e defendeu o capitão. Um grunhido saiu de seus lábios ao ver a força contida naquele golpe, mas não recuou. Ao invés disso, o rapaz forçou suas pernas a permanecerem onde estavam, lutando contra Miura. 

— Sai dai, Tom! — gritou ele para o homem que estava atrás de si.

Ouvindo aquilo, sem hesitar, ele obedeceu. Apesar de ser mais velho que o rapaz, era experiente o bastante para compreender que Luccas jamais faria aquilo sem uma razão. 

Dito e feito.

Uma vez que o companheiro desceu as escadas, Luccas fez uma jogada perigosa. Afinal, ele desviou a força das espadas acima de sua cabeça, usando o movimento para segurar o assassino pela cintura e largar a própria espada. A força contida no corte de Miura rasgou o ar e, como uma pressão, destroçou a parede onde anteriormente estivera o capitão.

À agarrada de Luccas, Miura ficou um segundo sem reação. Em seguida, se surpreendeu quando seu corpo foi erguido no ar. Era um movimento chamado suplex… Porém, de uma forma um pouco errada. Geralmente, segurava-se o corpo do adversário pelas costas, e não pela frente. Entretanto, isso não impediu o rapaz de usar isso ao seu favor. Ainda que fosse um assassino, mesmo ele poderia se surpreender às vezes. E foi justamente isso que aconteceu quando ele viu sua visão virar de ponta cabeça, sem entender como Luccas possuía tanta força nos braços.

— Iáá!

E foi assim que a cabeça de Miura bateu contra o chão fazendo um estalo. Tom estagnou no lugar, em choque com o que acabara de presenciar. Luccas, tremendo que um golpe viesse logo em seguida, soltou o corpo e saltou as escadas, parando ao lado do capitão.

— O que foi que você fez?!

— Eu não sei!

Os dois gritaram um com o outro, ainda assustados demais. Teria sido uma cena cômica e quase relaxante se isso tivesse encerrado o combate. Porém, mesmo Luccas sabia que aquilo não seria o bastante para parar Miura. Não demorou muito para que o Akai desse uma cambalhota e terminasse a volta, colocando-se de pé tão elegantemente que o esforço anterior pareceu ainda mais ridículo.

— Um movimento deselegante — foi o comentário de Miura ao endireitar a postura e arrumar o cabelo. Então, ao parar silenciosamente, suas íris brilharam em fúria — Que irritante.

Um arrepio ainda mais poderoso percorreu seus corpos quando as haladies de Miura brilharam em violeta. Ele parecia realmente nervoso pela humilhação de um segundo atrás. E, pela aura que emanava de seu corpo, ficou claro para a dupla espadachim que não sairiam ilesos daquela luta.



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