Ryota Brasileira

Autor(a): Jennifer Maurer


Volume 5 – Arco 3

Capítulo 45: Retorno ao Baile de Máscaras

Retornamos para o ponto presente, em meio ao baile de máscaras. Após uma quantidade grandiosa de acontecimentos ao longo dos dias, alguns desses aos quais Ryota sequer estava ciente de estarem acontecendo, ela finalmente estava tendo tempo para pensar. Nos fundos do salão recheado de pessoas muito bem-vestidas, com roupas elegantes e chamativas à luz dos lustres, com uma música viciante adentrando seus ouvidos e o cheiro dos aperitivos e álcool pairando no ar, a garota se sentiu um pouco confortável.

Geralmente, Ryota era o tipo de pessoa que gostava de ficar em um ambiente preenchido por pessoas, por mais que a maioria delas fosse desconhecida. Como alguém que tinha bastante facilidade em socializar e fazer amizades, amenizando o clima e fazendo os outros rirem com suas piadas e caretas bobas, não havia desconforto em estar rodeada de pessoas conversando e brindando.

Porém, quando as janelas estavam bem pouco abertas devido ao frio, tendo um forte cheiro de comida e perfumes espalhado pelo ar, impregnando roupas e até as próprias narinas… Certamente, até para aqueles que adoravam sair em grupo, o ambiente não seria confortável. Ainda mais quando sua mente, que deveria estar revigorada, estava completamente branca e confusa graças aos últimos ocorridos. 

Durante o pouco tempo em que permaneceu sozinha em meio ao baile, ou melhor, desde que havia saído daquele quarto escuro e sombrio, sua cabeça pesava e doía. A mente, que estava nublada demais para pensar, apenas aceitava informações sem qualquer vontade de retrucar. As preocupações maiores de Ryota, que eram basicamente a segurança de Marie e Edward, foram saciadas com a conversa de mais cedo. Assim, ela pôde finalmente descansar sem grandes problemas a incomodando. O que veio a incomodar mais tarde foi somente as consequências de passar tantos dias sem comer, beber ou dormir corretamente. E, é claro, de passar por horas e horas de torturas mentais e físicas, algumas delas podendo ficar marcadas permanentemente em seu espírito.

Mesmo Edward, que geralmente parecia do tipo que não prestava atenção nas pessoas, viu o quanto ela estava abalada depois do que havia passado. Ryota sempre era bastante inclinada a evitar que os outros descobrissem que estivesse passando por dificuldades, mas, naquele ponto, ela havia desistido completamente de relutar contra a exaustão. Seu corpo doía e pesava, assim como a cabeça. Seus olhos, quando observados, eram perceptíveis que faltavam aquele seu brilho de alegria característico. 

Constantemente com uma expressão de cansaço, ainda que a maquiagem e as roupas tentassem disfarçar isso, ainda era difícil de ocultar através da voz e movimentação do corpo. As pálpebras lutavam para não se fecharem por completo, deixando apenas um pedaço de seus olhos abertos para que pudesse observar os arredores. Entretanto, ela não conseguia se focar em entender as palavras dos outros, completamente alheia à tudo.

Nem mesmo quando Fuyuki Minami, sua amiga, veio conversar com ela, claramente irritada de não ter sido notificada sobre seu paradeiro durante todo aquele tempo, Ryota não conseguiu reagir ou responder de forma clara. E essa sensação de desconforto apenas cresceu quando uma outra dupla adentrou no salão do baile.

Estavam todos usando máscaras em seus rostos. Umas eram mais comuns do que outras. Porém, você sempre saberia dizer quem era guardião, quem era nobre e quem era da corte. As pessoas mais próximas à família real usavam as cores de suas famílias em suas vestimentas. O mesmo acontecia com os Fiore, que adentraram o salão usando as cores quentes comuns, sendo eles o vermelho e o amarelo. 

Por isso, quando duas novas pessoas entraram no salão usando aquelas cores, ainda roubando toda a atenção do espaço, pois alguém exclamou que as duas figuras chegaram, ninguém realmente se impressionou. O problema não eram suas roupas elegantes e máscaras bastante características, muito menos a reação em escala das pessoas correndo para cumprimentar Fanes Fiore que, como sempre, abraçou a multidão com um sorriso simpático e enorme em seu rosto.

O que fez um arrepio percorrer a espinha de Ryota, fazendo uma sensação de ânsia subir por sua garganta de forma que a bile se acumulasse foi o olhar dado pelo homens de cabelos negros em sua direção. 

Íris vermelhas como sangue podiam ser vistas mesmo à distância. E, nelas, continha toda a ameaça e terror necessários para fazer Ryota congelar completamente. A respiração se prendeu, o tato e os pensamentos se esvaíram como fumaça. Os olhos azuis perderam completamente o brilho da razão e se perderam. 

— Aparentemente, aqueles dois aproveitarão muito bem a festa. Apenas espero que não façam… Ryota? O que houve? Você ficou pálida de repente… 

As palavras de Fuyuki foram lentamente se alterando conforme ela percebia o estado terrível que sua amiga estava. A cor de seu rosto desapareceu e, por um instante, a duquesa achou que a garota fosse desmaiar ali mesmo. Percebendo que os olhos dela estavam paralisados na direção da porta, uma intuição aflorou e Fuyuki parou diante de sua vista, interceptando a troca de olhares.

— Ei, você está me ouvindo? Ryota? Olhe para mim, bem nos meus olhos.

Ainda que a visão de Miura tivesse sido interrompida pelo vestido da duquesa, Ryota permaneceu em choque. Havia suor escorrendo por suas mãos e testa. Fuyuki se inclinou e então, chamando-a baixinho, segurou seu rosto com ambas as mãos, tentando fazer com que a amiga reparasse em sua presença.

— Ah…!

Para sua surpresa, no entanto, o toque apenas a assustou ainda mais. Foi como se um choque elétrico atravessasse seu corpo instantaneamente, fazendo Ryota se encolher. Mas, graças a isso, as íris azuis se ergueram para a expressão de surpresa de Fuyuki, ainda com as duas mãos paradas no ar.

Lentamente, seus braços caíram para o lado do corpo.

— O que foi que fizeram com você…?

— … Fuyuki? Ah, é verdade, nós estávamos falando de alguma coisa… Desculpa, o que tinha dito, mesmo?

Ignorando o murmúrio raivoso da duquesa que fechou os punhos, se controlando para que o poder não escapasse e congelasse as paredes, Ryota apenas ignorou suas palavras e tentou retomar a conversa. Entretanto, ela realmente não se lembrava do que havia acontecido até pouco tempo atrás.

Sentindo que insistir no assunto apenas traria mais problemas, a duquesa inspirou fundo e, devagar, retirou a máscara do rosto da amiga, tocando a testa úmida dela.

— Seus lábios estão rachados. Quer um copo de água? Você parece meio cansada, hoje. Não acha melhor se retirar essa noite?

— Não precisa, eu estou bem.

Um sorriso bastante falso apareceu nos lábios de Ryota, que prontamente negou a oferta de Fuyuki. Em seguida, pegou a máscara nas mãos dela e colocou novamente no rosto. 

— Me desculpe por isso. Eu vou apenas ficar mais um pouco e então sairei, prometo.

— … Certo.

Os olhos verdes de Fuyuki se estreitaram por trás da máscara, erguendo-se para a multidão de pessoas. Eles vagaram até encontrarem cabelos loiros perdidos. Havia nela uma vontade profunda em apenas arrastar Ryota para longe daquele salão, mas parte dela sentiu que seria errado fazer aquilo. Estava ciente de que a garota deveria permanecer na festa durante, ao menos, um pequeno período antes de poder se retirar. Ainda era bastante cedo e levantaria suspeitas. Mas, tão grande quanto sua vontade era a curiosidade em saber o que realmente havia acontecido ao longo daqueles dias.

E foi com isso em mente que ela se virou para Ryota, que havia se encolhido novamente onde estava, com as mãos no colo e o olhar perdido no chão.

— Vou pegar uma bebida e retorno em um minuto, está bem?

— Ah… Claro. 

O sorriso perdido dela doeu em seu coração, mas Fuyuki se colocou de pé novamente e disparou a passos certeiros na direção do príncipe. 

***

Edward havia entrado fazia menos de dez minutos no salão de baile, mas ele já queria ir embora.

Apesar de precisar comparecer diversas vezes a reuniões e festas internas da nobreza, precisando se acostumar com a ideia de conversar sem parar durante horas a fio, mantendo um sorriso no rosto enquanto tenta criar argumentos inteligentes e discutir assuntos possivelmente desinteressantes, ele não era do tipo sociável. Particularmente, o príncipe preferia uma conversa entre amigos — não que ele soubesse o que era aquilo —, podendo deduzir que seria bem mais confortável de se estar.

O que piorava aquela situação era descobrir que não apenas sua guardiã estava em péssimas condições, como o responsável por aquilo havia recém entrado no salão de baile. Fanes Fiore, seu pai, acompanhado de seu único guardião, Miura Akai, após conversarem com algumas pessoas entusiasmadas, se dirigiram de onde estava o príncipe herdeiro.

Porém, antes que tivesse o desprazer de poder conversar com eles, uma outra figura não muito feliz apareceu atrás dele. Com uma aura gelada ao seu redor, Edward sequer precisou se virar para descobrir quem era. O sorriso formal dele tremeu quando se virou para a duquesa Minami, que parecia plena como sempre por baixo de sua máscara.

— Boa noite, dona Minami. A senhorita está linda esta noite.

— Ora, muito obrigada — Fuyuki fez uma reverência e agradeceu. Foi um diálogo clássico, porém, os olhos rosados e os esverdeados pareciam tentar se comunicar. A duquesa inclinou a cabeça, dando um passo para trás, quando apontou silenciosamente para a garota que estava encolhida perto da mesa de aperitivos — Aproveitando o baile? 

As palavras que saíram educadas foram duramente retrucadas pelo claro tom de impaciência em sua voz. Por estarem bastante próximos, o príncipe conseguiu perceber que um dos olhos dela tinha uma espécie de “tique” quando estava irritada, o que o assustou. Ele já tinha conversado com Ryota a respeito de Fuyuki no passado, sobre como a educada e reservada duquesa era sempre bastante distante, mas ela podia ser bastante confiável com aqueles que eram próximos. 

Agora, desagradavelmente, Edward descobriu que ela poderia ser estranhamente assustadora quando brava — ainda que não demonstrasse isso diretamente.

— Ainda estamos iniciando a noite, então há muito para se aproveitar. Acredito que, em alguns poucos minutos, a festa realmente começará de verdade e poderemos desfrutar melhor deste clima agradável.

Internamente, Edward torceu para que suas palavras e o torcer das sobrancelhas deixassem claro que não havia o que ser feito quanto a Ryota no momento. Ainda que permanecesse nas sombras, sua presença era muito importante ali. Eventualmente, quando a festa começasse de verdade, com as danças e bebidas alcoólicas sendo liberadas, os guardiões seriam liberados de sua guarda para se retirarem. Isso porque os nobres adoravam se embebedar até a madrugada e não havia necessidade de manter aqueles que estavam sob seu comando com ele, os permitindo fazer o que quisessem até o dia seguinte.

— Parece que você pegou o espírito, filho. Gosto disso!

— Senhor Fanes, você vai derrubar o senhor Over se continuar se apoiando nele desse jeito…

— Não adianta alertá-lo, senhor Akai. Sua Majestade perdeu completamente o controle…

As três figuras ainda menos agradáveis que se aproximaram foram Fanes e Juan Over, com o rei passando um braço ao redor do pescoço do homem que fazia uma carranca, e Miura logo atrás deles, tentando apaziguar a situação. Aparentemente, Juan não havia bebido o bastante para se embebedar, mas Fanes era bastante fraco para o álcool e logo havia se rendido à ele. Entretanto, ao invés de ficar irritado como quando estava com Al-Hadid, Juan apenas suspirou e se conteve.

Isso é ruim. Que péssima hora para esses três aparecerem…

Pensando assim, Edward se virou, nervoso, para o pai. Auxiliando-o, Fuyuki deu alguns passos para o lado, ficando de frente para onde estaria Ryota, fazendo todos eles voltarem seus olhos para o outro lado do salão. 

— Boa noite, Majestade. O senhor está maravilhoso esta noite, assim como sua Alteza — Fuyuki cumprimentou o rei com uma saudação lenta, piscando com o olho esquerdo para Edward, que quase chorou de alívio quando a viu fazer isso.

— Ora, ora, dona Fuyuki! A senhorita está linda, também! Não é mesmo, Juan? Hein, Miura? Quando uma dama aparece tão bem arrumada, é dever dos cavalheiros a encherem de elogios! 

— … Sim, certamente. A senhorita está deslumbrante.

— Digo o mesmo — Juan resmungou logo atrás das palavras de Miura, que a cumprimentou com respeito. 

O sorriso chamativo de Fanes parecia sugar toda a energia da festa para ele, como um sol brilhante. Por sorte, os nobres ao redor se agrupavam e sempre tentavam dialogar com eles, impedindo que se movimentasse para muito longe. Fuyuki continuou puxando conversa com o rei bêbado sem grandes problemas. Para a surpresa de Edward, a lábia da duquesa era boa.

O maior problema estava na figura sombria atrás do rei, que observava a duquesa com desdém e claro ódio. Seu porte e palavras podiam ser educados, mas o brilho assassino por trás da máscara não enganava ninguém. Miura sabia perfeitamente que Fuyuki e os outros estavam envolvidos no resgate de Marie, mas não podia abordar aquilo diretamente, necessitando guardar seus rancores pessoais para si. Se o pai de Edward estava envolvido naquilo ou não, o príncipe não sabia. Afinal, seu pai estava agindo como sempre, sem demonstrar qualquer sinal de preocupação.

Notando que era observado, Miura deslizou os olhos na direção de Edward, que enrijeceu o corpo.

— Algum problema, Alteza?

— … Não é nada, me perdoe. Apenas estava encantado com a noite cheia de estrelas — influenciando o guardião a olhar para trás, para as grandes janelas de vidro que revelavam Hera e o céu recheado de pequenos brilhos, Edward caminhou para o lado de Miura e sorriu — Faz um bom tempo desde que pude observá-las tão de perto.

Por um instante, Edward suspeitou que puxar conversa daquela forma descarada sobre o tempo, indicando-o a se virar, geraria suspeitar imediatas no Akai. Porém, o guardião apenas se deixou levar pela conversa e prosseguiu o diálogo, naturalmente, sem falar nada demais além de complementar o que era dito pelo príncipe — apenas algo esperado de uma conversa que algum nobre teria com um guardião comum, em que ele não podia falar nada além do necessário.

Por enquanto, nós dois podemos distrair eles… Mas não sei até quando. Espero que seja o bastante para que a Ryota possa limpar a mente.

Edward assim pensou e desejou do fundo do coração enquanto dava um olhar discreto para trás.

***

Sozinha, quando se viu pensando, a garota ergueu os olhos desfocados para as pessoas que passavam por ela. Para sua sorte, não a chamavam para dialogar — pois, ora, primeiro ela era uma guardiã, e segundo que era reservada o bastante para que os outros evitassem falar com ela. Ryota foi apresentada à nobreza, mas não necessariamente se aproximou deles o bastante para que eles fizessem o mesmo, então apenas agradeceu mentalmente por isso enquanto tentava relaxar.

Não era boa em pensar demais, então sempre evitou isso. Quando passava por momentos difíceis, em que raciocinar sobre um determinado assunto era difícil, apenas saia para caminhar pela floresta de Aurora ou se exercitar, forçando seu corpo a encontrar outra coisa para se concentrar do que a mente. 

Olhando para os lados, ela viu que outros guardiões também estavam isolados. A guardiã de Sofia, Amane Akai, estava a apenas alguns metros dela, de pé contra a parede, as mãos atrás do corpo e os olhos fechados, como se meditasse. Ela era o tipo de pessoa que Ryota não tinha vontade de se envolver de forma alguma, principalmente quando a Akai sentiu que estava sendo observada e deslizou as duas íris vermelhas na direção dela — porém, sem qualquer hostilidade ou ameaça envolvidas. De longe, de todos da família Akai que conheceu e teve a primeira impressão, Amane era a menos assustadora.

— O que foi, cabeça oca? Perdida em pensamentos? Isso não é a sua cara.

— … Sora?

— Não me diga que estava tão distraída que sequer me percebeu.

— Me desculpa.

— Ah. O que esperar de uma mentecapta, não é?

Ryota se virou quando ouviu uma voz familiar, dando de cara com alguém que há tempos não falava. O rapaz, que usava um terno e estava recostado contra a pilastra da parede bem ao seu lado, começou a falar com ela de repente. A garota sentiu constrangimento quando percebeu que realmente não o havia notado e, como de costume, recebeu um xingamento ao qual a palavra não fazia qualquer sentido para ela.

Sora ergueu os ombros, os braços cruzados, e balançou a cabeça com um sorriso descarado na face. Ele estava claramente de bom humor, o bastante para chamar sua atenção diretamente e ser tão sarcástico quanto sempre. Seus cabelos negros, normalmente soltos, estavam amarrados de lado, pendurados em seu ombro. Uma máscara bastante simples cobria seus olhos, discreta o bastante para sequer ser percebida. Porém, haviam os detalhes das cores da família Minami com seu clássico azul.

— De toda forma — ele voltou a falar — A Eliza trouxe sua mochila do hotel. Ela me pediu para te avisar, caso te visse.

— … A Liz… Entendi. Obrigada.

— Mas… O que infernos aconteceu com você? Sua cara está horrível, e sua voz… Parece meio rouca? Que nojeira.

Quando parte dela se sentiu culpada por ter deixado Eliza com tanto trabalho, Sora destruiu esse sentimento com xingamentos diretos enquanto a analisava de mais perto. Ryota, pela primeira vez, abriu um sorriso sincero e riu com o nariz.

— Se depender das suas avaliações, cabelinho, eu sempre serei horrível.

— É verdade.

Ryota soltou um suspiro ao ouvir Sora, ainda com um sorriso na face. Era reconfortante perceber que, ainda que todas aquelas coisas horríveis tenham acontecido, ele permanecia o mesmo, sem agir diferente com ela. Seus apontamentos eram doloridos, é claro, mas a sinceridade dele a deixava feliz.

— Mas… Até que esta vestimenta ficou bem-proporcionada em você, mesmo com todos os outros quarenta defeitos.

— Nossa, você até contou? Quanta dedicação em me humilhar… Então quer dizer que esse vestido realmente caiu bem em mim? Você me achou bonita?

— Não foi isso o que eu disse.

Sora retrucou rapidamente a interpretação dela, mas Ryota já havia se colocado de pé com um sorriso no rosto, segurando as barras do vestido enquanto girava no lugar para se amostrar. Não apenas uma, mas três pessoas a elogiaram naquela noite. O coração dela, que antes parecia frio e distante, de repente palpitou rapidamente com felicidade. Isso fez com que um pouco de cor voltasse ao seu rosto, as bochechas ficando vermelhas.

Reparando nisso, Sora também sorriu e desfez os braços cruzados.

— Aparentemente, cabeça de vento, você não foi a única que se aproximou da nobreza.

— O quê?

— Parece que alguém ficou bem próximo da dona Sofia.

Sora indicou com o queixo uma dupla de pessoas que estava do outro lado do salão, rodeados de nobres, em uma conversa acalorada. Eram servidos drinks e brindes soavam o tempo todo. Sofia, que parecia ainda mais exuberante e bela que o normal, com seu vestido branco e máscara, encantava os homens ao redor. Ao seu lado, uma figura curiosa também dialogava confortavelmente. Era um rapaz de cabelos violeta e olhos prateados, notável mesmo à distância. 

Ryota congelou no lugar de novo. Mas, dessa vez, uma queimação horrível inundou seu estômago, subindo por seus braços, garganta, e chegando até a cabeça. Seu rosto ficou vermelho de repente, bem mais do que deveria estar.

— Aparentemente, o Zero conseguiu fazer “amizade” com alguém da corte real. Agora ele pode se envolver mais com a nobreza sem parecer um estranho total. Bom, com aquela carranca horrível que ele chama de rosto, até eu viraria as costas para ele. 

Agora que Zero tinha Sofia para apoiá-lo, ele podia se apresentar mais apropriadamente para a nobreza, fazendo seu nome correr pela boca deles e melhorando sua imagem. Isso permitiria que não apenas eles o vissem com bons olhos, mas que, quando pudesse recuperar seu título de lorde, as pessoas da corte o agraciassem sem duvidar de sua índole. 

Ao silêncio da garota, Sora voltou seus olhos para Ryota e reparou que ela mordiscava o lábio.

— Hmm. Que bom pra ele.

— … Ué? Por que essa voz tão dura? Não me diga que ficou com ciúmes?

— Não.

A resposta direta e veloz foi o suficiente para culpá-la, mas Ryota não percebeu que a expressão de desgosto que fazia dizia tudo. Para Sora, foi um prato cheio para que pudesse provocá-la sem parar, dando um sorriso largo — totalmente fora do seu eu comum — enquanto a cutucava incessantemente.

— Ué, ué, ué? Eu estou vendo a Ryota, aquela Ryota pé no saco, cheia de si e faladora ficar com ciúmes? Hmmmm? Quer dizer que o jogo virou? Que interessante ver esse seu novo lado… 

— E-Eu não tô! Me deixa!

O guardião percebeu que, quanto mais a provocava, mais vermelho seu rosto ficava, assim como sua respiração descompassada para tentar se safar daquela situação constrangedora. E, por ser a primeira vez que Ryota passava por aquilo, uma vez que sempre que brincavam dela e Zero ser um casal ela nunca levava a sério, a garota não sabia como retrucar aquelas palavras de provocação.

Então, tudo o que conseguia fazer era fazer bico e responder de forma infantil, virando o rosto e sendo incapaz de encontrar um argumento lógico para rebater Sora. Mas foi justamente por estar se movimentando tanto, os olhos lutando para não voltarem-se para a mesa onde Sofia e Zero estavam, que ela se virou para a mesa de aperitivos e viu.

Logo ao lado deles, a pouco mais de dois metros, havia uma pessoa. Era um homem mais velho, com cabelos brancos e olhos afiados dourados como ouro. Ele usava um terno elegante e tinha uma postura perfeita, mas não se destacava demais em meio aos outros nobres. Uma pessoa discreta, porém, com uma presença impactante quando próxima de alguém. 

O rosto de Ryota se desfez do vermelho e voltou ao tom normal, com ela ignorando totalmente as provocações de Sora. Percebendo que a graça havia acabado, ele retornou ao seu humor usual e inclinou a cabeça.

— O que houve, cabeça oca?

Deslocando os olhos, ele notou o velho parado diante da mesa de aperitivos. Então, após um instante de silêncio, ele percebeu.

— Espere, ele é-

— Albert… É o meu avô.

Ryota conseguiu responder o guardião, soltando todo o ar que havia prendido nos pulmões de uma só vez.



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