Ryota Brasileira

Autor(a): Jennifer Maurer


Volume 5 – Arco 3

Capítulo 42: Olho por Olho, Dente por Dente

Diante de uma ameaça brutal de ataques invisíveis que vinham cortando o ar, a garota estendeu a mão enquanto segurava Lótus e então girou-a como um bastão. Quando uma alta velocidade foi atingida, Eliza retirou sua mão e o cajado permaneceu rodopiando no ar diante dela, criando uma barreira que fez as linhas estourarem e sumirem. Os golpes dados pela mascarada se desfizeram ao contato com o forte selo brilhante em azul, protegendo-a.

Porém, ao contrário dela, o ambiente não teve a mesma sorte. Paredes foram cortadas e o chão rachou. A pressão e poder daquele ataque era impressionante. Não apenas porque a adversária, Lysa, era forte, mas principalmente porque ela estava mal humorada. Em realidade, mais irritada do que nunca seria a definição mais correta.

— Aaaaaaah!! Sua ratinha miserável! Apenas pare com isso e seja acertada de uma vez!!!

Lysa, irada, com veias de exaltação em sua testa, brandou seu braço pelos ares e mais fios voaram na direção de Eliza. Eram como teias de aranha que se desenhavam no ar, tão finos que se tornavam praticamente inviável de se ver a olho nu. Porém, para Eliza, uma vez que ela se mantivesse fazendo movimentos grotescos e estivesse ciente de seu tipo de poder, aquilo não era problema.

Portanto, mais uma vez, quando atacou, a curandeira segurou seu cajado. Porém, fez um movimento diferente. Usou Lótus para cortar o ar como uma espada de cima a baixo. Os fios, então, a este toque, abriram espaço para que seu pequeno corpo atravessasse sem grandes problemas. Mais uma vez, o cenário ao redor foi destroçado graças aos golpes. Porém, as portas permaneciam intactas graças aos selos resistentes de Eliza.

— Pare! Pare, pare, pare, pare com isso! Você não tem vergonha?! Que tal me enfrentar diretamente?! Ficar se escondendo atrás dessas suas coisinhas brilhantes não te levará a lugar nenhum, sabia? Onde está seu orgulho?! Como vai me vencer se apenas ficar na defensiva?!

Lysa, contrariando seu estereótipo de mulher delicada e honrada, bateu seus pés com força no chão enquanto berrava, apontando para Eliza. Apesar de serem provocações baratas dadas por alguém que não conseguia acertar seu inimigo, ela estava correta. Como a garota não era especializada em combate, não possuindo nenhuma forma de ficar na ofensiva, sua única tática era se manter na defensiva. 

— E então?! Que tal me encarar de frente?! Hã?! Hein?! Ou você acha que consegue vencer desse jeito? Que falta de respeito encarar alguém dessa forma! Que tipo de pessoa você é?! Não acha que pode passar por cima de mim desse jeito, não é? Que maldade! Tão pequena e com tanta maldade no coração! Sua feia! Horrorosa! Que frustração! Aaaaaaaaahhhhhh!!!

— … E agora ela tá chorando?

Eliza fez uma careta, torcendo as sobrancelhas, quando viu Lysa mudar de raiva para tristeza em um instante. Ela chorava e berrava como criança, lágrimas escorrendo por seu rosto e máscara. Podia-se ouvir até fungadas de nariz horrendas, completamente o oposto de sua boa aparência. 

— Aaaah! Não me olha assiiiiim…! Eu só queria… Só queria uma luta justa! Que droga! Por que você é tão cruel? Você me odeia tanto assim? O que eu te fiz? Acabamos de nos conhecer, não é? Podia tentar ser um pouco mais legal comigo, não é? Por que precisamos lutar, pra começo de conversa? Dialogar não seria mais adequado?! Aaaaaah! Sua chata! Feia, feia, feia!

Apesar das palavras completamente dignas de um vocabulário infantil, e de ter andado em círculos com o diálogo, retomando um assunto que já havia sido estabelecido há tempos, a mulher criticou o fato de estarem lutando ao invés de conversarem. Embora Eliza tivesse vontade de responder a essas perguntas, ela se recordou que quando tentou, a própria Lysa não quis concordar com seus termos, chegando a conclusões próprias.

— Você é insana.

Essa foi a conclusão que Eliza chegou em voz alta, olhando com acusação para a mulher que ainda era uma completa bagunça de emoções. Entretanto, quando estava neste estado choroso, Lysa não parecia desejar atacá-la, estando completamente concentrada nas próprias lágrimas e lamentos.

— Insana?! O que você quer dizer com isso? Tá dizendo que eu sou maluca?! Sem noção?! Que não consegue pensar sozinha?! Que faltam parafusos aqui?! É isso mesmo?! Você me odeia tanto assim para me comparar com alguém insana?! Por acaso eu pareço maluca pra você?! É assim que você me vê?! Por quê?! Você ao menos sabe o que é alguém maluca de verdade?! Você não deve ter conhecido alguém sem noção antes pra dizer algo assim, pra começo de conversa! Qual é a sua?! Tá tentando me irritar?! Hã?!

— Apenas cale a boca por um segundo!

Cansada daquela falação infinita, Eliza, que agora também pareceu perder a paciência, exclamou enquanto girava o cajado em suas mãos antes de apontar a esfera azul brilhante na direção de Lysa. 

— Você queria um combate? Então escolheu a adversária errada.

Enquanto assim falava, a esfera brilhante de Lótus piscou em faíscas, e então vários selos circulares apareceram ao redor de Lysa. Eles planavam, parados, parecendo carregar um forte poder. Abaixo de seus pés, um ainda maior surgiu. Eram como símbolos com escritas e desenhos que pareciam irreconhecíveis para a mascarada, mas, ao tentar reagir a eles… 

— E-Eu não consigo me mexer!

— Posso não conseguir atacar, mas certamente sei como imobilizar alguém. Por isso…

— O que pensa que está fazendo comigo, sua maldita… Hmmm?!

— … Que tal se começarmos fazendo você ficar em silêncio?

Um dos selos, enquanto Eliza falava, voou contra o rosto de Lysa e grudou. Isso impediu que ela não apenas se movimentasse, mas também falasse. Ele pareceu colar contra sua pele, praticamente se fundindo a ela. Os lábios de Lysa foram selados, mas ela ainda resmungava com a garganta. Seus gritos internos apenas aumentavam de volume e intensidade, como se tentasse expor seus sentimentos em palavras a todo custo — ao ponto de precisar rasgar a própria garganta à força, se necessário.

— Fique parada, um pouco.

Agora que seus lábios foram selados, os demais selos foram atraídos e, como ele, grudaram no corpo de Lysa. Aos poucos, conforme se apertavam contra a pele e restringiam ainda mais seus movimentos, ela se encolhia e ficava na ponta dos pés, os braços grudados no corpo. Lysa de repente se tornou uma figura alta e brilhante, porém magra com restrições o bastante para que até mesmo sua voz fosse abafada.

— Ugh… Ela ainda está lutando?

Eliza sentiu uma pontada de dor na cabeça, suor escorrendo por suas têmporas. Segurou com mais força seu cajado e colocou mais esforço em concentrar seus poderes na esfera brilhante de Lótus, que brilhou ainda mais radiantemente quando mais concentração e poder foram direcionados.

— Mas que insistência…! O quão forte é a mente dessa mulher?!

Mais assustador do que ter seus movimentos restringidos, era ter sua própria consciência tomada. Não importa o quão parado o corpo de alguém estivesse, enquanto a pessoa lutasse e sua mente não cedesse, ainda era possível continuar lutando. Porém, deveria ser diferente quanto o assunto era selos. Era impossível forçar seu próprio corpo a lutar contra algo que era fisicamente impossível de empurrar, embora ainda fosse visível aos olhos. Como era nada mais do que chi concentrado, desenhado e muito bem moldado, o máximo que alguém poderia fazer para impedir de ser selado era ter a capacidade de sugar chi dos outros através de alguma habilidade.

Mas aquele não era o caso. Lysa, ainda que tão pressionada, enquanto sua mente deveria lentamente ser consumida pelas sombras da inexistência, ainda continuava a lutar. Ela não tinha desistido apenas porque estava prestes a ser confinada. As duas forças sobrepostas, que se rebatiam fortemente, faziam o ar vibrar. Reagindo ao poder daquela que os conjurou, os selos ao redor no corredor cintilavam em sincronia. Na escuridão daquele ambiente, a luz celeste era a única coisa que iluminava.

Então, enquanto toda essa concentração era depositada, um som horripilante se ergueu. Era como um grito lamentável e assombrado de uma criatura horrenda, mas que vinha da garganta da mulher selada. Seu corpo, que deveria permanecer perfeitamente imóvel, começou a tremer loucamente, batendo os pés contra o chão em um ritmo assustador. 

— I-Impossível…!

Conforme a crescente quantia se poder era concentrada, mais e mais o corpo tremia. Mais e mais Eliza suava e tinha dores, ao ponto de fraquejar até mesmo para segurar Lótus de forma apropriada. Suas mãos molhadas escorregavam pelo cabo. A luz ficava cada vez mais e mais forte, capaz de quase cegar os olhos âmbar da curandeira. Mas, ainda que não conseguisse focar sua visão diretamente, ainda podia se manter firme. Porém… 

— O quê?!

O som de algo rachando soou em seus ouvidos. Então, Eliza se assustou quando pedaços brilhantes como vidro voaram perto de seu rosto. Seus olhos foram diretamente guiados para a esfera azul de Lótus, que lentamente começava a quebrar. As rachaduras se estendiam mais e mais, bem devagar. 

— Está… Superaquecendo?!

Conforme a quantidade de chi crescia e se expandia, concentrada e imutável, o poder começava a superaquecer a esfera de poder de seu cajado. Eliza nunca havia chegado ao ponto de sobrecarregar Lótus com chi antes, então jamais imaginaria que algo do tipo poderia acontecer. Mas ver que estava prestes a se partir tão facilmente graças à força de vontade de Lysa…

… Eu preciso escolher entre destruir Lótus e soltar Lysa?

Era algo lógico. O problema é que ambas as opções eram excessivamente ruins. Soltar Lysa era o mesmo que desfazer todo o esforço colocado em selá-la até agora. Mas, pior do que isso, era a mascarada se soltar por conta própria depois de fazer a esfera celeste superaquecer e explodir em pedaços. Isso levaria ao mesmo destino da outra opção, porém com um problema ainda maior incluso.

— Tsc… Acho que não tenho escolha!

Exclamando em frustração, Eliza abaixou o cajado e lentamente parou o selamento. Ao invés de interromper completamente, ela escolheu lentamente desfazer a concentração, esperando que isso pudesse impedir a completa destruição da esfera de Lótus. Com uma expressão amarga, observou as luzes dos selos lentamente diminuírem de intensidade até permanecerem com o brilho fosco e piscante como o de um vaga-lume.

— … AaaaaaaaaaaaAAAAAHHHHHHHH!!

E então, um grito eufórico veio de Lysa quando os selos racharam e quebraram como vidro, se desfazendo no ar. Os braços que antes foram apertados contra o corpo forçaram sua abertura, fazendo uma ventania brusca balançar os cabelos de Eliza. Os pés da mascarada novamente alcançaram o solo, batendo com força.

Lysa estava rugindo. Era como uma besta que destruiu sua jaula em fúria, pronta para destroçar qualquer um que estivesse em seu caminho. Os cabelos dela foram completamente soltos, o chapéu tendo caído no chão e pisado por ela mesma no processo. Seus dentes pareceram ficar mais pontiagudos, a boca se abrindo conforme gritava cada vez mais. Os dedos de suas mãos estavam curvados e completamente separados uns dos outros, como se estivesse pronta para atacar. Ainda de cabeça baixa para se estabilizar, Lysa rosnava e rugia. Sua roupa foi rasgada em frangalhos, mantendo somente um pedaço da beleza que ainda restava. Os saltos de sua bota quebraram, finalmente, conforme batia os pés no chão como uma criança birrenta… E bizarramente assustadora. 

— Aaaaaah… Você me deixou irada, criança! — Lysa apontou com com o dedo na direção de Eliza, erguendo o rosto e revelando que um pedaço da máscara havia quebrado. Suas íris de tom cornalina se encolheram em fúria, ganhando um brilho alvo capaz de cortar — Para a merda com isso! Eu não fui paga pra passar por tal humilhação! Vou te fatiar em pedaços e levar embora o Tigre! Aaaargh!

Lysa rosnou para Eliza com uma ferocidade bem diferente das ameaças anteriores. Parecia que, ao invés de estar tendo um surto emocional, agora realmente estava enfurecida o bastante para não recuar para seu estado choroso. A curandeira havia a provocado a tal ponto tentando selá-la, mas sua mente de ferro não permitiu que isso fosse possível. 

Mesmo Eliza recuou diante do terror que aquele ser exalava, apertando Lótus contra o peito e franzindo a testa.

— Tigre?

— Sim, isso mesmo! Eu vim buscar a porcaria daquele gatinho ridículo! Onde ele está?! Me diga agora e lhe darei uma morte rápida, garota!

— Ugh!

Lysa sacudiu os braços com fúria e exigiu respostas, mas Eliza foi incapaz de se defender a tempo do corte em seus braços. Foi profundo o bastante para fazer sangrar gotas gordas, e doloroso ao ponto de largar Lótus contra o chão. A curandeira choramingou baixinho, fungando, enquanto se ajoelhava, começando a se curar.

— E então?! Onde ele está?! Onde-

— Fui eu quem o selou nesta Fortaleza. E, como responsável, não permitirei que chegue até a relíquia.

Tendo fechado seus ferimentos, Eliza rapidamente se colocou de pé segurando seu cajado. Ela parecia claramente exausta, mas não deixou que sua voz transparecesse sua desistência. Ainda que seu chi tivesse sido completamente gasto, ainda deveria proteger O Cristal da Ilusão das mãos daquela mulher horrível.

Foi neste momento que um som ensurdecedor abateu seus ouvidos. Tanto Eliza quanto Lysa escutaram o ressoar de algo que tremeu a Fortaleza, vibrando o ar como um trovão. E, após um instante, cessou. 

A mascarada, de repente, parou completamente. Ela pareceu perceber algo e piscando, incrédula, olhou para a curandeira com os lábios meio abertos.

— … Impossível. Koalem foi… 

— Deve ter sido o capitão Tom — Eliza também concluiu, olhando com alívio para a porta que ainda estava fechada — Então ele conseguiu vencer aquela criatura.

— Não pode ser! Não pode ser, não pode ser, não pode…! Como Koalem foi derrotado tão rapidamente! Isso não… Aquela criatura ridícula! Desperdiçou minha relíquia e meu tempo! Aaaaah! Eu não deveria ter esperado tanto de um morto-vivo feito por testes, não é?! Que merda!

— Um morto-vivo?

Com os ouvidos atentos, Eliza não deixou escapar as palavras ditas pela mascarada, que mais uma vez teve um surto de raiva. Sem se preocupar em guardar mais segredos, ela se virou para a garota e berrou:

— É isso mesmo! Ao contrário do Tigre que é um espírito legítimo, aquelas duas coisas horrorosas foram feitas por experimentos! Eu sabia que eles não dariam certo! Tudo porque insistiram que seriam úteis para mim, mas olha no que deu! Foram derrotados sem fazerem nada de útil! Bando de imprestáveis! Morreram pela segunda vez!! Espero que sofram pela eternidade e suas almas nunca retornem ao Pequeno Sol!!!

Eliza ficou estática observando Lysa reclamar sozinha, indignada com a própria situação. Aparentemente, apenas Koalem havia sido derrotado, mas ela falava como se tanto ele quanto a outra criatura do térreo também tivesse sido. 

— … Esses experimentos… Foram feitos… Em seres humanos?

— Sim, isso mesmo!! Em reles humanos que não tinham mais vontade de viver, se entregando completamente ao seu próprio Destino! É claro, é claro! E eu, como a Autoridade, deveria guiar esses imbecis… Ridículo! Eu odeio o meu trabalho! Morram, morram todos vocês de uma vez! Se não querem viver, apenas se matem!!! Parem de encher meu saco!!! Esses Aprosopos inúteis!! Todos eles, malditos! Só servem para serem sacrifícios mundanos e iscas! É para isso que nasceram, serem usados e descartados como lixo!!! Incluindo Koalem e Anoiem! Morram, morram, morram todos vocês!!!

— Como ousa falar dessa forma?! Eram vidas humanas!

— E quem liga?! Vocês todos vão morrer algum dia, então se não querem mais viver de toda forma, ao menos sejam úteis antes de se matarem, idiotas!!

— Todas as vidas importam! Elas são importantes! É meu trabalho cuidar de suas feridas e garantir que queiram continuar seguindo em frente!

— Cale essa maldita matraca!!

Eliza e Lysa, após gritarem enfurecidas uma com a outra, atacaram. Com seus dedos abertos e prontos para rasgar o pequeno corpo com os fios, a mascarada brandiu os braços como se a atacasse diretamente. Eliza apenas apontou a esfera de Lótus para eles e os desfez… Porém, alguns violentamente atravessaram sua pele, cortando um pedaço de sua coxa fora.

— Aaaaaargh! — Eliza cambaleou e caiu no chão de novo, chorando. Então, bateu a base do cajado contra o chão para se colocar de pé, conjurando um selo para curar seu ferimento — Não ouse… Chamar qualquer vida de inútil. Quem é você para dizer o que elas devem ou não fazer? 

— Eu sou a Autoridade do Destino, Lysa! Quando eu mando naqueles corpos, naquelas carcaças sem alma ou vontade de viver, eles devem me obedecer! 

— Não, eles não devem! — Mais uma vez, Eliza tentou desfazer o ataque dos fios, porém, como havia pouco chi restando, ela recebeu grosseiros cortes no braço direito que estava estendido para a frente. Gemeu de dor, lutando com o pouco chi que tinha para se curar. Sangue escorria e manchava suas roupas. Estava exausta demais para continuar. Mas, mesmo assim, ela jamais permitiria que alguém como Lysa ofendesse vidas humanas daquela forma. Fazia seu coração se apertar em tristeza e corpo ferver em fúria — Você com certeza não deve saber como eles se sentem! Sentir que quer desaparecer, porque não consegue fazer nada direito, porque vive nas sombras de alguém e não pode fazer nada pra mudar isso… Qualquer um desses sentimentos deve ser respeitado!

Conforme falava, Eliza sentia seus olhos encherem de lágrimas e escorrerem por seu rosto sujo de poeira e sangue. Não estava falando apenas pela experiência de ter cuidado de tantas pessoas diferentes, de ter visto a expressão de felicidade em estar vivo ou o puro desamparo de amigos e familiares ao saber que alguém se foi — lembrava de si mesma. Da pequena Eliza que se sentia insuficiente, mas que sempre via na irmã uma inspiração. Ainda que tivesse ido embora e nunca mais voltado, ainda que seus pais a olhassem como Iara e não Eliza no começo, ainda que ela fosse insuficiente em mais áreas do que poderia contar, ainda que diversas vezes tivesse pensado em desistir também, ainda assim… Ainda assim, ainda assim…

— Chega!

Para sua surpresa, Lysa avançou a passos rápidos contra ela e agarrou seu colarinho. Eliza foi incapaz de lutar contra, completamente exausta. O cajado foi jogado para longe com apenas um tapa da mascarada, que agora olhava com uma de suas íris cornalina bem perto das âmbar.

— Apenas cale essa sua maldita boca! Você é uma criança e não tem o direito de falar nada! O que é que você sabe sobre a vida, afinal? Nada!

— Isso não é verdade… 

Um tapa voou contra o rosto da garota. Foi forte o bastante para marcar sua pele, espalhando as lágrimas, o sangue e a sujeira. 

— Calada.

— Eu vi… Muitas pessoas passando por dificuldades… Diferentes…

Outro tapa, dessa vez na direção contrária. Ardia, doía. Ela estava exausta. Seus olhos estavam quase se fechando de tanto cansaço. Mas o coração de Eliza queimava como fogo, não permitindo que caísse. Seus olhos lutavam para olhar de volta para Lysa, que estava exasperada para fazê-la ficar em silêncio.

— Você também… É assim, não é…?

Lentamente, a mascarada soltou a gola que segurava… Para desferir um soco diretamente no nariz da pequena garota, que voou contra o chão, se estatelando. O ar fugiu de seus pulmões e, por um momento, seu cérebro se apagou. Mas logo voltou à consciência quando a mulher sentou-se sobre seu corpo e, em sequência, começou a desferir vários socos em sua face. Nariz, bochecha, mandíbula, olhos… Nada foi perdoado. Cada pequeno pedaço de seu delicado rosto foi ferido.

— Cala a boca! Cala a boca! Cala a boca! Cala essa boca! Cala! A! Boca! Cala logo! Fica quieta! Não fala mais nada! Eu vou estourar essa sua cara! Cala boca! Fica quieta! Cala logo, cala logo, cala logo!

Mas por mais que Lysa assim berrasse sozinha, Eliza havia se calado há muito tempo. Quando o primeiro soco a atingiu, a curandeira percebeu que não poderia mais fazer nada para reagir. Apenas sentiu a dor dos socos, do nariz quebrando, dos dentes sendo arrancados, do sangue voando, da consciência se esvaindo como fumaça…

— Ei.

— Hã?! — Lysa rugiu quando uma voz masculina soou de repente no silêncio do corredor destruído — Quem é você?

— O que pensa que está fazendo?

A voz do homem nas sombras era baixa como um sussurro. Como a luz de Lótus havia desaparecido, estavam praticamente no escuro. Mas, além das sombras, Lysa quase podia ver a feição dele. A feição de um homem enfurecido diante de tal cena.

Percebendo isso, Lysa sorriu, triunfante.

— Quer ver? O estado do rostinho dela?

À essa risada diabólica e crescente de Lysa, que revelava atrás de si uma Eliza completamente destruída e desacordada… Um feixe de luz azul brilhou. Do braço direito do homem, que o estendeu diante do corpo, cresceu uma lâmina brilhante como a água. 

— Antes, que tal você ver o estado dela?

— De quem?

Desta vez, foi Sasaki quem sorriu quando jogou com a mão livre a cabeça de Anoiem. Decapitada de forma lisa. Não havia qualquer expressão de dor ou surpresa. Possivelmente nem sentiu sua própria morte.

O sorriso de Lysa se desfez imediatamente.

— Então era verdade… Anoiem e Koalem foram derrotados ao mesmo tempo… Ai!

Enquanto pensava no que via, a mascarada nem percebeu Sasaki se aproximando, apenas dando um grito de dor quando ele agarrou seus cabelos e arremessou para o outro lado do corredor. Seu corpo bateu contra as pedras, a fazendo tossir por perder o ar.

Mas o foco de Sasaki era na sua discípula praticamente irreconhecível sob os machucados. Com o brilho da lâmina no braço direito, ele a pegou com o esquerdo e segurou-a com carinho. Ele semicerrou os olhos negros quando passou um dedo pelo rastro de sangue e, então deitou-a novamente, fazendo surgir um selo sobre seu rosto. Lentamente, os machucados começaram a cicatrizar e restaurar.

— Muito bem, então — Virando-se para Lysa, que havia se colocado de pé, a dupla se encarou — Como era mesmo aquele ditado? Olho por olho, dente por dente? 

Um sorriso maléfico se desenhou no rosto de Sasaki quando assim pensou, fazendo crescer outra lâmina em seu braço esquerdo e preparando-se para o combate.



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