Ribeira dos Desejos Brasileira

Autor(a): Rhai C. Almeida


Volume 1

Capítulo 7

Dia 20 | Ano 1***

22:45 PM

 

No caminho de volta para casa, a estrada de terra deixava as marcas das pisadas de Asher. A floresta silenciosa era regada pelas gotas de chuva que se intensificavam, e os habitantes selvagens, agora escondidos, recuavam para suas tocas.

As botas de Asher estavam pesadas de lama, ressoando grudentas em cada passo antes que ele se deparasse, sua mente atordoada, com uma raposa parada à sua frente.

Ele observou o animal imóvel, encarando-o como se um único movimento fosse uma sentença diante do inimigo.

— Por que está parada? — ele perguntou à criatura, o vento uivando pelos galhos das árvores. — Está zombando de mim? — Ele bateu o pé no chão.

Assustada, a raposa disparou para a mata, e Asher, virando o olhar para cima, avistou as lamparinas acesas na casa de Rose. Com o maxilar tensionado, ele seguiu em direção à residência, envolto pela chuva impiedosa.

Determinado a manter sua palavra, Asher ignorou a ponte de tábuas e permaneceu inerte diante da porta, apanhando a carta, esta, para sua surpresa, seca e muito bem protegida. No entanto, ao fitá-la, escolheu por deixá-la no chão. Mas, momentos depois, quando já se virava para partir, ele, de súbito, parou, agarrando os cabelos de sua cabeça, com raiva de si.

— Argh! Que merda! — ele arquejou, batendo na porta. — Rose!

Porém, ninguém atendeu.

Toc, toc.

Novamente, nenhum sinal.

Então, Asher caminhou para o lado e bisbilhotou pela janela. E em menos de três segundos, a porta se abriu.

— Pois não? — indagou Timothy. E, ao constatar a figura impaciente, ele arqueou uma sobrancelha, intrigado ao ver quem era. — Asher… há algum problema?

— Onde está a Rose?

Timothy ponderou antes de respondê-lo. — Não é uma boa hora. — Ele apoiou a mão na guarnição.

Asher o encarou, franzindo o cenho. De sua respiração, o ar condensado era levado pelo vento da noite fria. Ele não estava com paciência, tão pouco satisfeito com tal fala.

— Onde ela está? — ele exigiu, seu tom incisivo.

— Está tarde, Asher. — Timothy andou um passo à frente dele. — Volte outra hora.

Apesar da estatura de Asher superar a dele, Timothy não se preocupava com a sua voz áspera, especialmente diante do seu semblante atordoado.

De repente, por trás de Timothy, Rose apareceu.

— Asher? — ela perguntou, confusa com a sua presença. — O que faz aqui tão tarde? — Ela cobriu os braços com um xale.

Asher fixou os olhos na expressão apática de Timothy, indo ao encontro de Rose ao mostrar a carta.

— Sua amiga me pediu para entregar isso a você. Esqueci de perguntar o seu nome, mas ela quer falar com você amanhã de manhã. De qualquer forma, deve estar explicado na carta.

— Obrigada. — Olhou para a roupa dele, molhadas como as mechas de seu cabelo. — Você não quer entrar e tomar um chá? Está muito frio aí fora. — Ela pegou na mão dele e o puxou para dentro.

Após a ação inusitada, Asher analisou a expressão de Timothy. Um traço de provocação tomou o seu rosto enquanto era escoltado para dentro da casa.

E, sentado em uma poltrona velha, ele aceitou a xícara de chá das mãos de Rose, seus rostos banhados pela suave luz das lamparinas.

Ela trajava uma camisola levemente transparente, e sua silhueta se delineava pelas sombras.

— Por onde esteve, Asher? — Timothy proferiu, suas palavras com uma relutância que ele não conseguia esconder. — Você parece exausto.

Asher, entretanto, deu um pequeno gole no chá, fingindo não ter ouvido a observação de Timothy.

— O chá está bom — ele elogiou, distraído.

— E está fedendo à bebida — retrucou Timothy, os braços cruzados sobre o peito.

O olhar de desaprovação de Rose pousou sobre Asher ao constatar a sua embriaguez. — Você prometeu que ia parar de beber — ela comentou.

Apático diante da repreensão, Asher revirou os olhos, questionando-a:

— Por que isso a incomoda tanto? Foram só alguns goles.

— Porque você e o álcool não se dão bem! — Rose tocou na testa dele, preocupada com a forte febre. — Já se esqueceu da última vez?

— Estou bem — respondeu, inclinando a cabeça na mão dela.

Os olhos de Asher estavam vidrados em Timothy. Ele esperava alguma reação.

— Suas mãos estão frias. — Asher puxou o pulso dela. — Que tal esfregá-las em algo quente e…

— Ele está bêbado! — Timothy cortou, elevando o tom da voz. — Asher, vá embora! — mandou, resoluto em sua exigência.

Apesar da presença dele, Asher permaneceu indiferente, depositando um beijo na palma da mão dela.

— Acredite em mim, Rose — ele murmurou.

— É melhor você ir — ela respondeu, conforme as ordens de seu marido, afastando seu toque dele.

— Você não confia em mim? — Asher ergueu os olhos para ela, rendido enquanto seus lábios ansiavam por percorrer o braço dela.

Contudo, num instante, Asher reparou nas recentes marcas no pescoço de Rose, onde o xale não conseguia esconder. Ele analisou o cabelo ondulado de sua amiga, solto, livre das tranças; a clavícula marcada e seu corpo relaxado.

Então, após perceber que Rose recebeu uma atenção especial, Asher se levantou e andou até a porta.

— Asher? — ela indagou, confusa.

Ao cessar os passos para fora da casa onde Timothy aguardava para fechar a porta, Asher falou:

— Ela não é a sua puta de estimação. — Foi um golpe direto.

E Timothy não se calou.

— Está certo. Não preciso me submeter a um lugar cheio de vadias — rebateu Timothy. — Ela é minha esposa, mas para você, sempre será apenas uma amiga.

— Se você fosse competente, ela não estaria nem andando — sussurrou Asher. — Que tal aprender com alguém mais jovem como se faz?

Rose viu o semblante de Timothy mudar drasticamente, tomando uma expressão sombria.

— Timothy… — Ela segurou o braço dele.

De repente, o choro abafado da menininha ecoou pela casa.

— Veja como ela está, por favor — Rose insistiu.

Timothy assentiu, seus olhos oscilando entre ela e Asher. Assim, sem demora, ele foi até o cômodo.

— O que deu em você? Ficou louco? — Rose indagou, a decepção evidente em sua voz arrastada.

— Haha! — Asher soltou uma risada curta e sarcástica, em seguida inclinou o queixo para cima e soltou uma respiração profunda, sobretudo, exausto. — Eu já cumpri com a minha palavra.

— O quanto você bebeu? — Ela se aproximou dele.

A forte chuva formava pequenas poças de lama ao redor da moradia, e o gotejo da calha de madeira se transformava em um grave ruído.

O temporal se tornou impiedoso, mas isso não o incomodava.

— Pare de agir como uma mãe comigo, Rose! Não combina com você! — Ele desceu os degraus, afundado as botas na lama.

— Asher, na chuva não! — ela repreendeu. — Asher! — Rose fechou os olhos, as gotículas da ventania molhando seu rosto e suas roupas enquanto seus cabelos voavam no ar.


Capítulo novo toda sexta.

 

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