Volume 1
Capítulo 4
Dia 15 | Ano 1***
07:20 AM
Afastado da paisagem campestre, no topo de um morro onde o vento uivava, barracas estavam montadas, e alguns soldados mantinham vigília no local.
A guerra ainda estava em curso, e um homem de cabelos ruivos acobreados parcialmente ondulados, que pareciam as folhas do outono, observava o outro lado da colina com seus olhos verdes, semelhantes à paisagem da ribeira.
Ele analisava com atenção meia dúzia de soldados, cujos corpos estavam cobertos de cinzas, enquanto outros estavam cheios de ferimentos, arranhões e até perfurações das espadas e mosquetes da disputada batalha.
— Timothy? — falou um homem mais velho, com um tapa-olho e várias cicatrizes menores em seus braços. Sua voz era de surpresa, porém, feliz ao vê-lo. — O te traz aqui, rapaz?
— Velhote!
Os dois apertaram as mãos e se abraçaram, alegres pelo reencontro.
— Estou de folga hoje. Como tem passado? Alguma novidade?
— As mesmas histórias de sempre. Hoje perdemos um de nossos homens em uma emboscada. Os malditos cortaram caminho através das árvores e torturaram o coitado até os lobos darem um fim nele. Ele teve a língua cortada. — O velho olhou para o túmulo enquanto cavavam uma sepultura para havia restado do corpo do jovem.
— Ele tinha família?
— Era apenas um garoto, tinha dezesseis anos. Seus amigos contaram que ele estava buscando uma flor para sua irmã quando tudo aconteceu.
— Pobre rapaz — comentou Timothy, com pesar.
— É bom ver você de novo, rapaz. E o seu braço, está melhor?
— Diria que está melhorando, mas continuo tentando me acostumar com as consequências da fratura. Sinto que meu ombro e meu pulso não têm a mesma funcionalidade de antes. — Ele moveu o braço direito em várias direções — um tanto abatido, mas conformado.
— Ouvi dizer que você agora é pai — disse o velho, o sorriso visível em seu rosto. — Será que o bebê será tão travesso quanto o pai?
— É uma menina, tão adorável quanto a mãe.
— E como está a Rose?
— Acredito que esteja bem. — Respirou fundo. — Nós nos afastamos um pouco…, sabe? A mãe dela tem atrapalhado bastante a nossa relação. — Ele dobrou os braços no peito.
— Você deveria procurar um lugar para viver com a sua esposa, garoto. Ou traga sua sogra para que eu possa dar um jeito nela. — Ele balançou o corpo para frente e para trás — um gesto desnecessário na visão de Timothy.
— Deixe de brincadeira, Hobert. É nojento. — Um riso escapou de seus lábios.
— Ah, qual é o problema? — brincou Hobert, dando um leve tapa nas costas dele junto de um sorriso.
Ao centro da cidade, Rose estava parada à entrada do mercado movimentado. Várias pessoas fluíam entre as barracas, examinando vegetais, tecidos e uma variedade de especiarias. Ali, casas serviam como estabelecimentos comerciais, espaços de descanso e até mesmo locais de entretenimento para adultos, todos agrupados no coração da pequena comunidade.
— Você está bem? — Asher amarrou o cabresto do cavalo em uma cerca.
— Sim. Obrigada pela viagem. — respondeu com um sorriso gentil.
— Levou mais tempo do que o esperado, mas fico feliz que tenha gostado. — Asher entregou-lhe a cesta, que parecia pequena em sua mão.
Antes de partir, Rose segurou a mão de Asher, dizendo:
— Desculpe por antes. Você não precisava ouvir nada daquilo.
Contudo, ele se afastou e apanhou sua bolsa de Varlosy. E de costas para ela, Asher firmou a alça no ombro.
— Você está certa. Eu não precisava ter ouvido.
O corpo de Rose deu um leve salto, sua feição abatida pela resposta.
— Você sabe que eu faria tudo por você.
— Obrigada…
— No entanto, também sei que não estarei presente em todos os momentos da sua vida.
— O que você… quer dizer? — Ela encarou os ombros dele.
— Eu não sou seu irmão, Rose. Nem mesmo o seu pai. — Ele a fitou por alguns segundos. — Eu sou o seu amigo, e não importa qual escolha você tome, eu confiarei na sua decisão.
— Mas, você é mais que um irmão para mim! Você sabe disso, não sabe? — ela rebateu, dando um passo à frente.
— Eu agradeceria se você me tratasse como um estranho de vez em quando. — Ele mostrou um sorriso no canto dos lábios, mesmo que sua feição revelasse um certo desgosto.
— Por quê? — Ela comprimiu os lábios. — Eu disse algo que não deveria de novo?
— Não. — Asher avançou na direção dela e pousou sua mão sobre sua cabeça. — Você não disse nada de errado. Só quero que saiba que eu sou seu melhor amigo, e somente seu. — Ele sorriu. — Estarei com você, sempre que precisar.
— Você é esquisito. — Um sorriso discreto se desenhou em seus lábios.
Aos passos que se distanciava, Asher piscou para Rose e, em alguns segundos, desapareceu entre a multidão de moradores. Por outro lado, Rose apenas o observou partir, sem a certeza de quando, ou se o veria novamente.
E, mais adiante, Asher, envolto pela agitada multidão que parecia prensá-lo e ao som das vozes que se aglomeravam, capturou, pelo canto dos olhos, uma figura familiar.
Era um homem mais velho que ele, encostado no muro de uma casa comercial enquanto fumava um cigarro, fitando-o.
Num instante, Asher parou, surpreso com o encontro inesperado.
— Quanto tempo, hein? — O homem, barbudo e com a típica barriga de alguém íntimo com a bebida, soltou a fumaça pelo nariz.
Entretanto, Asher retomou a caminhada.
— Não finja que não me reconhece, filho.
Assim, o jovem caçador atravessou o mercado, a cada passo mais afastado da vila; das incessantes vozes em seus burburinhos. Em poucos segundos, ele se aproximava da floresta e da lama, do ar fresco e do cervo vigilante que, ao mover suas orelhas, detectou a presença de um intruso, um inimigo de passos silenciosos na mata.
À espreita.
Em um lento movimento, Asher empunhou seu arco. Seus olhos estavam afiados, como de um predador, fixos no animal. E firme em sua mão, uma flecha, pronta para ser lançada contra sua presa, preparado para abatê-la.
Incapaz de fugir.
Capítulo novo toda sexta.
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