Ribeira dos Desejos Brasileira

Autor(a): Rhai C. Almeida


Volume 1

Capítulo 12

Dia 26 | Ano 1***

16:30 PM

 

Pelas ruas da cidade, Rose acompanhou sua tia em uma caminhada tranquila. Juntas, visitaram diversas lojas, experimentaram vestidos elegantes e saborearam deliciosas guloseimas, aproveitando cada momento do dia. Durante o passeio, os pensamentos de Rose vagavam para Timothy, lembrando-se de seu cuidado com a pequena irmãzinha e apreciando o raro instante de paz ao lado da tia.

— Sentirei saudade — disse Rose, apertando suavemente as mãos de Ada, cujo  marido esperava na carruagem, com uma aparente indiferença à presença de Rose.

— Não se esqueça de que estarei ao seu lado para o que precisar. — Ada beijou a testa da sobrinha com carinho. — Quando sua mãe parar de se esconder de mim, diga a ela que eu quero conversar.

— Tudo bem.

Após as despedidas, Rose seguiu pelo trajeto ladeado por flores, imerso pela vegetação verdejante exuberante. O canto das cigarras preenchia o ar, enquanto os pássaros voavam em revoada, e o vento afastava lentamente as nuvens. Ao olhar para o céu, Rose notou uma ave planando sobre uma cabana solitária. A moradia pertencia a um caçador misterioso sobre o qual ela tinha suas dúvidas se realmente conhecia.

“Nossos sentimentos podem ser venenosos, mas você é a única que pode ser imune a eles. Não permita que sua indecisão machuque outras pessoas.” — O comentário de sua tia reverberou em sua mente e, num impulso repentino, ela acelerou os passos.

Na subida até a casa, Rose verificou as janelas da entrada. Como suspeitava, ele não estava lá. Sentindo-se desanimada, adentrou a floresta além da ribeira, um lugar que parecia guardar todos os seus segredos. Seu reflexo era espelhado na água e, sem um plano definido, ela se perguntava se o encontrar poderia trazer a resposta para o incômodo em seu coração.

De repente, um som estranho ecoou próximo a ela, como se algo estivesse sendo arrastado pela folhagem. Movida pela curiosidade, Rose avançou com passos leves, quase na ponta dos pés, esgueirando-se entre os imponentes troncos das árvores.

Ela fixou seu olhar atento em uma área mais profunda da ribeira, onde a água caía em uma pequena cascata. Lá, avistou um torso masculino com os ombros tensionados, puxando uma corda amarrada nas pernas de um cervo abatido. Não era outro senão o caçador das redondezas.

— Asher… — sussurrou ela, seguindo o jovem silenciosamente. Pelas roupas enlamaçadas, ficou claro que a caçada não fora tão fácil quanto ele muitas vezes fazia parecer.

Quando o viu subir até a cabana, Rose decidiu observá-lo a uma distância segura, onde acreditava que ele não a notaria. Inicialmente, seu coração estava decidido a conversar com ele, mas ela cedeu à curiosidade de vê-lo trabalhar.

Ao entrar na pequena cobertura atrás da cabana, Asher guardou sua caça e, conferindo suas vestes sujas, dirigiu-se com um balde de volta para a floresta. Rose, determinada a segui-lo, esperou cautelosamente que ele estivesse a uma distância segura, fitando-o entre as folhagens que, em parte, ofuscavam sua visão.

Após alguns segundos, Asher parou na parte mais funda da ribeira, um lago cuja existência Rose desconhecia. Esgueirando-se por trás de um tronco, viu quando ele retirou a camisa e desatou os fios que sustentavam a cintura de sua calça, revelando os músculos definidos. 

Seu coração acelerou. Rose desviou o olhar no mesmo instante, sem saber como reagir.

E imerso na correnteza, os ombros largos e musculosos e os cabelos escuros encharcados eram visíveis. Ela conseguia imaginá-lo perfeitamente, mas não teve a coragem de observá-lo diretamente, mesmo após o som da água batendo, como se estivesse se atirando em um grande salto.

E num ato deliberado, ela voltou sua atenção para ele. Os olhos de Rose se arregalaram ao perceber que a água cobria metade do corpo de Asher, do quadril para baixo. Ele retirava a água que havia entrado em seu ouvido, enquanto suas roupas estavam penduradas em um galho de árvore.

Após um breve instante de contemplação, Rose se agachou, onde uma série de pensamentos conflitantes a invadiu, convergindo para uma única pergunta: 

Devo falar com ele? 

Discretamente, ela virou metade do rosto em sua direção, seus olhos percorrendo o corpo dele. Seu olhar vagava pelo abdômen, pelos braços, e se detinha na expressão distante de Asher. Era a primeira vez que Rose observava com tal minúcia um corpo masculino e percebia como podia ser belo, tão atraente quanto a sensação de tocá-los sob os tecidos finos que ela costuma consertar para seu esposo.

Perdida em seus devaneios, Rose não notou o tempo passar. Asher, que estava à beira do lago, levantou-se, vestindo as calças, e em seguida mergulhou a camisa na água, esfregando-a antes de torcê-la. Ao se levantar com cuidado, Rose escorregou em um galho, e o som da sola de sua bota quebrou o silêncio, atraindo a atenção de Asher.

Merda! — pensou, escondendo-se atrás do tronco. No entanto, ele continuou onde estava, torcendo a camisa. Para o alívio dela, que, sem perceber, deixara a bainha do vestido exposta, desatenção que não passou desapercebida pelo olhar gélido de Asher.

— Você pretende ficar aí por quanto tempo? — perguntou ele, sua voz soando indiferente, como se a presença dela fosse algo corriqueiro.

Rose sentiu seu coração apertar, como se todo o esforço em se esconder tivesse sido em vão.

— Eu sei que é você, Rose — falou Asher, olhando para a água cristalina.

Sem escapatória, Rose, com suas tranças caindo sobre os ombros e o rosto levemente ruborizado, perguntou:

— E-Eu posso olhar?

— Isso vai depender de você. — Ele sorriu. — Você não acha que já olhou o suficiente?

— Eu não sou uma pervertida! — retrucou, incomodada com a acusação.

— E eu disse que você é? — respondeu, apático. — O que você quer?

Rose percebeu a entonação ríspida em sua voz, sentindo-se constrangida e desconfortável.

— Desculpe-me por segui-lo com a intenção de conversar — disse, tentando manter a compostura.

— E o que estamos fazendo agora não é uma conversa? — Ele apoiou os braços para trás, observando-a do outro lado da correnteza. Ela e suas sobrancelhas franzidas. 

— Você não vai nem se desculpar pela maneira ridícula como me tratou quando estava bêbado? — ela exigiu, incrédula com a postura desleixada dele.

— É verdade, fui um idiota — confessou ele sem hesitar. — Mas de que adianta eu me desculpar se já deixei bem claro o que sinto por você? Não acha tolice pensar que eu ficaria bem com isso?

— Perdão? — Rose estava inconformada. — Se queria tanto saciar seus desejos, por que não teve coragem de se declarar desde o começo? Timothy me contou que você estava prometido para a irmã dele, e mesmo assim, foi um covarde!

— Você acha mesmo que eu não tentei? — Ele se levantou, frustrado, entrando na água. — Esqueceu que sempre fui apenas o filho de um caçador? Nunca fui nada além de um capacho nas mãos dos outros! — Asher atravessou o lago, dirigindo-se a ela, completamente indignado.

— E eu tenho culpa? — Ela olhou fundo nos olhos dele. — Sempre o vi como um irmão, meu melhor amigo! E agora, você quer que eu aceite seus sentimentos? Tenho uma família, acredita mesmo que eu trocaria eles para ficar com você?

— Durante todos esses anos, nunca exigi mais do que sua amizade — expôs, seu rosto perto o suficiente para ela sentir sua respiração, e as gotas de água caindo de seu cabelo encharcado. — Então por que, agora que finalmente tive coragem de dizer o que sinto, parece que você não confia mais em mim? — Ele tocou delicadamente o rosto dela, fitando-a intensamente.


Último capítulo próxima sexta.

 

Acompanhe também o retorno de…

Príncipe de Olpheia



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