Ribeira dos Desejos Brasileira

Autor(a): Rhai C. Almeida


Volume 1

Capítulo 10

Dia 21 | Ano 1***

Madrugada

 

Imerso em seus pensamentos, Asher se encontrava sentado, absorto pelo fogo ardente. A luz alaranjada das chamas espelhava em seus olhos, dominados pelo brilho intenso e vivo do fogo. Sem se preocupar em mudar de roupa, ele se acomodou de maneira despojada na cadeira voltada para a lareira, capturado pelas memórias distantes de sua juventude.

Sete anos atrás.

A guerra prosseguia implacável, ceifando vidas no campo de batalha. Apesar de ser um mero fragmento de seu passado, a lembrança de uma garota dois anos mais nova que ele, que costumava visitar sua casa com suas tranças desordenadas, permanecia clara em sua mente.

— Asher! — A voz de Rose ecoou pelo ambiente, correndo para alcançá-lo. Seus olhos brilharam de empolgação e suas bochechas estavam coradas.

— Quer me acompanhar até a ribeira? — perguntou, ofegante.

À beira da água inquieta, Rose entregou-lhe uma coroa de flores que havia habilmente confeccionado.

— Fiz para você. Flores azuis e amarelas, porque lembram a cor dos nossos olhos.

— Obrigado — disse Asher, um pequeno sorriso surgindo em seus lábios.

— Isso simboliza nossa eterna amizade. — Rose colocou a coroa sobre a cabeça dele. — Seremos amigos para sempre! — Sorriu largamente. — E eu sei o que você vai pensar, mas eu gosto de ressaltar isso.

O olhar de Asher permaneceu fixo nela. Seus olhos tinham um brilho sonhador; ele estava determinado a preservar aquela amizade.

— Sua trança está bagunçada — observou, olhando para o cabelo dela.

— Você sabe fazer tranças? — Rose ajustou os fios em suas mãos. — Faça duas para mim.

Sem hesitar, o inexperiente rapaz começou a trançar os cabelos de Rose, suas mãos leves e delicadas.

Era uma memória vívida, um sonho de infância que ele guardava para escapar da realidade cinza que experimentara desde cedo. No entanto, essas memórias também incluíam dor.

— Seu moleque insolente! — bradou o homem, chutando o peito de Asher com fúria enquanto o jovem estava caído no chão da casa.

Asher gemeu de dor, tossindo uma mistura de saliva e sangue após o último chute. Sua mãe, inerte na cadeira, tragava o cigarro e observava as agressões com aparente desinteresse.

“Não é da minha conta”. Seus olhos azuis, cintilantes pelo reflexo do fogo da lareira, diziam isso.

Os órgãos de Asher, exceto o coração, pareciam pulsar de dor. Suas costelas doíam, mas com o tempo, aquela dor deixou de ser um problema, tornando-se parte do que ele havia se tornado.

Indiferente aos segundos que passavam, Asher não moveu um músculo. Sentia-se derrotado, enfastiado, a água escorrendo por seu braço e gotejando no chão enquanto a brasa crepitava na lareira.

— Rose… — murmurou, seus olhos fechados enquanto o rosto dela surgia em sua mente, atormentando-o.

A menininha que sempre sujava suas roupas e se escondia atrás dele quando sentia medo, havia crescido. Ela amadureceu. Tornou-se uma mulher, tão linda que seus sentimentos confusos não conseguiram se controlar.

A voz dela sussurrava em seus ouvidos. Suave e insistente. Sua figura era como uma aparição, chamando-o em sua imaginação.

— Asher… — A voz da figura ardilosa soou em um gemido, desejando-o ao ponto de Asher não conseguir distinguir se era um sonho ou um pesadelo.

A imagem nítida de Rose, com o sorriso que parecia carregar o verão; os olhos como mel na primavera, e os lábios rosados que eram sua tentação, estava mais próxima do que nunca.

O suor escorria pela testa de Asher, enquanto ele, com a mão cobrindo metade do rosto, não conseguia deixar de pensar nela. A face de Rose atraía-o em seus pensamentos, como se ela dependesse de seus braços, desejando-o entre suas pernas.

— Rose… — Ele ofegava no sonho, do qual não conseguia despertar, provando cada centímetro do fruto de sua tentação. A voz dela oscilou, implorando por ela ao mesmo tempo que seus delicados dedos finos afundavam nos cabelos dele.

Ele não conseguia parar. Estava rendido. Não importava quantas vezes Asher ouvisse a voz dela, ele já estava no seu limite.

— M-Merda… — Sua voz estremeceu, um último suspiro escapando quando ele, olhando para baixo, percebeu que não poderia parar. Seu peito subia e descia rapidamente, até finalmente elevar-se do êxtase. — Hah… — arfou, controlando sua respiração. — Merda… 

Ao amanhecer, Rose, com os braços envoltos no abraço de sua amiga, se despediu, acenando para ela e seu parceiro enquanto a grande embarcação se afastava do cais. As gaivotas alçavam voo e as tranças da jovem de semblante taciturno se moviam no ar. Assim como o vento soprava sem hora certa para refrescar o ambiente, Rose não conseguia deixar de pensar nas diversas respostas que poderia ter dado a Asher.

Ela se lembrava claramente do rosto dele, da expressão séria ao se declarar, marcada por uma tensão, como se estivesse tomado pelo medo. De repente, ao avistar uma carruagem na estrada de pedras, ela notou a figura de uma mulher vestida com trajes da alta sociedade e, junto dela, um chapéu adornado com uma pena que ocultava seus cabelos.

— Rose! — A mulher acenou de dentro da carruagem, convidando-a.

Após certo tempo, a carruagem, que antes seguia pela estrada da cidade, agora estava parada, com rodas sujas de lama, perto de uma simples casa. No entanto, aos olhos da mulher, tudo estava como ela se lembrava. Ela observou as cortinas remendadas, sem dar muita importância para o estado do chão. De todas as tarefas domésticas, o chá feito por sua sobrinha era o que ela mais apreciava.

— Estava com saudade deste sabor. — Ela sorriu. — Você sempre fez um ótimo chá.

— Obrigada, tia. — Rose notou a expressão curiosa da mulher, cujo semblante lembrava o de sua mãe.

— Você cresceu. Está linda, querida — comentou, feliz por vê-la saudável. — Como está sua mãe? Continua irrepreensível como sempre?

— Ela não mudou muito… — Rose desviou o olhar para o bule. — É a mesma de sempre. — Seus lábios se comprimiram em uma linha fina.

A mulher, cujos cabelos lembravam o rubro de uma joia de rubi, ao avaliar a expressão distante de sua sobrinha, falou:

— Estou hospedada na cidade. Meu marido está ocupado e tenho pouco tempo para mostrar as vantagens de um futuro comigo.

— Esse era seu objetivo desde o princípio, tia Ada? — Rose soltou um suspiro, nada surpresa. — Ou deveria chamá-la de vossa excelência, duquesa Ada?

Ada fitou os olhos de Rose, os mesmos olhos expressivos de sua irmã. Tão astuta como uma raposa ao perseguir sua presa, e soturna como uma coruja na quietude do crepúsculo.


Capítulo novo toda sexta.

 

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