Volume 2

Capítulo 3: O Resgate; e a Desintegração do Grupo Traidor

— 8 de Setembro —

“Bom dia, Senpai! Obrigada por ontem!”

Como sempre, Ichijou-san estava me esperando em frente à minha casa. Seu sorriso parecia mais suave do que o normal hoje. Alguns trabalhadores e estudantes do ensino fundamental que passavam olharam para ela surpresos, claramente impressionados com sua beleza.

“Bom dia. E agradeço também — vamos ver outro filme qualquer dia desses.”

Respondi um pouco sem jeito, e ela assentiu em resposta.

“Parece ótimo. Ontem foi um filme ocidental, então que tal um japonês ou um anime da próxima vez? Você viu algo recentemente, Senpai?”

Fiquei feliz por ela ter mencionado filmes. Se não fosse por isso, provavelmente teria lembrado do beijo de ontem e tornado esta manhã incrivelmente constrangedora. Graças ao nosso hobby em comum, a distância entre nós com certeza diminuiu. Tudo por causa da Mamãe, que amava filmes e dramas de TV — agora estou me aproximando da Ichijou-san por causa disso.

Começamos a andar, com a nossa conversa sobre filmes fluindo imediatamente.

“Ultimamente, tenho curtido filmes indianos.”

“Você quer dizer aqueles longos com danças?”

“Na verdade, muitos filmes indianos mais recentes nem têm tanta dança. Eles ainda são longos, claro, mas em vez de números musicais, geralmente tocam canções enquanto mostram paisagens naturais belíssimas. É realmente majestoso — super impressionante.”

“Isso parece interessante.”

É, acho que é bem raro um colegial curtir filmes indianos. Ri de mim mesmo por ter falado nisso.

“Tem alguma recomendação?”

“Surpreendentemente, os filmes indianos têm ótimos dramas humanos também. Eles têm alma — meio como os antigos filmes japoneses da era Showa. Claro, as cenas de ação também são boas. Recomendo Bajrangi Bhaijaan — é sobre um homem bondoso que encontra uma garotinha perdida de um país vizinho e embarca numa grande aventura para reuni-la com sua família.”

“Isso parece incrível!!”

“É de chorar. Se você estiver no clima para algo emocionante, é perfeito.”

Assisti num domingo à noite e chorei tanto que na segunda-feira o Satoshi comentou como meus olhos estavam inchados. Como a Ichijou-san parecia do tipo que vê muitos filmes, achei que valia a pena mencionar um indiano menos conhecido. Ela rapidamente abriu um site de filmes no celular e salvou o link.

“Obrigada. Vou assistir no fim de semana.”

Ela disse isso com um sorriso radiante.

“Senpai, mudando um pouco de assunto... o que você vai fazer com a história que escreveu?”

O manuscrito que a Ichijou-san tinha salvado desesperadamente para mim ainda estava comigo. Eu tinha planejado publicá-lo no jornal do clube, mas isso não ia mais acontecer. Ainda assim, parecia um desperdício deixá-lo para sempre na gaveta. É uma história curta, então não é longa o bastante para inscrever em um prêmio literário. Eu não sabia o que fazer com ele.

“Ainda estou pensando.”

“Então que tal postar num site de web novel?”

“Mas minha história não é fantasia nem comédia romântica — não é algo popular. Duvido que muita gente fosse ler.”

“Sério? Achei realmente boa. Eu queria que mais pessoas pudessem ler.”

“Obrigado. Mas postar online exige coragem. Podem vir comentários cruéis, e ver notas baixas pode ser desanimador.”

Quando se tratava do meu próprio trabalho, eu era bem pessimista. Ela sorriu gentilmente para mim.

“Bom, ter um escritor pessoal não é tão ruim assim.”

Nós dois rimos da piadinha dela. Ela realmente é gentil. Com certeza percebeu que eu estava lidando com algum trauma. Eu não queria simplesmente recusar, então comecei a dizer que ia pensar a respeito, mas então—

Algo aconteceu.

Bem na nossa frente, um incidente repentino ocorreu.

“Ugh—” Um senhor de idade que caminhava à nossa frente levou a mão ao peito e desabou.

“Eh—” Ichijou-san ofegou, virando-se para mim com uma expressão preocupada.

Eu fiquei congelado, incapaz de reagir, apenas encarando a cena.

O velho respirava com dificuldade, depois parou de se mexer completamente.

Isso é ruim.

Durante as férias de verão, eu trabalhei em um emprego temporário ajudando a montar eventos e participei de um treinamento de RCP. Lembrei do rosto do bombeiro que nos ensinou. Ele explicou como lidar com situações assim, não só em eventos, mas em qualquer lugar.

Eu tenho que fazer isso. Vai dar tudo certo — só preciso fazer o que aprendi naquele dia no treinamento.

“É sério. Ichijou-san, vá procurar um DEA!”

Salvar a vida desse homem vinha em primeiro lugar.

“Mas onde é que teria um...?”

Ela ficou paralisada, o rosto pálido.

“Tem um posto policial ali perto, certo? Tenho quase certeza de que eles têm DEAs lá. Mesmo que não tenham, os policiais devem saber onde encontrar um. Às vezes, até em lojas de conveniência tem. Eu vou ligar para a ambulância e cuidar dele aqui.”

“T-Tá, entendi!”

Ela disparou na direção do posto policial.

Segui o procedimento que aprendi no treinamento — verifiquei a consciência do senhor, chamei por ajuda das pessoas ao redor e comecei a prestar os primeiros socorros.

Um homem de meia-idade, gentil, imediatamente usou seu celular para ligar para a ambulância.

Agindo puramente por instinto, fiz tudo o que podia para ajudar o velho.

Ichijou-san logo voltou com um policial e um DEA.

Enquanto preparávamos o DEA, uma mulher na casa dos trinta se aproximou de nós.

“O que aconteceu?”

“Esse senhor — não o conhecemos — de repente levou a mão ao peito e desabou. Já ligamos para a ambulância e trouxemos um DEA. Mas ele não responde de jeito nenhum, por mais que tentemos falar com ele.”

“Obrigada. Eu sou enfermeira, então assumo daqui. Qual é o seu nome?”

“Aono.”

“Aono-kun, certo. Bom trabalho agindo tão rápido. Vou precisar da sua ajuda, tudo bem? E qual é o nome da sua namorada?”

A enfermeira deu instruções rápidas e claras. Lembrei do treinamento com DEA do workshop do meu emprego de meio período e segui as instruções dela e os comandos da máquina passo a passo.

“Ichijou. O que devo fazer?”

“Ichijou-san, você pode ver se a família desse senhor está por perto?”

“Entendido.”

Ela saiu correndo novamente. O policial que veio com ela começou a orientar o trânsito no beco estreito.

E assim, a operação de resgate começou.

Enquanto continuávamos fazendo tudo o que podíamos, a ambulância chegou, guiada pelo policial. Provavelmente não tinham se passado nem dez minutos, mas parecia tudo um borrão.

“Aono-kun, Ichijou-san — obrigada aos dois. Vou acompanhá-lo até o hospital, então não se preocupem. Graças à rapidez de vocês, acho que ele vai ficar bem.”

A enfermeira sorriu ao dizer isso.

Depois do primeiro choque do desfibrilador, o senhor recuperou a consciência. Ainda estava grogue, mas continuava dizendo: “Obrigado, obrigado.”

O policial verificou o documento que o homem carregava e disse que entrariam em contato com a família depois.

O velho parecia estar recuperando a consciência pouco a pouco.

“Bem então, nós vamos indo.”

Ao dizer isso, Ichijou-san assentiu. Sentindo-me um pouco mais aliviado, nós dois deixamos o local.

“Isso foi tenso. Ainda bem que o velhinho parece estar bem.”

Ichijou-san soltou um grande suspiro, com seu sorriso habitual voltando ao rosto.

“Foi tudo graças a você, Ichijou-san. Você se moveu rápida — ele foi salvo por causa disso.”

Ela balançou a cabeça com um sorriso gentil.

“Não é verdade. Foi você, Senpai, quem agiu tão rápido. Eu fiquei tão assustada que mal conseguia me mexer.”

“Mesmo assim, tivemos muita sorte hoje. Aquela enfermeira estava ali por acaso. Eu não teria conseguido sozinho.”

“Mas ainda assim, é raro encontrar alguém que consiga agir tão rápido por um estranho. Acho isso realmente incrível.”

Ouvir aquilo fez com que um pequeno pedaço da minha autoestima despedaçada — por causa do bullying da semana passada — fosse restaurado.

“Obrigado.”

Disse isso com o sorriso mais sincero que tinha dado em dias — talvez o melhor de todos até agora.

 

 

Perspectiva da Enfermeira

“Muito obrigado mesmo.”

A família do idoso, que havia corrido para o hospital, falou entre lágrimas enquanto expressava sua gratidão.

O filho dele, falando em nome da família, fez uma reverência respeitosa para mim. Ele usava um terno bem cortado, de aparência cara, e se movia com um ar refinado.

Graças ao tratamento rápido e adequado, a vida do velho havia sido salva. Ele precisaria ficar no hospital por um tempo, no entanto.

“Que nada. Na verdade, por favor, agradeçam aos estudantes que trouxeram o DEA. Sem aqueles dois, as coisas poderiam ter acabado muito pior.”

Sinceramente, os verdadeiros heróis foram aqueles dois. Eu apenas os apoiei.

Quando alguém dá o primeiro passo em situações assim, fica mais fácil para os outros seguirem. Sempre exige muita coragem ser o primeiro a agir.

“Somos imensamente gratos a eles. Adoraríamos agradecê-los pessoalmente, mas segundo a polícia, mesmo quando pediram as informações de contato, os estudantes simplesmente foram embora sem dar nada. Não tivemos a chance de expressar nossa gratidão. Você, por acaso, sabe como poderíamos encontrá-los?”

Pensar que eles tinham esse tipo de caráter com uma idade tão jovem. Eles poderiam facilmente ter feito aquilo por reconhecimento ou elogios.

As crianças de hoje em dia são realmente impressionantes.

“Eu só estava ali por acaso também… Ah! Mas ouvi seus nomes durante o resgate!”

“Sério!? Você se lembra deles?”

“Eles se apresentaram como Aono-kun e Ichijou-san.”

Só de ouvir isso, o filho abriu um sorriso profundamente grato. Ficava claro que ele realmente queria agradecer às pessoas que salvaram seu pai.

Que pessoa sincera.

“Aono-kun e Ichijou-san... Obrigado. Só de saber os nomes já basta. Vou tentar encontrá-los.”

“Então, vou me retirar agora.”

Será que dá mesmo para encontrar alguém só pelo nome? Esse pensamento passou pela minha mente, mas não consegui dizê-lo em voz alta. Eu esperava que, por algum milagre, eles fossem encontrados e devidamente reconhecidos pelo que fizeram.

Apesar de ter acabado envolvida num grande tumulto no meu dia de folga, senti-me estranhamente calma e contente. Meu trabalho é difícil, mas não quero ficar para trás desses estudantes incríveis. Saí do hospital com um sentimento quente no peito. De algum modo, parecia que meu esforço também havia sido reconhecido. Como se tudo o que eu tinha feito até agora não tivesse sido em vão — e isso encheu meu coração de uma alegria silenciosa.

 

— Alguma plataforma de streaming —

“Ei pessoal, estamos ao vivo de novo! Então, hoje eu estava na rua procurando locações pro próximo vídeo do canal, e do nada esse velhinho caiu bem na minha frente — me deixou totalmente em choque. Enquanto eu ainda estava em pânico, um casal de estudantes apareceu e começou a fazer os primeiros socorros como se fossem profissionais. Eu só consegui mesmo foi chamar a ambulância. Sério, eles foram incríveis. Ultimamente, toda hora acontece alguma coisa enquanto eu estou filmando. Semana passada mesmo, durante um vídeo de passeio em colaboração, a gente topou com uma briga. Parecia treta de triângulo amoroso ou algo assim — um cara estava apanhando feio. A gente correu para ajudar, mas ele simplesmente fugiu. Alguém chamou a polícia, mas quando chegaram, todo mundo já tinha sumido.”

Depois de terminar a live do meio-dia, fiz uma pausa. Eu só tinha saído hoje de manhã para experimentar aquele café da manhã famoso que todo mundo andava comentando, mas acabei me metendo no meio desse incidente todo. Talvez por ter chamado a ambulância, uma mulher que disse ser parente do velhinho me ligou há pouco. Eu tinha deixado meu contato com os policiais só por precaução. Pelo visto, passaram adiante.

Nesse trabalho de criador de conteúdo em vídeo, a gente não tem muitas chances de se conectar de verdade com as pessoas. Então foi mesmo legal ter alguém tão grato assim.

Eu tenho um canal de gastronomia com um toque local, e parece que até alguns policiais da região já viram meus vídeos. Depois que tudo se acalmou, acabei batendo papo com um deles.

É ótimo ler os comentários dos inscritos, mas nada supera uma interação real.

“Ah, olá de novo! Não, não, eu não fiz nada demais. Eu só estava filmando de brincadeira quando vi o velhinho desmaiar. Enquanto eu ainda estava parado sem saber o que fazer, aquele casal de estudantes já estava agindo. Eu só consegui mesmo foi chamar a ambulância. O quê? Uma recomendação do corpo de bombeiros? Ah não, sério, quem merece muito mais são os estudantes e a enfermeira… Espera, os estudantes foram embora sem nem dizer o nome?”

Sinceramente, não fiz nada que merecesse ser chamado de heróico. Eu ia me sentir até roubando crédito se as pessoas vissem assim.

“Sim, eu filmei sim. Tava gravando um vídeo de passeio na rua na hora. Está meio tremido, mas peguei o rosto deles. Mas postar o rosto de estudantes menores de idade na internet... não é muito certo, né?”

A mulher do outro lado da linha perguntou se talvez seria possível postar o vídeo nas redes sociais para ajudar a encontrá-los, mas minha consciência pesou. Provavelmente, eles não queriam esse tipo de atenção...

“É, desculpa. Quer dizer... talvez se eu borrar os rostos e mostrar primeiro para a polícia...”

Para ser sincero, eu realmente acho que eles merecem reconhecimento pelo que fizeram.

Tudo deu certo graças à resposta rápida e correta deles.

Mas aquele garoto... sinto que já o vi em algum lugar antes.

Onde será...? Não consigo lembrar…

De qualquer forma, decidi entregar o vídeo para a polícia.

Pensando bem, eu também tinha dado para eles aquela gravação da briga outro dia. Vai ver esses meus vídeos inocentes de review de comida acabam sendo úteis de maneiras inesperadas.

“Ah! Verdade — já é setembro, o que significa que o Kitchen Aono voltou a servir aquelas ostras fritas! O molho tártaro deles é incrível. Acho que vou passar lá para jantar hoje à noite!”

 

 

— Perspectiva do Endou —

Eu tive um sonho. Uma lembrança minha com a Eri de muito tempo atrás.

Estávamos na época do jardim de infância, rindo felizes juntos.

“Quando eu crescer, vou me casar com você, Endou-kun.”

Mas essa promessa nunca foi cumprida. Mesmo quando vejo aquela amiga de infância por quem eu me importava tanto, agora tudo que sinto é ódio.

Acordo, com aquele sorriso infantil perdido ainda pairando na minha mente.

Que pesadelo.

Aquele momento, que deveria ter se tornado uma memória preciosa, foi tirado de mim. E tudo que restou foi ódio — pelo homem que roubou isso, pelos cúmplices dele, e pela Eri também.

Ainda são apenas cinco da manhã.

Ontem, eu fui além do que costumo ir. Declarei guerra diretamente ao Kondo. Mas isso é só parte do plano.

Observando o comportamento dele, é claro: ele é forte no ataque, mas fraco na defesa. O orgulho dele é tudo, então, se você o provoca, ele surta e perde o controle.

Isso torna suas ações fáceis de prever.

Eu já abalei o relacionamento dele com o clube de futebol.

Agora, é só uma questão de tempo até que alguém o traia.

Mas mesmo que o Kondo seja punido, isso não será suficiente para a minha vingança. Eu tenho que arrastá-lo completamente para baixo.

É por isso que vazei informações para a Amada Miyuki. Pelo menos, isso deve abrir uma rachadura na confiança entre eles. E se eu conseguir provocar nem que seja um pouco de culpa nela, melhor ainda.

Não que eu algum dia fosse confiar numa mulher traidora.

Se tudo correr bem, posso abrir uma fenda entre o Kondo e o clube de futebol, e entre o Kondo e a Amada Miyuki. Assim, será mais difícil para eles combinarem suas histórias. Isso criará inconsistências que a escola poderá investigar.

E teve também a declaração de guerra de ontem. Arriscada, claro — mas o potencial de recompensa é enorme. Kondo, surpreendentemente covarde, provavelmente vai procurar apoio nas garotas quando as coisas ficarem estranhas com o clube de futebol. Se isso acontecer, ele pode entrar em contato com a Amada Miyuki — aquela que já viu as fotos — e eles podem brigar.

Se isso acontecer, jackpot. Ele pode até entrar em contato com a Eri, mas tudo bem. Se o contato entre eles diminuir, as suspeitas da Amada Miyuki só vão crescer.

E se a Amada Miyuki e a Eri perceberem uma à outra, as garotas vão começar a entrar em conflito. Kondo não terá mais para onde correr.

Então ele vai perder seu lugar tanto no clube de futebol quanto com as garotas, e será forçado a depender de outra pessoa.

Alguém — além de mim — que vem operando nos bastidores.

[Almeranto: Cara, esse Endou é o GOAT do bagulho, frio e calculista, brabo dms.]

 

 

── Perspectiva da Caloura do Clube de Literatura – Hayashi ──

“Presidente, obrigada por tudo.”

Eu estava nervosa, mas consegui dizer direito. A presidente pareceu surpresa por um momento, depois rapidamente voltou ao seu tom habitual.

“Você pode me dizer o motivo?”

O motivo... é porque o que ela fez com o manuscrito do Aono-senpai foi demais. Eu não podia continuar seguindo ela depois daquilo. Mas sou covarde demais para explicar isso. Por dentro, eu sempre sei exatamente o que quero dizer. Então por que não consigo expressar?

A Ichijou-san ficou ao lado do senpai, não importa quem se voltasse contra ele. Eu nunca conseguiria fazer isso.

Falar contra a maioria me apavora. Tenho medo de ser intimidada.

Por isso entendi tão dolorosamente bem o desespero do Aono-senpai. Ter seu manuscrito precioso rasgado em pedaços e jogado fora... Ser insultado, ter suas coisas escondidas, lixo enfiado no seu armário de sapatos…

Eu nunca quis fazer nada daquilo. E eu sabia que não havia chance de alguém tão gentil quanto ele fazer algo assim. Mas eu também não consegui impedir. Eu até consegui me desculpar, e ele me perdoou, mas isso foi tudo graças à Ichijou-san. Não muda o fato de que eu nunca fiz nada sozinha.

“Então você não vai me dizer nada?”

A expressão da presidente, normalmente gentil, mudou para uma de leve decepção.

“Desculpa. Eu só... não consigo colocar em palavras.”

Então ela sorriu. Mas os olhos estavam frios e cravados em mim.

“Se você contar uma palavra disso para alguém, eu não vou te perdoar.”

Ela apertou meu ombro com força.

“Você está me machucando.”

Tremendo, eu implorei com o olhar para que ela parasse.

“Agora você entendeu, né? Você também é responsável — por não ter impedido. Você não gostaria de ser punida junto com a gente, gostaria?”

O sorriso dela era gélido.

 

 

── Intervalo do Almoço – Perspectiva da Ichijou Ai ──

As aulas da manhã tinham acabado. Eu tinha uma promessa para cumprir com o senpai, então fui para uma sala vazia perto da enfermaria. Íamos almoçar juntos hoje. É difícil relaxar num lugar movimentado, então o senpai pediu permissão aos professores para usar uma sala em outro prédio.

Enquanto eu andava, comecei a ouvir sussurros de outros alunos.

“Ei, você ouviu sobre a Ichijou-san...?”

“Sim, ouvi. Dizem que ela está namorando aquele infame do Aono-senpai, né?”

“Por que uma garota tão bonita sairia com um cara violento?”

“É estranho, né?”

“Ou ele tem algum charme escondido que a gente não sabe, ou ela é só uma dessas garotas sem salvação que se apaixonam por bad boys.”

Todos diziam o que queriam. Não estavam dizendo na minha cara, então eu fiquei quieta — mas por dentro, eu tremia de raiva. Como podem dizer coisas tão irresponsáveis sem saber absolutamente nada da situação?

Foi o mesmo com a minha mãe. Todos espalhavam os rumores que queriam, mas ninguém jamais assumiu a responsabilidade.

É o mesmo agora. A maioria sem nome espalha calúnias sobre o Senpai sem se importar. E mesmo que a verdade venha à tona, vai acabar por aí. A maioria nem vai considerar que foram eles os culpados. Alguns talvez até pensem que foram as vítimas, como se tivessem sido enganados.

Esse pensamento faz meu coração afundar.

“Preciso ir logo até o Senpai.”

Antes, eu não teria suportado um clima tão maldoso. Mas agora é diferente. Ele está aqui. Não importa quantas pessoas tentem derrubá-lo, eu sei quem ele realmente é. Se não fosse por ele, eu não estaria viva agora.

Só isso já basta. Naquele dia, ele arriscou a própria vida para me salvar. Só essa verdade já é mais do que suficiente. Mesmo que uma pessoa tão gentil seja injustamente difamada, mesmo que ele tenha sido traído por alguém em quem confiava e se tornado alvo de bullying, a justiça dele será provada. Eu farei tudo que puder para garantir isso.

Porque essa é a única maneira que eu conheço de retribuir por ele ter me salvado.

E também...

Eu me apaixonei por ele. Ele valoriza os outros mais do que a si mesmo, e faz as pessoas felizes. Não importa com quem ele fale, trata todos com respeito. Mesmo esta manhã — pessoas normais não conseguiriam agir naquela crise. Especialmente depois de passar por um bullying traumático o bastante para deixar alguém desconfiado dos outros. E mesmo assim, ele agiu sem hesitação.

Como pessoa, ele é alguém que eu não posso deixar de respeitar. É por isso que eu o amo. É por isso que me apaixonei por ele. Eu nunca pensei que me apaixonaria por alguém. Mas ele me estendeu a mão das profundezas do desespero.

Como eu poderia não me apaixonar?

Abri a porta da sala vazia. Ele estava lá, sorrindo, me esperando.

 

 

── Perspectiva de Takayanagi ──

Durante o intervalo do almoço, eu estava na sala dos professores, comendo um pão e anotando algumas coisas, quando percebi que segurava a cabeça em frustração.

Mesmo que ontem tenha sido meu dia de folga, eu não conseguia parar de pensar na situação do Aono.

Hoje de manhã, Aono chegou no horário, ainda que por pouco. Eu estava preocupado que ele talvez não aparecesse depois do fim de semana, então fiquei rondando perto dos armários de sapatos. Então vi Aono entrando apressado na escola junto com Ichijou da turma 1. Depois perguntei casualmente e descobri que eles só tinham se atrasado um pouco porque ficaram conversando. Que alívio. Eu temia que o bullying tivesse piorado.

Mas se quisermos limpar o nome do Aono, precisamos revelar a verdade o quanto antes. As provas estão começando a se juntar. Tudo o que falta agora é algo definitivo.

“Mas tem uma coisa nesse caso que não me desce.”

O comportamento do Kondo. Aquele cara é conhecido por ser um canalha com garotas — principalmente por ir atrás daquelas que já estão namorando alguém. Um hábito realmente nojento. Mas no mundo de hoje, tudo isso é considerado questão de liberdade pessoal. A não ser que alguém seja casado, não há motivo para ação disciplinar.

Por isso, a escola tem tido tanta dificuldade para lidar com ele.

Então, por que, no caso do Aono, o Kondo foi tão longe a ponto de praticar bullying ativo? Ele sempre foi covarde demais para cruzar a linha final.

É aí que algo parece estranho.

E agora, mesmo que soe como uma teoria maluca, cheguei a uma possível conclusão.

“E se houver alguém por trás disso tudo — alguém que empurrou o Kondo a agir assim? Um mentor manipulando os fios...”

Droga, meu cérebro não está funcionando.

Talvez seja porque não comi direito. Isso está começando a me irritar.

Acho que devo jantar em algum lugar. Aquele vlogger de comida que eu sigo mencionou uma ótima casa de ramen perto da estação. Parece uma boa mudança de ares.

Abri o canal do vlogger para procurar o nome do restaurante.

Por causa do autoplay do site, o vídeo mais recente começou sozinho. O volume estava no mudo, então não ecoou pela sala dos professores, mas consegui ler as legendas para entender a ideia.

“E aí, pessoal, bem-vindos de volta. Então, hoje, enquanto filmava para um projeto novo, eu estava andando pela cidade quando esse velhinho de repente desmaiou bem na minha frente. Entrei em pânico, tipo ‘o que eu faço?!’ Mas aí esse casal de estudantes apareceu do nada e começou a fazer RCP — foi incrível. Tudo o que consegui fazer foi ligar para a ambulância. Sério, tanta coisa acontece quando você anda pelas ruas hoje em dia. Só na semana passada, quando eu estava filmando um tour colaborativo, a gente deu de cara com uma briga. Parecia um triângulo amoroso confuso ou algo assim, mas um cara estava apanhando feio. Corremos até lá, mas o garoto fugiu. Alguém chamou a polícia, mas quando chegaram, todo mundo já tinha sumido.”

Senti-me estranhamente intrigado, embora não soubesse por quê.

Então, depois da aula.

Acabei indo até a casa do Aono. Originalmente, eu planejava comer ramen, mas no caminho de volta, conferi as redes sociais do vlogger de comida e vi uma foto irresistível de um prato de ostras fritas da estação. Não resisti.

Sinceramente, como professor, visitar a casa de um aluno pode ser questionável — mas mesmo assim abri a porta da frente.

“Oh, Takayanagi-sensei. O que o traz aqui hoje?”

A mãe do Aono me cumprimentou com um sorriso. Estávamos mantendo contato regularmente, então construímos uma boa relação. Quando mandei um e-mail para ela sobre a próxima aula prática de reposição do Aono marcada para o próximo sábado, ela respondeu: “Muito obrigada, mesmo com sua agenda cheia. Por favor, venha comer com a gente se tiver tempo.” Então resolvi aceitar o convite.

O pai do Aono faleceu cedo, então sua mãe e o irmão mais velho agora cuidam juntos do restaurante da família. Só depois de me tornar um adulto trabalhador consigo realmente apreciar a dedicação deles — não é nada menos que notável. Dada a situação atual do Aono, é especialmente importante que a escola e a família mantenham uma linha forte de confiança e comunicação, então venho compartilhando informações ativamente com eles.

“Hoje, sou apenas um cliente. Vou querer o prato da estação com ostras fritas, por favor.”

“Oh, então vou caprichar na porção extra de repolho, por conta da casa.”

Ela disse isso com um sorriso. A mãe do Aono vinha lendo os relatórios que preparamos com muito cuidado. Sempre que tinha dúvidas, me enviava um e-mail, e eu fazia questão de responder com o máximo de detalhes possível.

Graças a isso, a família parece confiar mais na escola agora. Mesmo pelo telefone, consigo perceber que o tom dela suavizou bastante.

“Sensei, por favor... cuide do Eiji.”

O irmão mais velho do Aono saiu da cozinha, trazendo uma tigela de minestrone. Eu soubera que ele assumira responsabilidades muito cedo na vida, escolhendo trabalhar com seriedade em vez de desperdiçar a juventude — tudo pelo bem do irmão mais novo. Agora que eu e Aono conseguimos conversar com mais naturalidade, como fazíamos antes, entendi o quanto ele sente gratidão pela família.

Havia uma preocupação genuína em seus olhos quando falava do irmão.

“Sim. Sobre esse incidente, estamos fazendo tudo o que podemos para protegê-lo.”

Na verdade, o clima na escola começou a mudar. Menos alunos olham para Aono com desconfiança. Parte disso se deve à confiança que Ichijou Ai inspira, mas o próprio caráter do Aono tem um papel enorme nisso.

Alguns colegas do ano passado e até atuais ainda não sabem o que pensar dos rumores — mantêm distância do bullying e das fofocas. É perceptível o número de alunos assim.

Quando discutia como lidar com os créditos da experiência de química com o professor responsável, Endou — que foi colega de Aono no primeiro ano — se ofereceu: “Se for esse o caso, eu faço o experimento com ele depois da aula. O Aono-kun é um amigo importante, e quero ajudar no que puder.”

Ter amigos dispostos a se levantar em tempos difíceis — isso diz muito sobre o caráter de Aono.

“Com licença! Posso pedir uma porção extra de arroz?”

Um homem grande chamou, e a mãe do Aono respondeu prontamente: “Já vai!” Olhei de relance para o perfil dele por hábito — e percebi que era o vlogger de comida que eu costumava assistir. Então ele ainda estava aqui. Lembrei de ter visto aquela foto mais cedo.

Senti um pequeno arrepio de animação.

E uma profunda gratidão por essa coincidência.

No vídeo que assisti mais cedo enquanto procurava um lugar para comer, ele mencionou algo curioso. Eu vinha pensando nisso — e agora não conseguia evitar a suspeita.

Ele disse que, na semana passada, testemunhou um garoto apanhando numa briga que parecia ser por causa de um triângulo amoroso.

Brigas não são raras. As chances são pequenas. Mas esse homem se especializa em vídeos de cobertura local — então provavelmente filma por esta região. E a situação que descreveu era estranhamente parecida com o incidente que desencadeou o bullying contra Aono.

Mesmo a menor possibilidade vale a pena ser perseguida — se puder encerrar essa situação. Se puder acabar com o sofrimento do Aono.

Estou disposto a correr esse risco.

Levantei-me e fui até o vlogger.

“Com licença... posso te perguntar uma coisa?”

Estendi a mão para a porta da verdade.

“Eu assisto seus vídeos sempre. Continue com o ótimo trabalho!”

O vlogger sorriu calorosamente, já que aparentemente já havia terminado de gravar no dia.

“Oh, sério? Isso me deixa muito feliz. Muito obrigado!”

“Desculpe incomodar, mas num vídeo recente, acho que você mencionou ter esbarrado numa briga entre alguns jovens...?”

Ele pareceu um pouco confuso, depois assentiu. “Sim, eu mencionei isso.”

Não havia mais razão para ser vago. Até a mãe do Aono nos encarava, de olhos arregalados.

“Meu nome é Takayanagi. Sou professor de uma escola local. Na mesma época que você mencionou, um dos meus alunos foi agredido. Gostaríamos de consultar a polícia, mas não temos provas — e sem isso, não há nada que possamos fazer. Você poderia me mostrar o vídeo daquele dia? Mesmo que seja só para confirmar se o garoto que apanhou é meu aluno.”

Sinceramente, não tinha certeza se ele aceitaria. A pressão pública sobre criadores de conteúdo é intensa hoje em dia, e muitos são bastante atentos às regras. Este vlogger em particular é conhecido por ser respeitoso — sempre pedindo permissão para filmar, evitando horários de pico, esse tipo de coisa.

Mas se houver uma chance, eu me curvarei quantas vezes for preciso. Principalmente se for pelo bem do meu aluno.

“Hmmm, o que fazer...”

Entreguei a ele um dos cartões de visita que sempre carrego, por precaução.

“Sei que isso não serve como prova formal, mas aqui está meu cartão. Posso também mostrar minha carteira de motorista, se precisar. E este restaurante é da família do meu aluno, então...”

O vlogger olhou para a cozinha. Tanto a mãe quanto o irmão assentiram firmemente.

“Bem, se você está indo tão longe assim... Eu ainda tenho o arquivo do vídeo. Por favor, me dê um momento.”

Soltei um suspiro de alívio. Mas não podia relaxar ainda. Ainda havia uma grande chance de não ser a mesma pessoa.

“Aqui está.”

Sons barulhentos da rua enchiam o vídeo. Um grito de mulher.

Alguém gritou: “É uma briga!” A câmera virou naquela direção.

Mas não era uma briga. Era uma surra unilateral. Um homem, furioso, agarrou o ombro de outro garoto que estava ao lado de uma mulher — e começou a espancá-lo. Uma violência brutal. Era uma agressão.

O garoto que levou os golpes foi jogado ao chão. A força por trás daquilo era assustadora. Eu não conseguia ouvir o que estava sendo dito, mas o agressor gritava algo em um tom áspero e abusivo.

A mulher que estava com o agressor nem sequer tentou ver como o garoto estava. Ela simplesmente ficou parada, disse algumas palavras baixas e então saiu andando com o homem.

A câmera correu até o garoto que havia sido atingido.

“Ei, você está bem? Não tente andar. É melhor se deitar um pouco... Ei, vamos lá!”

O garoto, cambaleando e sem forças, simplesmente saiu andando sem dizer uma palavra.

Apenas o vlogger permaneceu, murmurando preocupado: “Espero que ele fique bem.”

O vídeo se cortou ali.

Prendi a respiração.

Porque as pessoas capturadas pela câmera não eram outras senão Aono Eiji, Amada Miyuki e Kondo do clube de futebol.

“Era isso que você estava procurando? Só para avisar, eu já enviei essa gravação para a polícia. Se você entrar em contato com eles, pode conseguir mais informações...”

“Muito obrigado. Esse com certeza era um dos meus alunos. Você entregou a filmagem no posto policial daqui da área? Por favor, me diga qual, assim posso entrar em contato.”

Depois de conseguir o local, me inclinei e sussurrei os detalhes do vídeo para a mãe do Aono.

“Era definitivamente o Eiji-kun. A filmagem mostra ele sendo agredido — de forma totalmente unilateral.”

Ao ouvir isso, ela respondeu com um tom gelado.

“Sensei... sei que isso pode causar problemas para a escola, mas eu nunca vou perdoar aqueles que machucaram o Eiji.”

Um professor normal talvez começasse a falar coisas como “o futuro dos alunos que fizeram isso”. Mas nossa escola é diferente.

“Não, isso é algo que o Aono-san deve decidir. A escola não tem o direito de interferir. E além disso, acredito que é responsabilidade de um professor fazer os alunos perceberem quando fizeram algo errado. Se um aluno se desvia do caminho certo, ele pode eventualmente fazer algo verdadeiramente imperdoável. Na verdade, o que aconteceu desta vez talvez já seja exatamente isso. Se for, então dar a eles a chance de assumir a responsabilidade também é uma forma de educação.”

“Obrigada. Onii-chan, me desculpa. Eu vou com o Sensei. Não conte nada ao Eiji ainda. Quando eu tiver certeza de tudo, eu mesma conto para ele.”

E assim, corremos em direção ao posto policial onde a filmagem havia sido entregue.

 

 

── Corpo de Bombeiros ──

“Acabamos de receber da polícia o vídeo do casal de estudantes que tem circulado online.”

Assenti ao ouvir o relatório do meu subordinado.

“Obrigado. Mesmo assim, esses estudantes de hoje em dia são incríveis. Agiram tão rápido e com tanta decisão... Nós, adultos, deveríamos aprender algo com eles.”

“É mesmo, Chefe dos Bombeiros. E tem mais — eles foram embora sem nem deixar os nomes. São bons demais para ser verdade, o que me deixa um pouco inquieto. Eu, na época de estudante, só jogava esportes, comia ramen com os amigos no caminho de casa e desmaiava sem estudar.”

Dei uma risada com o comentário autodepreciativo dele. Embora, para ser honesto, eu também não era exemplo — tenho minhas próprias mágoas.

“Não se compare a eles. Sabe quem foi que desmaiou? Yamada — o ex-deputado da assembleia estadual. Ele chegou a ser presidente. É uma figura importante. Até políticos nacionais se curvam diante dele.”

Por causa disso, estão insistindo para encontrarmos os estudantes de qualquer jeito. Até para o nosso lado seria ótimo ter um exemplo tão positivo para divulgar.

“Uau, não fazia ideia de que ele era tão importante assim.”

Bem, os jovens não saberiam mesmo.

“Certo, borre os rostos dos estudantes e use as redes sociais para pedir informações. Talvez consigamos alguma pista.”

Esse cara é ótimo com tecnologia, então tenho certeza de que ele vai cuidar disso sem problemas.

Fico imaginando quanto alcance isso vai ter. Tomara que logo tenhamos alguma resposta...

Mas eu não sabia que aquela postagem nas redes sociais se tornaria viral em poucas horas, acumulando centenas de milhares de reações.

 

 

── Emissora de TV Regional ──

“Isso é péssimo! O evento de ramen que a gente ia cobrir ao vivo acabou de ser cancelado. Os organizadores desistiram por causa dos ventos fortes — disseram que está perigoso demais.”

“O quê!? Droga. Isso vai abrir um buraco de cinco minutos no programa. A gente tem alguma matéria de reserva?”

“Bem... na verdade...”

“Ugh, não temos nada? O que vamos fazer? Expandir outro segmento...?”

“Ah! Diretor, tem algo perfeito. O corpo de bombeiros acabou de postar um vídeo nas redes sociais — mostra uns estudantes ajudando um homem que desmaiou. Está viralizando feito louco. A gente devia cobrir isso. Pelo que disseram, eles nem deram o nome e foram embora. O corpo de bombeiros está tentando encontrá-los para agradecer formalmente.”

“Perfeito — estamos com pouco tempo, e já temos a filmagem. Conseguir permissão para usar deve ser fácil. Se falarmos que vai passar num programa com grande audiência, eles provavelmente autorizam na hora.”

Tudo estava acontecendo em tempo real.

 

 

── Sala de descanso da delegacia ──

“Aquele vídeo que entregamos para os bombeiros mais cedo já foi postado rapidinho. Caramba, eles são ágeis.”

“É, ouvi dizer que envolvia um ex-deputado estadual.”

“Então é por isso que tudo está andando tão depressa.”

“Ei, o que foi, Minowa?”

“Ah, é sobre o garoto daquele vídeo. Achei ele familiar.”

“Uou, não me diga que já temos uma identificação?”

“Não, não sei o nome dele. Mas lembra, senpai? Cerca de uma semana atrás, teve aquele incidente no centro, onde um jovem foi agredido — completamente sem chance de reagir?”

“Ah, é. Aquele em que as pessoas sumiram depois. Tudo que a gente tinha era a gravação daquele streamer, né?”

“Isso mesmo. Como ninguém registrou queixa, não levamos adiante. Mas não acha que parece o mesmo cara?”

“Hm, pode ser. Não lembro direito. Vamos dar outra olhada depois do intervalo. Vai que a gente consegue uns pontos com o corpo de bombeiros.”

 

 

── Perspectiva de Takayanagi ──

Chegamos ao posto policial em frente à estação da cidade vizinha. Depois de explicar a situação, pedimos para ver novamente a filmagem. Era o mesmo vídeo que eu já havia assistido antes. Para a mãe do Aono, porém, era a primeira vez, e o choque ficou visível em seu rosto.

“Não pode ser… ele ser espancado de forma tão covarde…”

“Por quê… por que meu filho teve que passar por isso — só por tocar no ombro da garota com quem ele deveria estar namorando?”

“Isso é horrível… o Eiji passou por tudo isso… até mesmo traído pela Miyuki-chan. Deixado caído lá, sem nem ser ajudado. Frio e cruelmente abandonado… Por que eu não percebi…?”

A luz havia desaparecido dos olhos dela. Murmurava com emoção contida. Eu só podia observá-la, impotente para dizer qualquer coisa.

Por mais vezes que se assista — continua sendo brutal.

Uma agressão completamente unilateral. Não havia sinal de qualquer hostilidade por parte do Aono, ao contrário do que Kondo havia alegado.

Então era mesmo uma mentira.

“Eu nunca vou perdoar o garoto que bateu no meu filho. Ele é aluno da mesma escola, não é, Sensei?”

“Sim. O nome dele é Kondo, aluno do terceiro ano.”

Eu já havia contatado o diretor antes de vir para cá. Conforme o plano original, decidir se abriria ou não um boletim de ocorrência ficaria inteiramente a critério da mãe do Aono. Recebemos instruções para cooperar plenamente.

“Kondo. Então esse é o nome dele… Kondo…”

Ela repetiu o nome quase num sussurro, mas com uma firme determinação de não perdoá-lo.

“Quero prestar queixa. O que preciso fazer?”

Ela declarou isso com uma determinação inabalável e prosseguiu com os trâmites necessários. Como responsável legal, foi informada de que tinha o direito de registrar a denúncia em nome de um menor de idade.

Enquanto o processo seguia, dois policiais entraram no posto.

“Ei, bom trabalho!”

Um policial de uniforme os cumprimentou, e o mais velho entre eles perguntou:

“Esses dois estão ligados ao garoto do vídeo?”

O outro policial assentiu de imediato.

“Sim, ela é a mãe da vítima, e ele é professor da escola. Eles estão no meio do registro da ocorrência.”

“Entendo.”

O policial veterano se virou para nós e começou a falar com clareza.

“Meu nome é Doumoto. Desculpem aparecer de surpresa, mas gostaria que vissem mais um vídeo. Não se preocupem — não tem relação com o caso da agressão. É sobre um incidente de salvamento. Um dos meus subordinados achou que o filho da senhora poderia ser o estudante que ajudou a salvar um homem hoje e saiu sem dar o nome. Poderiam confirmar se é ele?”

“Claro.”

A mãe do Aono respondeu, com um leve suspiro de alívio. Depois de tudo o que acabara de ver, a ideia de assistir a um vídeo completamente diferente parecia quase um alívio.

As imagens mostravam Aono, com o uniforme escolar, ao lado de Ichijou Ai, socorrendo um homem caído.

Então era por isso que eles se atrasaram esta manhã… Tudo fazia sentido agora.

“Sim, é o meu filho. E a garota ao lado dele… ela é… alguém com quem ele tem um vínculo…”

As palavras dela vacilaram, surpresa.

“Entendo. Na verdade, graças à resposta rápida deles, o homem está se recuperando bem. Ele quer agradecer pessoalmente. O corpo de bombeiros também planeja homenageá-los.”

Passar daquelas imagens devastadoras para um vídeo dele praticando um ato nobre — é como ir do inferno ao paraíso.

Mesmo como professor, fiquei profundamente impressionado. A maioria dos adultos não conseguiria agir com tanta decisão numa situação assim. Especialmente alguém que acabou de passar por um desespero tão grande, com todos os motivos para desconfiar das pessoas. E, ainda assim, ele escolheu ajudar outra pessoa.

“Então é por isso, Eiji... Eu não fazia ideia... Ele nunca diz nada…”

O policial veterano sorriu.

“Você tem um filho maravilhoso. Tenho uma filha mais ou menos da idade dele e, acredite, não é fácil agir assim. Você criou um jovem notável. Quanto ao caso da agressão, vamos garantir que seja tratado corretamente.”

Suas palavras, gentis mas firmes, nos deram um forte sentimento de segurança.

“Muito obrigada.”

A mãe do Aono abaixou a cabeça, com lágrimas escorrendo pelos olhos.

Este mundo está realmente cheio de injustiça. Por que alguém tão bondoso como o Aono Eiji teve que sofrer tanto? Por que ele acabou sendo alvo desse bullying?

Não... Não posso pensar assim. Não posso me deixar consumir pelo negativo. Ele é quem deveria estar sentindo mais dor — e mesmo assim continua seguindo em frente...

Como adulto, preciso fazer tudo o que puder para aliviar, ainda que um pouco, esse fardo.

O primeiro passo é fazer o culpado inegável pagar.

O que vem depois não será fácil.

Preparei-me mais uma vez.

 

 

── Perspectiva de Shimokawa ──

Droga.

É segunda-feira, e mesmo depois da partida de treino de ontem, o técnico estava furioso — então, em vez de descansarmos para recuperar, fomos jogados em um treino completo. Hoje era para terminar cedo. Claro, aquela tensão desconfortável de ontem ainda pairava, e como esperado, Kondo-senpai não apareceu.

Para ser honesto, ninguém de nós estava em condições de treinar. O time estava completamente fora de sincronia.

O próximo torneio? É, provavelmente sem chance. Todo mundo sentia aquela mesma sensação de desistência.

“Vamos logo pra casa.”

Enquanto trocávamos de sapatos na entrada, de repente ouvimos o capitão gritando.

“Ei, Mitsuda! Que diabos é isso? Se explica!”

Assustados pelo tom incomum na voz dele, nós, calouros, corremos até lá.

O armário de sapatos do Mitsuda-senpai estava escancarado, e as fotos infames estavam espalhadas pelo chão.

Todos ficamos paralisados, sem palavras diante da cena bizarra.

“Então foi você afinal! Eu sabia — você estava enfurecido por ser mandado pelo Kondo, então descontou em nós! Você arruinou nossas vidas! Ria da nossa cara pelas costas, né?!”

A voz do capitão estava estridente, quase histérica.

“Não! Eu não sei de nada disso! Alguém plantou isso aí! Eu não traí ninguém — é uma armadilha!”

Ao ouvir isso, lembrei do Aono. No fim das contas, não estávamos todos sendo usados pelo Kondo-senpai? Não ajudamos a incriminar o Aono sem perceber? Especialmente o Mitsuda-senpai — ele estava espalhando boatos ativamente. Talvez isso seja o karma batendo na porta dele.

“Não confio mais em ninguém! Em ninguém!”

O capitão empurrou o Mitsuda-senpai contra os armários e foi embora. O que ficou foi um silêncio sepulcral.

“Esse não é o tipo de futebol que eu queria jogar...”

Foi Maehira, um calouro, quem falou. Todos nós nos viramos para olhar, surpresos. Os calouros não estavam envolvidos no incidente, então nos viam como lixo.

Droga... Isso não é culpa minha. É do Kondo-senpai.

Sem dizer mais nada, Maehira e os outros calouros foram embora.

Ficaram para trás as fotos — e nós, veteranos, afogados no desespero.

 

 

── Perspectiva de Eri ──

Peguei mantimentos no supermercado e voltei para a mesma casa vazia de sempre.

“Cheguei.”

É um velho hábito. Mesmo que não haja ninguém para responder, ainda digo isso.

Só serve para reforçar o fato de que existo no extremo oposto da felicidade.

“Vou fazer udon.”

Se eu apenas cozinhar alguns legumes e carne, não vou morrer de fome. Moro sozinha desde que o ensino médio começou, e essa tem sido minha vida. Nunca gostei de uma refeição sequer nesses últimos três anos. Contanto que eu ingerisse nutrientes suficientes para sobreviver, não me importava.

Fora os momentos em que via o Kondo-kun, eu fazia apenas o mínimo necessário para passar o dia. Todo o resto — cada momento sem ele — eu era basicamente uma zumbi.

Porque perdi tudo.

No ensino fundamental, eu era uma aluna exemplar. Tinha muitos amigos. Namorava meu amigo de infância, Endou Kazuki. Ele também era inteligente — um garoto de quem eu sempre me orgulhei.

Éramos próximos — todos achavam que acabaríamos juntos.

Mas eu fui quem destruiu essa felicidade prometida.

Conheci Kondo-kun no oitavo ano do fundamental, quando acabamos na mesma classe. Ele era o craque do time de futebol e se saía bem nos estudos. Sempre estava no centro das atenções.

Eu adorava o Kazuki. Admirava o Kondo — era só isso.

Mas estando na mesma turma, fomos nos aproximando aos poucos. Ele era bom em estudar e pacientemente me ajudava com os problemas de matemática com os quais eu tinha dificuldade.

Esse pequeno gesto foi o começo. Conforme ficávamos mais próximos, seu charme confiante, tão diferente da gentileza desajeitada do Kazuki, me arrebatou. Baixei a guarda. Quando percebi, já tinha entregado tudo para ele — e caído neste inferno.

Mas, no fundo, eu entendo.

A culpa é toda minha.

Tentei ignorar, mas a pessoa mais culpada não é ninguém além de mim.

Fui basicamente renegada pelos meus pais. Eles ainda cobrem minha mensalidade e despesas de moradia, mas fora isso, estou por minha conta.

Uma das minhas amigas de infância — alguém que conhecia desde o jardim de infância — me disse: “Como pôde fazer algo tão horrível? Se você realmente se importasse com o Endou-kun… não poderia ter feito algo tão cruel.” E então cortou relações comigo.

Não posso culpá-la. É natural.

Mas sem nenhum apoio dos meus pais, faculdade ou escola técnica estão fora de alcance. O sonho que eu alimentava — de me tornar professora — foi destruído por causa daquela única traição.

Ouvi dizer que o Kazuki nem conseguiu fazer as provas de admissão do ensino médio por causa do choque. Agora ele está repetindo de ano, estudando com alunos mais novos que nós.

Quando ele se matriculou no mesmo ensino médio, eu fiquei feliz. Eu sabia que não tinha direito de me sentir assim depois do que fiz, mas… não pude evitar ter esperança, só um pouco, de que talvez ele fosse quem me tiraria deste inferno.

Mas essa esperança desapareceu quase imediatamente.

Mesmo quando nos cruzamos no corredor, ele me olhava como se eu fosse lixo.

O sorriso gentil que ele costumava me dar — havia sumido. Eu nunca mais o veria. No fim, fui forçada a perceber que Kondo-kun era tudo o que me restava. Aquele símbolo do meu passado feliz tinha se tornado inalcançável, para sempre fora do meu alcance.

E agora, nem o Kondo liga para mim. Não passo de uma garota conveniente para ele.

No fundamental, namoramos brevemente, mas ele terminou logo depois. Depois disso, comecei a faltar às aulas. Quando ele descobriu, amoleceu — só um pouco — e começou a me ver de vez em quando de novo. Eu sabia que só estava sendo usada, mas não conseguia escapar das garras dele.

Eu tinha investido tudo nesse relacionamento. Por isso não conseguia largar. E assim me tornei essa “garota conveniente”, agarrada às migalhas que ele me oferecia. Apostei tudo — minha família, meu namorado, meus amigos, meus sonhos, meu futuro — nesse amor.

Entreguei toda a minha juventude ao Kondo-kun.

E o que restou foi este inferno.

Eu sei que ele tem outras garotas. Eu mesma vi, mais de uma vez.

Mas mesmo assim… eu acreditava que ele voltaria para mim. Que ele me escolheria — porque eu dei tudo para ele.

O envelope que chegou hoje pelo correio destruiu até essa última esperança.

Fotos dele, sorrindo feliz enquanto saía de um hotel com outra garota.

Se fosse só isso, talvez — só talvez — eu pudesse ter suportado.

Mas ele estava usando o colar combinado que compramos no fundamental.

Como se estivesse pisando nos meus sentimentos. Como se todos aqueles anos não significassem nada para ele. Como se toda a minha juventude fosse apenas uma posse para ele — nada mais.

Imperdoável.

Eu não posso me perdoar. Por ter traído as pessoas que mais importavam para mim.

Eu vou morrer. O fio ao qual eu me agarrava finalmente se rompeu. Porque não resta mais esperança — nenhuma.

Mas eu não serei a única a cair no inferno.

Aquele que criou este inferno... vai vir comigo.

Pelo menos, só neste momento final... eu quero ser fiel a mim mesma…

[Almeranto: Cara… que tristeza. O que esse Kondo fez é imperdoável, ele literalmente destrói a vida de quem ele interage. Mesmo a Eri tendo feito o que ela fez, ainda é bem triste ver a situação em que ela se encontra nesse momento.]

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