Reino da Verdade Brasileira

Autor(a): Lucas Baldi


Volume 4

Capítulo 81: Além da Fronteira

 



— Ele derrubou a Fortaleza sozinha — resmungou o Caos. — Nem vocês todos teriam facilidade de invadir e ultrapassar o encantamento de Gilmour — O próprio rei 1 encantou ela? Como se fazia isso? — Deveriam ir no mínimo com um grupo maior e com preparos adequados para um Laiky anormal. Ele fugiu da fronteira e convenientemente trabalha com os Ritualistas agora. Ele é mais inteligente que metade de mulas como vocês e talvez possa evoluir.

— Pelo rei, nós traremos a cabeça dele aqui — disse Ansel, o cavaleiro real ao lado de sir Zayden. — Não importa o quanto ele acha que pensa. Se está obedecendo aos covardes de mascaras, não está usando bem o cérebro — Algumas risadas. — Já derrotamos alguns Laikys na Fronteira em grupo separados. Imagine o que a maior força do reino 2 pode fazer?

Estar na frente de um Laiky… Como essa luta seria? Eu nunca me imaginaria em vantagem contra um. No único livro que fala sobre os laikys diz para “evitarmos a todo custo, pois somos sua única fonte de alimento”.

— Nós vamos a caça! — Um grito gutural de Ryu, e a maioria levantou as armas em um urro.

Que loucura. O Laiky com uma relíquia não era mais forte que a maioria deles? Digo, os Laikys comuns já eram equivalente a auroras. O que um anormal faria?

— Os Sangues de Luz farão algo a respeito da Fortaleza. Que estresse. Odeio a convocação de reis — O silêncio veio tão veloz que suas palavras ecoaram na sala. — Não temos mais a Fortaleza para armazenar as relíquias e aqui que essa coisa não vai ficar. Já enviei a merda do pássaro para Aerin Morwen.

Alguns rostos surpresos, inclusive o do meu pai. Eles engoliram seco enquanto sussurravam sobre a presença assustadora de um “Sangue de Luz, os mais poderosos que os reis”. 

Meu pai nunca falou muito sobre eles, e evitou qualquer assunto que pudesse se relacionar a eles. Ouvi dizer que assassinaram o pai de Bruno Lewis e tentaram matá-lo ainda quando bebê. 

Alyssa teve de assumir as pressas para manter seu filho vivo e talvez até um certo grupo de pessoas. Pareciam pessoas tão ruins quanto nossas ameaças internas e externas do país.

Mas onde ficavam? Por que não governavam diretamente então? Não era possível que apenas odiavam o estresse.

— Ah… — suspirou o rei. — Deixem a menina falar, precisamos de detalhes do que aconteceu na expedição. Preparem-se para ver o sol nascer, pois ninguém vai sair da sala até ela acabar.

Aeliana parecia… erguer levemente os lábios. Eu senti algo vir dela, mas não consegui entender. 

Era debochado e confiante ao mesmo tempo, seu olhar para baixo e postura simples e calma.

Olhares confusos, gotas de suor escorriam da maioria presente. Os segundos seguintes, a tensão em cada um. Aeliana queria isso? Meu coração bateu forte quando ela aumentou o sorrisinho.

O que- Seus olhos azuis acompanhados de um leve brilhar me encontraram, e todos os pelos do meu corpo se eriçaram. As pessoas se inclinaram para frente, ansiosos, quando ela começou a abrir a boca.

— O rei 1… — Sua voz calma, com um toque de felicidade e zombaria e confiança. — está morto.

Rei Reig arregalou os olhos enquanto seu queixo ia ao chão, e todos na sala começaram a gritar, a questionar essa informação, a xingá-la. Aeliana apenas permaneceu ali com as mãos nas costas e seu sorrisinho.

Até o Hiroki estava surpreso, coisa que vi em poucos momentos enquanto estive com ele. Os cavaleiros reais a bombardearam de perguntas como: “Como assim o rei da nação morreu?”, enquanto as auroras estavam com a mana agitada e as mãos nas bainhas de suas armas.

E eles tinham parte da razão no desespero. Como você dá uma informação dessa e continua assim, irmã? Não me diga que enlouqueceu como os outros.

— Explique essa brincadeira de mau gosto — disse o rei, agitado, e logo bateu na mesa. — Silêncio! — Sua aura esverdeada surgiu em sua mão. — Que porra aconteceu lá?

Nós… nós perdemos Gilmour? Ela não brincaria com isso. Todos estavam suando, o cheiro do medo era cada vez mais perceptível nesta sala. O Caos estava sério, sua aura duas vezes mais densa do que antes.

— Tivemos problemas para alcançar o reino 1. As trilhas foram desfeitas, qualquer caminho se tornara duvidoso — Aeliana olhou para mim de novo, e eu me arrepiei. — O reino possuía mais destroços que o habitual. Kaiser, filho do rei Gilmour, nos recebeu. Ele tomou a posição de primeiro rei em uma cerimônia fechada logo após a morte de seu pai.

— Os Sangues de Luz estão cientes disso? — questionou o rei. 

— Não foi possível convocá-los devido a urgência e o perigo do momento — Aeliana olhou para ele ao responder confiante, plena, arrogante. Então ela olhou para baixo e ninguém sequer se moveu. O silêncio permaneceu até que Aeliana erguesse os olhos para mim novamente. — Quem o assassinou foi Ealdred, segundo líder da equipe denominada “Ritualistas” — Apenas silêncio. Ninguém desejava interromper ela. — Houve uma batalha no campo além da muralha, onde Kaiser enfrentou o Laiky anormal e o rei Gilmour lutou contra Ealdred. Segundo o relato de Kaiser, o Laiky esteva ferido devido a algum combate anterior e lutou sem um dos braços — Alguém conseguiu ferir o Laiky!? — O que deu vantagem a ele na luta e quase finalização do inimigo, mas Ealdred usou uma magia nova e sem precedentes que superou as expectativas que nosso rei colocou sobre o grupo dos mascarados. Ele apenas disse: “Lindo, verdadeiramente belo. Temo que esse é o poder que eles estão tentando conquistar”. 

Longos segundo se passaram enquanto eu encarava minha irmã. Como tudo isso aconteceu sem que ninguém soubesse? Era tanto para pensar e refletir e… Ah, a madrugada seria longa.

— O reino voltou as atividades depois de dois meses, e surpreendentemente o número de monstros vindo da névoa diminuiu. Isso aconteceu há cerca de dois anos. Em nossa expedição, fomos para além da muralha, para o campo repleto de névoa, o qual havia apenas corpos de monstros, humanos, elfos e anões. — Ela olhou para as auroras, e uma delas saltou de susto. — A barreira de névoa era o limite estabelecido para ter chance de voltar vivo, mas ela se estendeu para toda a área de terra a qual batalhamos exatamente neste dia. Kaiser disse que nenhum ataque ocorreu durante três dias. Era engraçado pensar que tinha acabado.

O lugar mais perigoso do mundo e ela… parece bem!? 

— Procuramos o artefato pelos corpos apesar da dificuldade, mas… — Ela olhou para frente, para ninguém em especial, e cerrou os punhos, dando uma leve risada. — Uma pressão de aura veio de tão longe que eu, Aeliana Higasa, não pude nem identificar de quem era — Olhares assustados, dentes cerrados. — A pressão nos esmagou, era mais forte do que qualquer uma que eu já sentira. Um amontoado de monstros veio como uma onda de longe, mas — Ela mostrou os dentes. — o pior era que havia alguém atrás deles. Alguém os controlava. Vocês sabem o que isso significa? 

Aeliana abriu os braços, dando uma rápida olhada em todos ao redor, ainda com um sorriso no rosto. Ela chegou a girar uma vez, e até mesmo o Caos estava prestando atenção em cada palavra que saia de sua boca.

— Pode ser que a Fronteira realmente seja uma espécie de dungeon gigante. Nós nos preparamos para lutar, mas atrás de todos eles estava o Rei do Mundo. Semelhante a um Laiky, usava um traje antigo. Um que podemos ver em nossas escrituras sobre a sociedade perdida. De fato, sua forma se assemelhava a um Laiky, a um humano. Seu olhar era intelectual. Ele me encarou! Me encarou! — Ela olhou para mim de novo. — Eu não podia chamá-lo de monstro. Antes dos monstros nos alcançarem, ele simplesmente arremessou o artefato em minha direção. Devido ao sacrifícios do grupo, fui capaz de coletar a moeda em meio a manada de monstros e consegui fugir em seguida. Pela primeira vez na história, todos os monstros retornaram junto com a névoa.

Um ser que ficava além da Fronteira, além de tudo que conhecemos… Nunca tivemos chance de passar da beirada do que era seu território, e depois de anos, um ser que podia ter mais de 500 anos apareceu… 

Muita coisa acontecera nos últimos anos, mas isso era pior do que uma guerra em grande escala contra o reino de Balnor. Ele podia destruir todos nós. Eu não queria ver o fim. Essa informação-

Minhas mãos e pernas tremiam. Medo? Eu- eu-

— Caos, convoque os Sangues de Luz. Seja breve ao dizer o que aconteceu. 

— Sim, majestade — O Caos se curvou para o rei Reig e se retirou com pressa, fazendo os guerreiros pularem para fora de seu caminho.

— Quero que todos fiquem de vigia em cada canto do reino 2. O mínimo sinal desse tal Rei do Mundo deve ser dito a mim instantaneamente.

— Sim, Majestade — Kaizen e Ryu disseram e se curvaram juntos.

— Vão. É noite — Todos se curvaram na sala e se preparavam para sair, mas hesitaram andar quando o rei continuou: — Diga de novo o que aconteceu quando ele jogou o artefato para você — O rei olhou para Aeliana.

— Ele parecia não se importar com a moeda. Ele apenas andou casualmente, com as mãos nas costas, e desapareceu na névoa. E fugi da muralha, para a parte que fora destruída no confronto, e o Kaiser não sabia o que fazer.

— Kaiser é jovem para liderar o reino 1.

— A Fronteira está caindo, rei Reig — Os olhos se Aeliana brilharam mais quando encontraram os do rei. — Será o fim se o Rei do Mundo nos alcançar. 

— Movam-se! — gritou o rei, agitando os braços para acelerar o passo dos que ficaram para escutar a conversa.   

Meu pai, de dentes cerrados, olhou para mim.

— É hora de irmos — Olhei para Aeliana por um instante e ela acenou positivamente. — Ela vai nos encontrar depois, vamos.



-----------------



Saímos quase que correndo da sala de reunião, descendo novamente aquelas escadas cheias de ratos e baratas. No corredor escuro e com quase nenhuma tocha o iluminando, havia inúmeros ecos dos passos na escuridão a nossa frente.

Ele não era um monstro. Ou quase. O que era? Como? O que eram as dungeons? O que ele queria?

 Eu esbarrei nas costas de meu pai, que acendeu uma esfera de chamas em sua mão direita. Ele olhou para mim, atento, depois para de onde viemos e no fim para frente. 

Os passos pararam, e estávamos em silêncio total. Rapidamente fiquei de costas para ele e levei parte da minha aura avermelhada para as mãos. Meu coração acelerou quando encarei o vazio.

Traga-nos luz — Ele disse, e um clarão veio de seu poder, nos mostrando boa parte do corredor. 

Minhas pernas ainda tremiam. Eu era fraca aqui, eu morreria se tivesse vindo sozinha… Até que um piar veio de onde eu estava olhando e meu corpo parou. 

Ellie, vai morrer se não se concentrar.

Meu pai se posicionou sem tirar as costas das minhas e fez outra esfera de chamas, eu apenas ergui meus braços tremendo para o que estava vindo e-

Aaah! — Um grito agudo meu. 

Minhas energia se desfez quanto recuei um passo e os ratos passaram correndo nos cantos. Meu pai se virou agitado com seus punhos em chamas vermelhas e se acalmou quando viu o que era.

— Desculpa — falei, ainda recuperando o fôlego. — Pensei que era algo maior.

— Está tudo bem — Hiroki desativou o fogo da mão esquerda e segurou a minha, utilizando sua esfera na outra mão para nos guiar. — Em qualquer lugar seria mais seguro andar em silêncio no escuro — O assobiar do vento foi assustador quando olhamos de relance para trás. — Mas não aqui. Aqui vamos usar fogo.

Não houve um momento na caminhada em que eu conseguira parar de tremer. A cada som das armaduras quando passávamos, a cada eco vindo do escuro distante que nem sequer sabíamos se era humano ou mostro, eu mantive minha atenção mais em meus próprios passos do que no ambiente.

Minha irmã estava aqui com a pior notícia que o mundo podia receber e… Lumi podia precisar de apoio, força. Ele não se atreveria a morrer assim. Não foi para isso que eu me esforcei? Para ser diferente? Para ser melhor?

Eu podia ser. Eu conseguiria me tornar uma aurora. Enfrentar de frente seres que a maioria sequer considerasse estar de pé quando sentisse sua pressão de aura.

Finalmente chegamos a porta do meu quarto. Hiroki largou minha mão e segurou a maçaneta. Ele olhou brevemente para os lados e então para mim.

— Pegue só o que é importante — sussurrou, e eu acenei com a cabeça.

Ele abriu a porta devagar, sua atenção inteira no quarto enquanto eu vigiei os corredores. A única iluminação no quarto se tornara o brilho da lua sob a janela aberta com as cortinas agitadas pelo ar.

— Traga-nos luz — Um clarão de três segundos.

Nenhum ser no quarto.

Ainda saía fumaça das velas quando entrei e Hiroki me esperou na porta, e um calafrio me atingiu quando dei meus primeiros passos no quarto. Não havia rastro de nada, estava quase exatamente do jeito que deixei. 

Então o que abriu a janela até agora pouco?

O céu era diferente no reino 2. Mais cheio, mais vivo. Mas olhando para o sul, na direção da Fronteira… Parecia ser esplêndido. Acompanhada pelo som da minha respiração, andei lentamente até minha espada.

Segurei a lâmina e deixei que a energia vermelha de cortes a preenchesse, posicionando-a para a janela. Estiquei tremendo o braço e fechei um lado. Olhei de relance para Hiroki, que ainda me esperava com sua chama acesa. 

A floresta parecia mais escura agora, e as árvores estavam muito agitadas. Eu teria medo de ter que ir para lá, parecia muito pior do que uma dungeon ou encarar um Ritualista de frente. 

Quando fechei a janela por completo, o silêncio surgiu, e eu engoli seco. 

— Bom controle — sussurrou ele.

— Obrigada — respondi, erguendo levemente os lábios.

Meu pai sinalizou para irmos e eu o segui andando na ponta dos pés. Não queria mais ficar aqui. Seguimos novamente o corredor escuro até alcançarmos o lance de escadas.

Essa tensão de um ataque a qualquer momento, o mundo entrando em um grande perigo e… e… E eu aqui, uma Dilúculo acompanhando um aurora por corredores potencialmente mais perigosos que bandidos do reino 7.

Um piar de uma das armaduras escada acima. 

Meus pelos se eriçaram e eu senti algo vindo, algo que arrancaria minhas entranhas para fora assim que me alcançasse nos degraus. Meu pai olhou para cima com seu fogo e eu engoli seco quando-

— Aaah! — Um rato grande passou correndo, e uma corrente de ar veio agitando meu cabelo.

— Vamos — disse Hiroki, seu olhar afiado acima.

O último corredor tinha apenas uma tocha, mas cerca de seis armaduras nas paredes com alabardas. A porta de madeira levava para fora do castelo, restava não mais que vinte passos para sair desse lugar…

A cada passo dado a tensão crescia em mim. Olhei diversas vezes para o escuro atrás de nós enquanto Hiroki me puxava. 

Mas se viesse algo, eu teria que lutar. Teria que usar minha espada, minha magia, para confrontar uma criatura do reino 2. O medo na batalha era o maior aliado da morte, e hoje não era o meu dia de morrer.

Eu preciso viver para chegar ao nível da minha irmã.





Comentários