Reino da Verdade Brasileira

Autor(a): Lucas Baldi


Volume 3

Capítulo 58.5: Por uma vida melhor

 



O céu nunca esteve tão azul após aquela chuva. Os livros pesavam um pouco menos em minhas costas, fossem pelo treino ou pelo ódio que eu sentia quando era incapaz de entender um conteúdo. Estava um pouco menos complicado de acompanhar, minha base teórica fora, forçadamente, criada para conseguir uma nota decente no teste. Pouco mais de um mês de estudos era tão pesado quanto um de treino. Devia ser simples, como o conteúdo do livro podia ser tão diferente do da prova? Não era para ser a mesma coisa?

 

Sentando-me no grande chafariz, vi que a cidade começou a ser enfeitada para o evento do reino. Algumas pessoas vestiam roupas um tanto chiques, como vestidos dourados com um chapéu, na frente das lojas. Já outros máscara e um tipo de terno engraçado. A água subiu no mesmo instante que a brisa alcançou a cidade. Novamente, as nuvens passaram a vir às pressas da montanha, e a água do chafariz caía no pátio como chuva. O Olhar da Aura me permitia ver a mana que jazia na água, na aura das pessoas, até mesmo no chão. Um homem, que passava próximo, utilizou mana nas pernas e acelerou o passo. Mesmo que pouco, eu consegui enxergar o movimento. 

 

Porém parecia vago, simples. Para melhorar essa técnica eu precisava ver além.

 

A escola havia nos liberado mais cedo hoje, e sinceramente eu nem procurei saber o porquê. Os dias eram… relativamente tranquilos. Minha vida só ficava em risco quando um dos cinco se aproximava, apesar de não terem mexido comigo depois daquilo. Sem atividade Ritualista, sem sinal de Obscuro. Mesmo nos treinos de formalidade com Lotier e Fent, nada disso era comentado. Eu curtia e odiava essa pausa do caos. Parte de mim queria esquecer tudo e ter uma vida comum, viver com minha família sem ter medo de ser caçado, de colocá-los em risco. Eu sabia que meus pais eram fortes, mas apenas um Ritualista lutou contra Alatar e Rona ao mesmo tempo. Quantos realmente eles eram?

 

— O representante por aqui — Uma voz familiar veio de trás. — Você já visitou a biblioteca a qual conversamos? 

 

O Cavaleiro Real Raú sentou-se ao meu lado.

 

— Ainda não — falei, minha voz vaga. — A Academia me levou todo o tempo, apesar de ter me dado uma base de como usar melhor a minha magia. 

 

— Compreendo. Imagino que seja difícil se adaptar a… tudo. Mas temo dizer que ver o representante cabisbaixo pode desanimar quem passa ao seu redor, e o evento é em pouco mais de oito dias — Nos encaramos por um momento, e o som de todo o lugar pareceu sumir quando ele falou: — Que tal eu te contar sobre uma de minhas histórias? Talvez te distraia um pouco.

 

Acenei com a cabeça que sim, e ele continuou:

 

— Foi o mais próximo que cheguei do “Caminho Branco” — Meus pelos se eriçaram. — Oh, então você já ouviu falar. Como cavaleiro Real, eu preciso estar no lugar certo na hora certa porque somos poucos. No caso, eu não sei dizer se eu segui essa tradição. O Reino Um sofre ataques que, se não forem devidamente impedidos, podem derrubar não só a Fronteira, mas se alastrar para todos os outros reinos. O problema em questão era um Laiky — Meu coração acelerava conforme ele contava. — Normalmente perigosos, mas este desgraçado falou comigo quando atravessou as garras pelas minhas costelas, destruindo o aço de minha armadura. Minha visão escureceu quando ele deu alguns passos para trás, e um ser diferente se aproximou dele. Claro, eu não podia e nem posso provar que era o Caminho Branco, mas pelas imagens retratadas e relatos esquecidos eu supus ser.

 

— Como você, um cavaleiro Real, pode ser rendido assim? Os Caos também podem ser derrotados? — Quase me engasgando com as palavras, eu continuei. — De onde os Laikys vêm?

 

— Se nós fossêmos invencíveis, Lumi, não teríamos medo do que há dentro da Fronteira, e não temeríamos a volta dos Obscuros — Ele suspirou, lançando o olhar para frente. — Sabemos que eles habitam dentro da Fronteira, mas nunca chegamos tão longe para entender como são criados. Lá é um campo de guerra que só os mais pirados gostariam de entrar — Ele se levantou. — Obrigado novamente pelo papo.

 

Fiquei de pé e nos cumprimentamos em um aperto de mão.

 

— Igualmente, Raú.

 

Quando ele se virou de costas, falou brevemente:

 

— Fique atento a tudo e a todos. Você é um ponto curioso para nós cavaleiros. Alatar fala como se já fosse um de nós, embora eu acredite que você em breve será um.

 

— Como assim?

 

— Desde sua luta contra Miguel, há pessoas de olho no seu potencial. Boas e más, inimigas ou não — Ele virou o rosto por um momento e me deu um fraco sorriso. — Espero que tenha entendido o recado.

 

Quando ele se foi, eu finalmente comecei a processar se havia ficado com mais medo ou se de fato tinha me distraído.



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