Reino da Verdade Brasileira

Autor(a): Lucas Baldi


Volume 2

Epílogo

 

 

As correntes nos meus braços buscavam ansiosamente por qualquer vestígio de magia que eu liberasse. Desconfortáveis e frias, essas algemas me irritavam. Os dedos da minha mão ainda estavam quebrados por causa daquele moleque. Rangi os dentes ao relembrar a cena, eu iria me vingar. A única fonte de iluminação desta cela era a tocha depois da pequena janela da porta de ferro reforçado. Os guardas se mantiveram sempre atentos desde que fui jogado aqui, o medo deles me trazia uma vontade insaciável de rir e dilacerá-los. Guerreiros, cuja presença eu contava, teriam sido facilmente mortos pela criatura invocada. Talvez aqueles putos devessem ter feito uma cópia melhor do Laiky original. Contudo o problema foi aquele cavaleiro desgraçado. Eu iria me lembrar, eu iria passar minha lâmina afiada sobre a sua garganta, torturá-lo até que implorasse pela morte.

 

Alatar, lembre-se de mim. A relíquia estava em mim agora. 

 

A porta arranhou o chão de pedra quando foi aberta. Um guarda bem armadurado entrou segurando uma tigela de madeira um pouco maior que uma panela. Pelo cheiro e pela temperatura, a comida havia sido feita há pouco tempo. O indefeso soldado olhou para mim com desgosto, depois para as algemas. 

 

— Hora da comida, finalmente — falei, logo fiquei de pé, e o homem deu um passo para trás.

 

— Eu só te alimento porque ordenaram que você ficasse vivo, Letholdus. Por mim você seria executado em público, só assim para amedrontar quem quer que comande os Ritualista. 

 

— Poxa, eu achei que você vinha porque adorava ver o meu rosto — gargalhei.

 

— Que seja a última vez que eu veja esse seu rosto patético — Ele jogou a comida no chão. — Aproveite a refeição. 

 

— Qual é seu nome, guarda?

 

— Eu me chamo Eratos, peste.

 

— Eratos, quando eu sair daqui, você será o primeiro de quem eu irei atrás.

 

Eratos riu e se foi, trancando a porta com diversas fechaduras e ativando as runas mágicas. Fiquei de pé, cada osso do meu corpo estalou por ficar parado tanto tempo nessa cela. Estiquei meus braços e as algemas se partiram, andei até a comida e levitei cada grão de arroz de volta para o pote e, com uma pitada de fogo, esquentei o prato. Sentei-me contra a parede e degustei de refeição feita pelos cozinheiros de Tera. 

 

Lumi Kai conseguira escapar de mim. Foi assim que você se sentiu, Grannus? Deixei um moleque que nem podia utilizar a magia sair vivo e ainda me atacar. Ele diferia do garoto da profecia, no entanto. Lumi era realmente uma ameaça ao plano dele? Foi então que as luzes do lado de fora piscaram, e o medo nos corações dos guardas se fortaleceu. A famosa fumaça escura de Sekhem levou os guardas a desmaiarem. A porta da cela se abriu lentamente. Engoli seco ao ver a silhueta de um ritualista superior emergir das sombras.

 

— Você falhou — Sua voz emitia uma pressão de aura tão grande que, quando tentei me levantar, fez meus joelhos quebrarem o chão. — Lumi Kai despertou?

 

— Não. 

 

— O paradeiro dele é desconhecido agora. Como dois dos nossos melhores assassinos inferiores falharam em matar um simples garoto? 

 

— Eu posso matar ele! — Fiquei de pé, a risada louca se destacava em meu semblante. — A relíquia… ela está dentro de mim. Eu a absorvi!

 

— Você não sabe o que a energia das almas pode fazer — Sekhem sorriu. — Em breve, Grannus virá te informar sobre o plano. Depois disso, o mestre deseja um Kai.

 

— Outro Kai? Então podemos finalmente atacar Kanro e Emy — Um sentimento de euforia surgiu em mim. — Por que essa mudança repentina? 

 

— Ordens. Aproveite seu tempo aqui e medite sobre a relíquia que absorveu, você vai precisar se quiser se livrar de Alatar para nós.

 

— As relíquias têm esse potencial e seu potencial. Eu preciso mesmo ficar aqui? O plano já foi iniciado? 

 

— Letholdus, a semente do ódio já foi implantada nas demais sociedades, porém é um processo lento criar a ponta de coragem que os países precisam para, enfim, conspirar contra a queda dos dez reinos. Tenha paciência, o líder ordenou sua presença em Tera. Porque quando você sair — Sekhem andou até a porta. — sairá com a cabeça do rei. — Ele virou para mim, e a fumaça escura começou a tomar conta do seu corpo. — E a ordem do supremo é que rios de sangue corram por toda Tera — Sua voz aumentou com o evento da magia — Marcando nossa guerra contra os reinos!

 

O corpo dele sumiu e os guardas começaram a se levantar. Uma pequena esfera negra surgiu ao meu lado, e eu pude ouvir o sussurro de Sekhem.

 

— Use com cautela e a garganta do cavaleiro real será sua. 

 

Os guardas gritaram quando correram até mim e afundaram minha cabeça contra o chão, colocando as algemas em meus braços pelas costas. Eu só conseguia rir, no entanto. Como eu poderia me irritar se finalmente podia ter a força para matar Kanro e Alatar? 

 

Me aguardem, porque eu iniciei meu caminho para o nível superior.



Comentários