Volume 1 – Arco 5

Capítulo 60: É Um Até Logo

O dia já tinha amanhecido a algum tempo, mas dos três filhos do rei dos elfos do pico da lua, apenas dois estavam prontos, a última, a sétima filha, ainda estava se arrumando.

Penteava e perfumava seus longos cabelos cor de lua, era o dia da partida, o último dia que veria Ferrer, tinha passado algum tempo com ele, mas seu coração já parecia ficar pesado com aquela saudade.

Tinha aprendido tanto com ele, mal conseguia entender aquilo, por que sentia aquilo? Essa saudade de alguém que não conhecia bem, e estava tão… Ansiosa por deixá-lo: 

— Já acabou? — Seu irmão mais velho perguntou na porta do quarto.

— Quase. — Ela avisou se levantando para se olhar no espelho.

Seu vestido vermelho sem alças ou mangas mostrava não só seu busto, mas também uma tatuagem élfica que estava ali, ela era linda. Não podiam ir contra esse fato, mas pela primeira vez se sentia insegura.

Não tinha a pele clara das damas da corte, e mesmo que sua pele fosse bem vista entre os elfos da lua, será que ali seria? Não conseguia entender bem isso.

Nem por que se importava.

Tomou seu tempo para se enfeitar, colocando anéis, pulseiras, braceletes, tudo para parecer mais segura, era uma pela princesa em um vestido vermelho de bordados dourados, mesmo que aquelas damas da corte tentassem, ela ainda seria princesa. Mas então… Por que?

Talvez por ver como Ferrer interagia com elas, de modo tão cordial, mas sentia ainda um certo distanciamento entre ele e essas damas, talvez… Só talvez… Ele gostasse de verdade dela e não fosse apenas um deslumbramento inicial.

Finalmente se sentiu bonita o suficiente para sair do quarto, levando consigo a mala de mão onde suas jóias, maquiagens e perfume estavam.

Procurou reunir coragem, mesmo que não tivesse qualquer autoconfiança nesse momento, mas quem ligava? Sorrir e parecer perfeita era sua maior especialidade, não era sequer contra a usar magia para parecer mais… Angelical como seu nome dizia. As pequenas luzes de seus cabelos eram isso, pequenas bolinhas de luz que mantinha acesa com sua própria mana.

Seus passos quase não eram ouvidos, era de uma graça sem igual, e adorava essa persona mais graciosa, mesmo que cansasse um pouco, não se importava, no fundo gostava do aspecto mais “divino” que podia exalar com ajuda de sua própria magia.

Sabia que seu pai e seus dois irmãos já estavam esperando, então já estava ensaiando aquelas desculpas bobas para seu atraso, que não eram comum. Odiava atrasos, achava deselegante, irritante, e nunca gostava de ficar esperando mais que o proposto:

— Seraphs? — A voz firme do príncipe chegou aos seus ouvidos, virou seu rosto para o encontrar.

Ferrer estava mais “informal” do que viu nos últimos dias, uma camisa branca de botões, calças pretas e sapatos sempre bem lustrados, carregava um tipo de embrulho consigo, que pegou a atenção da princesa:

— Príncipe Ferrer! — Sorriu com aquele forte sotaque que Ferrer parecia adorar tanto.

O sorriso no rosto do príncipe brotou assim que o dela apareceu, ela sempre parecia ser um ser de fora do plano, algo que deveria ser grato apenas por tocar, sentir sua maciez e ouvir sua voz tão terna, ainda que a comunicação fosse uma questão entre eles, aos poucos estavam aprendendo o idioma um do outro, mas sinceramente, que coisa trabalhosa:

Está linda. — Ferrer arriscou aquilo.

Era curioso como ambos tinham um sotaque marcado um para o outro, enquanto Ferrer achava a coisa mais linda do mundo ouvir o sotaque de Seraphs, Seraphs achava a coisa mais fofa e engraçacinha do mundo ouvir o sotaque do príncipe humano, sempre lhe arrancava uma risadinha encantada:

Veio se despedir, príncipe?

Ferrer só entendeu duas palavras de fato, “despedir” e “príncipe” por associação, achou que ela estava dizendo que ele veio se despedir, então acenou com a cabeça, um sinal universal para “sim” assim seria mais fácil comunicar.

Claro, Seraphs ficou feliz, ele veio mesmo lhe ver, não apenas isso, não fez algo na frente dos outros, de forma diplomática, realmente veio vê-la! Seu coraçãozinho se alegrava.

Ferrer se perdeu completamente admirando o rosto iluminado pelo sorriso encantador de Seraphs, até esqueceu por que estava ali, piscando para voltar a realidade:

Pra você. — Estendeu o embrulho para ela, quase… Tímido? Que gracinha!

A princesa élfica colocou sua mala de mão no chão, pegando o embrulho, pelo olhar dele, parecia que ele queria que abrisse agora. O embrulho era circular, o que atiçou ainda mais sua curiosidade, com cuidado tirou todo o embrulho revelando uma bola de cristal! Seus olhos brilharam de surpresa, podia ver seu reflexo na superfície polida da esfera:

Para falar. Nós dois. — Ferrer esclareceu, mesmo que Seraphs tivesse entendido de primeira.

Abraçou contra si, se aproximando do príncipe com empolgação, sequer pensou quando seus lábios encontraram o rosto de Ferrer.

Um beijo na bochecha.

Foi tudo que bastou para ambos ficarem sem jeito, com o rosto corado, Seraphs se deixou levar completamente.

Ficaram ali, que nem dois bobos, se encarando pesando o ato que acabara que acontecer, corações acelerados, rostos quentes e bocas meio abertas.

Era uma cena fofa e engraçada, daria uma boa piada se Ian estivesse ali, isso era um fato inegável.

Ferrer se afastou primeiro, passando por Seraphs e pegando a mala, começando a andar para a saída, ele não veria, pois a garota estava na suas costas, mas Seraphs sorria.

Sorria por ter tomado aquela atitude, sorria por ter visto a cara toda boba do príncipe.

De fato, tinha gostado.

Ahrija estava ansioso olhando ao redor, estava partindo e sua amiga ainda não tinha vindo o ver, se despedir, será que estava tão ocupada assim que sequer poderia vim se despedir?

A cada minuto que passava ficava ainda mais murcho, seus ombros mais baixos, e Quevel ainda estava claramente preocupado que aquela queda que tanto previu acontecesse mais cedo do que imaginou, como ela poderia o esquecer daquele modo? Bem, ela era uma princesa, deveria estar ocupada:

— Ahrija, precisamos ir.

— Ela vai chegar.

Mas aquela vozinha incerta quebrava o coração do curandeiro, suspirou com aquilo, mais algum tempo e ele provavelmente iria querer ir embora, mas aquilo iria o destruir:

— Ela vem. — Repetia, mesmo sem qualquer certeza na voz.

— Ahrija…

— Ahrija! — A voz alta da pequena princesa chamou atenção dos dois.

Olharam ao redor, procurando, mas quem finalmente achou foi Quevel, vendo a garotinha flutuar até o chão, meio ofegante, ela estava correndo?

— Desculpa eu… Calma. — Elia pediu colocando as mãos no joelho, tentando recuperar o fôlego.

— Você veio! — Ahrija sorriu aliviado para aquela situação.

— Claro que vim, você não iria embora sem me ver, ia? — Olhou para seu amigo, quase indignada que ele pensou aquilo dela.

Colocou a mão no peito quando finalmente conseguiu respirar mais facilmente, mal sabiam o que fez para conseguir chegar ali, mesmo atrasada:

— Bem, parece que isso é um até logo afinal. — Quevel sentia que não havia mais o que fazer, aquela criança realmente iria fazer parte de sua vida e da vida de seu aprendiz permanentemente.

— Eu trouxe um presente! — Elia sorriu erguendo um embrulho meio torto que claramente tinha feito.

Mostrava o jeito infantil

Ahrija, com sua animação, se pôs a abrir o embrulho sem qualquer cuidado, revelando um tipo de relicário transparente, parecia um tipo de vidro especial, mas o que estava dentro era que surpreendeu: Uma mecha de cabelo.

Conseguia ver uma parte do cabelo dela menor pelo corte, os olhos de seu aprendiz brilharam, encarando o colar relicário e depois sua amiga:

— Agora estamos sempre juntos. — A voz de Elia estava realmente feliz com aquilo.

Ele tinha lhe entregado seu primeiro dente, Elia lhe entregou seu primeiro corte de cabelo, mesmo que não fosse tão equivalente, o gesto era sim importante para ambos, o brinco da menina ainda estava pendurado na orelha, exibido para todos aqueles que quisessem ver.

Compartilhavam ambos parte um do outro, selando um compromisso que sequer entendiam.

Quevel não iria admitir aquilo para ninguém, mas aquilo aqueceu seu coração, o emocionando o velho curandeiro.

E finalmente veio o abraço forte de duas crianças pequenas, com uma saudade que iria começar a crescer:

— Vou te visitar. — Elia garantiu aquilo, ainda apertando o amigo.

— Promete? — Ahrija pediu.

— Prometo. — Garantiu aquilo.

Era uma despedida que não queriam fazer, Elia realmente aprendeu a gostar do seu amigo mais querido, talvez apenas Daphne concorresse aquele posto, mas pra que? Poderiam os dois serem melhores amigos! Era simples.

Ficaram ali por longos minutos, abraçados, querendo talvez lembrar daquela sensação, afinal não sabiam exatamente quando se veriam, poderiam só ter essa sorte apenas no aniversário do ano que vem!

Não queriam mesmo passar tanto tempo longe! Mas séria necessário, o garoto não poderia morar no palácio e a garota não podia morar na vila dos aures.

Eram mundos bem diferentes, mas ainda sim eram tão amigos, como poderiam ter uma barreira na sua amizade? Era inconcebível para eles:

— Eu vou sentir tanta falta de vocês… — Confessou baixinho, ainda abraçada a Ahrija, mas  seus olhos encontraram os de Quevel.

Quando o abraço com seu pequeno amigo acabou, ficou ainda encarando o curandeiro, criava coragem antes de se jogar nos braços daquele homem dragão:

— Não vai embora. Tem lugar aqui pra vocês!

— Sabe que não podemos, pequena…

Aquelas despedidas eram dolorosas, mas para Elia eram especiais.

Finalmente tinha se conectado o suficiente com alguém a ponto de sentir saudades deles, coisa que era inconcebível quando estava na sua antiga vida, não tinha tempo para tal coisa.

E ali estava, triste pela partida de um garotinho de seis anos que tinha se ligado tanto!

Eram tantos sentimentos novos para uma criança de cinco anos e também para alguém que não estava acostumada com tantas coisas assim.

Amizade, respeito, aceitação, não eram coisas que se tinha num exército, e especialmente para ela que era apenas uma arma a mando de um império expansionista como aquele.

E agora…

Lágrimas brotavam em seu rosto infantil, não queria chorar na frente deles, mas aquilo acabou trazendo o choro de Ahrija, agora duas crianças choravam, se abraçando e pedindo para não irem embora.

Era uma cena engraçada, como se fossem embora de um parquinho! Quevel achou fofo e meio constrangedor, pois algumas pessoas já estavam olhando aquela situação toda.

Quevel esperou um pouco, até que eles se acalmassem e finalmente se soltassem, limpando as lagrimas com suas mãozinhas pequeninas:

— Se sentem melhor? — Quevel se abaixou, ficando na altura deles.

— Não quero ir…

A voz de Ahrija era chorosa, acompanhada das suas fungadas, e também de Elia.

Quem diria que choraria para alguém assim? Que sentiria falta de alguém daquele modo? Essa nova vida estava cheia de surpresas, e agora sequer conseguia controlar seu choro.

Era oposto da maga de guerra fria que um dia foi, mesmo tendo essas memórias, será que não era uma pessoa completamente diferente? Talvez…

Talvez assim sentisse que a culpa suavizasse um pouco, afinal se era diferente, não deveria passar por aquela redenção.

Mal percebeu quando Quevel tocou seu rosto, enxugando suas lágrimas com sua mão quente de dragão de fogo:

— Vai sentir minha falta? — Elia finalmente perguntou.

Quevel riu, se levantando, tomando seu pequeno aprendiz no colo, mas olhava ternamente para a garota:

— Mais do que imagina, pirralha.

Elia fungou mais uma vez, limpando seu rosto, mas acabando de se melecar toda por chorar, mas não importava!

— Nos vemos ano que vem, princesa.

— Espero que sim, dragão. — Elia respondeu.

— Tchau, Elia! — Ahrija disse tentando não chorar de novo.

Quevel abriu suas asas, segurando Ahrija no colo e finalmente alcançando voo, uma última vez olhou para trás, vendo a pequena criança ainda ali, acenando tristemente, como se fosse o fim do mundo:

— Crianças…

E então…

Partiu.

Deixando Elia para trás e todo um castelo cheio de pessoas, mas… Uma coisa tinha quebrado a cara.

Aquela garotinha era mesmo mais que uma princesa mimada.

Elia ficou ali, olhando eles se afastando, junto com tantos outros convidados que deveria se despedir, mas eles não importavam para ela, não ligava mesmo:

— Até mais, Ahrija.

 

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