Volume 1 – Arco 1

Capítulo 4: Uma Pequena Reunião

Os dias se passaram e chegou o último evento que os três príncipes teriam juntos: O aniversário de um ano de Eliassandra.

O que tinha entendido era que o evento seria mais íntimo, apenas para amigos próximos, mas então a pequena garota se perguntava por que raios todos estão tão arrumados assim?

Pelo que entendeu das conversas, viriam alguns amigos e familiares, provavelmente conheceria seus avós, e alguns nobres, nada mais que isso, mas mesmo assim ela estava sendo arrumada como se fosse ver o reino inteiro. Tentava não ficar agoniada com a roupa pesada demais para um bebê, era um vestido bufante lilás, a cor de sua mãe.

Cada uma das esposas de seu pai parecia ter uma paleta de cor que refletia em seus filhos, sua mãe, a rainha, sempre era vista com tons de lilás e lavanda, as vezes um rosa, já a Lady Ana Bael era vista com cores alegres como amarelo, verde, laranja, isso refletia em Ian que sempre estava de verde, sendo sua cor favorita. Já Lady Leopolda usava azul, assim como seu filho, ambos usavam cores frias, combinava com eles.

Até mesmo as jóias que usavam pareciam ter sua própria paleta, era óbvio que todas usavam ouro, mas eles tinham tonalidades diferentes, o outro dourado, mais comum, era reservado a Elengaria, por se destacar na pele albina da rainha. Já o ouro branco era sempre de Leopolda, dava ainda mais aquele ar de mulher fria que ela parecia sempre carregar, assim como seu filho, ouro rose era de Ana Bael, que sempre ficava tão belo nela.

Eram as três esposas do rei, qualquer homem que o olhasse sentiria inveja, mal sabia que a existência das outras duas foi por que a primeira não conseguiu satisfazer o gosto dos nobres ao redor de si:

— Vai ser a primeira vez que a senhorita vai usar uma coroa, está ansiosa? — A senhora que cuidava dela sorria trazendo a caixa adornada em alto relevo com seu próprio nome.

Tinha sido feita sob medida.

Nunca teve sequer algo parecido quando era uma maga de guerra, sequer tinha jóias, apenas um anel que compartilhava com um amigo que morreu antes dela. Estava ansiosa para ver aquilo, sentada em seu troninho de criança, provavelmente usaria isso para brincar com suas bonecas.

Quando a caixa foi aberta, os olhos da pequena princesa arregalaram, mesmo sendo pequena, era linda, assim como todos os seus irmãos, sua coroa era dourada, com arames finos de ouro que formavam flores e no centro de cada uma das flores tinham pequenas pedras brancas, e no centro da coroa tinha um belo diamante vermelho, assim como os olhos da princesa.

Aquilo parecia tão delicado e valioso que teve medo de tocar e quebrar, será que era possível? Era de ouro puro, sequer sabia se podia quebrar facilmente.

Quase ficou sem se mexer quando a coroa foi colocada em sua cabeça, e poderia dizer que finalmente parecia uma princesa:

— Está linda. — A velha empregada sorriu largamente olhando o reflexo de Elia no espelho.

Um ano inteiro.

Passou esse ano acreditando que talvez acordasse e ainda estivesse em guerra, que tudo não passava de um sonho bom que estava tendo.

Mas não.

Aquilo era real.

Ela morreu e reencarnou como a filha protegida do rei inimigo com quem lutou.

Era surreal.

Só o pensamento a fez sorrir, era grata por seja lá quem a fez nascer nesse novo mundo, nessa nova vida.

Não demorou muito para que a velha serva lhe levasse até sua familia, mesmo que faltasse alguns membros, afinal quando percebeu só estava ali seus pais, o rei Ricardo que vestia uma roupa vermelha com detalhes dourados, mas claro que sua atenção foi completamente para sua mãe, ela estava linda.

A rainha Elengaria usava um vestido  amarrado no pescoço longo, deixando os braços à mostra por não ter mangas, mas nos braços tinham braceletes e pulseiras douradas, as mãos também estavam repletas de anéi também dourados, ela não usava coroa agora, mas seus longos cabelos brancos estavam soltos e esvoaçantes, completando toda sua silhueta.

Ela estava linda.

Assim que viu a filha, estendeu as mãos para pegá-la dos braços da velha empregada, Elia sempre estava ansiosa para voltar para a mãe, então logo estava balançando os braços para ir para ela:

— Ela está linda. — A rainha sorriu com sua filha nos braços.

Era a primeira aparição pública de Elia, pública entre muitas aspas, já que todos no castelo já conheciam a pequena princesa, afinal quem não ficou feliz com seu nascimento? Ok, algumas pessoas não ficaram felizes, mas isso poderia ser visto depois.

Elengaria respirou fundo, estava nervosa, fora sua família imediata e as pessoas que moravam no castelo, era a primeira vez que sua família anterior veria sua filha, se perguntava se eles gostariam da pequena, se ela seria agradável.

Elia tinha um crescimento saudável, apesar de ainda não andar, para o sofrimento da criança, falava com clareza suficiente para que fosse entendida. Não podia exigir tanto de um bebê não é?

Mas Elia estava nervosa, fingir para poucas pessoas era uma coisa, para tantas de uma vez? Nem sabia quem eram as pessoas de fato, pouco sabia sobre a família anterior dos pais.

Seriam arrogantes? Seriam legais? Amistosos? Malvados? Não sabia e isso lhe dava ansiedade, mas como uma boa criança, apenas dava risada dos comentários de seu pai para si, enquanto sua mãe o impedia de bagunçar seu cabelo perfeitamente alinhado, por pouco tempo, obviamente, era criança! Logo mais estaria se bagunçando.

Quando as portas de madeira pesada foram abertas pôde ver o salão de reuniões intimas, mas mesmo sendo íntimo era algo até grande, tinha uma grande mesa num dos cantos com todo tipo de comida, algumas sequer conhecia, mas pelo que reparou, em respeito a sua pouca idade, não tinha bebidas alcoólicas.

Algumas pessoas já estavam ali, e mais uma vez não entendia como aquilo poderia ser chamado de simples, as pessoas usavam joias e estavam com roupas chiques, isso que é ser da realeza?

A primeira pessoa a se aproximar era uma pessoa incrivelmente parecida com sua mãe em feições, mas a pele era mais escura, assim como os cabelos, o que provava que sua mãe realmente sofria de uma condição que tirava o pigmento de sua pele, talvez o mesmo que afetasse seu cabelo. A mulher parecida com sua mãe usava um colar pesado que parecia brilhar demais, os cabelos negros estavam adornados de algumas joias e os olhos eram de um preto que chamava atenção, mas mesmo sendo bela como sua mãe… Elia a odiou no momento que deu uma risada arrogante:

— Essa é a princesa? Ela não é meio… Pequena? — Ela tinha uma voz irritante, cheia de sarcasmo que fez Elia fechar a expressão em automatico.

— Bem, ela tem apenas um ano Vivany, Eliassandra, essa é sua tia. — Elen tentou amenizar o comentário de sua irmã mais velha.

— Olá majestade, que prazer lhe ver. — A irmã ignorou completamente a princesa e sua mãe para sorrir para o rei.

Ricardo estava com uma expressão amarga, não gostou de ter sua pequena princesa ignorada daquele modo:

— Lady Vivany, acho que deveria cumprimentar a princesa. — Ele alertou com sua voz baixa.

Vivany tentou disfarçar, mas não estava feliz em ter que falar com a criança, mas nem mesmo Elia queria falar com ela, quando sua atenção se voltou para o pequeno serzinho nos braços de sua irmã mais nova, esse já estava com uma expressão amarga:

— Claro, boa noite, alteza. — Forçava um sorriso e uma voz amavel.

Elia ficou em silêncio, encarando a mulher, parecia pesar o que falaria a seguir, sua mãe lhe incentivou gentilmente a falar, afinal conhecia sua filha e sabia que mesmo com a pouca idade, ela falava:

— Ora Elen, não está querendo dizer que sua querida princesa já fala não é? — Vivany tentou provocar a irmã.

— Feia. 

A voz infantil ecoou pela sala, fazendo não só Lady Vivany arregalar os olhos, mas outros convidados prestarem atenção, e claro, o rei prender uma risada quando ouviu o que sua filha tinha falado:

— O que disse?

— Ela é só um bebê, aprendeu essa recentemente… Elia, se diz “boa noite, tia”. — Elen tentou amenizar o clima, sorrindo sem jeito para a irmã.

— Boa noite… Tia feia. — Elia completou.

Vivany ficou com um tique no olho esquerdo encarando aquele bebê que sorria como se soubesse exatamente o que estava fazendo, mas não deu tempo de falar mais nada, uma senhora mais requintada empurrou a lady gentilmente para longe:

— Quer dizer que a pequena princesa já fala? Demorei um ano inteiro para conhecer minha neta.

Elia desfez o sorriso para encarar a mulher que era alta, mesmo na sua idade avançada, ela ainda era alta, seus cabelos já eram grisalhos e não usava tantas jóias, principalmente brincos e colares, entendeu bem que era uma festa para conhecer um bebê:

— Olá mãe, quanto tempo. — O rei sorriu para aceitar a mão de sua mãe e beija-la.

—Sim, mas desde que seu pai faleceu, viver afastada realmente me fez bem. Como está Elen? Soube que sua gestação foi dificil. — Se referiu primeiro a sua nora.

— Sim, mas felizmente Elia é muito forte e saudável.

— Claro que sim, ela é filha do meu filho, aqui, venha com a vovó.

Elia olhou para sua mãe antes de aceitar ir com sua avó, nunca tinha visto aquela mulher na sua vida e agora ela era sua avó? Mãe de seu pai? Isso explicava por que ela era tão alta! Até mais que sua mãe:

— Ela tem os olhos. — Constatou olhando bem o rosto infantil de Elia.

A senhora mesmo sendo alta e tendo braços fortes, tinha uma expressão serena, o rosto já era marcado por rugas, sua pele não era tão branca quanto sua mãe, mas não chegava a ser escura como seu pai, fora isso era possível ver uma pequena cicatriz no lábio superior, provavelmente de uma batalha. Seus cabelos eram curtos, na altura das orelhas, seus olhos eram de um azul bem claro, não era frio como de Leopolda, era calmo e amável:

— Elia, essa é sua avó, Leonor. — Seu pai fez questão de apresentar.

Claro que Elia poderia falar seu nome de vez, mas tentou algumas vezes até conseguir sair algo mais decente com sua idade jovem:

— Leno. Vovó Leno. — Disse por fim, testando a senhora.

A senhora riu daquilo, achou a coisa mais fofa do mundo ver sua pequena neta falar daquele modo:

— E como estão minhas outras duas noras? E meus netos? — Parece que a conversa iria virar conversa de adultos.

Mas logo os outros presentes começaram a se aproximar de Elia e seus pais, tios, tias, alguns primos mais próximos, mas não viu seus avós maternos. Nem mesmo menção deles teve, o que lhe levantou algumas dúvidas, onde diabos estariam eles?

Mas seus pensamentos sempre eram interrompidos por um comentário passivo agressivo de sua querida tia, que realmente não foi com sua cara, e nem gostava de sua mãe, os comentários eram sempre disfarçados de inocência e ingenuidade, mas era claro que queria atingir sua mãe, como ninguém reparava? Ou talvez ela fosse tão irrelevante que ninguém ligava.

Mas Elia ligava.

E sua paciência estava por um fio.

Em algum momento seu pai ficou responsável por seus cuidados, sentado num sofá com Elia em uma das pernas enquanto Elengaria conversava animadamente com outras pessoas.

Pareceu a oportunidade perfeita para Vivany se sentar ao seu lado para puxar assunto com o rei, ela parecia mesmo ter muito interesse nele, mas quem não teria? Era um rei afinal:

— A Elen ainda não voltou ao corpo antigo não é? — Ela sorriu com um ar de inocência que só irritava ainda mais a criança.

— Ela está linda. — Ricardo cortou o assunto.

Vivany deveria ter se dado por vencida, mas não se deu, se aproximou do rei que sequer a olhava, dando atenção apenas à sua filha pequena que sorria:

— Uma pena que ela não é um garoto. — Ela sorriu levando uma mão ao rosto da criança. — Vai ser complicado para ela ser rainha…

Mais uma vez, Elia fechou a cara, encarando aquela mulher ardilosa querendo se esfregar no seu pai, que parecia estar desconfortável com aquilo:

— Mas o que esperar dela? É um milagre que a princesa esteja viva…

Elia se aproximou da mulher, empurrando a taça de bebida frouxa na sua mão, derrubando sobre sua roupa:

— Ora sua…

— Ora sua, o que? — Agora Ricardo pareceu irritado.

Vivany poderia não saber, mas o rei era extremamente protetor com seus filhos e sua caçula, como a única menina, era a princesinha da família, não parecia ser prudente mexer com ela.

O rei se levantou, não iria querer esperar a resposta da lady, não importava de fato o que ela iria falar, apenas queria se afastar de uma vez:

— Não acho educado falar da minha esposa assim, muito menos desrespeitar minha filha, mas como ela é sua irmã não irei expulsar da festa, mas peço que fique longe de mim Lady Vivany.

Lady Vivany ficou ali, encarando ele se afastar para junto da esposa, mas o que mais irritou era o sorriso pretensioso da pequena princesa, sempre com aquele ar de que sabia mais do que aparentava, como se fosse mais velha do que realmente parecia.

Que garotinha insuportável, como com tão pouca idade poderia ser tão irritante?

 



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