Raifurori Brasileira

Autor(a): NekoYasha


Volume 4

Capítulo 220.6: (SS) Dever De Um Sophiette [6/6]

Não demorou para a criatura em frente à jovem Sophiette investir com sua velocidade assustadora, era inacreditável que um ser sem magia conseguia ser tão rápido, contudo Sophia não ficou para trás e saltou.

Era ignorante no quesito de ataques, mas esquivas, fintas, defesas e projeções eram a sua especialidade, isso era bem útil quando precisava cansar Eliezer nas raras vezes que faziam um combate simulado.

Sabia que ali não venceria por tempo, essas coisas não eram humanos, não sabia nem se eles precisavam respirar para sobreviver.

Houveram mais três, quatro e cinco ataques simultâneos por parte do monstro, as pernas e braços magros, mas longos, obrigavam Sophia a se impulsionar com força no chão para gerar velocidade suficiente para desviar.

Viu apenas de relance, mas foi tempo suficiente para notar o olhar de tédio da Duquesa do Inferno, Leviathan mal se moveu do local desde que aquela luta começou, não tinha interesse na jovem Sophiette, só queria Aqua, porém se as crianças enchessem o saco demais, era certo que ela agiria.

“Ficar na defensiva por muito tempo não vai funcionar, a Lysandra não tem tanta mana… mas eu não sei nenhum ataque, mesmo minha força não vai fazer efeito se eu bater de qualquer jeito…” Sua espada provavelmente rolou pelo chão há algum tempo, era o pouco que tinha de poder ofensivo. “Ahh… eu não tenho nada a perder mesmo.”

Desde muito nova, ouvia que todas as crianças Sophiette nasciam como Gênios, Sophia não tinha aptidão para a magia, por isso Eliezer focou no treinamento de combate com armas, porém havia algo que se destacava na jovem, seu olhar apurado não servia apenas para ler as pessoas…

— Com certeza isso vai doer!

Ela conseguia copiar movimentos vistos apenas uma vez, sua mente decorava a lógica e o padrão por trás do golpe, permitindo-a usar um ataque ou defesa até mesmo melhor que o original… ela era um verdadeiro prodígio.

A garota arrancou pisando no chão com força, os golpes usados na sequência eram exatamente os mesmo que a criatura efetuou anteriormente, mas a diferença do tamanho dos membros da jovem Sophiette fizeram eles mais rápidos.

Bastou um chute e dois socos para o inimigo ser arremessado até a parede, a força descomunal da nobre provavelmente quebrou o braço da criatura quando ele tentou bloquear.

Sem tempo para se preocupar se o inimigo ainda podia levantar ou não, avançou contra o grupo espancando o menino ladino. Eles não prestaram atenção na luta da garota, por isso mal perceberam a aproximação dela.

Mesmo com seu jeito desleixado, Sophia empurrou uma das criaturas, o que foi suficiente para atrair as outras. Certamente não seria difícil derrotá-los, porém ainda havia a possibilidade de aparecerem mais.

Para encerrar a luta de uma vez, precisava cortar o mal pela raiz, ou seja… “Tenho que ma-matar Leviathan ford Ingrid…” Porém, ao encarar o local onde a Duquesa estivera estática até esse momento, surpreendeu-se, pois ela não estava mais lá. 

Um leve arrepio tomou conta do corpo da garota, seus sentidos rápidos souberam no mesmo instante a localização da sua inimiga: nas suas costas.

Virando a cabeça, viu aquela figura lhe encarando de cima e com raiva. Era bem menor que a demônia, e os seios voluptuosos dela quase impediam a visão do rosto bonito com a máscara.

— Você já encheu a minha paciência, garotinha. — Mesmo sabendo que era perigoso, Sophia tentou investir com um soco rápido, jamais conheceu alguém que desviou de seus ataques à curta distância, mas havia uma primeira vez para tudo.

Antes que seu soco chegasse ao ponto que seria impossível esquivar ou defender sem tomar dano, Leviathan adiantou-se e acertou uma joelhada rapidamente, jogando o braço da jovem Sophiette para o alto, o que abriu diversas aberturas na guarda da garota.

Sem hesitar, a demônia trocou o pé de ataque e afundou sua bota bonita e fina no plexo solar de Sophia, ela não fazia careta ou demonstrava qualquer sinal que usou muita força para isso, a base dos seus golpes eram a velocidade e o ataque nos pontos mais fracos do corpo humano.

Sophia sentiu o sabor metálico subindo a garganta, um frio invadiu o seu corpo de repente. A sensação dolorosa no estômago não desaparecia, mal conseguia ficar de pé, por mais que usasse a parede que impactou há pouco.

— Qual é a dessa cara, menina? Achei que fosse uma lutadora, mas parece que não tem experiência nenhuma em combate. Que vergonha, uma mulher deve ser perfeita em todos os seus aspectos. Veja só, tenho seios voluptuosos, um rosto bonito, um título nobre e a força. Se continuar sendo patética desse jeito, nunca vai arranjar um noivo.

As palavras da oponente não fizeram muito sentido na mente da garota, ela só podia pensar em levantar para salvar Aqua e todos os outros alunos, mas o seu corpo não obedecia.

“Droga… eu devia… ter treinado um pouco mais…” Esse pensamento repetia-se desde o início da luta, mas lamentar-se nesse momento não mudaria o resultado da batalha, ou melhor, do massacre.

A visão turva e a dor no estômago fizeram-na não perceber que rastejava pelo chão. Enfim, ao ver o olhar de desprezo que Leviathan ford Ingrid dava-lhe enquanto ia em direção a Aqua, percebeu algo:

“Eu fui… arrogante?”

O seu pai, o antigo líder do clã Sophiette, recusava-se a lutar por odiar o derramamento de sangue, mas havia uma diferença entre ele e sua filha: mesmo tendo lutado diversas vezes, foram raros os casos que o senhor Sophiette foi atingido.

Sophia engrandeceu-se demais, repetiu tantas vezes “eu odeio lutar e matar sem motivos”, que acreditou realmente que conseguiria matar alguém facilmente se iniciasse um combate, vencer em seus combates simulados contra o tio ou humilhar Edward só inflaram o seu ego.

Apesar do corpo começar a perder os sentidos, podia sentir lágrimas escorrendo do seu rosto e tocando o solo. A visão turva ainda captou quando Leviathan destruiu a defesa de Lysandra com um único golpe e, após arremessar a jovem de cabelos prateados, pegou Aqua.

Essa cena lhe lembrou algo importante que Eliezer disse-lhe certa vez: “Nós não treinamos apenas para machucar, Sophia. O mundo perfeito que você acredita não existe, sempre existirão aqueles que usam a sua força para o mal, e, se você não for forte o suficiente quando essas pessoas ameaçarem seus amigos ou sua família, só poderá sentar enquanto assiste ele destruindo tudo o que você tem.”

Por que não refletiu nessas palavras? Sempre ignorava tudo o que seu tio dizia, achava estúpido a guerra e o que ele chamava de “dever de um Sophiette”. 

“O dever de um Sophiette não é machucar, mas sim defender.” E com essas últimas palavras de Eliezer ressoando no interior da sua mente, apagou.

— Bom dia. Você é a Maria, certo? — uma garota perguntou à empregada varrendo a entrada da mansão.

— Sim, e quem seria você, senhorita?

Ah, desculpa aparecer sem avisar, eu sou Lysandra Ravenscroft, serva da casa Nightshade… eu desobedeci minha mestra e vim até aqui para ver como está a Sophia…

— Entendo, suponho que você seja uma das crianças envolvida no incidente de Nova Canaan, certo? — Maria lançou um olhar gentil em direção à garota. — No mês passado tivemos a visita do jovem Cedric e de um garoto misterioso, eles trouxeram presentes para a Sophia, mas não quiseram vê-la, alguns desejam esquecer tudo aquilo…

— O senhor Eliezer pediu para que não visitassem a senhorita Sophia até ela estar totalmente recuperada do que aconteceu, mas eu não consegui resistir, desculpe se estou incomodando.

— Já faz três meses… Sophia nunca mais foi a mesma depois daquele incidente.

— Ela está muito abatida? Talvez de cama? A senhorita Elara disse que nunca mais vai entrar em uma masmorra, só pensar nisso faz o corpo dela tremer.

— Na verdade… — Maria deu um suspiro. — Acho que seria mais interessante se você visse com os seus próprios olhos, talvez isso também faça você refletir um pouco. — A empregada apontou para um corredor no lado esquerdo da mansão.

Sem questionar, Lysandra seguiu-a. A construção rosa tinha três andares, mas se não entraram, significava que a jovem Sophiette estava do lado de fora, talvez tomando chá ou lendo livros em uma mesa embaixo de uma árvore? 

— Quando eu e a senhora Sophys chegamos de viagem, nos deparamos com o senhor Eliezer pedindo desculpas sem parar, achamos que era exagero o que ele dizia sobre Sophia… mas nos surpreendemos quando vimos a menina.

— Então a senhorita Sophia vive com a mãe?

— Não mais… ver ela daquela maneira fez a senhora Sophys perceber que já era hora de tornar sua filha independente, mas como a menina é a líder do clã Sophiette, ela ficou na mansão e a sua mãe seguiu para a região do ducado de al Mare. É irônico, na nobreza, a mãe que vai embora de casa se tiver menos poder que o filho quando ele se emancipa.

Uma menina sofrendo de um trauma irreversível e sem a mãe, a senhora Sophys não podia ter feito isso! Lysandra só ficava cada vez mais preocupada com a garota.

Ao aproximar-se do fim do corredor, escutou uma respiração ofegante, podia dizer que era a de uma garota, provavelmente a mesma garota que foi visitar. Ela acelerou o passo sem esperar a empregada, Sophia devia estar chorando como Elara, então podia dar um tratamento igual à jovem: um abraço, dizer que estava tudo bem e que não precisava mais se culpar pelo que aconteceu…

Lysandra pensava realmente que a garota Sophiette estava sofrendo e precisava de um ombro amigo, mas tudo o que pensou caiu por terra ao ver aquela cena. Seus olhos se arregalaram e o seu corpo ficou paralisado.

— Só existem duas escolhas a se fazer após uma experiência traumática como aquela, — Maria, logo atrás da serva de Elara, começou em um tom maternal — deixar o desespero tomar conta e isolar-se para isso nunca mais acontecer, ou…

“Ficar forte para lidar com a situação, se ocorrer novamente.” A empregada de Sophiette não precisou terminar seu diálogo, Lysandra entendeu ao ver a cena à frente.

Sophia tinha os cabelos rosados amarrados em um rabo de cavalo, a única roupa usada era uma calça folgada negra e várias bandagens no busto para segurar os seus seios em desenvolvimento.

— Quinhentos… — Os murmúrios escutados anteriormente eram nada mais que os sussurros da garota contando. — Quinhentos e um… quinhentos e dois… — A cada novo suspiro, o corpo sustentado pelos punhos fechados da jovem tocando a grama subia e descia, contraindo os músculos.

Fazia apenas três meses desde o incidente e a garota não era alguém que treinava muito, mas seu corpo já estava tão desenvolvido que ela conseguia realizar flexões de punho sem o apoio dos pés no chão. 

— Ela está treinando incansavelmente desde aquele dia…

Os olhos de Lysandra arregalaram-se com a cena. Achou que devia se esconder no medo após tudo aquilo, em sua mente, estaria tudo bem se Elara se isolasse e desistisse de sua vida no campo de batalha.

Estava errada.

Um grito de fúria foi escutado quando a jovem caiu no chão de joelhos, porém Sophia permaneceu inabalável, continuando a sua contagem. — Quinhentos e quinze... quinhentos e dezesseis…

As lágrimas da serva de Elara era por conta do quão patética esteve agindo, como podia ser chamada de empregada se apenas alimentava o medo que a sua mestra tinha? Com ódio, esticou o corpo no chão e apoiou os punhos contra o chão, antes de olhar para a líder do clã Sophiette e gritar:

— Senhorita Sophia, sei que pode ser pedir muito, mas eu quero treinar com você!

A jovem Sophiette simplesmente deu um sorriso satisfeito e, levantando-se e limpando o suor, aproximou-se de Lysandra. Aspalavras da serva de Elara eram suficientes para transmitir suas intenções.

— Irei preparar um lanche para quando vocês terminarem seus exercícios — Maria comentou com o seu sorriso maternal. — Parece que finalmente entendeu as palavras do seu tio. Você cresceu muito, Sophia — a empregada murmurou antes de desaparecer pelo corredor.






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