Raifurori Brasileira

Autor(a): NekoYasha


Volume 3

Capítulo 177: Tu, Que Confrontas O Destino

Uma densa energia escura vazava do interior de Kurone. O Sigilo de Azrael brilhava em um roxo intenso, aquela tatuagem começou a percorrer o pescoço do garoto, atravessando a pele e parando bem próximo ao olho esquerdo. A impressão que passava era que ele tinha veias violetas visíveis.

Os olhos do jovem também ganharam um tom arroxeado forte, brilhante, o que fazia com que ninguém tivesse coragem de encará-lo. A cada minuto, seu manto formado pela escuridão com labaredas roxas aumentava, assim como a pressão do local.

— A Luminus morreu… de novo?!  — vociferou a entidade que assumiu o corpo de Kurone. 

O trêmulo Lao Shi foi ao chão, ficou de joelhos, mas em nenhum momento ele ousou desviar sua atenção daquele ser poderoso. 

Aquele era um acontecimento que ele jamais imaginaria, como poderia prever que o primeiro Vassalo da Morte residia oculto no corpo daquele jovem patético?

Hime fez menção de sacar sua longa espada, mas o Arquifeiticeiro fez que não com a cabeça, seria suicídio tentar fazer qualquer coisa contra ele. 

A melhor estratégia ali era conversar, como fugir estava fora de cogitação, já que eles foram isolados naquela escuridão. 

Se a alma de Kurone Nakano ainda habitava aquele corpo, talvez poderiam tentar trazê-lo de volta com um diálogo sentimental… Lao Shi queria realmente acreditar que aquilo funcionaria, pois era a sua única alternativa.

— Este mundo não merece o meu perdão por fazer a Luminus sofrer, dizimarei todos os seres viventes para que ela possa descansar em paz! A começar por você, feiticeiro covarde e traidor, darei esta regalia ao menino Kurone Nakano, deceparei sua cabeça com as minhas próprias mãos! — rugiu o Vassalo.

Sim, era a primeira vez que Lao Shi, o homem conhecido por ser o único humano vivo com o poder próximo ao de uma divindade, sentia medo.

Quando era mais novo, o Arquifeiticeiro escutava histórias sobre o temível Vassalo da Morte, o discípulo do Anjo Caído Azrael. 

Apesar de ser misterioso, era de conhecimento geral que ele mantinha um ódio mortal pela humanidade.

Ninguém sabia exatamente o motivo pelo qual ele aceitou a mão do neto de Astarte e tornou-se um Vassalo ou como morreu, mas para o último caso a resposta estava ali à sua frente: ele não morreu, escondeu-se por tantos anos no corpo de um jovem incomum, afinal só alguém como Kurone para carregar aquele ser no seu corpo sem cair na insanidade.

Foi um erro terrível ter citado o sobre o suicídio da Reencarnação de Astarte. 

Quando Kurone o perguntou sobre o que acontecera em Eragon, Lao Shi pensou em contar sobre a garotinha chamada “Rory”, mas decidiu manter isso em segredo ao perceber que aquilo não faria bem ao jovem.

O que aconteceria se ele contasse a verdade a Kurone naquele momento? O Vassalo da Morte teria aparecido também? 

Talvez pudesse ter evitado tudo isso, pois o ser só surgiu devido à fúria do jovem por conta dos últimos acontecimentos. 

Asmodeus di Laplace e Lou Xhien Li se foram bem na frente de Kurone, e Lao Shi ainda decidiu provocar o jovem com a verdade, era a primeira vez que ele se arrependia de uma ação sua.

Mas como podia saber que o Vassalo da Morte teria algo a ver com a Reencarnação de Astarte?

Suor escorria pela testa de Lao Shi, sabia que bastavam poucos movimentos para aquele ser envolto por trevas matá-lo. Ele também ainda não estava totalmente recuperado dos últimos esforços.

— Porra! Quem foi que te deu o direito de pegar meu corpo assim?! — gritou uma voz conhecida. 

Apesar do som vir do corpo emanando energia negra, aquele tom delinquente e jovem destruía todo ar medonho passado pelo corpo.

“O Kurone está tentando recuperar o controle mesmo?!”, pensou o Arquifeiticeiro com espanto. Sim, aquele era realmente um jovem incomum, alguém capaz de confrontar até mesmo o controle de um Vassalo da Morte.

— Silêncio, criatura tola, — o Vassalo retomou o controle da fala, sua voz era grossa, sombria e envolta por ódio — você e sua deusa já não têm mais utilidade, fiquem quietos e eu permitirei que vislumbrem o caos e a desordem que trarei a Niflheim. Luminus está morta, então cabe a mim o dever de cumprir o meu propósito de destruir este mundo podre e recomeçá-lo… É o que Ryuu Toshiro chamara de “Missão Raifurori”! A libertação total da alma condenada de minha pequena irmão Luminus!!

— Eu não vou deixar, porra! Nem que eu precise me matar pra te impedir! — Kurone retornou e, para provar que falava sério, ele materializou sua escopeta de canos cerrados e a direcionou à própria cabeça.

— Criatura tola! Você não sabe de nada, é apenas um Irregular que serve como uma casca para conter o meu poder! Você nem existiria se não fosse pela deusa Annie!

Um sorriso de alívio apareceu no rosto de Lao Shi, pois o alvo do Vassalo agora era Kurone que, diferente do Arquifeiticeiro, não estava naquele mundo. 

O jovem só precisava ser forte para recuperar o seu corpo.

— Como isso é possível?! — perguntou Hime, os músculos da mulher loira estavam tensos devido ao medo.

— Parece que não conhecíamos o garoto como pensávamos, minha cara. Certamente a alma de Kurone está ligada a um mundo inalcançável para nós, o Seol dele serve como um receptáculo para todo esse mundo.

— Tá querendo dizer que tem um mundo dentro dele?!

— Não um mundo propriamente, minha cara, mas uma porta, e ele é a chave para abrir esta porta quando quiser. É inacreditável, mas Kurone é o que liga o Domínio do Vassalo da Morte ao nosso mundo — explicou Lao Shi. — Matá-lo não adianta, pois o Vassalo poderá encontrar outra chave e retornar ao nosso mundo.

— Então… — Hime olhou pensativa para o corpo em que duas vozes com tons diferentes discutiam entre si. 

— A porta está aberta e o garoto precisa fechá-la para recuperar o controle do seu corpo.

— Tá com medo é, desgraçado?! — gritou a voz de Kurone. 

— Então precisarei cuidar de você primeiro antes de destruir todo este mundo — respondeu a do Vassalo.

Após a última fala da voz grossa e sombria, houve uma explosão e a densidade das sombras aumentou. 

Ninguém preso naquele mundo paralelo envolto de trevas pôde se mover, afinal o tempo parou ali.

***

— A-acho que conseguimos atrair ele pra cá, Nie… — comentou Kurone. — E agora?!

Assim que o seu corpo foi tomado pela entidade que era o Vassalo da Morte, ele foi jogado para aquele pequeno mundo no fundo da sua mente, onde vivia Annie.

A deusa tinha olheiras pesadas no rosto de tanto chorar após a morte de Lou Xhien, mas agora a tristeza deu lugar ao ódio, era a primeira vez que o jovem via a garota com raiva.

O mundo onde estavam era, assim como o exterior, completamente coberto por trevas, e estas trevas provinham das rachaduras do céu. 

Kurone sempre via aquelas rachaduras e pensava que, um dia, algo ruim aconteceria envolvendo elas, só não imaginava que isso ocorreria tão cedo. 

Uma luz arroxeada surgiu no céu tomado pelas sombras e uma figura projetou-se. O jovem arregalou os olhos ao ver a aparência do ser descendo lentamente. 

Ele era uma versão adulta do Kurone, todos os seus cabelos eram negros e cobriam seus olhos, assim como o penteado anterior do jovem.

As roupas do ser que chegou ao chão naquele momento eram as mesmas do jovem: o conjunto branco costurado por Lou Xhien. 

Era como se Kurone visse ele mesmo do futuro, porém em uma versão sombria e emanando a maior vontade assassina que já viu na vida.

Annie tremeu ao ver aquele ser, pois além de uma vasto manto formado por trevas o seguir, as vozes insanas também o acompanhavam… pois eram pronunciadas por ele.

E Kurone finalmente percebeu, as vozes de loucura que o induziam a cometer atrocidades desde a infância eram as daquele homem. 

Desde a tenra idade, esteve andando ao lado de um Vassalo da Morte. Ele sentiu um leve incômodo ao pensar que podia estar sendo manipulado por todo esse tempo.

Qual era o sentido da sua vida, afinal? 

Segundo o que Annie dissera, ele nem devia ter nascido, mas sua alma surgiu da súplica daquela deusa aprisionada, e então o jovem nasceu com o único objetivo de matar Annie para livrá-la da aflição eterna que sofria no Hangar dos Mortos.

Mas, desde o seu nascimento, um Vassalo da Morte sussurrava-lhe coisas estranhas, imaginou que se ignorasse aquilo desapareceria, mas, então, veio o seu pai com aquele experimento doentio e injetou drogas nele sem piedade, fazendo com que as vozes aumentassem.

— Kurone, deixa para pensar depois, agora nosso foco é outro — falou Annie segurando a mão do garoto.

Ele ainda nem havia se recuperado da última batalha, na verdade na mente do garoto tudo aconteceu há poucas horas, mas já estavam prestes a enfrentar um inimigo com um poder ainda maior que o de Mamon von Faucher.

Assim que o garoto assumiu uma posição de batalha, a Máscara Infernal apareceu em seu rosto. Aquilo podia não ser muito considerando a força do inimigo, mas tentaria lutar.

No entanto, outro clarão tomou o céu antes que eles pudessem fazer qualquer movimento. A mente de Kurone estava realmente cheia naquele dia!

Um ser de pele branca, olhos negros de pupilas amarelas e asas pretas pairou pelo ar e aterrissou entre Kurone e Annie e aquele ser que assumia o corpo do jovem.

Assim que constatou quem era aquele outro, o Vassalo ficou de joelhos, enquanto a dupla lançou um olhar hostil para ele. 

Lá estava o provável responsável por tudo: o anjo demoníaco de asas negras, o neto de Astarte: Azarel.

— Lamento por atrasar-me, mas aliviado estou por saber que ainda não tiveram contato — falou o Suserano da Morte. — Se vós não quiserdes desaparecer desta linha temporal, sugiro que não façais contato físico, ou tornar-se-ão nada mais que cinzas.

Kurone estremeceu ao escutar aquilo. 

Ele poderia ser apagado da existência se tocasse o outro ser que tinha um rosto semelhante ao seu?

— Meu Suserano, esta criatura ridícula se recusa a desistir do controle do meu receptáculo — falou o Vassalo.

— Ainda não é hora, meu querido Vassalo, ainda não. Entendo tua fúria e vontade de destruir tudo e todos, mas por enquanto nada poderás fazer enquanto Kurone Nakano lutar contra o próprio destino e alterar o fio temporal deste mundo instável. Oh! Tu me excitas ao desafiar com unhas e dentes a própria morte, menino que carrega tantos fardos.

Kurone não entendia quase nada do que era dito ali, mas uma coisa era certa: Azrael tentava negociar com o Vassalo. 

Poderia até mesmo o Suserano da Morte temer o próprio servo?



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