Raifurori Brasileira

Autor(a): NekoYasha


Volume 3

Capítulo 157: Novos Orcs

Kurone descia as escadas rapidamente quando viu a figura de Lou Xhien no primeiro andar. A garotinha estava inquieta, batendo o pé e com o rosto um pouco corado.

— Aí está você… — Ela examinou o jovem, ele estava com o cabelo desarrumado e um pouco sonolento. — Você já vai dar início ao plano?

— S-sim, tô um pouco nervoso, mas vou conseguir — ele falou um pouco sem jeito. Ver aquela menina o fez sentir-se culpado pelas últimas horas agitadas que teve com Inari, seu rosto tinha olheiras leves por não ter dormido quase nada.

Assim que desceu as escadas, notou que Lou Xhien mantinha as mãos escondidas nas costas e olhava para ele de um jeito incomum. Enfim, quando passaram dois minutos sem falar nada, a menina rompeu o silêncio:

— I-isso é para você… — ela disse com o rosto vermelho de vergonha virado para o lado, sem fazer contato visual com o garoto que recebia o seu presente. — Eu não consegui fazer como era antes, mas me esforcei muito, espero que saiba disso.

Kurone pegou o objeto das mãos da menina. Era um tecido branco de textura familiar. Não podia estar enganado, era ele mesmo, afinal passou muito tempo andando com aquela roupa no Continente Ocidental. 

Lou Xhien passou todo aquele tempo costurando a sua antiga roupa de Santo, por isso ela não queria que ele visse, era um presente. Apesar do tecido ser o mesmo, a roupa estava diferente, principalmente na parte superior.

A calça branca continuava a mesma, assim como a camisa esbranquiçada interna, o que mudou, na verdade, foi o que vestia por cima. Antes, ele usava um manto branco com propriedades mágicas que o protegeu em momentos de apuro, mas aquele manto foi substituído por um sobretudo que chegava à altura do seu joelho.

Segundo Hime, quando ele chegou ali, desacordado e sem o braço esquerdo, já estava sem o seu fiel manto mágico, provavelmente o perdeu em Eragon, pois era um material muito resistente para rasgar como a calça ou a camisa interna.

Suas mãos tremeram ao vislumbrar aquele conjunto branco, era uma roupa nostálgica que o lembrava de que nunca exerceu seu título de Santo realmente. Inconscientemente, ele abraçou Lou Xhien e agradeceu-a por reparar algo tão valioso.

— N-não precisa agradecer! — a menina gritou ao ser surpreendida por um abraço do jovem. — Você precisa vestir para ver se está na medida certa!

Rapidamente, Kurone subiu as escadas para vestir a roupa. Quando retornou, ele estava caminhando devagar, olhando cada centímetro da nova roupa.

— E então, como estou? — perguntou analisando as mangas longas do sobretudo. O seu cabelo foi preso por uma fita vermelha por conta do tamanho.

No último mês, ele começou a crescer descontroladamente. Tinha o tamanho do cabelo de uma mulher e as mechas brancas persistiam nas pontas. Quem mais adorava aquele cabelo era Inari, pois ela podia brincar a vontade de cabeleireira, os dois coques que usava no dia anterior foi ideia da deusa.

As pessoas daquele mundo podiam controlar tanto o crescimento do cabelo quanto das unhas, mas isso necessitava de muita mana, o jovem não teve folga enquanto treinava para se concentrar nisso, por isso seu cabelo chegou àquele tamanho.

— Acho que precisa aparar um pouco do cabelo — comentou Lou Xhien. — Fique de joelhos ali.

O jovem obedeceu e ajoelhou-se no local ordenado. 

Com uma pequena tesoura afiada, que a garotinha usou para dar os toques finais na nova roupa de Kurone, ela começou a cortar o cabelo grande do jovem. Ficaram pelo menos cinco minutos ali, até que finalmente o cabelo havia retornado ao seu estado usual, nem muito grande e nem pequeno.

Uma mudança visível foi que a franja que cobria os olhos do jovem foi removida. Kurone ficou tonto por um momento, fazia anos que ele usava aquele corte que escondia seus olhos relativamente bonitos.

— Eles são muito bonitos para você esconder — falou a garotinha guardando a tesoura.

O jovem lembrou-se que outras pessoas disseram isso antes: sua irmã, sua mãe e Luna. Rory uma vez comentou algo, mas foi apenas uma piada sobre o estilo estranho dele.

Ele passou os dedos pela franja baixa algumas vezes, quase não acreditando que agora quase todo o seu rosto estava visível.

— Bem, bem, não temos tempo a perder, está chegando a hora… Boa sorte, Kurone — murmurou Lou Xhien subindo as escadas.

Ao lembrar-se da responsabilidade que tinha, o garoto levantou-se rápido e correu, atravessando o enorme torii que saudava os visitantes do templo, a pequena ponte onde as água do laguinho abaixo foram divididas por Lao Shi na noite anterior, e subir a escadaria que levava à parte superior da ilha.

Nunca sentiu as pernas tão pesadas como naquele dia, parecia levar uma eternidade para subir as escadas. Enfim, ele parou para descansar ao pisar no último degrau e parar em frente ao templo de meditação de Lou Souen.

Quem o aguardava meditando em uma das pedras era o seu mestre, Lao Shi. Apesar de ser o dia que iniciaram o ataque ao Arquiduque do Inferno, ele mantinha sua usual expressão calma.

— Gostei do corte de cabelo, — ele comentou saltando da pedra — realça seus olhos. Está pronto?

O nervosismo era muito grande para ele dizer algo, então apenas afirmou com a cabeça. Lao Shi estalou os dedos respondendo “perfeito” e ambos seguiram para a parte mais elevada daquela da ilha, atravessando a densa floresta de arbustos e árvores de folhas rosadas.

O chão produzia barulho conforme andavam por conta da imensa quantidade de folhas secas. Lou Souen explicara que aquelas árvores eram vivas e folhadas o ano inteiro, pois a cada folha que caía, outra nascia no lugar rapidamente. Para os habitantes do Continente Oriental, aquelas árvores eram o símbolo da imortalidade.

Kurone e Lao Shi pararam quando estavam bem distantes, em uma clareira repleta de folhas. O Arquifeiticeiro começou:

— Quando a Barreira d’Água for desfeita, uma anomalia de mana vai tomar conta do ar, mas isso será o de menos se comparado ao estrago que você fará. Terá cinco minutos para recuperar a mana e usar a sua técnica.

[Não fique tão nervoso, nós vamos conseguir!]

Kurone assentiu com uma expressão séria e fechou os olhos, suspirando lentamente.

O homem ao lado dele afastou-se e levantou as mãos, fazendo pequenas gotículas de água espalharem-se pelo cenário. O jovem podia sentir a energia mudando ao seu redor, era a tal anomalia explicada pelo seu mestre.

A camada cinza que cobria todo o céu da ilha foi desaparecendo gradualmente e o garoto sentiu poder soprando por todos os lados. A sensação da mana adentrando aquele local isolado era semelhante à de quando se abria a janela do carro abafado e o vento gelado e rápido tocava sua face. 

Ele concentrou-se para reunir mana em seu corpo. O seu atributo de reabastecimento de mana começou a trabalhar. Internamente, Annie tinha o trabalho de distribuir a energia vital nos locais mais importantes da sua alma e corpo.

Partículas azuis surgiram ao redor do garoto. Lao Shi não pôde deixar de assistir impressionado à cena daquele garoto absorvendo a força vital, ele ainda ficava impressionado com o fato da velocidade de absorção dele ser maior que a de devolução, sem falar em seu armazenamento interno que suportava uma quantidade extraordinária de mana.

Para Kurone, cinco minutos passaram-se voando e ele foi obrigado a abrir os olhos novamente, encarando o mestre uma última vez antes de esticar as mãos à frente. Podia sentir todo o corpo tremendo de excitação e pavor. Precisava se esforçar para que aquilo funcionasse!

A Marca da Besta que serpenteava o seu braço artificial esquerdo brilhou em um azul reluzente, fazendo o membro do jovem arder devido ao fluxo de mana agitado no local.

Aquela era uma técnica que não necessitava de encantamento ou qualquer outra coisa, mas ele decidiu gritar com todas as suas forças, na esperança de que um entoamento o desse mais força. Entoar o nome do feitiço era como o “kiai”, algo obrigatório que exteriorizava a vontade da sua alma, liberava a mana e a convertia em um ataque mágico.

Apesar de ser imune àquela regra, ele gritou com todas as forças que as suas cordas vocais permitiam. Todos os pelos do seu corpo eriçaram com a vibração do seu rugido:

— Convocação de Orcs!!!

Um clarão amarelo explodiu no céu e tocou o chão, obrigando Lao Shi a fechar os olhos. 

Energia vital emanava por todo o ar, e as folhas secas espalhadas pelo chão foram todas varridas ou pulverizadas pelo força do golpe. Apenas Kurone encarava o clarão de frente, forçando ainda mais a saída de mana para o exterior.

Do interior da luz amarelada, começaram a surgir vultos negros de criaturas humanoides. Um grito de guerra podia ser escutado reverberando pelo ar caótico da floresta.

Enfim, Kurone chegou ao seu limite e caiu de joelhos, pedindo internamente que a sua técnica tivesse funcionado. Ele apoiou as duas mãos no chão, ofegando como nunca, suor escorria de todo o seu rosto.

Na sua mente, também podia escutar Annie arfando, aquilo também forçava a deusa conectada à sua alma.

Ele ficou surpreso ao sentir uma mão tocando as suas costas e a voz que veio a seguir:

— O senhor está bem?

Ao olhar para cima, viu a figura de um orcs jovem, com o cabelo tirado dos lados e um coque prendendo o que sobrou na parte de cima. Nas costas do jovem monstro, havia um machado de tamanho razoável.

— Meu caro, acho que você conseguiu — comentou Lao Shi passando as mãos nos olhos devido à intensidade da luz. O homem apontou para o exército de monstro na frente do discípulo.

Kurone arregalou os olhos. Tinham pelo menos trinta orcs ali, cada um com o seu próprio estilo e arma, mas uma coisa era comum em todos: armaduras vermelhas e pretas ao estilo samurai.

— Conseguimos! Nós conseguimos! — gritou com a voz rouca, o último rosnado que quase destruiu suas cordas vocais e deixou a garganta ardendo como se acabasse de tomar o conteúdo de todo um frasco de pimenta.

[Sim, Kurone, nós conseguimos. Estamos cada vez mais próximos de vencer esta batalha!]

Quando o jovem contente ficou de pé, todos os orcs, incluindo o jovem ao seu lado, ficaram de joelhos, olhando para ele com extremo respeito, algo que o fez ficar desconfortável, mas ignorou aquilo e levantou o braço em uma posição de vitória, o gesto foi seguido pelo grito de guerra de alguns dos monstros, eles podiam ver a chama da batalha ardendo nos olhos daquele garoto que os convocou.



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